A Auditoria da Dívida Pública e os programas oficiais de governo dos presidenciáveis

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Rodrigo Ávila – Economista da Auditoria Cidadã da Dívida

Durante os últimos meses, a Auditoria Cidadã da Dívida divulgou amplamente e encaminhou aos presidenciáveis a “Carta Aberta à População”, com o objetivo de instruir a população a cobrar dos candidatos o seu posicionamento sobre a auditoria da dívida pública, e estimulá-los a incluir o tema nos respectivos programas de governo. Agora, encontram-se na página do Tribunal Superior Eleitoral todos os programas oficiais encaminhados pelos candidatos, o que nos permite uma análise mais nítida do posicionamento dos mesmos sobre a questão.

A candidata Vera Lucia (PSTU) respondeu a Carta Aberta da Auditoria Cidadã da Dívida, concordando com todos os seu itens, tais como:

“Reivindicamos a realização da auditoria da dívida pública – prevista no art. 26 das Disposições Transitórias da Constituição Federal de 1988 – que é fundamental para se obter a necessária transparência sobre o maior gasto do orçamento federal (juros e amortizações da dívida), que consome, todo ano, quase a metade das despesas federais, comprometendo também as finanças de estados e municípios. Consideramos que o conhecimento possibilitado pela realização da auditoria da dívida pública – com participação da sociedade – será fundamental para as decisões da política econômica do país, de modo a inverter a correlação de forças entre os gastos financeiros (que favorecem principalmente grandes rentistas nacionais e estrangeiros) e os investimentos sociais, aos quais a população brasileira tem direito, de acordo com o art. 6º da Constituição, mas não têm sido respeitados.”

Em seu Programa oficial entregue ao TSE, Vera Lucia defende: “Suspensão do pagamento da dívida e auditoria! As dívidas interna e externa constituem um dos principais mecanismos de subordinação do Brasil aos países ricos, seus bancos e empresas. É um verdadeiro duto que, anualmente, escoa algo como 40% do orçamento federal a um punhado de grandes banqueiros. É impossível mudar de fato o país sem acabar com essa agiotagem. É preciso suspender o pagamento da dívida, abrir essa caixa-preta e realizar uma auditoria. O fim do pagamento da dívida é condição primeira e fundamental para se investir em saúde, educação e emprego.”

O candidato João Vicente Goulart (PPL) também respondeu a Carta Aberta da Auditoria Cidadã da Dívida, se comprometendo em realizar a auditoria da dívida e concordando, por exemplo, com a afirmação, constante da Carta, de que “existem ilegitimidades em uma dívida “pública” surgida a partir de vários mecanismos fraudulentos e sobretudo de abusivas taxas de juros estabelecidas sob a falsa justificativa de combater a inflação, que na realidade decorre de preços administrados pelo próprio governo e outras variáveis que não guardam relação alguma com a taxa de juros.” Em seu Plano de Governo, Goulart propõeReduzir ao patamar internacional os juros reais (juros nominais menos inflação), especialmente a taxa básica (Selic) que remunera os títulos emitidos pelo governo.”

Os demais candidatos não responderam a Carta Aberta da Auditoria Cidadã da Dívida e em seus respectivos programas de governo assumiram os seguintes compromissos relacionados ao tema:

O candidato Guilherme Boulos (PSOL/PCB), em seu programa oficial, sobre a dívida pública, fala na “Realização de auditoria”, porém essa auditoria serviria “para evitar novos contratos lesivos ao povo brasileiro junto a instituições financeiras”. Ou seja, a auditoria proposta por Boulos seria voltada apenas para a prevenção de problemas futuros, deixando de enfrentar as inúmeras provas de irregularidades e até fraudes na formação da chamada dívida pública, que tem comprometido anualmente quase a metade do orçamento público federal e tem sido usada como justificativa para contrarreformas, corte e congelamento de gastos sociais e privatizações. Em seu Programa, propõe a redução na taxa de juros e “Mudança no perfil da dívida pública federal visando o alongamento de prazos, a eliminação da indexação dos títulos emitidos às variáveis macroeconômicas SELIC, inflação e câmbio e, assim, a redução do pagamento de juros sobre a dívida e seu caráter concentrador de renda”.

O candidato Lula (PT/PCdoB/PROS) não fala em auditoria, e defende o pagamento da dívida mediante mudança das regras fiscais, que significa aumento na arrecadação tributária e redução nos juros: “A reforma nas regras fiscais deve garantir a melhoria dos serviços públicos e a expansão dos investimentos, ao mesmo tempo em que recupera a capacidade de financiamento do Estado de bem-estar social, invertendo a atual trajetória da dívida e gerando resultados fiscais robustos.” Para a dívida dos estados, propõe “o abatimento da dívida dos estados em conformidade com a aplicação dos atuais indexadores da dívida para o saldo devedor”, sem explicar exatamente como se daria tal abatimento.

A candidata Marina Silva (REDE/PV) também não fala em auditoria, e também defende pagar a dívida mediante reformas fiscais: “A eficiência na gestão do orçamento disponível, dirigindo os recursos para as reais prioridades da população, com combate sem tréguas à corrupção e a evasão fiscal, nos possibilitará fazer mais com menos. Esse é o caminho para, associado à queda dos juros básicos, promover um ajuste fiscal que permita que a trajetória Dívida/PIB se estabilize.”

O Programa oficial de Ciro Gomes (PDT/AVANTE) também não fala em auditoria. Fala em redução de juros e mudança no perfil dos títulos: “Compromisso com a redução da taxa de juros básica (Selic) em compasso com a realização do ajuste fiscal; Redução da indexação no mercado financeiro, através da substituição gradual da participação de Letras Financeiras do Tesouro, corrigidas pela Selic, por títulos prefixados no financiamento da dívida”.

O Programa oficial de Álvaro Dias (Podemos, PSC, PRP, PTC) cita apenas o termo “Revisão do custo de rolagem da dívida pública”, sem explicar como se daria esta revisão, enquanto Cabo Daciolo (PATRIOTA), apesar de reconhecer que “o  Brasil possui uma elevada taxa de juros; elevada dívida externa e principalmente, uma dívida interna em níveis alarmantes”, apenas propõe “fazer uma reformulação das diretrizes macroeconômicas aplicadas no cenário nacional a fim de melhorar os resultados dos indicadores.”

José Maria Eymael  (DC), apesar de defender uma “Auditoria independente das contas públicas”, nada fala sobre a questão da dívida pública.

Geraldo Alckmin (PSDB / PTB / PP / PR / DEM / SOLIDARIEDADE / PPS / PRB / PSD) e  Henrique Meirelles (MDB / PHS) nada falam sobre o tema da dívida pública em seus programas oficiais, registrados no TSE.

Já o candidato Jair Bolsonaro (PSL / PRTB), além de não questionar o endividamento, ainda propõe a venda do patrimônio público para o pagamento da dívida, com a seguinte proposta: “Desmobilização de ativos públicos, com o correspondente resgate da dívida mobiliária federal. Estimamos reduzir em 20% o volume da dívida por meio de privatizações, concessões, venda de propriedades imobiliárias da União e devolução de recursos em instituições financeiras oficiais que hoje são utilizados sem um benefício claro à população brasileira.”

O candidato João Amoêdo (NOVO) também defende o pagamento da dívida pública por meio da redução do Estado, mais especificamente por meio da redução dos gastos sociais: “Reduzir o déficit público, obter superávit e reduzir a dívida pública (…) Centrar a atuação do Estado nas suas funções essenciais: saúde, educação e segurança pública.”

Portanto, diante dessas posições registradas no TSE, verificamos que é preciso que a população divulgue ainda mais a “Carta Aberta à População” e cobre de seus respectivos candidatos, para que estes avancem em relação ao conhecimento do tema do endividamento público e avancem em relação aos seus compromissos pela realização da necessária auditoria da dívida pública, com participação social.