Contínuas manobras para privilegiar gastos com a chamada dívida pública
A Livre-docente em Direito Financeiro pela USP, Doutora em Direito Administrativo pela UFMG, com estudos pós-doutorais em Administração pela FGV-RJ, Professora da FGV-SP e Procuradora do Ministério Público de Contas do estado de São Paulo, autora do artigo “PLP 93/2023 frusta federalismo fiscal e custeio dos direitos fundamentais”, Dra. Élida Graziane, faz um resgate histórico das disputas orçamentárias.
A Dra. Élida destaca a tendência histórica da União de concentrar receitas e descentralizar despesas, sendo que a Constituição de 1988 tentou equalizar o conjunto de recursos disponíveis com as obrigações condicionais atribuídas a todos os entes, inclusive fixou direitos fundamentais organizados em um arranjo federativo de responsabilidade solidária para garantir os direitos sociais. O SUS é o exemplo mais robusto desse arranjo constitucional, em que de um lado se prevê recursos (contribuições sociais dentro do orçamento da seguridade social), que originalmente previu 30% dos recursos do orçamento da seguridade social fossem destinados a saúde, ou seja, ao SUS, isso está previsto no Art. 55 do ADCT, mas nunca foi cumprido.
O próprio Governo Federal não cumpriu a Constituição na primeira LDO de 1989, gerando uma disputa orçamentária fratricida entre as áreas da seguridade social, a saúde, assistência e a previdência. A previdência corria em raia própria, a saúde e a assistência recebendo migalhas, disputando recursos, e foi aí que veio a CPMF, depois a própria Emenda 29 que colocou o piso da saúde em um patamar equivalente ao da educação, ao mesmo tempo que estabeleceu essa obrigação de rateio (divisão) de recursos com equidade.
Portanto a disputa de recursos entre as áreas sociais existe há décadas, assim como as desvinculações dos tributos vinculados a seguridade social, em um ato do ADCT, como o fundo social de emergência, o fundo de estabilização fiscal, a própria DRU mantida de 1994 a 2024; 30 anos de algo “transitório”, 8 emendas constitucionais que foram se prorrogando, criando o “CINISMO FISCAL”, regras apenas aplicáveis à União, comprometendo o custeio dos direitos fundamentais garantidos na nossa Constituição Federal, pois o que deveria ser destinado a seguridade deixou de sê-lo, tornou-se um mecanismo de falsear a capacidade de entregar o superávit primário, tudo isso para garantir o pagamento dos gastos com juros e amortizações da dívida pública.