Especialistas apontam ilegalidades e imoralidades do projeto de securitização da dívida

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Ilegalidades e comprometimento das Finanças Públicas: Esta foi a tônica dos depoimentos de especialistas à CFT durante Audiência Pública sobre o projeto de “Securitização de Créditos”: Em mais uma atividade para alertar parlamentares sobre os riscos embutidos no PLP
459/2017, professores, juristas, procuradores e auditores participaram, nesta terça-feira (14), de audiência pública na Comissão de Fiscalização e Tributação na Câmara dos Deputados, onde criticaram o projeto que quer securitizar créditos.

A coordenadora nacional da Auditoria Cidadã da Dívida mostrou que o texto do projeto está cifrado e não permite o entendimento do enorme dano às finanças públicas que está por trás dessa verdadeira engenharia financeira. Mostrou diagramas desenvolvidos em base a
investigações e documentos, inclusive durante a CPI da PBH Ativos S/A em Belo Horizonte, que permitiu comprovar o desvio de recursos arrecadados de contribuintes durante o seu percurso pela rede bancária; a transferência do fluxo da arrecadação e a perda de controle sobre esta; a geração ilegal de dívida pública e o enorme prejuízo aos cofres públicos (Veja telas).

Para ela, falsa propaganda tem sido veiculada no sentido de que o projeto possibilitaria venda de créditos podres, de difícil arrecadação, mas na verdade o que está sendo vendido é o fluxo da arrecadação, ou seja, o dinheiro que já caiu no banco!
“O recurso desviado sequer alcançará os cofres públicos e será pago por fora a especuladores, o que representa um desrespeito a toda legislação de finanças do país, que é estruturada com base no orçamento único”, ressaltou.

Como se não bastasse a subtração de recursos do Orçamento Público, alerta Fattorelli, esse esquema ainda gera dívida pública ilegal sem contrapartida ao Estado ao dar garantia real a essas operações de crédito, mais uma ilegalidade, totalmente proibida por toda a legislação financeira do país.
“Significa contratação irregular de dívida pública, que não é contabilizada como dívida mas como venda de ativo, mas na verdade é dívida pública, e é paga por fora com os recursos desviados durante o percurso pela rede bancária”, denuncia.

Ela lembrou que a relevância desse tema levou a Auditoria Cidadã a apresentar interpelação extrajudicial  para notificar os deputados(as) membros da Comissão de Fiscalização e Tributação, sobre os riscos que esse projeto representa, reforçando que futuramente não poderão se eximir de responsabilidade alegando desconhecimento.

Entraves para aumento da arrecadação

O juiz federal e representante da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Renato Lopes, falou sobre os entraves burocráticos do Estado Brasileiro que dificultam a arrecadação e deixam espaço para o surgimento de propostas absurdas como o PLP 459/2017.
“Ninguém compra dívida podre, dívida que nem o Estado consegue cobrar, isso é ilusão. Vocês acham que as instituições financeiras vão correr esse risco?”, ressaltou, lembrando que sem a garantia do Estado, não haveria interesse pela compra desses papéis.

Ele ainda afirmou que o PLP é uma afronta à Lei de Responsabilidade Fiscal e um risco às contas públicas.

Pirotecnia linguística

“Esse projeto propõe a regulamentação da desregulamentação, pois retira do controle e da fiscalização toda normativa financeira nacional”, afirmou o professor e juiz federal, Antônio Gomes de Vasconcelos. Para ele, esse projeto abre espaço para um escoamento de recursos públicos que está na contramão da EC 95 (teto de gastos), que congela gastos sociais e investimentos por 20 anos.
Para ele, a redação do projeto é vaga e obscura, um claro jogo de linguagem para camuflar seus reais propósitos, se esquivando de regras constitucionais.
“Isso é claramente uma operação financeira vedada pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF)”, lembrou.

O professor lembrou que para a criação de uma estatal é preciso haver uma vinculação legal, e, segundo ele, os propósitos dessas empresas não dependentes não se enquadrariam. “Se aprovado, esse projeto estará instituindo uma anarquia financeira no país, o que causa
extrema insegurança jurídica”, reforçou.

 

Sustentabilidade das contas públicas

O presidente da Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite), Juracy Soares ressaltou que além de facilitar meios de cobrar tributos, é preciso que se discuta um modelo tributário mais justo e inclusivo.

“Entendo que os entes federados pressionem pela aprovação de projetos que tragam recursos, mas é preciso pensar em formas sustentáveis de financiamento das necessidades de cada um”, lembrou.

Burla à Constituição

Por que estados e municípios pressionam tanto pela aprovação do PLP 459?

De acordo com a advogada e coordenadora do núcleo São Paulo da Auditoria Cidadã da Dívida, Carmen Bressane, a legislação veda estados e municípios de emitir títulos da dívida local como meio de levantar recursos junto ao mercado financeiro, por isso alguns entes usam uma estatal como “laranja” para realizar uma operação de crédito e pressionam pela aprovação de propostas questionáveis como esse PLP 459, que afrontam toda a legislação vigente no país.
“O PLP 459 quer legalizar a operação de empresas que já estão operando à revelia da legislação”, criticou.

A advogada explicou como a Companhia Paulista de Securitização (CPSec), do estado de São Paulo, vem operando. Inicialmente foi criada uma empresa de fachada, que funciona no mesmo prédio da Secretaria da Fazenda, cujo capital social seria de R$ 355 milhões, valor que foi integralmente aportado pelo estado. Além disso o estado de SP assumiu elevados custos com advogados permanentes e seguros, devido ao enorme risco jurídico das operações sabidamente ilegais.
Essa empresa, segundo Carmen, emite debêntures lastreadas em créditos tributários parcelados, com garantia estatal, juros e atualizações altíssimos.

O custo financeiro da manutenção dessa empresa irá consumir milhões em recursos públicos, que serão pagos pelo estado, caso a CPSec não consiga honrar seus credores.

“O estado garante por meio da entrega do fluxo financeiro de mais de R$ 2 bilhões entregues à empresa na forma de créditos parcelados, ou seja, todo esse gasto para receber antecipado um dinheiro que o ente receberia de qualquer forma, pois no caso de créditos parcelados o
risco é praticamente nulo”, explicou, lembrando que antecipação de receita também é uma prática ilegal.

Só o Estado perde

O presidente do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz), Achilles Frias, afirmou que o projeto cria uma operação de crédito disfarçada, sem qualquer benefício para o Estado, gerando prejuízos de médio e longo prazo.

“Temos uma dívida ativa federal em torno de R$ 2 trilhões em que parte disso são créditos podres. Ocorre que esse projeto não securitiza a parte podre, como dá a entender, e sim a parte mais facilmente arrecadável”, lembra.

O presidente do Sinprofaz ressaltou que o PLP 459 cria um novo mecanismo de especulação, transferindo uma área estratégica do Estado, como a arrecadação tributária, para bancos e o sistema financeiro.

“Essa lei é um emaranhado de dispositivos nebulosos para ludibriar a sociedade e capturar recursos públicos”, destacou.

Ações

O Deputado Félix Mendonça Junior (PDT/BA), autor do requerimento para a realização da audiência Pública, sugeriu que seja elaborada uma “Carta ao Parlamento Brasileiro” a ser distribuída no Congresso Nacional, alertando sobre os riscos e impactos do PLP 459/2017. A
coordenadora da Auditoria Cidadã propôs que o documento também aborde a necessidade de investimento na administração tributária.

O parlamentar afirmou ainda que irá pedir para que o projeto seja incluído na pauta da Comissão de Constituição e Justiça.