Análise Preliminar nº 6 – Dívida Interna Brasileira (Análise elaborada para prestar assessoria à CPI da Dívida Pública instalada na Câmara dos Deputados 2009/2010)

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CPI DA DÍVIDA PÚBLICA 

ANÁLISE PRELIMINAR Nº. 6 

DÍVIDA INTERNA

 Apresentação

Análise Preliminar elaborada em cumprimento à designação do Presidente da CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito, deputado Virgílio Guimarães, para prestar assessoria à CPI da Dívida Pública instalada na Câmara dos Deputados, criada para “investigar a dívida pública da União, Estados e Municípios, o pagamento de juros da mesma, os beneficiários destes pagamentos e o seu impacto nas políticas sociais e no desenvolvimento sustentável do país”.

A CPI da Dívida foi instalada em 19 de agosto de 2009, tendo sido prorrogada, com previsão de encerramento em 27/04/2010, devido ao prazo regimental. Cabe esclarecer que o trabalho objeto da presente análise preliminar contou com a participação dos seguintes integrantes: Maria Lucia Fattorelli Carneiro, Auditora Fiscal da Receita Federal do Brasil (a partir de 29.09.2009), Aldo Olmos Molina Júnior, Auditor Interno da Caixa Econômica Federal (a partir de 23.11.2009), além do apoio técnico de 2 auditores do Tribunal de Contas da União por algumas semanas.

Reuniões formais da CPI da Dívida Pública realizadas em 26/08/2009 e 09/09/2009 debateram amplamente a metodologia dos trabalhos da CPI. Ficou estabelecido que, em relação à Dívida Interna, o marco inicial seria a partir de 1987, conforme requerimentos aprovados em 09/09/2009. Assim, a presente análise preliminar abrangeu as investigações sobre a dívida interna brasileira no período compreendido entre 1987 e 2009, dividida nos seguintes capítulos:

 

  • Introdução
  • Capítulo I – Limitações ao trabalho
  • Capítulo II – Dívida Interna Federal em Títulos Públicos

 

II.1 – Estoque da Dívida Mobiliária Federal Interna – dívida interna representada por títulos públicos

 

II.2 – Fluxos da Dívida Mobiliária Federal Interna – Juros e Amortizações

 

II.2.1 – Ausência de informações sobre os juros nominais efetivamente pagos

 

II.2.1.1 – Exercício de Estimativa dos Juros Nominais somando-se o IGP-M

 

II.2.1.2 – Estimativa dos Juros Nominais com base no cálculo ponderado das emissões

 

II.3 – Admissão de atualização monetária para a dívida pública

 

 

  • Capítulo III – Peso da Dívida Pública no Orçamento da União e o impacto nos Direitos Humanos

 

  • Capítulo IV – Análise da Natureza da Dívida – Investigações sobre a Contrapartida da Dívida Interna Federal

 

IV.1 – Introdução: dificuldades para determinar a natureza da dívida interna

 

IV.2 – Utilização da dívida interna para pagar dívida anterior, interna e externa

 

IV.3 – Emissão de dívida para pagar juros

 

IV.4 – Demais fatores

 

IV.5 – A utilização das elevadas taxas de juros internas como sustentação do Plano Real e a liberalização de movimentação de capitais

 

IV.6 – O Sistema de Metas de Inflação

 

IV.6.1. – Questionamentos sobre o marco legal

IV.6.2 – Deficiências do sistema de metas de inflação

IV.6.3 – Definição das taxas de juros e a possibilidade de conflito de interesses

IV.6.4 – Semelhança entre os juros esperados pelo mercado e os definidos pelo Banco Central

IV.6.5 – O inexplicável elevado patamar das taxas de juros brasileiras e o processo de decisão do COPOM

IV.6.6 – Captação das expectativas de mercado

 

IV.7 – Inflação de Custos

 

IV.8 – Dívida: o custo da Política Econômica

 

IV.9 – Demais fatores que influenciaram o crescimento da dívida interna

 

IV.9.1 – Novação de dívidas do Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS)

 

IV.9.2 – Outras dívidas Securitizadas

 

IV.9.3 – Programa de Fortalecimento das Instituições Financeiras Federais (PROEF)

 

IV.9.4 – TDA (Títulos da Dívida Agrária)

 

IV.9.5 –  Proex

 

IV.9.6 – BNDES

 

IV.9.7 – Medida Provisória 2.181/2001

 

IV.9.8 – Dívida Agrícola

 

IV.9.9 – FIES – Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior

 

IV.9.10 – Estados e Municípios

 

IV.9.11 – Programa de Incentivo à Redução do Setor Público Estadual na Atividade Bancária – PROES

 

IV.9.12 – Fundo Soberano

 

IV.9.13 – O Programa Nacional de Desestatização (PND)

 

IV.9.14 – O Crescimento da Dívida Interna em 2009 e o empréstimo de R$ 100 bilhões ao BNDES

 

  • Capítulo V – A acumulação de reservas cambiais e o aumento da dívida interna

 

  • Capítulo VI – Concentração do Poder Decisório e fragilidade dos controles efetuados pelo TCU, CGU e Senado Federal

 

VI.1 – Tribunal de Contas da União

 

VI.2 – Controladoria Geral da União

 

VI.3 – Congresso Nacional

 

VI.4 – Senado Federal

 

  • Capítulo VII – Resumo das ilegitimidades da dívida interna

 

  • Capítulo VIII – Conclusões e Recomendações

 

INTRODUÇÃO

 

Os trabalhos da CPI foram marcados por uma série de limitações, conforme exposto mais adiante na presente Introdução.

 

A evolução da dívida mobiliária interna federal, de 1994 a 2009, está apresentada no Gráfico 1. Cabe observar que os dados correspondem ao conceito de dívida interna do Governo Central, que equivale ao Governo Federal mais o Banco Central:

 

 

Gráfico 1

Nota: as fontes dos dados estão explicitadas na Tabela 1. Utilizou-se o conceito de Dívida Mobiliária Federal Interna definido no artigo 29 da Lei de Responsabilidade Fiscal, que compreende os títulos da dívida emitidos pelo Tesouro Nacional e pelo Banco Central.

 

Como se vê, a dívida mobiliária interna federal passou de R$ 85,8 bilhões em 1994 (considerando-se os títulos de responsabilidade do Banco Central) para R$ 2,04 trilhões em dezembro de 2009, apresentando expressivo e acelerado crescimento, e tem consumido mais de 35% das receitas orçamentárias anuais para o pagamento de parte dos juros e amortizações (sem considerar o “refinanciamento”).

Diante deste crescimento exponencial do endividamento público, cabe a esta CPI investigar a dívida interna sob diversos aspectos, dentre eles:

 

  1. a sua necessidade, a fundamentação legal e a legitimidade da sua origem e dos seus elementos causais;

 

  1. o perfil da dívida em si, com todos os seus detalhes constitutivos, quais sejam: o seu montante, a lista nominal completa dos credores, a legalidade e a legitimidade dos seus fluxos constitutivos, o impacto social do ônus e dos benefícios que a justificam.

 

Impõe-se a partir dessa visão a necessidade de respondermos às seguintes indagações:

 

  • A dívida interna é necessária?
  • Qual o fundamento legal que ensejou o seu surgimento e vem sustentando seu crescimento?
  • A Dívida Interna é Legítima? Ela atende às conveniências nacionais?

 

Em documento remetido à CPI, referindo-se ao início do Plano Real, o Tribunal de Contas da União – TCU – assinalou o forte crescimento da dívida mobiliária representada pelos títulos emitidos pelo Tesouro Nacional, indicando que tal modalidade da dívida interna apresentou um aumento de 42,7% no período e consumiu grandes somas de recursos: “Foram gastos para o pagamento dos títulos da dívida pública, vencidos ao longo de 1995, valores da ordem de R$ 100,2 bilhões, sendo R$ 89,7 bilhões a título do pagamento do principal e R$ 10,5 bilhões a título de encargos.”

Considerando que o montante da dívida mobiliária federal interna em janeiro de 1995 era de R$ 86 bilhões e a dívida externa nesse período estava em cerca de US$ 143 bilhões, o montante de pagamentos de principal e encargos indicados pelo TCU, da ordem de R$ 100,2 bilhões em 1995 recomendam a realização de profunda auditoria da dívida mobiliária, especialmente devido à relevância do volume de recursos correspondentes ao superávit primário produzido pelo país desde 1996 até 2008, no montante de R$ 678,3 bilhões, reservados para assegurar o pagamento de parte dos juros dívida.[1]

As investigações da CPI sobre a dívida interna sofreram diversas limitações, sendo relevante o fato de que, até o momento, o Banco Central e o Ministério da Fazenda não informaram o montante dos juros nominais da dívida interna efetivamente pagos por regime de caixa a cada ano, como requisitado pela CPI. Considerando que o objeto da CPI inclui “o pagamento dos juros da dívida pública”, tal informação é extremamente relevante, especialmente considerando o seguinte:

  • As informações sobre “juros nominais” contidas tanto na página do Tesouro Nacional como do Banco Central correspondem aos juros calculados sobre a dívida líquida do setor público, conceito desenvolvido no Brasil e que não é utilizado por outros países para o cálculo de juros, tendo em vista que a dívida interna que terá que ser paga e sobre a qual de fato incidem as taxas de juros é a dívida bruta e não líquida. Diante disso, é imprescindível a informação sobre o montante dos juros nominais efetivamente pagos, que não foi prestada à CPI;
  • As informações sobre juros e encargos efetivamente pagos que consta do sistema de contabilidade pública (SIAFI) corresponde somente à parcela dos denominados “juros reais”, ou seja, à parcela que ultrapassa a atualização monetária no período. Dessa forma, a referida informação do SIAFI também não expressa o montante dos juros nominais efetivamente pagos, tal como requisitado pela CPI, e até o momento não atendido pelos órgãos de controle do endividamento público.

Cabe ressaltar, portanto, a ausência de dados estatísticos relevantes, tendo em vista que não foram apresentados à CPI, por parte dos órgãos competentes, dados completos sobre os fluxos de pagamentos (juros e amortizações) e recebimentos (ingressos decorrentes da emissão de títulos) da dívida interna, e a relação desses fluxos com os saldos da dívida a cada ano, o que indica séria deficiência de controle interno sobre a dívida pública.

Também não foram informados adequadamente à CPI os credores da dívida interna a cargo do Tesouro Nacional e respectiva distribuição de freqüência (participação dos grandes e pequenos credores), principalmente no caso dos Fundos de Investimento e outras aplicações bancárias, o que também prejudicou os trabalhos de investigação e indica deficiência de controle interno sobre a dívida pública.

 

Esta deficiência nos permite questionar um argumento muito difundido por diversos setores, de que os principais credores da dívida interna estariam na classe média brasileira.

 

O processo de crescimento acentuado da dívida interna teve início a partir do final da década de 80, com a crescente liberalização dos fluxos internacionais de capital, mediante alterações substantivas à revelia da Lei nº. 4.131/62, cujo processo foi considerado absolutamente irregular conforme acusação formal, por crime de improbidade administrativa, contra ex-dirigentes do Banco Central, do Banco do Brasil e de outras instituições financeiras, apresentada por procuradoras federais.

Assim, a liberalização financeira foi o passo essencial para o estabelecimento de uma política de atração de capitais estrangeiros por meio de altas taxas de juros nos anos 90, que provocou o crescimento acelerado da dívida interna e, consequentemente, dos juros devidos. De acordo com as investigações realizadas e em base a diversos depoimentos à CPI, não se vislumbraram justificativas técnicas para o elevadíssimo patamar de taxas de juros praticadas no Brasil, o que demanda o aprofundamento das investigações face ao indício de contínuo dano ao patrimônio público, provocado pela transferência de significativo volume de recursos públicos para os detentores de títulos da dívida interna.

A partir dos depoimentos colhidos pela CPI e demais investigações realizadas, verificou-se que o fator mais importante para o crescimento da dívida interna foi a manutenção de altas taxas de juros – Selic – e a prática de taxas ainda mais elevadas que a “Selic” em colocações de títulos da dívida interna. O reiterado oferecimento de taxas de juros bem superiores à Selic é outro aspecto que demanda o aprofundamento das investigações, pois esta já é a taxa de juros mais elevada do mundo (atualmente em 8,75%), e não se verificaram quaisquer justificativas para a prática, pelo Tesouro, de taxas bem superiores a esta (atualmente acima de 13% em diversas operações), o que também pode configurar expressivo dano ao patrimônio público.

Desde 1999, com a edição do Decreto 3.088, foi instituído no Brasil o regime de “Metas de Inflação”, que elegeu a Política Monetária – taxas de juros – como o principal instrumento de combate da inflação. O referido decreto conflita com a Lei 4.595, da qual decorre, pois não considerou as demais variáveis mencionadas na referida lei, tais como a prevenção ou correção de depressões econômicas e outros desequilíbrios conjunturais. Além desse indício de ilegalidade, as investigações e depoimentos à CPI possibilitaram constatar que a eleição das taxas de juros como praticamente o único instrumento de combate à inflação contém uma série de inconsistências que representam expressivo contra-senso com repercussões econômicas e sociais cuja investigação e quantificação necessita ser aprofundada, conforme detalhado na presente análise.

As taxas de juros (“Selic”) têm sido definidas por 8 (oito) membros do Copom com base em critérios não matemáticos, pois, conforme informado pelo Banco Central à CPI, a decisão é tomada a partir de apresentações técnicas e discussões exaustivas e “não decorrem da aplicação de uma fórmula que definiria qual deveria ser a decisão do Comitê sobre a meta da taxa Selic”. Portanto, verifica-se que há um componente subjetivo relevante na definição das referidas taxas de juros, que influenciam diretamente toda a economia do país – tanto do setor público como privado.

Confirmou ainda o Banco Central que os votos de seus membros não são divulgados, o que fere o princípio da transparência previsto na Constituição Federal.

Os membros do Copom que definem as taxas de juros e demais autoridades do Banco Central realizam reuniões com “analistas independentes” para a aferição de expectativas de inflação e outras variáveis, tendo a CPI apurado que estes constituem – em sua imensa maioria – representantes dos segmentos financeiros diretamente interessados em altas taxas de juros, o que pode caracterizar conflito de interesses, demandando-se o aprofundamento das investigações e a apuração de responsabilidades. Adicionalmente, a CPI constatou que a maior parte dos membros do Copom passou a trabalhar no setor financeiro privado após deixar o Banco Central, o que demonstra a simbiose entre as esferas pública e financeira privada, que deve ser completamente investigada e auditada, a fim de determinar possíveis favorecimentos ao setor privado em detrimento aos interesses públicos.

A CPI evidenciou que ao mesmo tempo em que as autoridades monetárias têm defendido a elevação das taxas de juros sob a justificativa de controle inflacionário, as mesmas autoridades convivem com os grandes aumentos nos preços administrados (tarifas de energia, telefone, combustível, entre outros) que influenciam fortemente na formação dos preços, o que representa um total contra-senso. Adicionalmente, os órgãos de defesa da livre concorrência não têm conseguido combater adequadamente os cartéis privados, cuja atuação também influencia o controle da inflação. Diante disso, é recomendável que o controle da inflação não se restrinja apenas às taxas de juros, o que contém inclusive indício de ilegalidade, mas considere as demais variáveis relevantes que influenciam a formação dos preços.

Na presente análise preliminar verificou-se que a dívida dos estados também cresceu aceleradamente devido aos altos juros estabelecidos pela esfera federal, mesmo antes que tais dívidas fossem renegociadas pela União, processo que teve lugar a partir de 1997. Após esse processo, as dívidas continuaram a crescer devido à atualização monetária pelo índice IGP-DI, que se mostrou extremamente oneroso e volátil, elevando o saldo da dívida dos estados ao patamar de R$ 320 bilhões em dezembro de 2008.

 

A CPI realizou simulação utilizando o IPCA para o cálculo da atualização monetária da dívida dos estados renegociada pela União, chegando a um resultado R$ 100 bilhões inferior, ou seja, R$ 219 bilhões em dezembro de 2008, por ser este o termo final das informações prestadas pelo Ministério da Fazenda à CPI. Essa distorção ocorreu em razão de o índice IGP-DI ter apresentado inflação bem maior que os demais índices de preços, pelo fato de refletir a inflação no atacado e a variação do dólar, variáveis estas que não guardam relação com a inflação efetivamente ocorrida no país, que é medida pelo IPCA, até mesmo para fins de política de controle de inflação do Banco Central.

 

Mais recentemente, outro fator tem determinado o crescimento acelerado da dívida interna: devido à ausência de controle de capitais, massivas quantidades de dólares têm ingressado no Brasil em busca das rentáveis taxas de juros internas. O Banco Central tem adquirido esses dólares (cuja cotação se encontra em queda nos últimos anos) e os destina à excessiva acumulação de reservas internacionais, que já superam os US$ 200 bilhões. Segundo o renomado economista Dércio Garcia Munhoz, em depoimento a esta CPI, “Para a Alemanha ter o que o Brasil tem ela teria que multiplicar as reservas por 3; a Itália por 4; a França por 4; os Estados Unidos por 2,5 vezes. Ou seja, as nossas reservas são absurdas.”

A justificativa do governo para a compra dessa avalanche de dólares tem sido a de evitar a valorização da moeda nacional, entretanto, depoimentos de especialistas à CPI mostraram que essa justificativa não tem sustentação técnica, nem na realidade dos fatos, pois quanto mais o Banco Central compra os dólares, mais estimula sua entrada, ao sinalizar ao mercado que garantirá sua compra. Adicionalmente, a política de compra de dólares ocasiona maior aumento na dívida interna, pois o governo opta por financiar tal compra por meio da emissão de mais títulos dessa dívida. Além disso, essa opção tem ocasionado prejuízos de bilhões de reais ao Banco Central (que é arcado pelo Tesouro, ou seja, por toda a sociedade), gerando expressivo dano ao Patrimônio Público e também à indústria nacional. Portanto, tal opção tem provocado elevado custo financeiro e social ao país, devendo ter sua investigação aprofundada a fim de elucidar as verdadeiras justificativas para a ausência de controle de capitais e compra recorrente da avalanche de dólares que ingressam no país.

Adicionalmente, quando o Tesouro Nacional efetua o pagamento da dívida em dinheiro, o Banco Central tem lançado títulos no mercado sob a justificativa de conter o aumento da base monetária, por meio das “Operações de Mercado Aberto”, sendo que não existe qualquer contrapartida financeira[2] para essa dívida emitida pelo Banco Central, o que fere o disposto no artigo 34 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

A CPI demonstrou, em gráfico, que a acumulação de reservas segue a mesma trajetória das operações de mercado aberto realizadas pelo Banco Central, indicando claramente que a acumulação de reservas internacionais se deu às custas do aumento da dívida interna:

 

Gráfico 2

 

Gráfico extraído da Exposição de Paulo Sérgio Souto (Presidente do Sindicato dos Economistas do Rio de Janeiro) a esta CPI.

 

O fato de o Banco Central manter elevadas reservas em dólares em seu ativo e operações compromissadas lastreadas em títulos da dívida interna em seu passivo significa enorme transferência de recursos do setor público para o setor financeiro privado, tendo em vista que o dólar vem se desvalorizando (ou seja, gerando rendimentos negativos para o governo) e as aplicações das reservas em títulos do Tesouro norteamericano são ínfimos, enquanto o setor privado fica com os ativos em reais (que tem se valorizado frente ao dólar), e que rendem altas taxas de juros.

Esse mecanismo tem provocado elevados prejuízos operacionais ao Banco Central (R$ 93 bilhões no 1º. Semestre de 2009), cujo custo é transferido ao Tesouro Nacional e arcado pela sociedade como um todo. Esse fato constitui um grave indício de violação do princípio republicano no sentido de adequado trato da coisa pública pelos agentes do Estado, cujo indício de dano ao patrimônio público, demonstrado pela prática continuada de mecanismo que sabidamente tem sido danoso, devendo ter sua investigação aprofundada.

Por outro lado, esse mesmo mecanismo tem garantido elevados ganhos aos investidores que trouxeram seus dólares ao Brasil e lucraram cerca de 50% de janeiro a outubro de 2009[3], ou seja, a opção pela emissão de títulos da dívida interna para “enxugar a base monetária”, aliada à ausência de controle de capitais, tem funcionado como um instrumento de vultosa transferência de recursos públicos principalmente para o setor financeiro privado.

Da análise preliminar realizada não se vislumbra contrapartida legítima para a dívida interna, que alcança o elevadíssimo patamar de R$ 2 trilhões e tem consumido, juntamente com os pagamentos da dívida externa, mais de 30% dos recursos orçamentários anualmente, conforme detalhado na presente análise, mesmo desconsiderando-se a “rolagem” dessas dívidas. A partir dos documentos disponibilizados à CPI e demais fontes de pesquisa, depreende-se que o endividamento interno cresceu principalmente em decorrência das elevadíssimas taxas de juros praticadas no país, cuja definição não restou justificada objetivamente, tendo sido evidenciada a participação maciça de representantes do setor financeiro no processo de sua definição.

Portanto, o acelerado crescimento da dívida interna verificado nos últimos anos pode ser explicado também por meio da excessiva acumulação de reservas internacionais, cujo custo tem sido elevadíssimo para a sociedade brasileira, pois estamos emitindo dívida interna a juros excessivamente altos para aplicar em moeda que se encontra em franca desvalorização e cuja remuneração é nula, significando enorme transferência do setor público para o setor financeiro privado.

Apesar de a taxa Selic encontrar-se em patamar excessivamente elevado (8,75% ao ano) a CPI verificou que as colocações de títulos da dívida interna têm sido feitas a taxas ainda mais elevadas – acima de 13% ao ano – o que demanda a realização da auditoria dessa dívida, com o aprofundamento das investigações sobre os danos ao Patrimônio Público decorrentes deste processo.

A ausência de resposta completa aos requerimentos de informações formulados pela CPI, relativos aos fluxos e estoques da dívida interna resultou em enorme prejuízo à presente análise. Visando a suprir a falta desses dados, a CPI buscou informação publicada no sistema de contabilidade pública – SIAFI[4] – verificando que no período de 1995 a 2009, o governo federal gastou R$ 1,036 trilhão com juros e R$ 1,094 trilhão de amortizações das dívidas interna e externa pública, ou seja, pagamos R$ 2,13 trilhões apenas em juros e amortizações da dívida pública no período de 1995 a 2009, conforme dados do SIAFI. Apesar desss vultosos pagamentos superiores a R$ 2 trilhões no período de 1995 a 2009, a dívida interna apresentou trajetória de crescimento exponencial nesse período. A dívida externa também continuou crescendo no período.

É importante ressaltar que no montante pago a título de amortizações, de R$ 1,094 trilhão, não foi incluído o valor correspondente ao refinanciamento no montante de R$ 4,087 trilhões, ou seja, a “rolagem” da dívida, que significa o pagamento de amortizações por meio da emissão de novos títulos.

As fontes de recursos utilizadas para o pagamento dos mais de R$ 1 trilhão de amortizações foram, principalmente, os pagamentos das dívidas dos estados e municípios com a União, arrecadação de tributos, lucros das estatais, dentre outras fontes. Por sua vez, o pagamento dos mais de R$ 1 trilhão de juros tem sido efetuado principalmente mediante a emissão de novos títulos, o que tem transformado a dívida interna em mera acumulação de juros sobre juros, sem contrapartida em bens e serviços ao país.

A CPI enfrentou grande dificuldade para obter dados sobre os juros da dívida interna efetivamente pagos pelo país. O Ministério da Fazenda não respondeu, até o momento, ao Requerimento de Informações da CPI que solicitou tal dado[5].

Constatou-se grande disparidade entre os dados obtidos no SIAFI e os dados publicados pelo Banco Central, que utilizam diferentes conceitos e metodologias. Relativamente ao pagamento de juros, por exemplo, enquanto o SIAFI considera os juros ‘reais’ (descontada a inflação) efetivamente pagos no período (critério de caixa), o Banco Central divulga os juros ‘nominais’, porém, calculados apenas sobre a dívida ‘líquida’, utilizando o critério de competência, ou seja, o quanto a dívida aumentou devido aos juros apropriados no período. Portanto, qualquer que seja a fonte de pesquisa recorrida, não está disponível o dado referente aos juros nominais efetivamente pagos, conforme requerido pela CPI e não atendido pelo Ministério da Fazenda até o momento.

 

Cabe ressaltar que os juros nominais divulgados pelo Banco Central são calculados apenas sobre a Dívida Líquida do Setor Público[6] e não sobre a dívida bruta, sendo que até mesmo o representante do FMI – Murilo Portugal – que depôs à CPI frisou que a dívida que tem que ser paga é a bruta e não a líquida.

Adicionalmente, durante as investigações realizadas pela CPI constatou-se que a parcela dos juros correspondente à atualização monetária tem sido considerada como “amortizações”, o que demanda o aprofundamento das investigações, pois há indício de que tal procedimento represente um desrespeito à Constituição Federal, especialmente a denominada “Regra de Ouro”, que proíbe a emissão de títulos para pagar despesas correntes, dentre as quais destacam-se os juros. Vale lembrar que a ‘regra de ouro’ encontra-se repetida no art. 12, § 2º da Lei de Responsabilidade Fiscal, ao estabelecer que o montante das operações de crédito não pode ser superior ao valor das despesas de capital. A motivação da citada regra foi limitar a emissão de novas dívidas ao montante das amortizações de capital, além de evitar que as operações de crédito fossem contratadas para financiar despesas correntes.

Ora, ao extrair a parcela da atualização monetária do “Rendimento” dos títulos da dívida, classificando tal atualização monetária como parte do “principal”, o montante das despesas de capital estabelecido na Constituição Federal fica inflado da parcela correspondente à atualização monetária, permitindo, assim, um aumento do referido limite para emissão de novos títulos da dívida pública. Tal procedimento tem permitido a elevação das emissões de títulos da dívida interna, provocando aumento acelerado de seu montante e dos pagamentos dos altíssimos juros que incidem sobre a mesma.

Além do indício de desobediência ao dispositivo constitucional, tal fato é extremamente relevante também para efeito de comparação das despesas de “Juros da Dívida” com as demais despesas, ou seja, quando comparamos as despesas de juros com as despesas de Pessoal, Previdência, e outras, há uma grande distorção, pois tais dispêndios encontram-se traduzidos em grandezas distintas. Enquanto os dispêndios com Pessoal ou Previdência englobam a variação de preço neles embutidos (por exemplo, reajustes salariais decorrentes de inflação, atualização de tabelas dos serviços de saúde, atualização de benefícios previdenciários, reajuste do salário mínimo decorrente da inflação, dentre outros), o valor dos “Juros e Encargos da Dívida” considera somente a parcela dos juros que supera a inflação. Tal fato decorre de metodologia utilizada no Balanço Orçamentário da União, que considera como “Juros” somente a parcela que supera o IGP-M, e computa a atualização monetária da dívida pública juntamente com a rubrica “Amortização”.

 

O Gráfico 3, a seguir, demonstra que em 2009 foram gastos pela esfera federal R$ 124 bilhões de juros e R$ 256 bilhões de amortizações da dívida pública (excluindo-se a rolagem da dívida), totalizando R$ 380 bilhões, que corresponde a 35,57% do Orçamento da União executado em 2009.

 

 

 

 

 

Gráfico 3 – Orçamento Geral da União – 2009

Fonte: SIAFI. Não inclui o “refinanciamento”, ou seja, o pagamento de amortizações por meio da emissão de novos títulos.

A fonte de todos os dados é o Sistema Access da Câmara dos Deputados. As despesas estão subdivididas por função. No caso da função “Encargos Especiais”, esta foi desmembrada, entre 3 itens:

– Juros e Amortizações da Dívida: representa a soma do Grupo de Natureza de Despesa (GND) 1 (Juros e Encargos da Dívida) com o GND 6 (Amortizações da Dívida), nas Sub-funções “Serviço da Dívida Externa” e “Serviço da Dívida Interna”.

– Transferências a Estados e Municípios: Modalidades de Aplicação 30 e 40.

– Outros encargos especiais: todas as demais despesas da Função “Encargos Especiais”.

 

Conforme antes mencionado, o valor inserido no Balanço Orçamentário da União a título de “JUROS e Encargos da Dívida” compreende somente a parcela dos JUROS que supera o valor correspondente à atualização monetária.

Diversos e graves indícios de ilegalidades foram constatados na presente investigação. Os títulos que o Banco Central lança no mercado (por meio das “Operações de Mercado Aberto”) representam dívida feita sem autorização legislativa, tendo em vista que a Lei Complementar 101/2000 proibiu a emissão de títulos pelo Banco Central.

A Medida Provisória 435/2008, em flagrante violação ao Parágrafo Único do Art. 8º da Lei Complementar 101/2000, permitiu que cerca de R$ 50 bilhões de recursos legalmente vinculados a outras áreas específicas (Royalties do petróleo, FUNDAF, entre outras) pudessem ser destinados ao pagamento da dívida. Tal mecanismo foi perpetuado por dispositivo da Medida Provisória 450/2008. Esse fato também constitui indício de dano ao patrimônio público que deve ter sua investigação aprofundada.

Em 2009, os pagamentos de juros e amortizações da Dívida Interna e Externa consumiram mais de 35% do Orçamento Geral da União. Essa prática recorrente tem subtraíndo recursos que deveriam se destinar ao atendimento das necessidades sociais prioritárias da sociedade, o que caracteriza desrespeito a fundamentos constitucionais da República Federativa do Brasil: a soberania (Art. 1º, I) e a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III).

Ao subtrair vultosos recursos das áreas sociais, a dívida interna também representa violação de objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: a erradicação da pobreza (art. 3º, III) e também do próprio princípio republicano em sentido de adequado trato da coisa pública pelos agentes do Estado, violando ainda o disposto no artigo 6º. da Constituição Federal.

Diante de todos os fatos constatados na presente Análise Preliminar, especialmente os indícios de dano ao patrimônio público e aos direitos humanos, recomenda-se o aprofundamento das investigações e a realização da auditoria integral da dívida pública, adotando-se medidas visando à redução das taxas de juros praticadas no país, o estabelecimento de controle sobre o fluxo de capitais, a revisão do regime de metas de inflação, a revisão das dívidas estaduais, a revisão da política de acumulação de reservas e de produção de ‘superávit primário’, dentre outras medidas.

Finalmente, cabe mencionar que a CPI obteve acesso aos trabalhos realizados pelo Tribunal de Contas da União (TCU), cujas cópias foram disponibilizadas em atendimento aos Requerimentos de Informações Nº. 58/2009 e 68/2009, devendo ressaltar a falta de regulamentação do art. 30, incisos I e II da Lei de Responsabilidade Fiscal, no que concerne aos limites globais para o montante da dívida consolidada da União e para o montante da dívida mobiliária federal, cuja preocupação é levantada pelo TCU em vários documentos:

No Aviso nº 1.447, de 17.12.2009, o TCU citou as principais normas constitucionais e infraconstitucionais que definem o marco regulamentar brasileiro, destacando que: “Embora o Poder Executivo da União tenha encaminhado as propostas para as três esferas de governo, não foram fixados limites e condições para a União”, e, complementa: “… a falta de normas que limitem a dívida pública da União sempre foi objeto de preocupação para esta Corte de Contas, tendo sido objeto de destaques especificamente encaminhados ao Congresso Nacional nos seguintes termos do item 9.5 do Acórdão nº 1.573/2006-Plenário referente ao Relatório de Gestão Fiscal da União do 3º quadrimestre de 2005, de relatoria do Ministro VALMIR CAMPELO:

9.5.1 aos Presidentes da República e do Congresso Nacional, em face do que estabelece art. 30 da Lei Complementar n. 101/2000, ressaltando os seguintes fatos preocupantes:

9.5.1.1 a Dívida Líquida do Setor Público atingiu ao final de 2005 o montante de 1,002 trilhão de reais;

9.5.1.2 o crescente endividamento cria a necessidade de geração de superávits primários cada vez maiores, cujos recursos, voltados ao pagamento de juros, deixam de ser aplicados em obras de infra-estrutura ou em políticas sociais, o que vem comprometendo o desenvolvimento nacional;

9.5.1.3 se encontram em tramitação no âmbito:

9.5.1.3.1 do Congresso Nacional, o Projeto de Lei n. 3.431/2000, que “estabelece limites para a dívida pública mobiliária federal”;

9.5.1.3.2 do Senado Federal, a Mensagem n. 154/2000, que cuida da “proposta de limites globais para o montante da dívida consolidada da União, de que trata o inciso I do art. 30 da Lei Complementar n. 101, de 4 de maio de 2000”;

9.5.1.4 a necessidade de legislação específica, prevista no art. 30 da LRF, que defina os limites de endividamento da União (grifou-se)”

Ainda segundo o TCU[7]…permanece pendente a fixação de limite para a dívida consolidada e mobiliária da União, a primeira a cargo do Senado Federal e a segunda do Congresso Nacional” e complementa: “… a dívida pública, por vezes inevitável e necessária, deve ser controlada de perto, pois seu saldo é fluido, suscetível a alterações que, muitas vezes, são ocasionadas por variáveis que não são objetivamente apuráveis e controláveis. Considerando que a capacidade de tributar do Estado é limitada por imperativo constitucional, a elevação da dívida pública e a necessidade de pagamentos segundo o cronograma pactuado geram , no outro lado, redução de receita disponível para fazer frente a outras despesas necessárias ao funcionamento da máquina e ao desenvolvimento econômico e social da Nação. O comprometimento da receita fiscal  com o pagamento da dívida. Por representar passivo de prestações sucessivas numa trajetória de longo prazo é dado do regime financeiro público que demanda cuidado e atenção específicos.

O TCU mencionou[8] que são realizadas várias fiscalizações de auditorias “...com o propósito de controlar a dívida pública no seu conjunto, seja por meio das fiscalizações sistemáticas – a cada quadrimestre – dos Relatórios de Gestão Fiscal da União, seja por meio de auditorias e outros instrumentos de controle empreendidos com a finalidade de subsidiar a elaboração do Parecer Prévio a cargo desta Corte de Contas”, tendo juntado ao Aviso 1.435/GP-TCU as principais fiscalizações efetuadas e respectivas cópias de decisões, destacando-se os Acórdão 1.573/2006 e 451/2009-Plenário que: “…permitem identificar desafios enfrentados pela administração pública no controle das operações de crédito, cuja realização impacta diretamente na trajetória almejada para a dívida pública. O Acórdão nº 1.573/2006-Plenário determina a realização de estudos pela STN no sentido de dirimir, para esfera federal – e conseqüentemente para as demais esferas de governo -, um modelo de estruturação de contas contábeis mais preciso, cuja descrição espelhe de forma mais clara os novos conceitos de operações de crédito previstos no § 1º do art. 29 da LRF, com especial destaque para a contabilização das operações provenientes de assunção, reconhecimento e confissão de dívida que não impliquem ingresso de recursos orçamentários, como ocorre com os parcelamentos de débito preexistentes. Por sua vez, o Acórdão n º 451/009 reitera a determinação do primeiro, no sentido de fixar prazo para apresentação de cronograma para a definição das contas, assim como do sistema de transparência da dívida pública do país previsto nos artigos 31 e 32, §§ 4 da LRF e artigo 27 da Resolução do Senado Federal nº  43, de 2001, sistema este ainda pendente de implementação pelo Ministério da Fazenda.

Comunicou o TCU à CPI que o sistema eletrônico exigido pela Lei de Responsabilidade Fiscal que deverá garantir transparência às contratações encontra-se pendente, o que tem sido acompanhado por recentes acórdãos daquela Corte:

“As auditorias do TCU têm buscado observar a transparência das contratações de operações de crédito por entes públicos, assim como verificar se tais entes têm observado a obrigatoriedade de autorização prévia para realização dessas operações por parte do Ministério da Fazenda, do BACEN e do Senado Federal. Os artigos 31 e 32, § 4º da Lei Complementar nº 101, de 2000, como dito, avançam no sentido de exigir a total transparência da dívida pública contraída pelos entes das três esferas de governo, por meio da institucionalização e manutenção de sistema eletrônico centralizado e atualizado das dívidas interna e externa, garantido amplo e irrestrito acesso ao público, inclusive por meios eletrônicos, dos encargos e condições de contratação e saldos atualizados e limites relativos às dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito e concessão de garantias. Porém, a implementação desse sistema permanece pendente, questão que vem sendo acompanhada pelo TCU conforme se observa do teor dos Acórdãos nº 1.573-20056 e 451/2009-Plenário e destacado no Voto do Relator ao relatar o TC que resultou no Acórdão nº 314/2009-Plenário.”.

“Outras ações relacionadas aos instrumentos facilitadores da gestão da dívida pública apontados na ISSAI 5440 podem ser encontradas nos Acórdãos nº 435/2009-1ª Câmara e 5403/2009-1ª Câmara, que reiteram determinações anteriores no sentido de que os demonstrativos sintético e analítico da dívida consolidada da União passem a ser elaborados a partir das informações do SIAFI, visto que as informações disponíveis no sistema de controle do BACEN não espelham todas as situações consideradas no conceito de operação de crédito e dívida pública definido pela Lei Complementar nº 101, 2000.”

 

A CPI constatou que grande parte dos fatos relevantes e objeto de investigação por parte dessa CPI não chegaram a ser auditados pelo TCU, tendo constatado também a ausência de contabilização detalhada, aliada à insuficiência de documentação, o que prejudicou a comprovação da contrapartida de grande parte da dívida pública, tanto interna quanto externa, o que constitui mais uma prova da necessidade da realização da auditoria da dívida prevista na Constituição Federal de 1988.

 

O aspectos que foram apresentados resumidamente na presente Introdução estão dispostos nos seguintes capítulos, que detalham as investigações realizadas pela CPI da Dívida Pública e apontam relevantes irregularidades e indícios de ilegalidades, que envolvem centenas de bilhões de reais, havendo ainda indícios de dano ao patrimônio público, com sérios impactos sociais e desrespeito aos direitos humanos:

 

O Capítulo I relata as limitações ao trabalho que prejudicaram o aprofundamento das investigações e a exposição do detalhamento do ocorrido;

O Capítulo II apresenta os números da dívida pública federal interna, representada por títulos públicos, bem como os critérios utilizados nas definições sobre “Dívida”, “Juros” e “Amortizações”;

O Capítulo III demonstra o peso da Dívida Pública no Orçamento da União e seu impacto nos Direitos Humanos;

O Capítulo IV trata da natureza da Dívida Interna Federal, mencionando a utilização de elevadas taxas de juros internas, o Sistema de  Metas de Inflação, o custo da Política Econômica e demais fatores que influenciaram o crescimento da dívida interna;

O Capítulo V descreve sobre a excessiva acumulação de reservas cambiais e o conseqüente  aumento da dívida interna;

O Capítulo VI trata da concentração do poder decisório e da fragilidade dos controles efetuados pelo TCU, CGU e Senado Federal;

O Capítulo VII apresenta um resumo das ilegitimidades da dívida interna;

O Capítulo VIII contém as conclusões e recomendações decorrentes do trabalho realizado..

 

 

 

 

 

 

 

 

 

I – LIMITAÇÕES AO TRABALHO

I.1 – ÓRGÃOS DO GOVERNO NÃO RESPONDERAM SATISFATORIAMENTE A REQUERIMENTOS DE INFORMAÇÃO FUNDAMENTAIS PARA A TOMADA DE POSIÇÕES FRENTE À DÍVIDA

 

I.1.1 – Dados sobre os saldos e os fluxos da dívida interna – valores pagos e valores apurados nas emissões de dívida interna – e quais fatores influenciaram seu crescimento

 

A CPI enfrentou sérias limitações em decorrência da insuficiência de informações sobre estoques e fluxos da dívida interna, especialmente a ausência da informação sobre os juros nominais efetivamente pagos, cuja informação não foi prestada à CPI até a presente data.

 

O Requerimento de Informações Nº 9/09, de autoria do dep. Ivan Valente, aprovado dia 9 de setembro de 2009, instou o Ministério da Fazenda e o Banco Central a disponibilizar a esta Comissão, no prazo de 15 dias, os saldos anuais da Dívida Interna desde janeiro de 1994 até dezembro de 2008, incluindo-se as “Operações de Mercado Aberto” do Banco Central, mencionando-se, em cada ano, os valores contratados/recebidos, as amortizações pagas, os juros devidos e os juros pagos, bem como a demonstração do saldo final anual.

 

Esse Requerimento também solicitou o detalhamento de todos os fatores que implicaram em crescimento da dívida interna (assunção de outras dívidas, variação cambial, juros acumulados, etc), quantificando o impacto de cada um desses desde janeiro de 1994 até dezembro de 2008.

 

Em sua resposta, o Ministério da Fazenda informou, por meio do Memorando nº 1241/2009/CODIV/SECAD-III/STN/MF-DF[9], que “a STN somente passou a elaborar e divulgar os Fatores de Variação da Dívida Pública a partir de 1999, razão pela qual não estão sendo encaminhados os dados referentes aos anos anteriores”. O citado Memorando também informou: “não dispomos dos dados nesse nível de detalhamento para períodos anteriores.”

 

Importante ressaltar que na tabela enviada com os fatores de variação da Dívida Pública Mobiliária Federal Interna (DPMFi) a partir de 1999, não constaram as informações sobre os itens solicitados no Requerimento, tais como variação cambial e assunção de outras dívidas.

 

O Memorando também informou que “Os dados relativos aos anos de 1987 a 1998, bem como as “Operações de Mercado Aberto” estão sendo fornecidas pelo Banco Central, detentor dos mencionados dados”. No entanto, contrariando as informações prestadas pelo Ministério da Fazenda, o Banco Central não enviou os referidos dados. Na Nota Técnica Demab-2009/002, o Banco Central encaminhou apenas “os saldos anuais referentes à dívida mobiliária de responsabilidade do Banco Central do Brasil (BC).” (grifo nosso).

 

Portanto, o Banco Central somente encaminhou os dados referentes à dívida mobiliária de sua responsabilidade, não informando satisfatoriamente sobre a dívida de responsabilidade do Tesouro Nacional, que representa a maior parte da dívida interna.

 

Posteriormente, o Banco Central enviou informações adicionais, porém, também limitadas à dívida sob sua responsabilidade[10].

 

Em janeiro de 2009, o Ministério da Fazenda encaminhou à CPI o Aviso nº 30/MF, de 22 de janeiro de 2010, juntamente com o Memorando nº 23/2010/COGER/GABIN/STN/MF-DF[11], que trouxe tabela com fatores que implicaram em crescimento da dívida interna. Tal Memorando foi encaminhado após ter sido reiterado pela segunda vez[12] o Requerimento de Informações nº 9/2009 desta CPI, aprovado em setembro de 2009.

Porém, conforme será explicitado no item IV.9 desta Análise Preliminar, tal tabela foi enviada ainda incompleta, e com sérias limitações, que restringiu bastante a análise da origem da dívida interna. Foram encaminhados ainda mais dois ofícios ao Ministério da Fazenda solicitando o esclarecimento de informações, cujas respostas também não foram satisfatórias, conforme também exposto no item IV.9 da presente análise.

Relativamente aos fluxos – juros e amortizações – a CPI reiterou o pedido de informações por meio de diversos Ofícios, a exemplo do Ofício 160/10-P, de 01.02.2010, letra “c” que solicitou expressamente “informar os valores dos JUROS efetivamente pagos pelo regime de Caixa em cada ano (juros reais e inflação), não respondido até o momento”.

 

Portanto, o governo não forneceu à CPI dados fundamentais para a verificação do custo efetivo da dívida interna, bem como informações sobre sua origem e formação, prejudicando as investigações sobre sua legalidade ou legitimidade.

 

Diante dessa omissão do Executivo, cabe questionar qual seria o respaldo para as diversas declarações de representantes do governo, segundo as quais a dívida interna teria origem preponderante na assunção de outras dívidas e esqueletos, visto que, quando solicitados a apresentar oficialmente tais informações à CPI, demonstram que não possuem tais informações.  

 

 

 

 

I.1.2 – Dados sobre credores da dívida interna

 

O Requerimento de Informações nº 4/2009, aprovado dia 9 de setembro de 2009, solicitou ao Ministério da Fazenda a disponibilização, no prazo de 15 dias, das informações sobre os detentores de títulos da dívida interna pública federal (incluindo-se nesta as operações compromissadas do Banco Central e os chamados “Títulos Vinculados”), discriminando por categoria de credor (conforme detalhado no Requerimento) o valor dos títulos detidos e a sua participação no total.

 

Esse Requerimento solicitava a distribuição de freqüência dos credores em cada segmento, o que poderia permitir a mensuração da participação dos grandes e pequenos credores nesta dívida.

 

Em resposta, o Ministério da Fazenda encaminhou o Aviso nº 323/MF, de 28/09/2009, no qual informou: “encaminho a Vossa Excelência, em resposta à solicitação dessa Comissão, cópia do Ofício 789/2009-BCB/Secre, de 25/09/2009, elaborado pelo Banco Central do Brasil”.

 

Porém, contrariando a informação constante do referido Aviso nº 323/MF do Ministério da Fazenda, o ofício do Banco Central trouxe apenas a Nota Técnica Demab-2009/001[13], que por sua encaminhou informações referentes apenas à Dívida Mobiliária de Responsabilidade do Banco Central do Brasil, nada informando sobre a dívida de responsabilidade do Tesouro Nacional, que representa a maior parte da dívida interna.

 

Adicionalmente, a referida Nota Técnica ainda afirmou que não poderia informar o valor da dívida detido pelas “pessoas físicas ou jurídicas não residentes no Brasil”, e que “nem todos os detentores da dívida podem ser identificados pelo Banco Central, já que o Selic permite o registro da carteira de títulos em contas de cliente, que não são individualizadas. Nessas contas, o proprietário do título não fica discriminado.

 

A Nota Técnica também informou que “o Banco Central, por não ser o órgão supervisor de fundos de pensão e entidades de previdência e de fundos de investimento, não detém os dados dos participantes ou cotistas dessas entidades e fundos”.

 

Após reiterado o pedido de informações pela Presidência da CPI, o Ministério da Fazenda enviou a Nota STN/CODIV/nº 1442/2009, de 13 de outubro de 2009[14], que trata da dívida interna de responsabilidade do Tesouro Nacional. Porém, mais uma vez, grande parte das informações requeridas não foi enviada à CPI, a exemplo da distribuição de freqüência dos detentores finais da dívida interna no caso dos Fundos de Investimento, o que impede a identificação da representatividade dos credores desta dívida.

 

Na precitada Nota a Secretaria do Tesouro Nacional admitiu que não detém os dados dos participantes ou cotistas de Fundos de Investimento, e que também “não tem como identificar a vinculação dos recursos utilizados pelas instituições financeiras na aquisição de seus títulos públicos, não dispondo também de informações sobre a composição do passivo do sistema financeiro.

 

Por outro lado, a Nota Técnica Demab-2009/001[15] informou que, das atuais Operações de Mercado Aberto do Banco Central (que efetivamente representam dívida interna, mas que geralmente não são incluídas no saldo desta dívida anunciado ao público pelo governo), cujo estoque era de R$ 422,661 bilhões em agosto de 2009, nada menos que R$ 391,518 bilhões eram devidas a “Bancos captadores de depósitos à vista”. Isso significa que são as instituições financeiras as principais credoras desta importante parcela da dívida interna de quase meio trilhão de reais.

 

Posteriormente, o Banco Central encaminhou novas respostas ao Requerimento nº 4, porém, sem divulgar a distribuição de freqüência dos credores finais da dívida interna detida pelos Fundos de Investimento (que representam cerca de 50% da dívida interna de responsabilidade do Tesouro Nacional) e outras aplicações bancárias.

 

Portanto, o governo não forneceu à CPI informações fundamentais para a verificação dos principais beneficiários da dívida interna.

 

Essa omissão do Executivo não respalda as diversas declarações de membros do governo, segundo as quais, visto que, quando solicitados a prestar oficialmente tais informações à CPI, demonstraram que não possuem tais informações

 

Diante dessa omissão do Executivo, cabe questionar qual seria o respaldo para as diversas declarações de representantes do governo, segundo as quais a dívida interna beneficia principalmente a classe média e grande parte da população brasileira, visto que, quando solicitados a apresentar oficialmente tais informações à CPI, demonstram que não possuem tais informações.  

 

 

I.2 – DEFICIÊNCIA NA ESTRUTURA DA EQUIPE PARA A REALIZAÇÃO DO TRABALHO DA CPI

 

Para uma adequada análise das informações da CPI, seriam necessárias dezenas de pessoas. Importante ressaltar que nas recomendações da Comissão Mista de 1989 (que visava ao cumprimento do Artigo 26 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias) consta a necessidade de realização de auditoria da dívida com a participação de 50 especialistas, o que jamais se realizou.

Porém, o pessoal especializado da CPI contou apenas com uma auditora da Receita Federal por seis meses, um auditor da Caixa Econômica Federal por apenas quatro meses, e auditores do Tribunal de Contas da União, por algumas semanas. A equipe contou com o apoio de uma Assistente Social por quatro meses e dois funcionários de apoio do Ministério Público, que foram disponibilizados durante algumas semanas à CPI.

Desta forma, por maiores que fossem os esforços da equipe, o curto espaço de duração da CPI não foram suficientes para a investigação adequada de todos os aspectos que envolvem o endividamento brasileiro, por isso se recomenda a realização da auditoria integral dessa dívida.

 

I.3 – ATRASO NO COMPARECIMENTO DE AUTORIDADES À CPI.

Apesar de terem sido aprovados Requerimentos convidando o Ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o Presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, até o fechamento da presente análise (26/03/2010) tais autoridades ainda não chegaram a comparecer à CPI.

Tais autoridades haviam sido “convidadas” para depor à CPI, entretanto, em 17 de março de 2010, a CPI aprovou a convocação do Presidente do Banco Central Henrique Meirelles. Mesmo assim, este não compareceu à CPI até a presente data, prejudicando a elaboração da presente análise.

 

I.4 – NÃO-APROVAÇÃO DE IMPORTANTES REQUERIMENTOS DE INFORMAÇÃO E DE AUDIÊNCIAS

 

Em diversas reuniões da CPI, não havia número suficiente de deputados para estabelecer-se o quórum mínimo para votações de requerimentos de informação e de audiências públicas. Dessa forma, um simples pedido de apenas um deputado permitia com que qualquer requerimento fosse retirado de pauta. Tal fato atrasou a aprovação de diversos requerimentos e prejudicou outros, dentre eles os convites a importantes autoridades responsáveis pelo endividamento público, como os ex-ministros da Fazenda Antônio Palocci e Pedro Malan, do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Foram, ainda, rejeitados os requerimentos para a realização de audiências públicas nos estados, prerrogativa da CPI, o que teria possibilitado a ampliação do debate e o aprofundamento das discussões sobre a problemática da dívida dos estados com a União.

 

I.5 – EXÍGUO PRAZO DE FUNCIONAMENTO DA CPI

 

O tempo disponibilizado para o presente trabalho foi extremamente exíguo, impossibilitando a apresentação de resultados mais detalhados e completos, como merece o tema de tamanha relevância para o país.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

II – Dívida Interna Federal em Títulos Públicos

 

CAPÍTULO II – Dívida Interna Federal em Títulos Públicos  

 

No presente capítulo são analisados os números da dívida pública federal interna representada por títulos públicos – denominada dívida mobiliária – buscando demonstrar seu estoque e o fluxo de pagamentos, bem como os critérios utilizados pelos órgãos oficiais nas definições da “Dívida”, dos “Juros” e “Amortizações”.

Cabe esclarecer que a presente análise se concentra na dívida mobiliária da esfera federal – responsável pela maior parte da dívida pública e pelas obrigações de pagamento de juros e resgates, embora existam outros conceitos de dívida pública utilizados no Brasil[16].

A relevância da presente análise é demonstrada pelo fato de o estoque da dívida pública federal representada pela totalidade de títulos públicos emitidos pelo Tesouro Nacional ter alcançado, em 31.12.2009, o montante de R$ 2.036.230.541.688,00. Adicionalmente, apenas parte do pagamento dos juros e amortizações (excluindo-se a “rolagem”[17], ou “refinanciamento”) dessa dívida consumiu, em 2009, 36% dos recursos do Orçamento da União Executado.

Desde 1988, o Ministério da Fazenda é o ente competente para “planejar, supervisionar, normatizar e controlar os serviços de colocação e resgate de títulos da dívida pública mobiliária federal, passando o Banco Central do Brasil a desempenhar a função de agente exclusivo para a execução financeira dos serviços da dívida”, conforme Decreto nº 94.443, de 12.06.1987. No ano de 1987 foi também implantado o SIAFI – Sistema Integrado de Administração Financeira.

Cabe mencionar também que em 10.03.1986, mediante Decreto nº 92.452, foi criada a Secretaria do Tesouro Nacional – STN, tendo, dentre outras, como atribuição:

  1. a) compatibilizar, com os objetivos da execução financeira e orçamentária da União, a contratação de operações de crédito externo, previamente à concessão de credenciamento pelo Banco Central do Brasil (Decreto nº 84.128/79, artigo 7º, § 1º e 2º); e a contratação ou renovação de operações de crédito interno, inclusive operações de arrendamento mercantil (Decreto nº 84.128/79, artigo 4º, V, e 8º).
  2. b) efetuar o registro de todas as operações a contratação ou renovação de operações de crédito interno.

 

II.1 – ESTOQUE da Dívida Mobiliária Federal Interna – Dívida Interna representada por Títulos Públicos  

O Gráfico 4, a seguir, mostra o estoque da dívida mobiliária interna desde 1994 até dezembro de 2009.

Gráfico 4

Nota: as fontes dos dados estão explicitadas na próxima tabela. Utilizou-se o conceito de Dívida Mobiliária Federal Interna definido no artigo 29 da Lei de Responsabilidade Fiscal, que compreende os títulos da dívida emitidos pelo Tesouro Nacional e pelo Banco Central.

 

 

 

A Dívida Interna Federal representada por Títulos Públicos, denominada Dívida Mobiliária Federal Interna, compreende os títulos da dívida emitidos pelo Tesouro Nacional e pelo Banco Central, conforme definido no artigo 29 da Lei de Responsabilidade Fiscal[18]:

 

Art. 29. Para os efeitos desta Lei Complementar, são adotadas as seguintes definições:

(…)

       II – dívida pública mobiliária: dívida pública representada por títulos emitidos pela União, inclusive os do Banco Central do Brasil, Estados e Municípios;

(…)     

  • 2o Será incluída na dívida pública consolidada da União a relativa à emissão de títulos de responsabilidade do Banco Central do Brasil.

 

A Lei de Responsabilidade Fiscal proibiu que o Banco Central emitisse títulos da dívida pública a partir de maio/2002, tendo em vista que a LRF foi publicada em 05 de maio de 2000, estabelecendo o prazo de dois anos para tal providência:

 

Art. 34. O Banco Central do Brasil não emitirá títulos da dívida pública a partir de dois anos após a publicação desta Lei Complementar.

 

As estatísticas divulgadas pelo Banco Central mostram a existência de títulos de sua emissão até o ano de 2005, tendo em vista a continuidade da negociação de títulos emitidos no prazo da precitada lei complementar.

 

A CPI enfrentou grande dificuldade para obter dados sobre os juros da dívida interna efetivamente pagos pelo país. O Ministério da Fazenda não respondeu, até o momento, ao Requerimento de Informações da CPI que solicitou tal dado[19].

Constatou-se grande disparidade entre os dados obtidos no SIAFI e os dados publicados pelo Banco Central, que utilizam diferentes conceitos e metodologias. Relativamente ao pagamento de juros, por exemplo, enquanto o SIAFI considera os juros ‘reais’ (descontada a inflação) efetivamente pagos no período (critério de caixa), o Banco Central divulga os juros ‘nominais’, porém, calculados apenas sobre a dívida ‘líquida’, utilizando o critério de competência, ou seja, o quanto a dívida aumentou devido aos juros apropriados no período. Portanto, qualquer que seja a fonte de pesquisa recorrida, não está disponível o dado referente aos juros nominais efetivamente pagos, conforme requerido pela CPI e não atendido pelo Ministério da Fazenda até o momento.

 

Cabe ressaltar que os juros nominais divulgados pelo Banco Central são calculados apenas sobre a Dívida Líquida do Setor Público[20] e não sobre a dívida bruta, sendo que até mesmo o representante do FMI – Murilo Portugal – que depôs à CPI frisou que a dívida que tem que ser paga é a bruta e não a líquida.

Adicionalmente, durante as investigações realizadas pela CPI constatou-se que a parcela dos juros correspondente à atualização monetária tem sido considerada como “amortizações”, o que demanda o aprofundamento das investigações, pois há indício de que tal procedimento represente um desrespeito à Constituição Federal, especialmente a denominada “Regra de Ouro”, que proíbe a emissão de títulos para pagar despesas correntes, dentre as quais destacam-se os juros. Vale lembrar que a ‘regra de ouro’ encontra-se repetida no art. 12, § 2º da Lei de Responsabilidade Fiscal, ao estabelecer que o montante das operações de crédito não pode ser superior ao valor das despesas de capital. A motivação da citada regra foi limitar a emissão de novas dívidas ao montante das amortizações de capital, além de evitar que as operações de crédito fossem contratadas para financiar despesas correntes.

Ora, ao extrair a parcela da atualização monetária do “Rendimento” dos títulos da dívida, classificando tal atualização monetária como parte do “principal”, o montante das despesas de capital estabelecido na Constituição Federal fica inflado da parcela correspondente à atualização monetária, permitindo, assim, um aumento do referido limite para emissão de novos títulos da dívida pública. Tal procedimento tem permitido a elevação das emissões de títulos da dívida interna, provocando aumento acelerado de seu montante e dos pagamentos dos altíssimos juros que incidem sobre a mesma.

Além do indício de desobediência ao dispositivo constitucional, tal fato é extremamente relevante também para efeito de comparação das despesas de “Juros da Dívida” com as demais despesas, ou seja, quando comparamos as despesas de juros com as despesas de Pessoal, Previdência, e outras, há uma grande distorção, pois tais dispêndios encontram-se traduzidos em grandezas distintas. Enquanto os dispêndios com Pessoal ou Previdência englobam a variação de preço neles embutidos (por exemplo, reajustes salariais decorrentes de inflação, atualização de tabelas dos serviços de saúde, atualização de benefícios previdenciários, reajuste do salário mínimo decorrente da inflação, dentre outros), o valor dos “Juros e Encargos da Dívida” considera somente a parcela dos juros que supera a inflação. Tal fato decorre de metodologia utilizada no Balanço Orçamentário da União, que considera como “Juros” somente a parcela que supera o IGP-M, e computa a atualização monetária da dívida pública juntamente com a rubrica “Amortização”.

 

Portanto, a CPI da Dívida Pública enfrentou grandes limitações e, apesar dos requerimentos de informações e sucessivas reiterações, não conseguiu obter a informação acerca dos juros da dívida interna federal efetivamente pagos.

 

Diante da ausência de informação precisa sobre o valor dos juros da dívida interna federal efetivamente pagos, as investigações se pautaram da definição da dívida pública mobiliária estabelecida pela Lei de Responsabilidade Fiscal e dos dados disponíveis sobre os saldos da referida dívida, a fim de estimar o montante da obrigação de pagamento de juros a que estão sujeitos os entes federais representados pela União e Banco Central do Brasil.

 

Cabe esclarecer que nessa fase dos trabalhos não serão somados os títulos de responsabilidade dos estados e municípios, a fim de evitar duplicidade de cômputo. Os Estados e Municípios ficaram proibidos de emitir títulos de sua dívida a partir da Lei 9496/97 e Medida Provisória nº 1.811-1/99[21], respectivamente, que promoveram a renegociação das dívidas públicas desses entes com a União. Assim, considerando que a União emitiu títulos públicos[22] correspondentes a tais passivos, não serão somados, nessa análise as dívidas dos estados e municípios, a fim de evitar duplicidade de cômputo.

 

Dessa forma, utilizando-se a definição da Lei de Responsabilidade Fiscal para a dívida pública mobiliária, foram pesquisados os dados divulgados pelo Banco Central, em sua respectiva página na internet, detalhados nas tabelas a seguir, que demonstra que a Dívida Mobiliária Pública de responsabilidade do Tesouro Nacional e do Banco Central atingiu, em 31.12.2009, cifra superior a dois trilhões de reais: R$ 2.036.230.541.688,00.

Tabela 1 – ESTOQUE DA DÍVIDA MOBILIÁRIA FEDERAL INTERNA e OPERAÇÕES COMPROMISSADAS (R$)                                              

 

  I II III IV
ANO

(Final de Período)

Títulos Responsabilidade do Tesouro Títulos de Responsabilidade do Bacen Soma Operações de Mercado Aberto
         
1994 59.302.389.748,00 26.452.924.555,00 85.755.314.303,00  
1995 84.596.387.621,00 49.345.663.212,00 133.942.050.833,00  
1996 114.775.016.343,00 83.104.898.352,00 197.879.914.695,00  
1997 225.731.816.000,00 65.237.711.996,00 290.969.527.996,00  
1998 343.820.319.307,00 104.709.069.521,00 448.529.388.828,00  
1999 464.506.617.226,00 63.019.803.564,00 527.526.420.790,00  
2000 555.912.504.392,00 85.686.298.573,00 641.598.802.965,00 -3.989.161.000,00
2001 687.328.699.223,00 126.197.604.689,00 813.526.303.912,00 -18.656.057.634,00
2002 838.795.607.301,00 67.125.090.097,00 905.920.697.398,00 64.110.429.000,00
2003 978.104.224.949,00 30.658.969.216,00 1.008.763.194.165,00 55.716.535.000,00
2004 1.099.543.491.840,00 13.583.941.606,00 1.113.127.433.446,00 47.206.826.000,00
2005 1.252.525.587.614,00 6.815.480.606,00 1.259.341.068.220,00 22.856.205.534,00
2006 1.390.693.785.194,00   1.390.693.785.194,00 60.030.247.598,00
2007 1.583.871.437.117,00   1.583.871.437.117,00 165.813.420.334,00
2008 1.759.134.189.187,00   1.759.134.189.187,00 300.490.997.676,00
2009 2.036.230.541.688,00   2.036.230.541.688,00 427.874.468.831,00
         
FONTES: Coluna I – Quadros divulgados pelo Banco Central do Brasil, Anexos à Nota para Imprensa – Política Fiscal dos seguintes períodos, disponível em www.bc.gov.br/htms/infecon/notas.asp?idioma=p&id=ecoimphist: 1994, 1995, 1996, 1997, 1998, 1999, 2000, 2001, 2002, 2003, 2004, 2005, 2006 e 2007 no Quadro XXV de Jan/2008 e em 2008 e 2009 no Quadro XXXV de Jan/2010. Coluna II– Quadros divulgados pelo Banco Central do Brasil, Anexos à Nota para Imprensa – Política Fiscal dos seguintes períodos, disponível em www.bc.gov.br/htms/infecon/notas.asp?idioma=p&id=ecoimphist: 1994, 1995, 1996, 1997, 1998, 1999, 2000, 2001, 2002, 2003, 2004 e 2005 no Quadro XXV-A de Jan/2007 Coluna III = Coluna I + Coluna II Coluna IV – Quadros divulgados pelo Banco Central do Brasil, Anexos à Nota para Imprensa – Política Fiscal dos seguintes períodos, disponível em www.bc.gov.br/htms/infecon/notas.asp?idioma=p&id=ecoimphist:2000, 2001, 2002, 2003, 2004, 2005, 2006, 2007, 2008 e 2009 no Quadro XXXVI de Jan/2010

 

É importante ressaltar, inicialmente, que todos os dados mencionados na Tabela 1 foram extraídos de divulgações do Banco Central, a fim de manter a mesma fonte para os dados, tendo em vista a grande divergência de critérios e metodologias utilizados pelo Banco Central e Tesouro Nacional, que levam a grandes discrepâncias.

A discrepância de informações entre os dados divulgados pelo BC e pela STN pode ser ilustrada por meio de comparação do valor do Estoque de Títulos da Dívida Mobiliária Federal de responsabilidade do Tesouro Nacional divulgado pelas duas instituições, conforme Tabela 2 a seguir:

 

Tabela 2 – Comparativo entre valores divulgados pelo Banco Central e Tesouro Nacional

ESTOQUE DE TÍTULOS PÚBLICOS FEDERAIS DE RESPONSABILIDADE DO TESOURO
  I II III
ANO (Final de Período) Valores divulgados pelo Banco Central

 

Valores divulgados pela Secretaria doTesouro Nacional Diferença
  R$ R$ R$
1994 59.302.389.748,00 60.147.803.000,00 -845.413.252,00
1995 84.596.387.621,00 85.592.608.000,00 -996.220.379,00
1996 114.775.016.343,00 114.617.625.000,00 157.391.343,00
1997 225.731.816.000,00 225.626.159.000,00 105.657.000,00
1998 343.820.319.307,00 346.827.925.000,00 -3.007.605.693,00
1999 464.506.617.226,00 468.044.905.830,00 -3.538.288.604,00
2000 555.912.504.392,00 531.217.845.200,00 24.694.659.192,00
2001 687.328.699.223,00 670.226.540.000,00 17.102.159.223,00
2002 838.795.607.301,00 816.165.868.930,00 22.629.738.371,00
2003 978.104.224.949,00 956.689.111.390,00 21.415.113.559,00
2004 1.099.543.491.840,00 1.072.385.054.760,00 27.158.437.080,00
2005 1.252.525.587.614,00 1.231.412.242.810,00 21.113.344.804,00
2006 1.390.693.785.194,00 1.375.441.704.400,00 15.252.080.794,00
2007 1.583.871.437.117,00 1.571.537.427.220,00 12.334.009.897,00
2008 1.759.134.189.187,00 1.751.946.771.650,00 7.187.417.537,00
2009 2.036.230.541.688,00 1.937.222.839.670,00 99.007.702.018,00
FONTES:
  Coluna I – Quadros divulgados pelo Banco Central do Brasil, Anexos à Nota para Imprensa – Política Fiscal dos seguintes períodos, disponível em www.bc.gov.br/htms/infecon/notas.asp?idioma=p&id=ecoimphist: 1994, 1995, 1996, 1997, 1998, 1999, 2000, 2001, 2002, 2003, 2004, 2005, 2006 e 2007 no Quadro XXV de Jan/2008 e em 2008 e 2009 no Quadro XXXV de Jan/2010. Coluna II – Estoque da Dívida Pública Federal Interna por Títulos STN/CODIV/GEEST dísponivel em www.tesouro.fazenda.gov.br/estatistica/est_divida.asp Coluna III = Coluna I + Coluna II

 

Cabe esclarecer que a inclusão, na Tabela 1, dos valores referentes às operações compromissadas do Banco Central realizadas a partir de 2000 visou a demonstrar a crescente utilização dessas operações após a vedação, pela Lei de Responsabilidade Fiscal, de títulos de emissão própria do BC. É visível, na Tabela 1, o incremento das operações de mercado aberto em substituição aos títulos de emissão própria do Banco Central, a partir de 2002.

Anteriormente a 2000, as operações compromissadas do Banco Central não eram apartadas das operações com títulos de sua emissão conforme explicações apresentadas à CPI da Dívida Pública, consignadas nas Notas Técnicas DEMAB – 2009/004[23] e Demab-2009/001[24], das quais constou, textualmente:

  • Notas Técnicas DEMAB – 2009/004:

 “Conforme apurado com o Departamento de Contabilidade e Execução Financeira (Deafi), até o ano de 1992, o plano contábil do Banco Central (BC) não previa o registro das operações compromissadas em contas apartadas tanto do lado do Ativo quanto do Passivo. Nessa época, todas as operações definitivas e compromissadas afetavam diretamente a carteira de títulos do BC. Ou seja, não havia distinção entre os conceitos de custódia e de carteira. Tal conceito também era adotado nos registros do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic). Os extratos da posição de custódia do Banco Central no referido sistema para esses anos também mostram apenas uma posição única de carteira, sem abertura de títulos a recomprar ou a revender. Sendo assim, apesar de não ser possível segregar as operações de mercado aberto, os saldos da dívida no período de 1987 a 1991 constantes do Anexo A da mencionada Nota Técnica Demab 2009/002 já incluem essas operações do BC, tal como solicitado pela CPI (saldos anuais da dívida interna no período, incluindo-se as Operações de Mercado Aberto).”

  • Nota Técnica Demab-2009/001[25]:

 “Para o período de 1993 a 1999, conforme Anexo C, são apresentados os detentores no formato divulgado na ‘Nota para Imprensa’ sobre mercado aberto, sem a abertura da carteira própria e dos títulos vinculados. O conceito para divulgação da dívida nesse levantamento foi o da carteira avaliada pelo preço do lastro dos títulos (preço aceito pelo Banco Central em suas operações compromissadas).”

 

Atualmente, as operações compromissadas realizadas pelo Banco Central já se aproximam de meio trilhão de reais. É visível, na Tabela 1, o incremento de tais operações em substituição aos títulos de emissão do Banco Central, a partir de 2002.

Em 2008, ano em que as operações compromissadas realizadas pelo Banco Central já alcançavam a casa dos R$ 300 bilhões, foi editada a Medida Provisória nº. 435, visando a “assegurar ao Banco Central do Brasil a manutenção de carteira de títulos da dívida pública em dimensões adequadas à execução da política monetária” de forma “direta, sem contrapartida financeira, mediante expressa autorização do Ministro de Estado da Fazenda.”[26]

Dessa forma, a referida MP 435 autorizou que o Tesouro Nacional emita e entregue ao Banco Central, sem contrapartida financeira, qualquer volume de títulos públicos federais que possa ser considerado “adequado” para que o Banco Central execute política monetária.

A Medida Provisória 435/2008, em flagrante violação ao Parágrafo Único do Art. 8º da Lei Complementar 101/2000, permitiu que cerca de R$ 50 bilhões de recursos legalmente vinculados a outras áreas específicas (Royalties do petróleo, FUNDAF, entre outras) pudessem ser destinados ao pagamento da dívida. Tal mecanismo foi perpetuado por dispositivo da Medida Provisória 450/2008. Esse fato constitui indício de dano ao patrimônio público que deve ter sua investigação aprofundada.

De acordo com a Constituição Federal, o Banco Central pode comprar ou vender títulos de emissão do Tesouro, não havendo previsão para a hipótese de utilização de títulos sem contrapartida financeira:

Art. 164. A competência da União para emitir moeda será exercida exclusivamente pelo banco central.

(…)

  • 2º – O banco central poderá comprar e vender títulos de emissão do Tesouro Nacional, com o objetivo de regular a oferta de moeda ou a taxa de juros.

 

Especialmente diante do fato de que tais títulos entregues ao Banco Central são remunerados pelo Tesouro, recomenda-se o aprofundamento dos estudos jurídicos a fim de determinar a constitucionalidade da entrega de títulos do Tesouro ao Banco Central, sem qualquer contrapartida financeira.

Esse tema foi abordado durante os debates da CPI pelo ex-deputado federal Sérgio Miranda:

 

De fato, meus amigos, é uma operação profundamente estranha, algo esdrúxulo, nós termos 500 bilhões de reais em títulos com cláusula de recompra, grande parte títulos de curtíssimo prazo. Isso cria uma enorme distorção. Eu assisti aqui um depoimento do Prof. João Sayad, que ele comentava isso, são as tais jabuticabas que só existem no Brasil, que mais da metade, e pelos dados do próprio Banco Central, quando analisa os títulos com cláusula de recompra. ele diz; aqui o relatório do Banco Central do mês de outubro, do mês de novembro: “A participação por indexador registrou a seguinte evolução em relação a setembro, a porcentagem de títulos indexados a câmbio caiu de 0,6 para 0,5; de títulos vinculados à taxa SELIC passou de 28,2 para 27,5%; a de títulos prefixados reduziu-se de 24,9 para 22,9, devido a resgate líquido de LTN. A dos títulos vinculados a índices de preços  recuou de 21 para 7 e para 21,49.” E continua: “Essas operações foram compensadas pelas operações compromissadas, cuja participação evoluiu de 23,7% para 26,5%.”

Se somarmos as operações compromissadas, 26,5%, com os títulos selicados emitidos pelo Tesouro nós temos mais de 50%, quase 55%. Com essa aberração, se o Banco Central aumenta a taxa de juros isso repercute diretamente na dívida pública, porque aumenta a dívida pública, mais de metade dos títulos. E com essas operações compromissadas, sinceramente, os objetivos do Tesouro ao levantar o PAF, o Plano Anual de Financiamento, ele se decompõe. O Tesouro não tem emitido títulos na base da SELIC. tem pagado mais caro — que é outra observação que faço, Deputado Pedro Novais.

Nesse ponto, vale tecer algumas considerações sobre a carteira de Títulos do Tesouro em posse do BACEN e também sobre as Operações Compromissadas. Ambos os itens patrimoniais associam-se à política monetária. Como se sabe, as operações clássicas de política monetária são três: (i) operações de mercado aberto; (ii) janela de redesconto; e (iii) encaixes obrigatórios. O método mais amplamente utilizado pelos bancos centrais são as operações de mercado aberto, que consiste na compra e venda de títulos com o objetivo de regular a liquidez e o custo das reservas bancárias. As reservas bancárias são parte da Base Monetária (Moeda) e correspondem à soma dos saldos não aplicados, existentes nas contas que os bancos comerciais possuem junto ao Banco Central. Tais saldos determinam o excesso de liquidez monetária, ou seja, o excesso de moeda em poder dos bancos comerciais. Na maior parte dos países, as operações compromissadas são o mecanismo preferencial para a condução da política monetária, em função de sua agilidade, o que possibilita um ajuste fino no controle da liquidez. No Brasil tais operações já atingem o montante de meio trilhão de reais. A atual política monetária tem representado elevadíssimo custo financeiro e social, conforme abordado nos próximos capítulos da presente análise preliminar.

O governo não tem divulgado os dados da dívida mobiliária interna federal tal  como demonstrado nas Tabelas 1 acima, mas tem dado maior importância para a divulgação da chamada “Dívida Líquida do Setor Público”. Esse conceito não é utilizado pelos demais países, face às distorções que tal conceito pode provocar, tendo em vista que desconta da dívida bruta certos ativos financeiros, até mesmo aqueles sobre os quais o país recebe remuneração baixa ou mesmo negativa, como no caso das reservas cambiais[27].

Importante citar trecho da intervenção do Relator desta CPI, Deputado Pedro Novais, sobre a inexistência de bibliografia sobre o conceito de “dívida líquida”, durante a Audiência Pública de 5/11/2009, que contou com a exposição do Vice-Diretor Gerente do FMI, Murilo Portugal:

Dep. Pedro Novaes – (…) “Refiro-me especificamente à comparação dívida bruta com dívida líquida. Em geral, trazem-nos dados da dívida líquida. Há poucos dias, eu presidi uma reunião conjunta de 3 Comissões e o Presidente do Banco Central trouxe-nos a demonstração de que nossa dívida líquida é 42%, o que é bastante aceitável. Mas V.Exa. acaba de nos trazer o problema da dívida bruta. Eu quero dizer a V.Exa. que não sou economista, portanto posso ser perdoado por isso, mas na época da relatoria da Lei de Responsabilidade Fiscal eu fui obrigado a consultar 25 livros da Biblioteca da Câmara para tentar uma definição de dívida líquida. E não o consegui.

Então, aquela definição que está na Lei de Responsabilidade Fiscal foi de autoria minha e daqueles 2 cidadãos que estão ali, que são os assessores da Comissão de Orçamento. Pois bem. Eu fiquei sabendo agora que a dívida ótima para um país em desenvolvimento, e no caso estaria o Brasil, seria abaixo de 50%, e que atualmente a nossa está acima de 60%. Estou me referindo à dívida bruta. Isso é muito diferente de se dizer que a dívida do Brasil é de 42%.

 

 

Portanto, o indicador mais adequado para se obter a verdadeira situação fiscal do país é a dívida bruta, e não a líquida, até porque todos os demais países calculam a dívida bruta, que é a dívida que terá que ser paga, como afirmou o depoente Murilo Portugal:

 

 

“A dívida pública ainda é elevada no Brasil, pelos padrões internacionais, para o caso dos países emergentes. E para fazer essas comparações do Brasil com outros países, ao invés de usar o conceito de dívida líquida, que é mais usado aqui no Brasil, temos que usar o conceito de dívida bruta, porque esse é o conceito que os outros países usam. Portanto, as estatísticas dos outros países são calculadas em termos de dívida bruta. Então, para fazer a comparação, a gente tem que passar do conceito de dívida líquida para o conceito de dívida bruta. E as agências de crédito Análise e Risco, a Moods e a Fitch, por exemplo, elas utilizam também o conceito de dívida bruta, e não de dívida líquida, nas suas análises, porque, afinal de contas, é a dívida bruta que tem que ser paga.”

 

 

A CPI requereu ao Banco Central e ao Tesouro Nacional – Requerimento de Informações Nº 9/09 – os saldos anuais da dívida interna desde janeiro de 1987, dentre outras informações, a fim de obter o estoque efetivo da dívida interna federal. Tal requerimento foi importante, pois as informações sobre o estoque da dívida mobiliária federal são divulgadas de forma dispersa, como antes mencionado.

 

Em nenhuma das respostas apresentadas pelas instituições restou demonstrado o estoque da dívida interna federal, tal como indicado na Tabela 1 retro, que indica que o montante da dívida mobiliária federal interna superou o patamar de R$ 2 trilhões em dezembro/2009.

 

Diante disso é importante que a CPI recomende que as instituições oficiais passem a divulgar de forma transparente o estoque efetivo da dívida pública mobiliária federal, tendo em vista que esta é a dívida que terá quer paga e sobre a qual incidirão juros e demais taxas.

 

 

 

 

II.2 – FLUXOS DA DÍVIDA MOBILIÁRIA FEDERAL INTERNA – JUROS E AMORTIZAÇÕES

 

Os fluxos da dívida compreendem a entrada e saída de recursos. O fluxo de entrada corresponde à emissão de novas dívidas, enquanto a saída se refere ao pagamento de juros e amortizações.

O estoque da dívida é, portanto, influenciado principalmente por estes dois fluxos. Os fatores que determinaram o crescimento da dívida interna mobiliária federal são objeto de exame no final do capítulo IV da presente análise preliminar.

Cabe, inicialmente, expor brevemente os principais conceitos que envolvem o tema, de acordo com a legislação e manuais de contabilidade do setor público, de modo a melhor definir variáveis como juros, atualização monetária, dentre outros.

Um dos principais objetivos da CPI, indicado em seu título, é a investigação sobre o PAGAMENTO DE JUROS DA DÍVIDA PÚBLICA.

Cumpre inicialmente mencionar que a CPI da Dívida Pública não conseguiu obter os dados relativos sobre o valor efetivamente pago a título de juros e amortizações, apesar de sucessivas reiterações, tendo enfrentado as seguintes dificuldades conceituais, cuja legalidade é questionável, como se mencionará a seguir:

  • O valor dos juros nominais divulgado pelo Banco Central é calculado sobre a dívida líquida do setor público, e não sobre a dívida bruta;
  • O valor dos juros “pagos” informado no Balanço Orçamentário, conforme dados extraídos do SIAFI, corresponde ao denominados juros “reais”, ou seja, exclui dos rendimentos pagos a parcela correspondente à atualização monetária;
  • A parcela da atualização monetária[28] (compõe o valor dos juros nominais  O valor das amortizações “pagas” informado no Balanço Orçamentário engloba a parcela dos rendimentos pagos que corresponde ao valor da atualização monetária ;
  • Parte dos juros tem sido paga mediante a emissão de novos títulos, não havendo transparência em relação a esse montante;
  • O Tesouro Nacional não informou à CPI o valor dos juros efetivamente pagos, nem das amortizações efetivadas no período, tendo enviado a Tabela dos “Fatores Condicionantes do Crescimento da Dívida do Setor Público”[29], da qual consta que todo o superávit primário produzido no período de 1996 a julho de 2009, no montante de R$ 678,3 bilhões teria sido destinado ao pagamento de juros. A mesma tabela indica que os juros “nominais” (calculados sobre a DLSP) do mesmo período somaram R$ 1.530,6 bilhões. Ou seja, todo o superávit primário do período foi insuficiente para cobrir menos da metade dos juros do mesmo período, ainda que minimizados face ao cálculo dos mesmos com base na dívida líquida do setor público. Tal fato indica que não tem sido efetuada qualquer amortização efetiva da dívida mobiliária federal, pois nem os juros tem sido pagos, apesar do esforço fiscal de produzir elevados superávits primários, sendo tais juros incorporados ao estoque da dívida, o que explica o acelerado crescimento do estoque da mesma.  

 

Apesar dessas dificuldades, as investigações realizadas pela CPI constataram que o valor inserido no Balanço Orçamentário da União a título de “JUROS e Encargos da Dívida” compreende somente a parcela dos JUROS que supera o valor correspondente à aplicação do IGP-M.

Tal metodologia para a divulgação do valor dos juros constou explicitamente do Relatório denominado “Resultado do Tesouro” e tabelas anexas, que a Secretaria do Tesouro Nacional passou a divulgar em sua página na internet, a partir de agosto de 1995.

Relativamente à Dívida Pública, o referido relatório explicou o caráter metodológico utilizado para a mensuração dos juros reais divulgados pela Secretaria do tesouro nacional, que considera apenas os pagamentos excedentes sobre o IGP-M, conforme trecho a seguir transcrito[30]:

Os encargos com a dívida interna ascenderam a R$ 867 milhões dos quais R$ 841 milhões relativos à dívida mobiliária. O crescimento observado sobre agosto de 1994 explica-se por dois fatores. O primeiro, de caráter metodológico, deriva do fato de que a mensuração dos juros reais considera apenas os pagamentos excedentes sobre o IGP-M. Nos meses de julho e agosto do ano passado, esses pagamentos foram influenciados pelos efeitos estatísticos, sobre esse índice, da transição URV – Real. O segundo fator, associado à base de comparação, é a redução no estoque da dívida mobiliária em mercado, derivada da forte monetização verificada nos primeiros meses do Real.

 

Conforme Manual de Despesa Orçamentária[31], os JUROS DA DÍVIDA MOBILIÁRIA correspondem a “Despesas orçamentárias com a remuneração real devida pela aplicação de capital de terceiros em títulos públicos.”

 

Essa metodologia vem sendo aplicada desde a edição do Plano Real, conforme se depreende dos Relatórios divulgados na página do Tesouro Nacional na internet, denominados “Resultado do Tesouro”, acompanhado das respectivas tabelas de dados.

 

Tal fato é extremamente relevante, pois quando são comparadas as despesas de Juros da Dívida com as demais despesas com Pessoal, Previdência, dentre outros, há uma grande distorção, pois tais dispêndios encontram-se traduzidos em grandezas distintas. Ou seja, enquanto os dispêndios com Pessoal ou Previdência englobam a variação de preço neles embutidos (por exemplo, reajustes salariais decorrentes de inflação, atualização de tabelas dos serviços de saúde, atualização de benefícios previdenciários, reajuste do salário mínimo decorrente da inflação, dentre outros), o valor dos “Juros e Encargos da Dívida” considera somente a parcela dos juros que supera a inflação do período, ou seja, exclui a parcela do rendimento correspondente ao pagamento de atualização monetária. Tal fato decorre de metodologia utilizada no Balanço Orçamentário da União, que considera como “Juros” somente a parcela que supera o IGP-M, e computa a atualização monetária da dívida pública juntamente com a rubrica “Amortização”.

Portanto, os dados são divulgados segundo metodologias distintas: enquanto gastos com pessoal e demais áreas sociais computam os valores nominais correntes efetivamente pagos (embutidos os eventuais reajustes salariais e de benefícios ao longo dos anos decorrentes da inflação), os gastos com juros da dívida pública são descontados do IGP-M calculado sobre o estoque da dívida.

Cabe esclarecer que para comparar os gastos, devem ser consideradas sempre tanto os valores dos juros como das amortizações informados no Orçamento da União Executado, pois a rubrica “amortizações” engloba a parcela do rendimento dos títulos da dívida (parte dos juros nominais) correspondente à atualização monetária.

A distorção decorrente da comparação de dados distintos pode ser visualizada nos gráficos 5 e 6 a seguir.

É importante ressaltar que nos dados informados no Gráfico a seguir não foram computadas as parcelas do “Refinanciamento”. Caso fosse considerado o Refinanciamento, o peso da dívida seria ainda maior e o gasto com o endividamento corresponderia a 48% do total gasto.

Gráfico 5 – Orçamento Geral da União – Gastos selecionados – R$ milhões

(COMPUTANDO O GASTO COM JUROS E AMORTIZAÇÕES DA DÍVIDA PÚBLICA)

Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional – SIAFI. Não inclui a rolagem, ou “refinanciamento” da dívida.  Disponível em: http://www.stn.fazenda.gov.br/contabilidade_governamental/execucao_orcamentaria_do_GF/Despesa_Grupo.xls

 

Tendo em vista os argumentos antes mencionados que demonstram que o valor indicado no Balanço Orçamentário a título de “Juros” computa somente o valor dos “juros reais” e que a parcela do rendimento correspondente à atualização monetária paga é computada nas “amortizações”, a comparação demonstrada no gráfico acima é a mais próxima da realidade, pois compara os gastos efetivamente pagos com a soma dos valores indicados no Balanço Orçamentário a título de juros e amortizações.

Tabela 3 – Gastos com Juros e Amortizações da Dívida (exclusive o refinanciamento)

(R$ milhões)

Ano Juros e Encargos da Dívida Amortizações Total
1995          16.766,16            9.029,74          25.795,90
1996          19.492,00            7.891,74          27.383,74
1997          21.033,23          13.266,55          34.299,78
1998          30.812,50          24.410,78          55.223,28
1999          45.355,56          27.180,92          72.536,48
2000          38.834,85          43.899,66          82.734,51
2001          52.816,43          54.635,70        107.452,13
2002          55.260,68          68.961,28        124.221,96
2003          65.706,83          79.550,92        145.257,75
2004          74.373,39          71.602,31        145.975,70
2005          89.839,64          49.251,22        139.090,87
2006        151.151,88        120.929,46        272.081,34
2007        140.078,87          96.858,00        236.936,87
2008        110.168,28        170.982,05        281.150,33
2009        123.864,47        256.167,80        380.032,27
TOTAL     1.035.554,78     1.094.618,13     2.130.172,90

Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional – SIAFI. Não inclui a rolagem, ou “refinanciamento” da dívida.  Disponível em: http://www.stn.fazenda.gov.br/contabilidade_governamental/execucao_orcamentaria_do_GF/Despesa_Grupo.xls

 

No Gráfico 6, a seguir, transcrevemos o comparativo normalmente divulgado pelo governo, que divulga os dados do orçamento utilizando metodologias distintas para demonstrar os gastos sociais e os gastos com a dívida pública. Ou seja, compara apenas os “juros reais” (que exclui a parcela da atualização monetária) com o pagamento efetivo dos gastos com pessoal, educação, saúde, previdência e assistência social, que são considerados pelos valores nominais correntes efetivamente pagos.

Os dados foram extraídos do Relatório Anual do Tribunal de Contas da União correspondente ao ano de 2002[32], que apresenta a seguinte evolução dos dispêndios das seguintes áreas: Previdência e Assistência Sociais, Pessoal, Juros e Encargos da Dívida, Saúde e Saneamento, Educação e Cultura:

Gráfico 6

 

Depreende-se que os dados expostos no Relatório do TCU (que utiliza como fonte os dados divulgados pelo Banco Central) aparentam que os dispêndios com Juros e Encargos da Dívida estariam aquém dos dispêndios com Pessoal ou Previdência.

Entretanto, ao se considerar as despesas com JUROS traduzidas na mesma base que as demais despesas, constata-se que estes são bem superiores.

 

II.2.1 – AUSÊNCIA DE INFORMAÇÕES SOBRE OS JUROS NOMINAIS EFETIVAMENTE PAGOS

A CPI enfrentou grande dificuldade para obter dados sobre os juros da dívida interna efetivamente pagos pelo país. O Ministério da Fazenda não respondeu, até o momento, ao Requerimento de Informações da CPI que solicitou tal dado[33].

Constatou-se grande disparidade entre os dados obtidos no SIAFI e os dados publicados pelo Banco Central, que utilizam diferentes conceitos e metodologias. Relativamente ao pagamento de juros, por exemplo, enquanto o SIAFI considera os juros ‘reais’ (descontada a inflação) efetivamente pagos no período (critério de caixa), o Banco Central divulga os juros ‘nominais’, porém, calculados apenas sobre a dívida ‘líquida’, utilizando o critério de competência, ou seja, o quanto a dívida aumentou devido aos juros apropriados no período. Portanto, qualquer que seja a fonte de pesquisa recorrida, não está disponível o dado referente aos juros nominais efetivamente pagos, conforme requerido pela CPI e não atendido pelo Ministério da Fazenda até o momento.

 

Cabe ressaltar que os juros nominais divulgados pelo Banco Central são calculados apenas sobre a Dívida Líquida do Setor Público[34] e não sobre a dívida bruta, sendo que até mesmo o representante do FMI – Murilo Portugal – que depôs à CPI frisou que a dívida que tem que ser paga é a bruta e não a líquida.

Adicionalmente, durante as investigações realizadas pela CPI constatou-se que a parcela dos juros correspondente à atualização monetária tem sido considerada como “amortizações”, o que demanda o aprofundamento das investigações, pois há indício de que tal procedimento represente um desrespeito à Constituição Federal, especialmente a denominada “Regra de Ouro”, que proíbe a emissão de títulos para pagar despesas correntes, dentre as quais destacam-se os juros, conforme detalhado no próximo item da presente análise. Vale lembrar que a ‘regra de ouro’ encontra-se repetida no art. 12, § 2º da Lei de Responsabilidade Fiscal, ao estabelecer que o montante das operações de crédito não pode ser superior ao valor das despesas de capital. A motivação da citada regra foi limitar a emissão de novas dívidas ao montante das amortizações de capital, além de evitar que as operações de crédito fossem contratadas para financiar despesas correntes.

Ora, ao extrair a parcela da atualização monetária do “Rendimento” dos títulos da dívida, classificando tal atualização monetária como parte do “principal”, o montante das despesas de capital estabelecido na Constituição Federal fica inflado da parcela correspondente à atualização monetária, permitindo, assim, um aumento do referido limite para emissão de novos títulos da dívida pública. Tal procedimento tem permitido a elevação das emissões de títulos da dívida interna, provocando aumento acelerado de seu montante e dos pagamentos dos altíssimos juros que incidem sobre a mesma.

Além do indício de desobediência ao dispositivo constitucional, tal fato é extremamente relevante também para efeito de comparação das despesas de “Juros da Dívida” com as demais despesas, conforme mencionado no item precedente desta análise.

 

II.2.1.1 – Exercício de Estimativa dos Juros Nominais somando-se o IGP-M

Diante da ausência de resposta oficial ao requerimento que solicitou informações sobre o valor dos juros nominais efetivamente pagos e diante do fato de que tal dado não se encontra disponível dentre as diversas informações disponibilizadas pelo Ministério da Fazenda e Banco Central, a CPI realizou, preliminarmente, o exercício demonstrado no gráfico a seguir para estimar o valor dos juros nominais, acrescentando-se aos juros reais (constantes do Relatório do TCU acima), a atualização monetária medida pelo IGP-M. Para isso, tomou-se o estoque da dívida mobiliária federal ao início de cada ano, constante na Tabela 1, e aplicou-se o índice IGP-M.

A distorção evidenciada no gráfico a seguir, que mostra forte elevação no valor dos juros nominais em 1999 reflete a influência da variação cambial embutida no índice de atualização monetária IGP-M. Por outro lado, é importante prosseguir as investigações, pois na prática não se verificou queda no pagamento de juros, como o exercício de estimativa a seguir evidenciou em 2000:

 

Gráfico 7  – EXERCÍCIO DE ESTIMATIVA DE JUROS NOMINAIS SOMANDO-SE O IGP-M

Dispêndio de várias áreas (R$ milhões correntes)

Fonte: Relatório Prévio sobre as Contas do governo de 2001, análise do “Impacto da Dívida Pública Federal”, item 2.8.2. Os juros nominais foram estimados aplicando-se o IGP-M ao estoque da dívida do início de cada ano, constante na Tabela 1, e somando-se os juros reais apresentados na publicação do TCU.

 

Tabela 4 – Dispêndio de várias áreas (R$ milhões correntes)

  1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001
Estoque inicial da Dívida (a)                           85.755                         133.942                         197.880                         290.970                         448.529                         527.526                         641.599
 

IGP-M (%) (b)

15,24 9,19 7,74 1,79 20,10 9,95 10,37
Atualização Monetária

(c = a x b)

                          13.068                           12.306                           15.314                             5.203                           90.163                           52.499                           66.549
Juros reais (d)                           16.873                           19.492                           21.033                           30.812                           45.356                           38.835                           52.816
Juros Nominais (c+d)                           29.941                           31.798                           36.347                           36.015                         135.519                           91.334                         119.365
Educação e Cultura                             9.373                             9.495                           10.428                           14.938                           16.160                           10.854                           11.915
Saúde e Saneamento                           14.782                           14.727                           17.986                           16.657                           19.250                           20.431                           23.867
Previdência e Assistência Sociais                           52.576                           63.957                           69.991                           81.169                           88.844                           97.849                         112.842
Pessoal                           37.889                           40.901                           44.530                           47.947                           51.571                           58.241                           65.449

Fonte: Relatório Prévio sobre as Contas do governo de 2001, análise do “Impacto da Dívida Pública Federal”, item 2.8.2. Os juros nominais foram estimados aplicando-se o IGP-M ao estoque da dívida do início de cada ano, constante na Tabela 1, somando-se os juros reais apresentados na publicação do TCU.

Verifica-se, portanto, que os gastos com juros calculados segundo o exercício de estimativa acima demonstrado também superaram os demais gastos sociais.

 

II.2.1.2 – Estimativa dos Juros Nominais com base no cálculo ponderado das emissões

Outra metodologia para a estimativa dos juros nominais corresponde à multiplicação da taxa de juros média ponderada em cada ano (ou mês) pelo estoque da dívida no período, conforme se demonstrará a seguir[35].

Considerando que a CPI não teve acesso ao valor efetivamente pago a título de juros nominais efetivos da dívida interna, essa assessoria tentou calcular tais juros a partir de dados da tabela disponível na página do Tesouro Nacional, denominada “Histórico dos Resultados das Ofertas Públicas do Tesouro Nacional”[36], que contém informações sobre as taxas de juros ofertadas a cada leilão de títulos da dívida interna.

Cabe ressaltar que esta estimativa aplica as taxas de juros observadas nas emissões de cada ano a todo o estoque do endividamento (ou seja, incluindo os títulos emitidos em anos anteriores), o que pode gerar diferenças significativas entre os juros estimados e os juros efetivamente ocorridos.

Inicialmente cabe elucidar o significado de alguns termos informados no citado Histórico de Resultados, de modo a torná-los acessíveis à compreensão geral, ou seja:

  1. Relativamente à operação, o termo “Tradicional” informado no citado Histórico de Resultados corresponde às operações de Vendas Tradicionais, correspondente, portanto, a uma emissão de títulos vendidos. Foram consideradas também as operações indicadas como “Troca”, pois nesse caso também houve emissão de títulos.
  2. Relativamente às taxas de juros nominais aplicadas em cada leilão, é imprescindível elucidar a peculiaridade das informações disponibilizada na tabela do citado Histórico de Resultados, tendo em vista o seguinte:
    • Quando a mesma indica taxa de juros efetiva igual a “0,00” (zero), isso significa que a taxa utilizada na operação foi a Taxa Selic (título pós-fixado), como no caso das LFTs (Letras Financeiras do Tesouro).
    • Quando aparece uma taxa reduzida (cerca de 4% a 6%), significa que esta operação envolveu título indexado a índice de preços, sendo tal percentual o adicional de juros anual além do referido índice de preços (como no caso das NTN-B, ou Notas do Tesouro Nacional Série B).
    • Quando constam taxas próximas ou superiores à Taxa Selic, significa que o título é pré-fixado, como no caso das LTNs (Letras do Tesouro Nacional).

 

Tomando-se como base a tabela disponível na página do Tesouro Nacional, denominada “Histórico dos Resultados das Ofertas Públicas do Tesouro Nacional”[37], foi possível se estimar o custo médio das emissões de títulos pelo Tesouro Nacional, a cada mês, desde o ano 2000 até 2009. Este período foi adotado uma vez que a tabela do Tesouro Nacional inicia-se no ano 2000.

Considerou-se a emissão dos títulos LTN, LFT, NTN-B, NTN-C e NTN-F. Não foi incluído o título NTN-D (que possui rendimento vinculado à variação cambial), pois nas 55 operações de emissão identificadas, em 52 constava o número zero na coluna denominada “Volume Financeiro Aceito”. Isto representou uma limitação ao trabalho, visto que foi grande o peso das desvalorizações cambiais na elevação da dívida interna.

No caso dos títulos indexados à taxa Selic, considerou-se, no presente exercício de estimativa, a taxa vigente à época da emissão. No caso de títulos pré-fixados, considerou-se a própria taxa de emissão (“Taxa Aceita”). No caso de títulos indexados a índice de preços, considerou-se a inflação vigente no mês de emissão, projetada para os 12 meses seguintes, mais o adicional de taxa de juros aceita.

A tabela a seguir mostra o custo médio das emissões, a cada mês, custo esse representado pela estimativa da taxa anual de juros nominais, ponderada pelo volume financeiro aceito em cada emissão:

 

Estimativa da Taxa média anual de JUROS NOMINAIS aplicada nas emissões de títulos do Tesouro Nacional

Mês 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009
Jan 19,46% 16,32% 19,84% 27,70% 15,74% 18,18% 16,80% 12,74% 12,46% 12,51%
Fev 19,50% 15,35% 19,48% 25,17% 16,24% 17,19% 14,87% 11,88% 11,70% 11,31%
mar 18,85% 16,39% 18,53% 24,47% 16,26% 19,60% 14,68% 12,38% 11,77% 11,18%
abr 18,09% 16,43% 19,20% 25,24% 16,09% 19,02% 14,62% 11,54% 12,50% 10,89%
mai 19,59% 18,19% 19,24% 26,22% 17,55% 19,23% 14,74% 11,11% 13,46% 10,37%
Jun 18,31% 17,85% 19,68% 24,67% 16,41% 18,72% 15,25% 10,57% 13,45% 10,24%
Jul 17,26% 20,24% 21,71% 26,13% 16,96% 18,41% 14,79% 10,98% 14,25% 10,54%
Ago 17,57% 22,88% 24,10% 22,81% 17,21% 19,61% 14,69% 11,63% 13,37% 10,53%
Set 16,57% 19,03% 34,52% 20,24% 17,17% 18,51% 13,67% 11,15% 14,11% 10,43%
out 16,95% 22,97% 23,65% 19,98% 17,03% 18,20% 13,59% 11,41% 14,71% 11,13%
nov 17,61% 21,01% 24,53% 17,37% 17,23% 17,71% 13,07% 11,50% 13,68% 10,93%
dez 16,33% 20,63% 24,07% 16,60% 18,93% 16,89% 12,91% 11,72% 13,98% 10,44%
Média Anual 18,29% 18,63% 22,60% 23,66% 16,95% 18,45% 14,43% 11,58% 12,98% 10,82%

Fonte: Tabela disponível na página do Tesouro Nacional, denominada “Histórico dos Resultados das Ofertas Públicas do Tesouro Nacional, disponível na página http://www.stn.fazenda.gov.br/divida_publica/leiloes/downloads/resultados/banco_de_dados.xls

Nota: Considerou-se a emissão dos títulos LTN, LFT, NTN-B, NTN-C e NTN-F. Não foi incluído o título NTN-D (que possui rendimento vinculado à variação cambial), pois nas 55 operações de emissão identificadas, em 52 constava o número zero na coluna denominada “Volume Financeiro Aceito”. A média foi ponderada pelo “volume financeiro aceito” em cada emissão.

 

Utilizando-se a metodologia de cálculo acumulado, verificou-se que a taxa de juros nominais acumulada durante estes 10 anos (2000 a 2009), aplicada nos leilões de títulos da dívida interna, foi de 371,14%, o que representa uma remuneração 4 vezes superior à inflação observada no período, segundo o IPCA[38]. Tal valor também é maior que a própria taxa Selic acumulada no período, que atingiu 346,16%.[39].

Essa estimativa demonstra os relevantes ganhos proporcionados pela prática de elevadíssimas taxas de juros no país. Cabe, entretanto, repetir que devido às limitações antes descritas, o percentual de 371,14% não chegou a considerar os títulos indexados ao câmbio, face às limitações antes mencionadas, referentes às ofertas do título NTN-D (que possui rendimento vinculado à variação cambial), o que demonstra que a presente estimativa está bem conservadora, ou seja, aquém do custo efetivo da dívida interna.

Aplicando-se tais taxas de juros médias anuais estimadas ao estoque da dívida pública mobiliária interna[40] no início[41] de cada ano, podemos estimar os juros nominais anuais da dívida interna:

Estimativa de Juros Nominais Anuais – Dívida Pública Mobiliária Interna Federal

Ano Estoque inicial da dívida

(R$ bilhões)

(a)

Taxa média anual de juros nominais

(b)

Estimativa dos juros nominais anuais

(R$ bilhões)

(a x b)

2000 453,13 18,29%              82,88
2001 512,92 18,63%              95,53
2002 635,11 22,60%            143,54
2003 636,86 23,66%            150,66
2004 737,34 16,95%            125,00
2005 826,70 18,45%            152,56
2006 984,93 14,43%            142,11
2007 1.087,90 11,58%            125,96
2008 1.203,96 12,98%            156,30
2009 1.221,10 10,82%            132,15
TOTAL            1.306,70

Fonte: Banco Central e Tesouro Nacional. Elaboração própria. Nota: Considerou-se o estoque divulgado no Quadro 11 da Nota para a Imprensa “Mercado Aberto”, do Banco Central, disponível em http://www.bcb.gov.br/htms/infecon/demab/ma201001/NImprensa.zip , excluindo-se as Operações de Mercado Aberto.

 

Um importante dado que se pode extrair da tabela acima é que os juros nominais acumulados estimados de 2000 a 2008 foram de R$ 1.174,55 trilhão, valor este R$ 86 bilhões superior ao valor de R$ 1.088,47 trilhão de “Juros Competência” no mesmo período, informados na tabela “Saldos anuais e fatores de variação da dívida interna, em poder do público”, enviada a esta CPI pela Secretaria do Tesouro Nacional. Ou seja, apesar dos cálculos estimados terem utilizado parâmetros conservadores, o total dos juros nominais obtido nessa estimativa ainda foi superior aos ‘juros competência’ informados à CPI, o que demanda o aprofundamento das investigações e completo acesso aos dados que não chegaram a ser proporcionados à CPI.

Além do mais, conforme explicitado anteriormente, os juros efetivamente ocorridos podem ter sido bem maiores, dado que se considerou, na estimativa, as taxas vigentes nas emissões de cada ano, e não as taxas incidentes sobre todo o estoque da dívida.

Portanto, devem ser aprofundadas as investigações sobre a metodologia utilizada pelo Tesouro Nacional para o cálculo dos juros, dentro dos “fatores de variação da dívida interna”.

Já em 2010, analisando-se as emissões de títulos efetuadas pelo Tesouro Nacional, verifica-se que, de 1º de janeiro a 18 de março, foram emitidos R$ 105 bilhões em títulos da dívida interna, sendo R$ 35 bilhões indexados à Taxa Selic, R$ 18 bilhões indexados a índices de preços e R$ 51 bilhões em títulos pré-fixados, ou seja, cuja taxa de juros não segue a taxa Selic, pois é fixada no momento da emissão.

Analisando-se essas emissões que totalizaram R$ 51 bilhões, verifica-se que a taxa de juros de juros nominais média desses títulos foi superior a 12% ao ano, ou seja, muito acima da Taxa Selic, de 8,75%, que já é a taxa de juros mais elevada do mundo.

 

 

 

II.3 – ADMISSÃO DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA PARA A DÍVIDA PÚBLICA

 

De acordo com o MANUAL TÉCNICO DE CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PÚBLICO[42]a Contabilidade Aplicada ao Setor Público constitui ramo da Ciência Contábil e deve observar os Princípios Fundamentais de Contabilidade, que representam a essência das doutrinas e teorias relativas dessa ciência, consoante o entendimento predominante nos universos científico e profissional do País.”

 

O citado manual aborda os princípios fundamentais de Contabilidade – Princípio da Entidade; Princípio da Continuidade; Princípio da Oportunidade; Princípio do Registro pelo Valor Original; Princípio da Atualização Monetária; Princípio da Competência; Princípio da Prudência.

Relativamente à atualização monetária, o citado manual menciona que “Para atendimento ao Princípio da Atualização Monetária, o setor público segue o disposto na Resolução CFC nº 900/2001, que torna a atualização monetária compulsória quando a inflação acumulada no triênio, medida com base no Índice Geral de Preços do Mercado (IGPM/FGV), atingir 100% ou mais.

 

A Resolução CFC 900/2001 estabeleceu o seguinte, relativamente à atualização monetária:

RESOLUÇÃO CFC Nº 900/2001

Dispõe sobre a aplicação do Princípio da Atualização Monetária.

O CONSELHO FEDERAL DE CONTABILIDADE, no exercício de suas atribuições legais e regimentais;

Considerando que o “Princípio da Atualização Monetária”, conforme o “caput” do art. 8º da Resolução CFC nº 750-93, obriga a que “Os efeitos da alteração do poder aquisitivo da moeda nacional devem ser reconhecidos nos registros contábeis através do ajustamento da expressão formal dos valores dos componentes patrimoniais”;

Considerando que a atualização objetiva que “… permaneçam substantivamente corretos os valores dos componentes patrimoniais e, por conseqüência, o do patrimônio líquido”, segundo o inciso II do parágrafo único do art. 8º da dita Resolução;

Considerando que a aplicação do Princípio, não está atrelada a qualquer parâmetro em termos de nível inflacionário;

Considerando que os padrões internacionais de Contabilidade somente requerem a atualização monetária quando a taxa acumulada de inflação no triênio se aproxima ou exceda a 100%;

Considerando que a partir da implantação do Plano Real a economia e a moeda brasileira vem apresentando estabilidade;

 

Resolve:

 

Art. 1º A aplicação do “Princípio da Atualização Monetária” é compulsória quando a inflação acumulada no triênio for de 100% ou mais.

Parágrafo único. A inflação acumulada será calculada com base no Índice Geral de Preços do Mercado (IGPM), apurado mensalmente pela Fundação Getúlio Vargas, por sua aceitação geral e reconhecimento por organismos nacionais e internacionais.

 

Art. 2º A aplicação compulsória do “Princípio da Atualização Monetária” deverá ser amplamente divulgada nas notas explicativas às demonstrações contábeis.

 

Art. 3º Quando a taxa inflacionária acumulada no triênio for inferior a 100%, a aplicação do Princípio da Atualização Monetária somente poderá ocorrer em demonstrações contábeis de natureza complementar às demonstrações de natureza corrente, derivadas da escrituração contábil regular.

  • 1º No caso da existência das ditas demonstrações complementares, a atualização deverá ser evidenciada nas respectivas notas explicativas, incluindo a indicação da taxa inflacionária empregada.
  • 2º A Atualização Monetária, neste caso, não originará nenhum registro contábil.

Art. 4º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

JOSÉ SERAFIM ABRANTES – Presidente

 

Cabe ressaltar que o Manual de Despesa Nacional editado em 2008[43], ao explicar o Princípio da Atualização Monetária, transcreveu o art. 8º. da Resolução CFC nº. 750-93, ato anterior ao Plano Real e às novas regras mencionadas na precitada Resolução CFC nº. 900/2001:

2.2.5 Princípio da Atualização Monetária

 

Art. 8º Os efeitos da alteração do poder aquisitivo da moeda nacional devem ser reconhecidos nos registros contábeis por meio do ajustamento da expressão formal dos valores dos componentes patrimoniais.”[44]

 

Para atendimento ao Princípio da Atualização Monetária, o setor público segue o disposto na Resolução CFC nº 900/2001, que torna a atualização monetária compulsória quando a inflação acumulada no triênio, medida com base no Índice Geral de Preços do Mercado (IGPM/FGV), atingir 100% ou mais.

 

Outra Resolução do Conselho Federal de Contabilidade, específica para o Setor Público – Resolução nº. 1111/2007 – aprovou Apêndice II à Resolução 750-93, citando seu enunciado e mencionando, textualmente, o seguinte:

Princípio da Atualização Monetária

(…)

Perspectivas do Setor Público

Na hipótese de que o consenso em torno da mensuração dos elementos patrimoniais identifique e defina os valores de aquisição, produção, doação, ou mesmo, valores obtidos mediante outras bases de mensuração, desde que defasadas no tempo, necessita-se de atualizá-lo monetariamente quando a taxa acumulada de inflação no triênio for igual ou superior a 100%, nos termos da Resolução CFC nº. 900/2001.

A mesma Resolução estabeleceu, em relação ao Princípio do Valor Original:

Princípio do Registro pelo Valor Original

Perspectivas do Setor Público

Nos registros dos atos e fatos contábeis será considerado o valor original dos componentes patrimoniais.

Valor Original, que ao longo do tempo não se confunde com o custo histórico, corresponde ao valor resultante de consensos de mensuração com agentes internos ou externos, com base em valores de entrada – a exemplo de custo histórico, custo histórico corrigido e custo corrente; ou valores de saída – a exemplo de valor de liquidação, valor de realização, valor presente do fluxo de benefício do ativo e valor justo.

 

Em relação ao setor privado, logo após a edição do Plano Real, a Lei 9249/95 vedou a utilização de qualquer sistema de correção monetária – tanto para pessoas físicas como jurídicas (arts.  4º. e 17)[45].

Por outro lado, relativamente ao setor público, a Lei de Responsabilidade Fiscal[46] admite a atualização monetária da dívida mobiliária refinanciada[47], conforme artigo 29:

Art. 29. Para os efeitos desta Lei Complementar, são adotadas as seguintes definições:

(…)

        V – refinanciamento da dívida mobiliária: emissão de títulos para pagamento do principal acrescido da atualização monetária.

(…)

  • 3o A atualização monetária do principal da dívida mobiliária refinanciada não poderá superar a variação do índice de preços previsto na lei de diretrizes orçamentárias, ou em legislação específica.

 

A partir desse dispositivo, a Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO – de cada ano[48] tem disposto o seguinte:

Lei 11.768, de 14.08.2008

Art. 73 – A atualização monetária do principal da dívida mobiliária refinanciada da União não poderá superar, no exercício de 2009, a variação do Índice Geral de Preços – Mercado – IGP-M da Fundação Getúlio Vargas.

Evidencia-se que a LDO, tal como a LRF, estabeleceram um LIMITE para a atualização da dívida mobiliária refinanciada.

Nenhuma das duas leis determinou a atualização da dívida mobiliária, mas tão somente estabeleceu o limite correspondente ao IGP-M para a dívida refinanciada. Tal dispositivo legal, smj, não ampararia excluir da parcela do rendimento pago pelos títulos da dívida interna a parcela da “inflação relevante” e classificá-la como amortização, pois evidentemente, o rendimento pago pelos títulos não se confunde com o principal da dívida.

Porém, no Memorando 1241/2009/CODIV/SECAD-III/STN/MF-DF, enviado a esta CPI[49], a Secretaria do Tesouro Nacional, em sua Tabela 1 (que apresenta os fatores de variação da Dívida Pública Mobiliária Federal Interna), atualiza monetariamente toda a dívida pelo IGP-M, reduzindo os juros apenas à parcela que supera tal índice.

Questionada pela CPI acerca da justificativa para esta utilização do IGP-M para a atualização monetária da dívida pública na Tabela 1 do citado Memorando[50], a Secretaria do Tesouro Nacional respondeu o seguinte [51]:

“Quanto ao IGP-M informamos que ele é utilizado para cumprir o disposto na Lei de Diretrizes Orçamentárias, decretada pelo Congresso Nacional, que menciona que a atualização monetária do principal da dívida mobiliária refinanciada da União não poderá superar, no exercício, a variação do Índice Geral de Preços – Mercado – IGP-M da Fundação Getúlio Vargas.”

Porém, conforme mostrado anteriormente, a LDO não permite a atualização monetária da dívida total, mas tão somente a sua parcela refinanciada.

Tal metodologia adotada pelo governo tem uma série de implicações.

Inicialmente, já significa um tratamento diferenciado em comparação com os demais ativos, que somente serão objeto de atualização monetária quando esta apresentar variação superior a 100% no período de três anos.

Significa também um privilégio de tratamento a um determinado ativo do setor público – a dívida pública – enquanto os demais ativos do patrimônio de Pessoas Físicas e Pessoas Jurídicas não são atualizados, sendo inclusive tributados na apuração do ganho de capital por ocasião de sua venda.

Outro fato importante é relativo aos limites estabelecidos na CF, especialmente a denominada “Regra de Ouro” que proíbe a emissão de títulos para pagar despesas correntes, dentre as quais destacam-se os juros.

Art. 167. São vedados:

(…)

III – a realização de operações de créditos que excedam o montante das despesas de capital, ressalvadas as autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta;

 

A regra de ouro na verdade é aquela que diz, no art. 12, § 2º da LRF, que o montante das operações de crédito não pode ser superior ao valor das despesas de capital. Ou seja, tal regra visa a evitar que as operações de crédito sejam contratadas para financiar despesas correntes.

 

Art. 12. As previsões de receita observarão as normas técnicas e legais, considerarão os efeitos das alterações na legislação, da variação do índice de preços, do crescimento econômico ou de qualquer outro fator relevante e serão acompanhadas de demonstrativo de sua evolução nos últimos três anos, da projeção para os dois seguintes àquele a que se referirem, e da metodologia de cálculo e premissas utilizadas.

  • 1o Reestimativa de receita por parte do Poder Legislativo só será admitida se comprovado erro ou omissão de ordem técnica ou legal.
  • 2o O montante previsto para as receitas de operações de crédito não poderá ser superior ao das despesas de capital constantes do projeto de lei orçamentária.
  • 3o O Poder Executivo de cada ente colocará à disposição dos demais Poderes e do Ministério Público, no mínimo trinta dias antes do prazo final para encaminhamento de suas propostas orçamentárias, os estudos e as estimativas das receitas para o exercício subseqüente, inclusive da corrente líquida, e as respectivas memórias de cálculo.

 

Ora, ao extrair a parcela da atualização monetária do “Rendimento” dos títulos da dívida, classificando tal atualização monetária como parte do “principal”, o montante das despesas de capital estabelecido na Constituição Federal fica inflado da parcela correspondente à atualização monetária.

É importante mencionar que os dados divulgados na página do Tesouro Nacional apontam como rendimento[52] dos títulos públicos tanto a parcela da “atualização monetária” como “Juros”.

O cômputo da atualização monetária como parte do “principal” e não como parte do “rendimento” está explícito no recém aprovado MANUAL DE DEMONSTRATIVOS FISCAIS – MDF[53], documento que instruirá a elaboração do Relatório Resumido de Execução Orçamentária e, consequentemente, o Balanço Orçamentário. O referido MDF determina, relativamente às AMORTIZAÇÕES:

 

 

MANUAL DE DEMONSTRATIVOS FISCAIS, página 23

Instruções para o preenchimento do Balanço Orçamentário

“AMORTIZAÇÃO DA DÍVIDA – Nessa linha, registrar as despesas com o pagamento do principal e da atualização monetária ou cambial da dívida pública interna e externa, contratual ou mobiliária. O refinanciamento da dívida pública não poderá ser informado nessa linha, pois deverá ser registrado destacadamente na linha AMORTIZAÇÃO DA DÍV. / REFINANCIAMENTO (XI).”

 

 

Esse mecanismo está permitindo que a parcela dos juros (Despesa Corrente) correspondente ao valor do IGP-M seja financiada mediante a emissão de novos títulos (Receita de Capital) e também mediante a utilização de qualquer outra fonte disponível, conforme disposto no art. 11 da MP 435:

 

 Art. 11. O superávit financeiro das fontes de recursos existentes no Tesouro Nacional em 31 de dezembro de 2007 poderá ser destinado à amortização da Dívida Pública Mobiliária Federal interna.

 Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica às fontes de recursos decorrentes de vinculação constitucional e de repartição de receitas a Estados e Municípios.

 

Constata-se, portanto, que a informação do valor da AMORTIZAÇÃO DA DÍVIDA impede o conhecimento do efetivo pagamento a título de principal (ou capital) da dívida, tanto interna quanto externa, tendo em vista que o valor informado a título de “Amortização” agrega parcelas de atualização monetária[54] e variação cambial que na realidade constituem partes do rendimento pago e não do capital principal.

Diante disso, é recomendável que a CPI da Dívida Pública exija a publicação destacada dos valores referentes ao pagamento de amortizações sejam informados destacadamente, separando-se os valores das amortizações do “principal”, bem como os pagamentos efetuados a título de “atualização monetária” e variação “cambial”, segregando-se sempre os valores das dívidas “interna” e “externa”, “contratual” e “mobiliária”.

Tal providência é necessária, tendo em vista o princípio constitucional da transparência exigido para operações públicas, especialmente as relativas ao endividamento público, que envolvem valores vultosos.

A informação da “Amortização da Dívida” a ser indicada no Orçamento Executado, necessita ser individualizada, de forma a cumprir a denominada “Regra de Ouro” inserida na Constituição Federal, que impede a contratação de dívida ou emissão de títulos para pagamento de despesa correntes que superem o valor do principal da dívida. Na medida em que as despesas pagas a título de atualização monetária e cambial são apropriadas como “Amortização”, são distorcidos os cálculos.

A Constituição Federal dispõe, no inciso III do art. 167 que é vedada “a realização de operações de créditos que excedam o montante das despesas de capital, ressalvadas as autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta”.

Por sua vez, a Lei de Responsabilidade Fiscal – § 2º do art. 12 – dispõe que o montante previsto para as receitas de operações de crédito não poderá ser superior aos das despesas de capital constantes do projeto de lei orçamentária.

 

As “Despesas de Capital” são justamente as “Amortizações”. Dessa forma, ao somar às amortizações as despesas pagas a título de “atualização monetária e cambial” – que são parte da remuneração do empréstimo e não do capital principal – se está inflando o montante das amortizações e, conseqüentemente, alargando o limite determinado na LRF. Portanto, a CPI deve recomendar o aprofundamento das investigações para se apurar os danos ao Patrimônio Público decorrentes deste fato.

O próprio Manual de Demonstrativos Fiscais estabelece (página 191) que “Ao impedir que o montante das operações de crédito em um exercício financeiro exceda o montante das despesas de capital, evita-se que sejam realizados empréstimos para financiar despesas correntes como pagamento de funcionários, despesas administrativas e, principalmente, juros.”

Inportante destacar que o “Manual Técnico de Contabilidade Aplicada ao Setor Público”, em sua página 54, também coloca as despesas com juros como “despesas correntes”, conforme o diagrama a seguir.

Fonte: Manual Técnico de Contabilidade Aplicada ao Setor Público, Aplicado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, Válido para o exercício de 2009 (Portaria Conjunta STN/SOF nº 3, de 2008), 1ª edição – Volume II – Manual de Despesa Nacional, pág 54. Disponível em :http://www.stn.gov.br/contabilidade_governamental/download/Manual_Despesa_Nacional_30102008_MTCASP_.pdf

 

Conclui-se que não há qualquer dúvida de que amortizações são referentes a pagamentos de parcela do principal da dívida, e portanto, são classificadas como despesas de capital. Por outro lado, os rendimentos pagos pelos títulos da dívida – juros nominais – fazem parte do grupo das despesas correntes. A forma de divulgação dos valores pagos a título de juros e amortizações utilizada pelo governo não atende ao princípio da transparência, pois considera a parte do rendimento correspondente à atualização monetária como se fosse despesa de capital.

Cabe ainda mencionar outros princípios constitucionais:

 

 

PRINCÍPIO ORÇAMENTÁRIO DA UNIVERSALIDADE

 

Segundo os artigos 3º e 4º da Lei nº 4.320/64, a Lei Orçamentária deverá conter todas as receitas e despesas. Isso possibilita um controle parlamentar efetivo sobre as finanças públicas.

 

Art. 3º A Lei de Orçamentos compreenderá todas as receitas, inclusive as de operações de crédito autorizadas em lei.

 

 

Tal princípio complementa-se pela “regra do orçamento bruto”, definida no artigo 6º da Lei nº 4.320/64:

 

“Art. 6º. Todas as receitas e despesas constarão da lei de orçamento pelos seus totais, vedadas quaisquer deduções.”

 

O Manual de Contabilidade menciona (Capítulo Receita sob o enfoque orçamentário):

 

“Conforme o caput do artigo 3º da Lei nº 4.320/64, a Lei de Orçamentos compreenderá todas as receitas, inclusive as de operações de crédito autorizadas em lei. Assim, o equilíbrio orçamentário pode ser obtido por meio de operações de crédito.

 

Adicionalmente, conforme estabelece o art. 167, III, da Constituição Federal é vedada a realização de operações de crédito que excedam o montante das despesas de capital, dispositivo conhecido como regra de ouro. De acordo com esta regra, cada unidade governamental deve manter o seu endividamento vinculado à realização de investimentos e não à manutenção da máquina administrativa e demais serviços.”

 

PRINCÍPIO ORÇAMENTÁRIO DA LEGALIDADE

 

Tem o mesmo fundamento do princípio da legalidade aplicado à administração pública, segundo o qual cabe ao Poder Público fazer ou deixar de fazer somente aquilo que a lei expressamente autorizar, ou seja, a administração pública se subordina aos ditames da lei. A Constituição Federal de 1988, no artigo 37, estabelece os princípios da administração pública, dentre eles o da legalidade e, no seu artigo 165, estabelece a necessidade de formalização legal das leis

orçamentárias:

 

“Art. 165. Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão:

I – o plano plurianual;

II – as diretrizes orçamentárias;

III – os orçamentos anuais.”

Dadas as limitações impostas às investigações por parte da CPI, recomenda-se o aprofundamento dos estudos jurídicos a fim de determinar a legalidade da utilização do conceito de “dívida líquida” e demais cálculos baseados nesta, que impedem a devida transparência do montante da dívida interna federal e a carga de juros nominais efetivos que incidirão sobre esta.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

III – Peso da Dívida Pública no Orçamento da União e o impacto nos Direitos Humanos

 

 

III – Peso da Dívida Pública no Orçamento da União e o impacto nos Direitos Humanos

Ao longo dos anos, a dívida pública tem consumido a maior parcela do Orçamento Geral da União, o que representa um peso para a sociedade, pois todas as áreas sociais são sacrificadas pelo peso da dívida.

Apesar dos elevados pagamentos anuais para o serviço[55] da dívida pública, a dívida interna vem aumentando aceleradamente, e a dívida externa também continua crescendo[56].

Os gráficos a seguir mostram como a dívida tem sido o item mais relevante do Orçamento Geral da União nos últimos anos, representando a principal fatia de recursos, bem superior às demais áreas sociais importantes.

A fonte de todos os dados[57] utilizados foram o Sistema Access da Câmara dos Deputados e a Secretaria do Tesouro Nacional[58].

A cada ano foram elaborados dois gráficos, sendo que o primeiro considerou apenas os gastos com juros e amortizações da dívida, sem computar o “refinanciamento” da dívida, que representa, segundo a Lei de Diretrizes Orçamentárias, “o pagamento do principal, acrescido da atualização monetária da dívida pública federal, realizado com receita proveniente da emissão de títulos.” O segundo gráfico de cada ano inclui a despesa com o refinanciamento da dívida pública federal.

Cabe ressaltar que, conforme já explicitado nos itens anteriores deste Relatório, os juros que estão sendo considerados são os denominados juros “reais”, ou seja, já descontada a inflação, medida pelo IGP-M.

Gráfico 8 – Orçamento Geral da União – Executado – 2009

Inclui Refinanciamento da Dívida (Total = R$ 1,329 trilhão)

Fonte: Sistema Access da Câmara dos Deputados, e Tesouro Nacional, conforme explicitado no texto anterior.

 

 

Gráfico 9 – Orçamento Geral da União – Executado – 2009

Exclui Refinanciamento da Dívida (Total = R$ 1,068 trilhão)

Fonte: Sistema Access da Câmara dos Deputados, e Tesouro Nacional, conforme explicitado no texto anterior.

Gráfico 10 – Orçamento Geral da União – Executado – 2008

Inclui Refinanciamento da Dívida (Total = R$ 1,195 trilhão)

Fonte: Sistema Access da Câmara dos Deputados, e Tesouro Nacional, conforme explicitado no texto anterior.

 

Gráfico 11 – Orçamento Geral da União – Executado – 2008

Exclui Refinanciamento da Dívida (Total = R$ 917 bilhões)

Fonte: Sistema Access da Câmara dos Deputados, e Tesouro Nacional, conforme explicitado no texto anterior.

Gráfico 12 – Orçamento Geral da União – Executado – 2007

Inclui Refinanciamento da Dívida (Total = R$ 1,165 trilhão)

Fonte: Sistema Access da Câmara dos Deputados, e Tesouro Nacional, conforme explicitado no texto anterior.

 

Gráfico 13 – Orçamento Geral da União – Executado – 2007

Exclui Refinanciamento da Dívida (Total = R$ 790 bilhões)

Fonte: Sistema Access da Câmara dos Deputados, e Tesouro Nacional, conforme explicitado no texto anterior.

 

Gráfico 14 – Orçamento Geral da União – Executado – 2006

Inclui Refinanciamento da Dívida (Total = R$ 1,175 trilhão)

Fonte: Sistema Access da Câmara dos Deputados, e Tesouro Nacional, conforme explicitado no texto anterior.

 

Gráfico 15 – Orçamento Geral da União – Executado – 2006

Exclui Refinanciamento da Dívida (Total = R$ 798 bilhões)

Fonte: Sistema Access da Câmara dos Deputados, e Tesouro Nacional, conforme explicitado no texto anterior.

Gráfico 16 – Orçamento Geral da União – 2000 a 2009 – Por função – Sem considerar o “Refinanciamento”

Fonte: Sistema Access da Câmara dos Deputados, e Tesouro Nacional, conforme explicitado no texto anterior.

 

 

 

 

 

Gráfico 17 – Orçamento Geral da União – 2000 a 2009 – Por função – considerando o “Refinanciamento”

Fonte: Sistema Access da Câmara dos Deputados, e Tesouro Nacional, conforme explicitado no texto anterior.

 

 

O Orçamento da União é a peça que materializa as decisões decorrentes dos embates entre os atores ao longo de sua formulação. Nesse sentido, é uma instituição com ligação direta ao nível de democratização da sociedade. Numa palavra, quanto maior fosse a participação popular na sua elaboração, mais democráticas tenderiam a ser as decisões de alocação dos recursos públicos; inversamente, quanto mais isolada a elaboração orçamentária, menos democrática seria a gestão das finanças estatais. Dentro desse processo, o mesmo se aplica à dívida pública.

No Brasil, os gastos referentes ao endividamento não estão sujeitos à discussão com o Parlamento, devido à vedação dada pelo § 3º do artigo 166 da CF, que diz:

“As emendas ao projeto de lei do orçamento anual ou aos projetos que o modifiquem somente podem ser aprovadas caso:

I – sejam compatíveis com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias;

II – indiquem os recursos necessários, admitidos apenas os provenientes de anulação de despesa, excluídas as que incidam sobre:

  1. a) dotações para pessoal e seus encargos;
  2. b) serviço da dívida [sem grifo no original];
  3. c) transferências tributárias constitucionais para Estados, Municípios e Distrito Federal”

Portanto, o Parlamento não pode sequer participar da discussão sobre a parcela mais importante do orçamento, ou seja, os gastos com o endividamento.

Cabe ressaltar que, segundo o estudo “Anatomia de uma fraude à Constituição”, de Adriano Benayon e Pedro Antonio Dourado de Rezende [59], de agosto de 2006, este dispositivo teria sido inserido de forma ilegal na Constituição. Portanto, cabe à CPI encaminhar esta grave denúncia ao Ministério Público Federal, para que seja investigada a legitimidade do citado dispositivo da Constituição face às denúncias de ocorrência de fraude em sua inclusão no texto constitucional.

É importante ressaltar que todos os privilégios dos gastos com a dívida pública decorrem do precitado dispositivo constitucional.

Outro ato que privilegia os gastos com a dívida pública em detrimento dos demais gastos sociais é a denominada “Lei de Responsabilidade Fiscal” – Lei Complementar 101/2000.

Cabe ressaltar que a priorização dos gastos com a dívida interna foi imposta pelo FMI em várias Cartas de Intenção, as quais exigiam a criação de tal Lei, que promove a priorização do chamado “Resultado Primário”, ou “Superávit Primário”, ou seja, a garantia de que os gastos sociais serão contingenciados para se garantir o pagamento da dívida. Abaixo reproduzimos vários artigos desta Lei que assim dispõem:

 

ESTABELECIMENTO DAS METAS DE RESULTADO PRIMÁRIO

Art 4º, § 1o Integrará o projeto de lei de diretrizes orçamentárias Anexo de Metas Fiscais, em que serão estabelecidas metas anuais, em valores correntes e constantes, relativas a receitas, despesas, resultados nominal e primário e montante da dívida pública, para o exercício a que se referirem e para os dois seguintes.

Art 5º, I – O projeto de lei orçamentária anual (…) conterá, em anexo, demonstrativo da compatibilidade da programação dos orçamentos com os objetivos e metas constantes do documento de que trata o §1º do art. 4º;

 

CORTES DE GASTOS SOCIAIS PARA SE ATINGIR AS METAS DE RESULTADO PRIMÁRIO

Art. 9º Se verificado, ao final de um bimestre, que a realização da receita poderá não comportar o cumprimento das metas de resultado primário ou nominal estabelecidas no Anexo de Metas Fiscais, os Poderes e o Ministério Público promoverão, por ato próprio e nos montantes necessários, nos trinta dias subseqüentes, limitação de empenho e movimentação financeira, segundo os critérios fixados pela lei de diretrizes orçamentárias.

 

IMPEDIMENTO A QUALQUER MEDIDA QUE AFETE O RESULTADO PRIMÁRIO

Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá (…) atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições:

I – demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias;

II – estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

(…)

Art. 16. A criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa será acompanhado de:

        I – estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subseqüentes;

        II – declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias.

 

LIMITAÇÃO AO GASTO COM PESSOAL

 

Art. 19. Para os fins do disposto no caput do art. 169 da Constituição, a despesa total com pessoal, em cada período de apuração e em cada ente da Federação, não poderá exceder os percentuais da receita corrente líquida, a seguir discriminados:

        I – União: 50% (cinqüenta por cento);

        II – Estados: 60% (sessenta por cento);

        III – Municípios: 60% (sessenta por cento).

 

RECONDUÇÃO DA DÍVIDA AO LIMITE, VIA RESULTADO PRIMÁRIO

 

Art. 31. Se a dívida consolidada de um ente da Federação ultrapassar o respectivo limite…

        I – estará proibido de realizar operação de crédito interna ou externa, inclusive por antecipação de receita, ressalvado o refinanciamento do principal atualizado da dívida mobiliária;

        II – obterá resultado primário necessário à recondução da dívida ao limite, promovendo, entre outras medidas, limitação de empenho, na forma do art. 9º.

  • 2º Vencido o prazo para retorno da dívida ao limite, e enquanto perdurar o excesso, o ente ficará também impedido de receber transferências voluntárias da União ou do Estado.

 

Na Análise Preliminar sobre a Dívida Externa, Capítulo V, apresentamos um resumo dos impactos sociais do processo de endividamento brasileiro, sendo relevante, nessa análise relativa à dívida interna, citar trechos do depoimento prestado à CPI pelo Presidente do Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro, Sr. Paulo Sérgio Souto:

 

“Para finalizar, quero ainda apontar o que considero mais dramático e grave em todo esse processo de financeirização e endividamento extraordinário do Estado.

O brutal esforço que representa para o Estado brasileiro a manutenção da atual política econômica tem implicado elevar de forma contínua a carga tributária, com forte concentração de recursos na órbita federal, para o pagamento dos juros e encargos da dívida; implica, também, como vimos, altas taxas de juros que impacta negativamente a produção e a geração de empregos. Contudo, a face mais dramática desse processo é o prejuízo acarretado para o orçamento público.

(…)

A distribuição dos recursos orçamentários, pelas principais Funções Orçamentárias, mostra a iníqua gestão do orçamento público, em prol da manutenção do pagamento de juros e encargos que, como vimos, apenas realimenta o endividamento do Estado.

De cada cem reais arrecadados pela União, em 2008, nada mais que R$ 30,57 foram gastos com o pagamento de juros e amortizações de uma dívida que não pára de crescer, enquanto a Saúde, a Assistência Social ou a Educação tiveram de se contentar com recursos ínfimos, entre R$ 2,57 (para a “prioritária” Educação) e R$ 4,81, para a Saúde, a mais aquinhoada das áreas sociais, excluindo-se a Previdência Pública, que possui os seus recursos próprios, sofre com os efeitos da DRU – a Desvinculação de Receitas da União, e mesmo assim é responsabilizada, pela ótica financista, como a vilã das contas públicas.

Esta é apenas uma das dimensões da preocupante e paradoxal conjuntura que vivemos.

Vivemos gritantes distorções que se agravam no nosso dia-a-dia. Violência criminal sem precedentes; caos nos transportes públicos; incapacidade do setor público de saúde em atender minimamente à população; absoluta falta de rumo para enfrentar a crise de formação escolar dos jovens e adolescentes; descrédito crescente da população em relação aos políticos, à política e às suas instituições são exemplos nítidos de uma sociedade que se mostra doente.

A partir da ótica financista, abandonamos investimentos na infra-estrutura do país e aprofundamos um modelo agrícola baseado em monoculturas, altamente predador de recursos naturais, concentrador de renda e riqueza, extremamente tóxico em seus insumos e que requer pesados dispêndios do Estado, em refinanciamentos constantes e periódicos das dívidas do setor agrícola. 

Paradoxalmente, ou – pior – como grave sintoma desta enfermidade política, social e econômica, observamos uma absoluta alienação da maioria da população, e de seus ditos formadores de opinião, com o terrível quadro que se desenha na nossa realidade. Ao contrário, há uma inconseqüente atmosfera de otimismo no ar.

Precisamos reagir.

O esforço que o trabalho desta CPI representa, nos permite fornecer todos os subsídios para uma mudança que se faz necessária.”

 

Considerando que a priorização dos gastos com a dívida pública provocaram fortes impactos sociais, é fundamental ligar os impactos sociais à subtração dos direitos humanos, inclusive para fins legais.

A Constituição Federal estabelece, em seu artigo 6º, verbis:

Art. 6o São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

O referido dispositivo constitucional não tem sido devidamente cumprido, por falta de recursos: 46,2 milhões de brasileiros vivem abaixo da linha da pobreza, e condenados à exclusão social. Outros 10,7 milhões são considerados “indigentes”, ou seja, famintos[60]. Por outro lado, o art. 166, II, § 3º, “b”, da mesma Constituição, que prioriza os gastos com dívida pública, tem sido rigorosamente cumprido, com pagamento dos juros mais generosos do mundo.

A ausência de atendimento aos direitos sociais básicos constitui ofensa ao direito à vida digna e constitui crime de ação continuada, imprescritível.

Diante disso, é importante citar, em sua íntegra, Parecer da Dra. Flávia Piovesan[61] sobre os impactos da dívida pública na subtração de recursos que deveriam ser destinados ao atendimento das necessidades sociais:

 

IMPACTO DA DÍVIDA PÚBLICA

NA IMPLEMENTAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS

 

     Este estudo tem por objetivo enfocar o impacto da dívida pública na implementação dos direitos sociais, à luz dos parâmetros protetivos internacionais e constitucionais adotados pelo Estado Brasileiro.

 

  1. Direitos Sociais e a Concepção Contemporânea de Direitos Humanos

Os direitos humanos refletem um construído axiológico, a partir de um espaço simbólico de luta e ação social. No dizer de Joaquin Herrera Flores[62], compõem uma racionalidade de resistência, na medida em que traduzem processos que abrem e consolidam espaços de luta pela dignidade humana. Invocam uma plataforma emancipatória voltada à proteção da dignidade humana.

Enquanto reivindicações morais, os direitos humanos nascem quando devem e podem nascer. Como realça Norberto Bobbio, os direitos humanos não nascem todos de uma vez e nem de uma vez por todas[63]. Para Hannah Arendt, os direitos humanos não são um dado, mas um construído, uma invenção humana, em constante processo de construção e reconstrução[64].                       Considerando a historicidade dos direitos humanos, destaca-se a chamada concepção contemporânea de direitos humanos, que veio a ser introduzida pela Declaração Universal de 1948 e reiterada pela Declaração de Direitos Humanos de Viena de 1993.

            Esta concepção é fruto do movimento de internacionalização dos direitos humanos, que surge, no pós-guerra, como resposta às atrocidades e aos horrores cometidos durante o nazismo. É neste cenário que se vislumbra o esforço de reconstrução dos direitos humanos, como paradigma e referencial ético a orientar a ordem internacional. Se a Segunda Guerra significou a ruptura com os direitos humanos, o Pós-Guerra deveria significar a sua reconstrução.

     Neste contexto, a Declaração de 1948 vem a inovar a gramática dos direitos humanos, ao introduzir a chamada concepção contemporânea de direitos humanos, marcada pela universalidade e indivisibilidade destes direitos. Universalidade porque clama pela extensão universal dos direitos humanos, sob a crença de que a condição de pessoa é o requisito único para a titularidade de direitos, considerando o ser humano como um ser essencialmente moral, dotado de unicidade existencial e dignidade, esta como valor intrínseco à condição humana. Indivisibilidade porque a garantia dos direitos civis e políticos é condição para a observância dos direitos sociais, econômicos e culturais e vice-versa. Quando um deles é violado, os demais também o são. Os direitos humanos compõem, assim, uma unidade indivisível, interdependente e inter-relacionada, capaz de conjugar o catálogo de direitos civis e políticos com o catálogo de direitos sociais, econômicos e culturais.

     Para Asbjorn Eide: “O termo ‘direitos sociais’, por vezes chamado ‘direitos econômicos-socias’, refere-se a direitos cujo objetivo é proteger e avançar no exercício das necessidades humanas básicas e assegurar condições materiais para uma vida com dignidade. O fundamento deste direito no Direito dos Direitos Humanos encontra-se na Declaração Universal de Direitos Humanos, que no artigo 22 enuncia: “Toda pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social e à realização, pelo esforço nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada  Estado, dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento de sua personalidade”.[65].

     Ao examinar a indivisibilidade e a interdependência dos direitos humanos, leciona Hector Gros Espiell: “Só o reconhecimento integral de todos estes direitos pode assegurar a existência real de cada um deles, já que sem a efetividade de gozo dos direitos econômicos, sociais e culturais, os direitos civis e políticos se reduzem a meras categorias formais. Inversamente, sem a realidade dos direitos civis e políticos, sem a efetividade da liberdade entendida em seu mais amplo sentido, os direitos econômicos, sociais e culturais carecem, por sua vez, de verdadeira significação. Esta idéia da necessária integralidade, interdependência e indivisibilidade quanto ao conceito e à realidade do conteúdo dos direitos humanos, que de certa forma está implícita na Carta das Nações Unidas, se compila, se amplia e se sistematiza em 1948, na Declaração Universal de Direitos Humanos, e se reafirma definitivamente nos Pactos Universais de Direitos Humanos, aprovados pela Assembléia Geral em 1966, e em vigência desde 1976, na Proclamação de Teerã de 1968 e na Resolução da Assembléia Geral, adotada em 16 de dezembro de 1977, sobre os critérios e meios para melhorar o gozo efetivo dos direitos e das liberdades fundamentais (Resolução n. 32/130)”.[66]

     A partir da Declaraçåo de 1948, começa a se desenvolver o Direito Internacional dos Direitos Humanos, mediante a adoção de diversos instrumentos internacionais de proteção.

O processo de universalização dos direitos humanos permitiu a formação de um sistema internacional de proteção destes direitos. Este sistema é integrado por tratados internacionais de proteção que refletem, sobretudo, a consciência ética contemporânea compartilhada pelos Estados, na medida em que invocam o consenso internacional acerca de temas centrais aos direitos humanos, na busca da salvaguarda de parâmetros protetivos mínimos – do “mínimo ético irredutível”. Neste sentido, cabe destacar que, até agosto de 2007, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos contava com 160 Estados-partes; o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais contava com 157 Estados-partes; a Convenção contra a Tortura contava com 145 Estados-partes; a Convenção sobre a Eliminação da Discriminação Racial contava com 173 Estados-partes; a Convenção sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher contava com 185 Estados-partes e a Convenção sobre os Direitos da Criança apresentava a mais ampla adesão, com 193 Estados-partes.[67].

     Ao lado do sistema normativo global, surgem os sistemas regionais de proteçåo, que buscam internacionalizar os direitos humanos nos planos regionais, particularmente na Europa, América e Africa. Os sistemas global e regional nåo såo dicotômicos, mas complementares. Inspirados pelos valores e princípios da Declaraçåo Universal, compõem o universo instrumental de proteçåo dos direitos humanos, no plano internacional. Nesta ótica, os diversos sistemas de proteção de direitos humanos interagem em benefício dos indivíduos protegidos. Ao adotar o valor da primazia da pessoa humana, estes sistemas se complementam, interagindo com o sistema nacional de proteção, a fim de proporcionar a maior efetividade possível na tutela e promoção de direitos fundamentais.

           Ressalte-se que a Declaração de Direitos Humanos de Viena, de 1993, reitera a concepção da Declaração de 1948, quando, em seu parágrafo 5o, afirma: “Todos os direitos humanos são universais, interdependentes e inter-relacionados. A comunidade internacional deve tratar os direitos humanos globalmente de forma justa e equitativa, em pé de igualdade e com a mesma ênfase.”

     Feitas essas considerações a respeito da concepção contemporânea de direitos humanos e o modo pelo qual se relaciona com os direitos sociais, transita-se à análise da proteção internacional e constitucional a estes direitos.

 

 

  1. A Proteção dos Direitos Sociais no Sistema Global

     Preliminarmente, faz-se necessário ressaltar que a Declaração Universal de 1948, ao introduzir a concepção contemporânea de direitos humanos, foi o marco de criação do chamado “Direito Internacional dos Direitos Humanos”, que é um sistema jurídico normativo de alcance internacional, com o objetivo de proteger os direitos humanos.

     Após a sua adoção, em 1948, instaurou-se uma larga discussão sobre qual seria a maneira mais eficaz em assegurar a observância universal dos direitos nela previstos. Prevaleceu o entendimento de que a Declaração deveria ser “juridicizada” sob a forma de tratado internacional, que fosse juridicamente obrigatório e vinculante no âmbito do Direito Internacional.

     Esse processo de “juridicização” da Declaração começou em 1949 e foi concluído apenas em 1966, com a elaboração de dois distintos tratados internacionais no âmbito das Nações Unidas – o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais – que passavam a incorporar, com maior precisão e detalhamento, os direitos constantes da Declaração Universal, sob a forma de preceitos juridicamente obrigatórios e vinculantes.

     O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC), que até 2007 contemplava a adesão de 157 Estados-partes, incluindo o Estado Brasileiro que o ratificou em 1992, enuncia um extenso catálogo de direitos, que inclui o direito ao trabalho e à justa remuneração, o direito a um nível de vida adequado, o direito à moradia, o direito à educação, à previdência social, à saúde, etc.       Se os direitos civis e políticos devem ser assegurados de plano pelo Estado, sem escusa ou demora – têm a chamada auto-aplicabilidade -, os direitos sociais, econômicos e culturais, por sua vez, nos termos em que estão concebidos pelo Pacto, apresentam realização progressiva. Vale dizer, são direitos que estão condicionados à atuação do Estado, que deve adotar todas as medidas, tanto por esforço próprio como pela assistência e cooperação internacionais[68], principalmente nos planos econômicos e técnicos, até o máximo de seus recursos disponíveis, com vistas a alcançar progressivamente a completa realização desses direitos (artigo 2º, parágrafo 1º do Pacto)[69].

     No âmbito regional interamericano, há que se mencionar o Protocolo de San Salvador, em matéria de direitos econômicos, sociais e culturais, que entrou em vigor em novembro de 1999, tendo sido ratificado pelo Estado Brasileiro em 1996. Tal como o Pacto dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, este tratado da OEA reforça os deveres jurídicos dos Estados-partes no tocante aos direitos sociais, que devem ser aplicados progressivamente, sem recuos e retrocessos, para que se alcance sua plena efetividade.  O Protocolo de San Salvador estabelece um amplo rol de direitos econômicos, sociais e culturais, compreendendo o direito ao trabalho, direitos sindicais, direito à saúde, direito à previdência social, direito `a educação, direito à cultura,….Este Protocolo acolhe (tal como o Pacto dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais) a concepção de que cabe aos Estados investir o máximo dos recursos disponíveis para alcançar, progressivamente, a plena efetividade dos direitos econômicos, sociais e culturais.

     Extraí-se da jurisprudência internacional, fomentada especialmente pelo Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, relevantes princípios a orientar a hermenêutica concernente aos direitos sociais. Dentre os princípios relacionados aos direitos sociais, destacam-se: a) o princípio da observância do minimum core obligation; b) o princípio da aplicação progressiva, do qual decorre o princípio da proibição do retrocesso social; c) o princípio da inversão do ônus da prova; d) princípio da participação, transparência e accountability; e e) os deveres dos Estados em matéria de direitos sociais.

 

  1. a) princípio da observância do minimum core obligation no tocante aos direitos sociais

     A jurisprudência internacional, fomentada pelo Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, tem endossado o dever dos Estados de observar um minimum core obligation no tocante aos direitos sociais. Como explica David Bilchitz: “O Comitê sustenta que o “minimum core obligation” relativo a cada direito requer a satisfação ao menos dos níveis essenciais mínimos de cada direito pelos Estados-partes. (…) O núcleo essencial mínimo demanda obrigações que satisfaçam o ‘mínimo essencial de cada direito”[70].

     O dever de observância do mínimo essencial concernente aos direitos sociais tem como fonte o princípio maior da dignidade humana, que é o princípio fundante e nuclear do Direito dos Direitos Humanos.

 

  1. b) princípio da aplicação progressiva dos direitos econômicos, sociais e culturais, do qual decorre o princípio da proibição do retrocesso social

     O General Comment n.03 do Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais afirma a obrigação dos Estados de adotar medidas, por meio de ações concretas, deliberadas e focadas, de modo mais efetivo possível, voltadas à implementação dos direitos sociais. Por consequência, cabe aos Estados o dever de evitar medidas de retrocesso social. Para o Comitê: “Qualquer medida de retrocesso deve envolver a mais criteriosa consideração e deve apenas ser justificável tendo como referência a totalidade dos direitos previstos pela Convenção no contexto da máxima aplicação dos recursos disponíveis”.

     Cabe reafirmar que o Pacto dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais estabelece a obrigação dos Estados em reconhecer e progressivamente implementar os direitos nele enunciados, utilizando o máximo dos recursos disponíveis.  Da aplicação progressiva dos econômicos, sociais e culturais resulta a cláusula de proibição do retrocesso social em matéria de direitos sociais. Para J.J. Gomes Canotilho: “O princípio da proibição do retrocesso social pode formular-se assim: o núcleo essencial dos direitos sociais já realizado e efetivado através de medidas legislativas deve considerar-se constitucionalmente garantido, sendo inconstitucionais quaisquer medidas que, sem a criação de esquemas alternativos ou compensatórios, se traduzam na prática em uma anulação, revogação ou aniquilação pura e simples desse núcleo essencial. A liberdade do legislador tem como limite o núcleo essencial já realizado”[71].

     Ainda no General Comment n.03, como destaca David Bilchitz: “O Comitê da ONU têm identificado várias categorias de obrigações impostas aos Estados no campo dos direitos econômicos e sociais. No Comentário Geral n. 03, o Comitê reconhece a distinção entre obrigações de conduta e obrigações de resultado. Obrigações de conduta demandam a adoção de medidas “razoavelmente calculadas para realizar o exercício de um direito particular”. Obrigações de resultado demandam “dos Estados que alcancem objetivos específicos para satisfazer parâmetros substantivos. (…) direitos econômicos e sociais tipicamente impõem ambas obrigações de conduta e de resultado”.[72]

 

  1. c) princípio da inversão do ônus da prova

     Nos termos do artigo 2 (1) do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, os Estados têm a obrigação de adotar todas as medidas necessárias, utilizando o máximo de recursos disponível, para a realização dos direitos sociais.

     É com base neste dever que emerge o princípio da inversão do ônus da prova. Como leciona Asborn Eide: “Um Estado que clame não ter a possibilidade de satisfazer suas obrigações por motivos de força maior tem o ônus de provar que este é o caso e que tem sem sucesso buscado obter suporte internacional para assegurar a disponibilidade e a acessibilidade de direitos”[73].

 

  1. d) princípio da participação, transparência e accountability

     Outro relevante princípio no campo dos direitos sociais atém-se ao dever dos Estados de assegurar mecanismos de participação, transparência e accountability nos processos de elaboração, implementação e impacto das políticas públicas sociais. Daí a importância do componente democrático na formulação, na realização e no impacto de políticas públicas sociais, bem como do próprio orçamento público, como eficaz instrumento no combate à corrupção.

 

  1. e) deveres dos Estados

     O Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, em seu General Comment n.12, realça as obrigações do Estado no campo dos direitos econômicos, sociais e culturais: respeitar, proteger e implementar.

     Quanto à obrigação de respeitar, obsta ao Estado que viole tais direitos. No que tange à obrigação de proteger, cabe ao Estado evitar e impedir que terceiros (atores não-estatais) violem estes direitos. Finalmente, a obrigação de implementar demanda do Estado a adoção de medidas voltadas à realização destes direitos.

 

                 Passa-se neste momento ao enfoque da proteção dos direitos sociais na Constituição Brasileira de 1988. Como será sustentado, a Carta de 1988 acolhe a concepção contemporânea de direitos humanos, empresta especial destaque aos direitos sociais como direitos fundamentais e atribui aos direitos enunciados pelos tratados de direitos humanos ratificados pelo Brasil (como é o caso do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais) status constitucional. Verificar-se-á que os direitos sociais encontram consistente e sólida proteção na esfera internacional e constitucional, o que demanda do Estado Brasileiro o cumprimento de deveres jurídicos atinentes à implementação destes direitos.

 

 

  1. A Proteção dos Direitos Sociais na Constituição de 1988

            A Constituição Brasileira de 1988 simboliza o marco jurídico da transição democrática e da institucionalização dos direitos humanos no país. O texto constitucional demarca a ruptura com o regime autoritário militar instalado em 1964, refletindo o consenso democrático “pós ditadura”. Após vinte e um anos de regime autoritário, objetiva a Constituição resgatar o Estado de Direito, a separação dos poderes, a Federação, a Democracia e os direitos fundamentais, à luz do princípio da dignidade humana. O valor da dignidade da pessoa humana, como fundamento do Estado Democrático de Direito (artigo 1o, III da Constituição), impõe-se como núcleo básico e informador de todo ordenamento jurídico, como critério e parâmetro de valoração a orientar a interpretação do sistema constitucional.

          Introduz a Carta de 1988 um avanço extraordinário na consolidação dos direitos e garantias fundamentais, situando-se como o documento mais avançado, abrangente e pormenorizado sobre a matéria, na história constitucional do país. É a primeira Constituição brasileira a iniciar com capítulos dedicados aos direitos e garantias, para, então, tratar do Estado, de sua organização e do exercício dos poderes. Ineditamente, os direitos e garantias individuais são elevados a cláusulas pétreas, passando a compor o núcleo material intangível da Constituição (artigo 60, parágrafo 4o). Há a previsão de novos direitos e garantias constitucionais, bem como o reconhecimento da titularidade coletiva de direitos, com alusão à legitimidade de sindicatos, associações e entidades de classe para a defesa de direitos.

           De todas as Constituições brasileiras, foi a Carta de 1988 a que mais assegurou a participação popular em seu processo de elaboração, a partir do recebimento de elevado número de emendas populares. É, assim, a Constituição que apresenta o maior grau de legitimidade popular.

                 A Constituição de 1988 acolhe a idéia da universalidade dos direitos humanos, na medida em que consagra o valor da dignidade humana, como princípio fundamental do constitucionalismo inaugurado em 1988. O texto constitucional ainda realça que os direitos humanos são tema de legítimo interesse da comunidade internacional, ao ineditamente prever, dentre os princípios a reger o Brasil nas relações internacionais, o princípio da prevalência dos direitos humanos. Trata-se, ademais, da primeira Constituição Brasileira a incluir os direitos internacionais no elenco dos direitos constitucionalmente garantidos.

            Quanto à indivisibilidade dos direitos humanos, há que se enfatizar que a Carta de 1988 é a primeira Constituição que integra ao elenco dos direitos fundamentais, os direitos sociais e econômicos, que nas Cartas anteriores restavam pulverizados no capítulo pertinente à ordem econômica e social. Observe-se que, no Direito brasileiro, desde 1934, as Constituições passaram a incorporar os direitos sociais e econômicos. Contudo, a Constituição de 1988 é a primeira a afirmar que os direitos sociais são direitos fundamentais, tendo aplicabilidade imediata.

                 Nesse passo, a Constituição de 1988, além de estabelecer no artigo 6º que são direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, ainda apresenta uma ordem social com um amplo universo de normas que enunciam programas, tarefas, diretrizes e fins a serem perseguidos pelo Estado e pela sociedade. A título de exemplo, destacam-se dispositivos constitucionais constantes da ordem social, que fixam, como direitos de todos e deveres do Estado, a saúde (artigo 196), a educação (artigo 205), as práticas desportivas (artigo 217), dentre outros. Nos termos do artigo 196, a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. No campo da educação, a Constituição determina que o acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo, acrescentando que o não oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente. Para os direitos sociais à saúde e à educação, a Constituição disciplina uma dotação orçamentária específica[74], adicionando a possibilidade de intervenção federal nos Estados em que não houver a observância da aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde (artigo 34, VII, e).

                 Adicione-se que erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais constitui objetivo fundamental do Estado Brasileiro, elevado a princípio fundamental do constitucionalismo de 1988.

           A ordem constitucional de 1988 acabou por alargar as tarefas do Estado, incorporando fins econômico-sociais positivamente vinculantes das instâncias de regulação jurídica. A política deixa de ser concebida como um domínio juridicamente livre e constitucionalmente desvinculado. Os domínios da política passam a sofrer limites, mas também imposições, por meio de um projeto material vinculativo. Surge verdadeira configuração normativa da atividade política. Como afirma J.J.Gomes Canotilho: “A Constituição tem sempre como tarefa a realidade: juridificar constitucionalmente esta tarefa ou abandoná-la à política, é o grande desafio. Todas as Constituições pretendem, implícita ou explicitamente, conformar o político.”[75]

                 Cabe ainda mencionar que a Carta de 1988, no intuito de proteger maximamente os direitos fundamentais, consagra dentre as cláusulas pétreas, a cláusula “direitos e garantias individuais”. Considerando a universalidade e a indivisibilidade dos direitos humanos, a cláusula de proibição do retrocesso social[76], o valor da dignidade humana e demais princípios fundamentais da Carta de 1988, conclui-se que esta cláusula alcança os direitos sociais. Para Paulo Bonavides: ”os direitos sociais não são apenas justiciáveis, mas são providos, no ordenamento constitucional da garantia da suprema rigidez do parágrafo 4o do art.60.”[77]  São, portanto, direitos intangíveis, direitos irredutíveis, de forma que tanto a lei ordinária, como a emenda à Constituição que afetarem, abolirem ou suprimirem os direitos sociais, padecerão do vício de inconstitucionalidade.

                 Desde o processo de democratização do país e em particular a partir da Constituição Federal de 1988, os mais importantes tratados internacionais de proteção dos direitos humanos foram ratificados pelo Brasil[78], destacando-se, no âmbito dos direitos sociais e econômicos, a ratificação do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais em 1992 e do Protocolo de San Salvador em matéria de direitos econômicos, sociais e culturais, em 1996.

Além dos significativos avanços decorrentes da incorporação, pelo Estado Brasileiro, da normatividade internacional de proteção dos direitos humanos, o pós-1988 apresenta a mais vasta produção normativa de direitos humanos de toda a história legislativa brasileira. A maior parte das normas de proteção aos direitos humanos foi elaborada após a Constituição de 1988, em sua decorrência e sob a sua inspiração.

     A Constituição Federal de 1988 celebra, deste modo, a reinvenção do marco jurídico normativo brasileiro no campo da proteção dos direitos humanos, em especial dos direitos sociais.

     Considerando a proteção internacional e constitucional dos direitos sociais, analisar-se-á o impacto da dívida pública na implementação dos direitos sociais.            

 

  1. O Impacto da Dívida na Implementação dos Direitos Sociais

O endividamento externo e interno é um dos principais fatores a comprometer o orçamento público brasileiro, consumindo elevada parcela dos recursos públicos, que deixam de ser endereçados a políticas públicas essenciais para a implementação dos direitos sociais, como saúde, educação, moradia, transporte, assistência social, saneamento básico, dentre outros.

Ao apreciar a execução do orçamento federal em 2008, avaliando a distribuição de recursos correspondentes ao total de R$924 bilhões, conclui a pesquisa da Auditoria Cidadã da Dívida[79]:

 

 

“As despesas com o serviço da dívida (juros mais amortizações, exclusive o refinanciamento) consumiram 30,57% dos recursos do período, ou seja, o equivalente a R$ 282 bilhões, e foram muitas vezes superiores aos gastos com áreas sociais fundamentais, como saúde (4,81%), educação (2,57%) e assistência social (3,08%). Além disso, é quase nulo o valor destinado a setores importantes como Organização Agrária (com apenas 0,27% dos gastos), Transporte (0,51%), Ciência e Tecnologia (0,43%), Habitação (0,02%) e Saneamento (0,05%)[80]”.

 

                 Organismos internacionais têm considerado a dívida externa como um obstáculo central dos países em desenvolvimento no que se refere ao cumprimento das obrigações internacionais em matéria de direitos sociais previstas no Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. No entender do UN High Level Task Force on the Implementation of the right to development[81]

 

“a heavy debt burden is a major obstacle for poor developing countries in meeting their obligations under the International Covenant on Economic, Social and Cultural Rights”[82] (…) the poverty afflicting least developed countries is exacerbated by an unsustainable debt burden and the billions of dollars that those countries pay in their debt-servicing obligations divert a large part of scarce resources from crucial programmes of education, health care and infrastructure, severely limiting the prospects for the realization of the right to development. State’s obligation to debt had to take sufficiently into account national priorities of human development and poverty reduction, consistent with its human rights obligations and the need to maintain trust in the financing system[83].

 

                 Na percepção do UN High Level Task Force on the Implementation of the right to development, o investimento de bilhões de dólares no pagamento de dívidas insustentáveis, tendo como mais grave conseqüência a escassez de recursos em programas essenciais nas esferas da educação, saúde e infra-estrutura social, estaria a limitar a realização do direito ao desenvolvimento. Adverte o UN High Level Task Force que as obrigações dos Estados relativas ao pagamento de dívidas devem levar em consideração as prioridades nacionais no que tange ao desenvolvimento humano e à redução da pobreza decorrentes das obrigações internacionais em matéria de direitos humanos.

                 Neste sentido, faz-se necessário definir a sustentabilidade da dívida à luz dos deveres dos Estados no que se refere à redução da pobreza e à promoção e à proteção dos direitos humanos[84]. Sob a perspectiva dos direitos humanos, o pagamento da dívida deve ser restringido ao limite que não traduza, em hipótese alguma, violação a direitos sociais básicos, como os direitos à alimentação, à saúde, à educação, à seguridade social, dentre outros.

 

  1. Conclusão

     No caso brasileiro, reitere-se, as despesas com o serviço da dívida consumiram 30,57% do orçamento público de 2008, sendo significativamente superior aos gastos destinados a áreas sociais fundamentais, como saúde (4,81%), educação (2,57%), assistência social (3,08%), habitação (0,02%) e saneamento básico (0,05%).

     A elevada dotação orçamentária destinada ao pagamento da dívida pública constitui grave ofensa ao dever do Estado Brasileiro de implementar os direitos sociais consagrados pela ordem normativa internacional e constitucional. Tal pagamento simboliza afronta do Estado Brasileiro aos deveres assumidos no plano internacional e constitucional relativamente à implementação dos direitos sociais. Viola, ademais, a necessidade de assegurar a tais direitos absoluta prioridade, mediante a preservação de seu núcleo essencial (“minimum core obligation”), com a observância do princípio da aplicação progressiva dos direitos sociais, a vedar o retrocesso social. Afronta, ainda, o Estado Brasileiro a obrigação jurídica de investir o máximo dos recursos disponíveis para alcançar, progressivamente, a plena efetividade dos direitos econômicos, sociais e culturais – obrigação decorrente do Pacto Internacional de Direitos Econômicos Sociais e Culturais e do Protocolo de San Salvador em matéria de direitos sociais.

     Concluí-se, portanto, que a execução do orçamento federal em 2008, sob o prisma da distribuição de recursos, caracteriza grave inconstitucionalidade, configurando, ainda, ilícito internacional, em violação direta aos dispositivos enunciados nos artigos 3o, III, 6o, 196, 198, 205 e 212   da Constituição Brasileira, bem como nos artigos 2o, 11, 12 e 13 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos Sociais e Culturais e nos artigos 1o, 10, 13 do Protocolo de San Salvador em matéria de direitos sociais, ambos ratificados pelo Estado Brasileiro.  

 

São Paulo, 31 de janeiro de 2010.

Flávia Piovesan

 

ARTIFÍCIOS PARA A SUBTRAÇÃO DE RECURSOS SOCIAIS PARA A DÍVIDA

A destinação de grandes somas de recursos vinculados a diversas áreas sociais para o pagamento da dívida pública tem sido possibilitada por artifícios ilegais, conforme constatado na presente investigação. A Medida Provisória 435/2008, em flagrante violação ao Parágrafo Único do Art. 8º da Lei Complementar 101/2000, permitiu que cerca de R$ 50 bilhões de recursos legalmente vinculados a outras áreas específicas (Royalties do petróleo, FUNDAF, entre outras) pudessem ser destinados ao pagamento da dívida. Tal mecanismo foi perpetuado por dispositivo da Medida Provisória 450/2008.

Os pagamentos de juros e amortizações da Dívida Interna e Externa têm consumido mais de 30% do Orçamento Geral da União, subtraindo recursos que deveriam se destinar ao atendimento das necessidades sociais prioritárias da sociedade, o que caracteriza desrespeito a fundamentos constitucionais da República Federativa do Brasil: a soberania (Art. 1º, I) e a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III).

Ao subtrair vultosos recursos das áreas sociais, a dívida interna também representa violação de objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: a erradicação da pobreza (art. 3º, III) e também do próprio princípio republicano em sentido de adequado trato da coisa pública pelos agentes do Estado, violando ainda o disposto no artigo 6º. da Constituição Federal.

Diante de todos estes fatos constatados, é recomendável a realização da auditoria integral dessa dívida, dentre diversas outras medidas, como se mostrará neste Relatório: redução das taxas de juros praticadas no país, o estabelecimento de controle sobre o fluxo de capitais, a revisão do regime de metas de inflação, a revisão das dívidas estaduais, a revisão da política de acumulação de reservas e de produção de ‘superávit primário’, dentre outras medidas.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

IV – Análise da Natureza da Dívida – Investigações sobre a Contrapartida da Dívida Interna Federal

 

 

 

 

 

 

 

 

 

IV.1 – INTRODUÇÃO: DIFICULDADES PARA DETERMINAR A NATUREZA DA DÍVIDA INTERNA

 

Conforme mencionado no Capítulo relativo a “Limitações ao Trabalho da CPI”, foram enfrentadas sérias dificuldades para obter informações, especialmente relacionadas à contrapartida da dívida pública, tanto interna quanto externa.

Para pesquisar a natureza da dívida interna federal foram solicitadas informações sobre os FATORES QUE INFLUENCIARAM SEU CRESCIMENTO, conforme se analisará detalhadamente ao final do presente capítulo.

As pesquisas da Dívida Interna partiram de 1987 – data estabelecida como marco inicial das investigações da CPI da Dívida Pública sobre a Dívida Interna.

Constatou-se que a mesma tem sido utilizada principalmente para pagar a própria dívida, tanto interna quanto externa, e tem crescido principalmente em função das elevadas taxas de juros praticadas no país, como se analisará mais detalhadamente no presente capítulo.

Já no início dos ano 80, diversos atos legais previam a emissão de títulos para viabilizar o pagamento da própria dívida, inclusive os juros, como no caso da Lei de Diretrizes Orçamentárias para 1992 (Lei 8.211/1991), o que caracteriza o “anatocismo”, ou a capitalização de juros. Além do mais, a Lei 8.249, de 24.10.1991 (Revogada pela Lei 10.179/2001) estabelece as características das “Notas do Tesouro Nacional” e isenta de Imposto de Renda os juros produzidos.

 

IV.2 – UTILIZAÇÃO DA DÍVIDA INTERNA PARA PAGAR DÍVIDA ANTERIOR, INTERNA E EXTERNA

Uma vez que o esforço fiscal produzido para pagar o serviço da dívida interna federal não tem sido suficiente para pagar sequer o montante dos juros, a dívida interna não tem sido amortizada, sendo continuamente “rolada”, ou seja, novos títulos são emitidos para refinanciar a dívida, provocando seu contínuo crescimento.

Além de troca de dívida nova por dívida interna anterior, recentemente foram realizadas diversas operações de pagamento antecipado de dívida externa – como por exemplo o pagamento antecipado ao FMI no valor de US$ 15,5 bilhões em 2005, o resgate de parcela restante de bônus Brady no valor de US$ 6,2 bilhões em 2006, dentre outras – com emissões simultâneas de dívida interna, mais cara, conforme analisado no Capítulo IV da análise preliminar sobre a dívida externa.

 

Considerando que foram proporcionadas à CPI apenas informações parciais relativas às justificativas para o crescimento da dívida interna a partir de 1991[85], a CPI pesquisou a legislação que rege a matéria a partir de 1987, tendo localizado diversos atos legais que comprovam a relação direta entre as dívidas interna e externa, merecendo destaque os atos a seguir, relativos a autorizações para emissão de títulos da dívida interna para a “troca”, “refinanciamento”, “permuta”, “resgate antecipado” e “reestruturação” de dívida externa, mencionados a seguir, comprobatórios de que parte da dívida interna tem como contrapartida o pagamento de dívida externa, sendo necessário o aprofundamento das investigações para determinar em que montante:

 

ATO LEGAL TRANSFORMAÇÃO DE DÍVIDA EXTERNA EM INTERNA E VICE-VERSA
Resolução do Senado Federal nº 96, de 1989 Em seu Artigo 3º determina que as operações de crédito interno e externo de natureza financeira da União e de suas autarquias e a concessão de garantias pela União observarão os seguintes limites:

(…)

Excetuam-se dos limites a emissão de dívida pública federal destinada ao refinanciamento da dívida externa garantida pelo Tesouro Nacional.

Lei 8.211, de 22.07.1991 Art. 10. A receita decorrente da emissão de títulos da dívida pública federal, ressalvadas aquelas a que se refere o art. 1º da Lei nº 8.018, de 11 de abril de 1990, somente poderá ser destinada ao atendimento das seguintes despesas:

(…)      II – refinanciamento da dívida externa de responsabilidade da União, ou por ela garantida, renegociada com a comunidade financeira internacional, nos termos que vierem a ser aproados pelo Senado Federal

 

Lei 8.249, de 24.10.1991 Art. 1º As Notas do Tesouro Nacional (NTN), criadas pelo art. 30 da Lei nº 8.177, de 1º de março de 1991, poderão ser emitidas para troca voluntária por Bônus da Dívida Externa Brasileira, de emissão do Tesouro Nacional, que foram objeto de permuta por dívida externa do setor público, registrada no Banco Central do Brasil, através do “Brazil Investment Bond Exchange Agreement“, de 22 de setembro de 1988.

 

Discussão do Projeto de Lei que deu origem a Lei 8.249 (…) O Presidente da República, já que trata de mensagem de S.Exa, insere naquele projeto que foi desmembrado outro tipo de Nota do Tesouro Nacional, que tem a finalidade específica e danosa aos interesses nacionais de possibilitar a conversão de Títulos da Dívida Externa em Títulos da Dívida Interna.

 

Decreto 1.108, de 13.04.1994      § 1º A NTN-A, a ser utilizada na operação da troca por Brazil Investment Bond (BIB), de acordo com o art. 1° da Lei n° 8.249/91, terá as seguintes características:

Art. 4º. A Secretaria do Tesouro Nacional emitirá NTN-L para fins de realização de troca de títulos de responsabilidade do Tesouro Nacional na carteira do Banco Central do Brasil, a ser emitida até o limite do passivo externo do banco, a ser assumido pelo Tesouro Nacional nos termos do Plano Brasileiro de Refinanciamento e Clube de Paris.

 

Decreto 2.701, de 30.07.1998 Estabelece as características dos Títulos da Dívida Pública Mobiliária Federal Interna: Art. 4º. A NTN-A, a ser utilizada na operação de troca por “Brazil Investiment Bond – BIB”, de acordo com o inciso III do art. 1º da Medida Provisória nº 1.697-56/98, e pelos demais títulos emitidos em decorrência de acordos de reestruturação da dívida externa brasileira, será emitida em nove subséries distintas: NTN-A1, NTN-A2, NTN-A3, NTN-A4 , NTN-A5, NTN-A6, NTN-A7, NTN-A8 e NTN-A9

 

MP nº 1.974-80, de 01.06.2000 Dispõe sobre os títulos da dívida pública de responsabilidade do Tesouro Nacional, consolidando a legislação em vigor sobre a matéria (troca de dívida externa por dívida interna)

 

Decreto 3.859, de 04.07.2001 Art. 7º. A NTN-A, a ser utilizada nas operações de troca por “Brazil Investment Bonds – BIB”, de acordo com o inciso III do art. 1º da Lei nº 10.179, de 2001, e pelos demais títulos emitidos em decorrência de acordos de reestruturação da dívida externa brasileira, e para fins de substituição das Notas do Tesouro Nacional Série L – NTN-L, existentes junto ao Banco Central do Brasil, até o limite da obrigação decorrente do “Multi-Year Deposit Facility Agreement – MYDFA”, conforme disposto no art. 6º da Medida Provisória nº 2.179-34, de 28 de junho de 2001, será emitida em nove sub-séries distintas: NTN-A1, NTN-A3, NTN-A4, NTN-A5, NTN-A6, NTN-A7, NTN-A8, NTN-A9 e NTN-A10.
Lei 8.447, de 21.07.1992 Art. 43. A receita decorrente da emissão de títulos da dívida pública federal, pelo Tesouro Nacional, será destinada ao atendimento das seguintes despesas:

     (…)

     II – refinanciamento da dívida externa do setor público brasileiro que seja, ou venha a ser, de responsabilidade da União, nos termos da Resolução n° 20, de 20 de junho de 1991, do Senado Federal, e de outras resoluções congêneres que venham a ser baixadas por esta instituição;

     III – refinanciamento da dívida interna mobiliária de Estados, Distrito Federal e de Municípios, nos termos da Lei n° 8.388, de 30 de janeiro de 1991;

 

Medida Provisória nº 799, de 30.12.1994: altera o art. 30 da Lei nº 8177/91, alterado pela

Lei nº 8696/93

 

     Art. 2º. O art. 2º da Lei nº 8.249, de 24 de outubro de 1991, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 2º. A NTN será emitida com as seguintes características gerais:
III – formas de colocação: (…) c) direta, em favor de interessado, e mediante expressa autorização do Ministro de Estado da Fazenda, não podendo ser colocada por valor inferior ao par, quando se tratar de emissão para atender ao Programa de Financiamento às Exportações – PROEX, instituído pela Lei nº 8.187, de 1º de junho de 1991; nas operações de troca por Brazil Investiment Bond BIB”, de que trata o art. 1º desta Lei; e nas operações de troca por bônus previstas nos acordos de reestruturação da dívida externa.

 

Lei 9.066, de 01.01.1995 Autoriza o Poder Executivo a contratar com a ITAIPU Binacional pagamento de débito junto ao Tesouro Nacional com títulos da dívida externa brasileira, denominados “BRAZIL INVESTMENT BOND – BIB“, em valor correspondente a até US$ 92,800,000.00 (noventa e dois milhões e oitocentos mil dólares dos Estados Unidos da América).

 

Lei 8.481, de 12.11.1992 Autoriza abrir o orçamento fiscal da União em favor de operações oficiais de crédito de até Cr$ 86,87 trilhões para atender ao refinanciamento da dívida externa do setor público e demais encargos. Os recursos necessários decorrerão da emissão de títulos. O artigo 2º autoriza abrir o orçamento em favor de EFU no valor de até Cr$ 12,41 trilhões para atender ao s encargos decorrentes do refinanciamento da dívida externa. Artigo 5º autoriza abrir o orçamento fiscal da União em favor de operações oficiais de crédito de até Cr$ 68,25 trilhões para atender ao pagamento de amortização e encargos da dívida interna pública.

 

Resolução 69, de 1996 Autoriza a União a realizar operações de recompra e reestruturação dos títulos da dívida externa brasileira, contemplando a aquisição dos títulos, com deságio, no mercado secundário, a emissão de novos títulos para substituir os antigos, ou outras modalidades de operações, com os objetivos de reduzir o estoque ou encargos da dívida, alongar os prazos de pagamento ou ajustar o perfil do endividamento externo do setor público brasileiro.

  Art. 6º. Os ganhos financeiros líquidos obtidos com as operações de que trata esta Resolução serão obrigatoriamente utilizados para o abatimento da dívida pública externa ou interna.

 

Decreto nº 3.590, de 06.09.2000 Dispõe sobre o sistema de Administração financeira Federal.

Art. 5º – Compete ao órgão central do Sistema de Adminstração Financeira Federal:

IV – gerir a dívida pública mobiliária federal e a dívida externa de responsabilidade do Tesouro Nacional

 

Resolução 43, de 2001 Art. 7º As operações de crédito interno e externo dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios observarão, ainda, os seguintes limites:

Art. 11 Até 31 de dezembro de 2010, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios somente poderão emitir títulos da dívida pública no montante necessário ao refinanciamento do principal devidamente atualizado de suas obrigações, representadas por essa espécie de títulos.

 

Resolução do Senado Federal Nº  87, de 19 de dezembro de 1994

 

autorizou a emissão de títulos de responsabilidade do Tesouro Nacional no exterior, no valor de US$ 2.000.000.000,00 (dois bilhões de dólares), destinando-se os recursos à substituição da dívida mobiliária interna por dívida externa;

 

Resolução do Senado Federal Nº 57, de 10 de novembro de 1995 elevou o referido valor para US$ 5.000.000.000,00 (cinco bilhões de dólares), mantendo a mesma destinação acima citada;

 

Resolução do Senado Federal Nº 5110 de junho de 1997 elevou o referido valor para US$ 10.000.000.000,00 (dez bilhões de dólares), mantendo a mesma destinação acima citada;
Resolução do Senado Federal Nº 23 de 29 de junho de 1999 elevou o referido valor para US$ 20.000.000.000,00 (vinte bilhões de dólares), mantendo a mesma destinação acima citada;
Resolução do Senado Federal Nº 74, de 19 de dezembro de 2000 elevou o referido valor para US$ 30.000.000.000,00 (trinta bilhões de dólares), mantendo a mesma destinação acima citada;
Resolução do Senado Federal Nº 34, de 28 de junho de 2002 elevou o referido valor para US$ 40.000.000.000,00 (quarenta bilhões de dólares), mantendo a mesma destinação acima citada;
Lei 8.481, de 12.11.1992

 

Art. 7º Fica o Poder Executivo autorizado a promover alteração do título da subatividade “71.101.03.008.0034.2200.0001 – Administração da Dívida Pública Mobiliária Federal”, constante da Lei n° 8.409, de 28 de fevereiro de 1992, para “71.101.03.008.0034.2200.0001 – Bônus da Dívida Externa (Brazilian Investment Bond – BIB).

 

Decreto 1.108, de 13.04.1994, Consolida o Regulamento da Lei 8.249/1991 (NTN –A, …várias séries)

Art. 1º.(…)

     § 1º A NTN-A, a ser utilizada na operação da troca por Brazil Investment Bond (BIB), de acordo com o art. 1° da Lei n° 8.249/91, terá as seguintes características:

Art. 4º. A Secretaria do Tesouro Nacional emitirá NTN-L para fins de realização de troca de títulos de responsabilidade do Tesouro Nacional na carteira do Banco Central do Brasil, a ser emitida até o limite do passivo externo do banco, a ser assumido pelo Tesouro Nacional nos termos do Plano Brasileiro de Refinanciamento e Clube de Paris.

     § 2º A NTN-L poderá ser resgatada antecipadamente em decorrência da assunção, pelo Tesouro Nacional, da divida externa atualmente de responsabilidade do Banco Central do Brasil.

Art. 5º. Será emitida NTN-M, a ser adquirida com os recursos decorrentes das capitalizações realizadas ao amparo do Contrato de Troca e Subscrição do Bônus de Dinheiro Novo e de Conversão de Dívida, datado de 29 de novembro de 1993.

Resolução 69, de 1996 Autoriza a União a realizar operações de recompra e reestruturação dos títulos da dívida externa brasileira, contemplando a aquisição dos títulos, com deságio, no mercado secundário, a emissão de novos títulos para substituir os antigos, ou outras modalidades de operações, com os objetivos de reduzir o estoque ou encargos da dívida, alongar os prazos de pagamento ou ajustar o perfil do endividamento externo do setor público brasileiro.

  Art. 6º. Os ganhos financeiros líquidos obtidos com as operações de que trata esta Resolução serão obrigatoriamente utilizados para o abatimento da dívida pública externa ou interna.

 

Decreto 2.701, de 30.07.1998 Estabelece as características dos Títulos da Dívida Pública Mobiliária Federal Interna.

Art. 4º. A NTN-A, a ser utilizada na operação de troca por “Brazil Investiment Bond – BIB”, de acordo com o inciso III do art. 1º da Medida Provisória nº 1.697-56/98, e pelos demais títulos emitidos em decorrência de acordos de reestruturação da dívida externa brasileira, será emitida em nove subséries distintas: NTN-A1, NTN-A2, NTN-A3, NTN-A4 , NTN-A5, NTN-A6, NTN-A7, NTN-A8 e NTN-A9.

     § 1º A NTN-A1 , a ser utilizada nas operações de troca por ” Brazil Investment Bond – BIB” terá as seguintes características:

§ 2º A NTN-A2 , a ser utilizada nas operações de troca por ” Interest Due and Unpaid Bond – IDU”, terá as seguintes características:

     § 3º A NTN-A3 , a ser utilizada nas operações de troca por “Par Bond “, terá as seguintes características:

     § 4º A NTN-A4 , a ser utilizada nas operações de troca por “Discount Bond“, terá as seguintes características:

     § 5º A NTN-A5 , a ser utilizada nas operações de troca por ” Front Loaded Interest Reduction Bond – FLIRB“, terá as seguintes características:

     § 6º A NTN-A6 , a ser utilizada nas operações de troca por “Front Loaded Interest Reduction Bond With Capitalization – C- Bond“, terá as seguintes características:

     § 7º A NTN-A7 , a ser utilizada nas operações de troca por “Debt Conversion Bond – DCB“, terá as seguintes características:

     § 8º A NTN-A8 , a ser utilizada nas operações de troca por “New Money Bond – NMB“, terá as seguintes características:

     § 9º A NTN-A9 , a ser utilizada nas operações de troca por “Eligible Interest Bond – EIBond “, terá as seguintes características:

 

Decreto 2.987, de 12.06.1999 Art. 1º. O art. 4° do Decreto n° 2.701, de 30 de julho de 1998, passa a vigorar com a seguinte redação:

Art. 4º (…)

§ 10. A NTN-A10, a ser emitida para fins de substituição das NTN-L existentes junto ao Banco Central do Brasil, até o limite da obrigação decorrente do MYDFA, terá as seguintes características

 

 

 

Relativamente à Lei 8.249/1991, que permitiu a troca de Notas do Tesouro Nacional (NTN) por Bônus da Dívida Externa Brasileira denominados BIB – Brazil Investment Bond Exchange Agreement“, é importante resgatar parte da discussão objeto do respectivo projeto de lei, que apesar dos contundentes argumentos contrários acabou sendo aprovado:

 

“O SR. PAULO RAMOS (PDT – RJ. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Sra e Srs. Deputados, é preciso uma atenção muito especial à matéria que vai ser votada, na medida em que representa o desmembramento do Projeto de Lei n 1.583, que tratava primeiro das Notas do Tesouro Nacional, chamadas ecológicas. O Presidente da República, já que trata de mensagem de S.Exa, insere naquele projeto que foi desmembrado outro tipo de Nota do Tesouro Nacional, que tem a finalidade específica e danosa aos interesses nacionais de possibilitar a conversão de Títulos da Dívida Externa em Títulos da Dívida Interna.

E mais, além de possibilitar tal conversão, abre perspectiva de privatização.

Sabemos que o Presidente da República, de forma equivocada e atentatória aos mais elementares preceitos constitucionais, desautorizando esta Casa, colocando em xeque a competência do Poder Legislativo, encaminhou a Medida Provisória n 299, que tem exatamente a finalidade de criar perspectivas de utilização dos Títulos da Dívida Externa, entre outros, no processo de privatização. Mas as incursões no Poder Executivo estão se dando de diversas formas, uma delas através do Projeto anterior, n 1.583, também danoso, porque trata igualmente de conversão da dívida externa em projetos ecológicos, conversão, esta que, no fundo, convalida uma dívida externa que ainda está pendente de análise crítica e de avaliação deste Congresso Nacional, por imposição do art. 26 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Vem S. Exa, o Presidente da República, com essa incursão que foi desmembrada.

(…) É preciso, Sr. Presidente, que esta Casa saiba que votará agora um projeto que permite a conversão da dívida externa em títulos da Dívida Interna, sem qualquer deságio; permite ainda esse projeto a atualização do valor nominal dessas notas pela variação da cotação do dólar. Temos embutidos aqui vários crimes de lesa-pátria.”

 

Adicionalmente, cabe ressaltar que os Bônus da Dívida Externa Brasileira denominados BIB – Brazil Investment Bond Exchange Agreement” (que a Lei 8249/91 permitiu transformar em Dívida Interna), haviam sido decorrentes da transformação de juros atrasados, ou seja, um caso de anatocismo explícito, correspondente à transformação de juros em principal, operação proibida pela legislação brasileira, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal.

 

Em relação ao Decreto 2.701, de 30.07.1998, também mencionado na tabela acima, é relevante registrar que logo após a questionável transformação da dívida externa com bancos internacionais em bônus da dívida externa, nos moldes do Plano Brady, em 1994, em montante de cerca de US$ 50 bilhões, grande parte de tais bônus “Brady” passou a ser gradativamente transformada em títulos da dívida interna, conforme autorizado pelo mencionado decreto 2.701/98. A transformação da dívida externa com bancos privados estrangeiros nos moldes do Plano “Brady” é objeto do Capítulo III da análise preliminar sobre a dívida externa, sendo relevante mencionar que a CPI não teve acesso às dívidas que foram objeto daquela transformação, nem às parcelas de dívidas privadas que se encontravam inseridas nos acordos que fizeram parte de tal transformação em bônus “Brady”. Em resumo, essas sucessivas operações de troca comprovam a contínua reciclagem de dívida externa eivada de questionamentos em dívida externa representada por bônus e, em seguida, por dívida interna.

Os citados atos legais e sucessivas operações de troca demonstram a estreita relação entre a dívida interna e externa, bem como a necessidade de aprofundamento das investigações, tendo em vista a falta de acesso aos documentos relativos a tais trocas de dívida externa por dívida interna, e vice-versa, de forma a determinar a parcela da contrapartida da dívida interna que decorre de pagamento de dívida externa, especialmente dívidas privadas.

Cabe citar também página do Tesouro Nacional na internet[86], onde são explicitados mecanismos de troca de dívida externa em interna:

 

CONVERSÃO DE DÍVIDA

  1. Quais são as possibilidades de conversão de Dívida Externa em Dívida Interna?

    R: A legislação em vigor abre duas possibilidades. A primeira, a exclusivo critério e conveniência do Ministério da Fazenda, em que títulos emitidos em decorrência de acordos de reestruturação da dívida externa brasileira, Acordo de 1988 e de 1992 (Plano Brady), são trocados por títulos da dívida interna, Notas do Tesouro Nacional, série A (NTN-A) em diferentes sub-séries, a depender do título externo a ser convertido. A segunda possibilidade refere-se à troca de Bradys por NTN-D para aplicação em projetos culturais na área de audiovisual.

    2. Qual a legislação que disciplina a troca de títulos da dívida externa por títulos da dívida interna?

    R: Os instrumentos legais são: Lei nº 10.171/2001, Decreto nº 3.859/2001 e Portaria do Ministério da Fazenda nº 55/99. No caso específico de conversões para projetos na área de audiovisual, além da Lei e Decretos citados, aplica-se ainda a Portaria do Ministério da Fazenda nº202/96.

    3. Quais os títulos externos passíveis de troca por títulos da dívida interna?

    R: Os títulos externos aceitos para troca, à conveniência do Ministério da Fazenda, encontram-se listados na tabela abaixo, com os respectivos títulos da dívida interna. Os títulos internos emitidos refletem as mesmas características dos títulos da dívida externa utilizados no processo de troca, com prazo de resgate igual ao tempo restante do título externo substituído.

 

DÍVIDA EXTERNA RENEGOCIADA DÍVIDA INTERNA

Acordo de reestruturação da dívida de 1988
Brazil Investment Bond (BIB) ou Exit Bond

Plano Brady (Plano Brasileiro de Financiamento de 1992)
Par Bond
Discount Bond
Front Loaded Interest Reduction Bond – FLIRB
Front Loaded Interest Reduction Bond with Capitalization – C-Bond
Debt Conversion Bond – DCB
New Money Bond – NMB
Eligible Interest Bond – EI Bond

 

NTN – A1

NTN – A3
NTN – A4
NTN – A5
NTN – A6
NTN – A7
NTN – A8
NTN – A9

  1. Quais os procedimentos para a troca de títulos?

    R: A operação de troca, se aceito o requerimento para troca, é iniciado com abertura de processo na Secretaria do Tesouro Nacional em são indicados os títulos a serem utilizados, séries, números, data de emissão, valores, identificação de detentores, nome e endereços das pessoas responsáveis a serem contatadas. A Secretaria do Tesouro Nacional analisa a conveniência da operação e, no caso de aprovada, encaminha o pedido para a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional – PGFN. Com a aprovação da PGFN, o Tesouro passa aos procedimentos formais para concretizar a operação. Os novos títulos representativos da dívida interna são emitidos no dia 15 de cada mês no caso de NTN-As e no dia 1º no caso de NTN-Ds. Considerada a tramitação normal, recomenda-se a entrada do pedido na Secretaria do Tesouro Nacional com antecedência mínima de 45 (quarenta e cinco) dias.

    6. O que acontece com as garantias ou colaterais de títulos externos no processo de conversão?

    R: Com a conclusão do processo de conversão, esses colaterais são liberados e revertidos para o Tesouro.

 

Analisando-se os Balanços Gerais da União (BGUs), disponíveis na página da Controladoria Geral da União na internet[87], encontrou-se citações, a partir do ano 2000, acerca de conversões de dívida externa (bônus Bradies) em Notas do Tesouro Nacional (NTN`s):

BGU 2000, item 4.4.1:

  1. d) Emissão especial de NTN-A, no montante de R$ 853 milhões, para troca por títulos da dívida externa mobiliária brasileira (Bradies) em decorrência de acordo de reestruturação da dívida externa;

(…)

  1. m) Emissão de NTN-D, no valor de R$ 6 milhões, para troca por títulos da dívida mobiliária externa (Bradies) em decorrência de acordo de reestruturação da dívida externa para utilização em projetos voltados às atividades de produção, distribuição, exibição e divulgação, no Brasil e no exterior, de obra audiovisual brasileira, preservação de sua memória e da documentação a ela relativa, aprovados pelo Ministério da Cultura, bem como mediante doações ao Fundo Nacional da Cultura – FNC;

(…)

 

BGU 2001, item 4.4.1:

Emissão de NTN-D, no valor de R$ 480,2 mil, emitidos para troca por títulos da dívida mobiliária externa (Bradies) em decorrência de acordo de reestruturação da dívida externa para utilização em projetos voltados às atividades de produção, distribuição, exibição e divulgação, no Brasil e no exterior, de obra audiovisual brasileira, preservação de sua memória e da documentação a ela relativa, aprovados pelo Ministério da Cultura, bem como mediante doações ao Fundo Nacional da Cultura – FNC;

BGU 2002, item 6.1:

Emissão de NTN-D, no valor de R$ 2.453 mil, emitidos para troca por títulos da dívida mobiliária externa (Bradies) em decorrência de acordo de reestruturação da dívida externa para utilização em projetos voltados às atividades de produção, distribuição, exibição e divulgação, no Brasil e no exterior, de obra audiovisual brasileira, preservação de sua memória e da documentação a ela relativa, aprovados pelo Ministério da Cultura, bem como mediante doações ao Fundo Nacional da Cultura – FNC;

(…)

Cancelamento de títulos (Bradies) no montante de US$ 1.050.000,00, nos meses de abril e junho de 2002, convertidos por títulos da dívida mobiliária interna (NTN-D), para utilização nos Projetos “Madame Satã” e “Cidade de Deus” do Programa Audiovisual;

BGU 2003, item 6.1.6:

Cancelamento de títulos (Bradies) no montante de US$ 796.000,00, nos meses de maio e setembro de 2003, convertidos por títulos da dívida mobiliária interna (NTN-D), para utilização em Programa Audiovisual;

 

IV.3 – EMISSÃO DE DÍVIDA PARA PAGAR JUROS

O principal responsável pelo crescimento da dívida interna, desde o seu surgimento, tem sido o impacto provocado pelas elevadas taxas de juros praticadas no Brasil.

O superávit primário produzido desde 1999 não tem sido suficiente para pagar sequer os juros, que assim são incorporados ao estoque da dívida.

A Tabela dos “Fatores Condicionantes do Crescimento da Dívida do Setor Público” enviada pela STN à CPI[88] indica que os juros constituem o principal fator condicionante do crescimento da dívida do setor público, acumulando o montante de R$ 1.530.600.000.000,00 no período de 1996 a julho de 2009.

Ainda que todo o superávit primário produzido no mesmo período de 1996 a julho de 2009, no montante de R$ 678.300.000.000,00, seja considerado para reduzir o montante dos juros nominais[89] do mesmo período, como indicado na tabela da STN, depreende-se que foi incorporada ao estoque da Dívida Líquida do Setor Público (DLSP) a parcela dos juros no valor de R$ 852.300.000.000,00.

Ou seja, todo o superávit primário produzido no período não cobriu nem a metade dos juros “nominais”, ainda que minimizados, pois são calculados sobre a DLSP, o que demonstra a ausência de transparência em relação ao efetivo peso dos juros pagos, indicando também o elevado patamar das taxas de juros praticadas nos últimos anos.

Cabe transcrever trecho e tabela constantes do documento enviado pela STN à CPI da Dívida Pública:

“De forma mais direta, o BC também pública regularmente uma tabela com os fatores de variação da DLSP, desde 1996. Tal tabela encontra-se a seguir:

 

 

TABELA 5 – DÌVIDA LÍQUIDA DO SETOR PÚBLICO (DLSP) – FATORES CONDICIONANTES (R$ BILHÕES)

 

Discriminação dez/95 dez/96 dez/97 dez/98 dez/99 dez/00 dez/01 dez/02 dez/03 dez/04 dez/05 dez/06 dez/07 dez/08 jul/09 TOTAL
Dívida líquida total – saldo 208,5 269,2 308,4 385,9 516,6 563,2 680,1 896,1 933,6 982,0 1.035,3 1.112,7 1.200,8 1.153,6 1.283,4
Dívida líquida – var.ac.ano 60,7 39,2 77,4 130,7 46,6 116,9 216,0 37,5 48,3 53,3 77,4 88,1 -47,2 129,8 1.075,0
Fatores condicionantes: 60,7 39,2 77,4 130,7 46,6 116,9 216,0 37,5 48,3 53,3 77,4 88,1 -47,2 129,8 1.075,0
   NFSP 45,0 51,6 68,2 56,3 39,8 42,8 65,3 87,2 54,1 72,6 83,9 71,5 57,2 56,7 852,3
   Primário 0,7 8,3 -0,1 -31,1 -38,2 -44,0 -47,4 -56,8 -73,8 -84,4 -76,8 -89,7 -106,4 -38,4 -678,3
   Juros nominais 44,2 43,3 68,3 87,4 78,0 86,8 112,8 144,1 128,0 157,0 160,7 161,2 163,7 95,1 1.530,6
   Ajuste cambial 1,5 4,1 6,9 69,4 18,3 30,9 148,0 -66,1 -18,0 -20,0 -6,9 21,0 -77,4 61,2 172,4
   Dívida interna      indexada ao câmbio 1,0 1,6 4,3 39,9 9,5 19,2 76,7 -22,7 -3,3 -4,6 -2,2 -2,4 3,2 -2,7 117,3
   Dívida externa – metodológico 0,5 2,5 2,6 29,5 8,9 11,7 71,3 -43,4 -14,7 -16,0 -4,7 23,4 -80,6 63,9 55,1
   Dívida externa – outros ajustes -0,2 0,0 0,0 0,0 0,0 -0,4 -0,3 15,8 6,5 -1,1 2,8 -2,5 -26,4 12,9 7,0
   Reconhecimento de dívidas 15,2 -0,2 15,2 14,0 8,7 44,6 6,7 0,6 6,5 3,3 -0,4 -0,6 0,1 0,6 114,4
   Privatizações -0,7 -16,3 -12,9 -9,0 -20,2 -1,0 -3,6 0,0 -0,8 -1,0 -2,0 -1,3 -0,8 -1,6 -71,1
Memo:                                
    PIB doze meses – valorizado 745,1 876,3 968,9 991,0 1.160,0 1.236,5 1.364,4 1.745,8 1.744,1 2.036,8 2.157,4 2.424,6 2.736,8 2.971,0 2.913,0
Fonte:Banco Central do Brasil. Elaboração: STN/COGEP/GEPED                          

 

 

“Fundamental também é perceber a importância dos superávits primários para a administração da trajetória da DLSP. Se não fossem as metas de superávit primário, a DLSP poderia estar em um nível R$ 678,3 bilhões acima daquele observado em Jul/2009.

A incorporação de juros ao estoque da DLSP entre dez/1995 e jul/2008 maior do que os superávits primários acumulados neste período culminaram com uma Necessidade de Financiamento do Setor Público (NFSP) de R$ 852,3 bilhões, resultado que é compatível com o fato de o setor público ainda não ter alcançado o equilíbrio de seu resultado nominal consolidado.”

 

A contínua incorporação de juros ao estoque da dívida interna tem provocado seu crescimento exponencial, pois sobre essa parcela de juros incorporados passam a incidir novos juros, fazendo com que a dívida cresça de forma exponencial, sem qualquer contrapartida real em bens ou serviços, mas decorrente apenas da incidência de juros sobre juros. Por essa razão, a dívida interna federal já ultrapassou a casa dos dois trilhões de reais em dezembro/2009.

Cabe ressaltar que o Supremo Tribunal Federal proíbe a incorporação de juros sobre juros, conforme Súmula 121, de 1963, que assim se pronunciou:

“É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada.”.

Tal súmula se baseou na Lei da Usura, art 4º, segundo o qual “É proibido contar juros dos juros”. Recentemente, em 2001, o governo federal editou a Medida Provisória 1.963-17, cujo artigo 5º assim dispõe:

“Nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano.”

Cabe registrar aqui trecho de artigo do jurista Paulo Brossard:

“Enquanto isso, a generosidade oficial para com as instituições financeiras continua sem limite. Ao serem divulgados os resultados dos bancos no ano passado, quando a nação inteira sofreu duros efeitos da recessão, viu-se que atingiram índices jamais vistos, chegando a mais de 500% em certos casos. Pois exatamente agora, o impagável governo do reeleito, invocando ‘relevância e urgência’, editou mais uma medida provisória oficializando o anatocismo, que o velho Código Comercial, o código de 1850, já vedava de maneira exemplar, e que a nossa tradição jurídica condenou ao longo de gerações. Aliás, na linha da lei de usura, de 1933, é a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, cristalizada na Súmula 121, segundo a qual ‘é vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada’. Sabe o leitor a fundamentação da medida ‘urgente e relevante’? É que a cobrança de juros sobre juros vinha sendo praticada pelos bancos. Em vez de condenar o abuso, pressurosamente, o governo homologou o abuso mediante medida provisória. É um escárnio. A medida apareceu na 17ª edição da MP nº 1.963; na calada da noite foi gerada.”

De fato, a partir de 2001 houve grande crescimento no lucro dos bancos, de acordo com os dados divulgados pelo Banco Central:

 

Gráfico 18

Fonte: Banco Central.

 

A legalidade da Medida Provisória 1.963-17/2001 está sendo questionada junto ao STF, porém, a proibição da capitalização de juros em operações maiores de um ano não está sujeita à discussão, dado que a referida MP permitiu o anatocismo apenas em operações inferiores a um ano.

Embora os juros incidentes sobre a dívida interna sejam, em sua maior parte, juros simples, todos os anos o governo emite grande volume de títulos para viabilizar o pagamento dos juros que estão vencendo, conforme amplamente divulgado pelo SIAFI. O que caracteriza expressa capitalização dos juros vencidos, que a partir daí renderão mais juros, indefinidamente, ou seja, em um período maior que um ano.

Portanto, cabe a esta CPI recomendar ao Ministério Público que atue junto ao Supremo Tribunal Federal no sentido de questionar a legalidade dos juros sobre juros existentes na Dívida Interna brasileira. A CPI deve também recomendar o aprofundamento das investigações para se apurar os danos ao Patrimônio Público decorrentes deste fato.

 

 

O explosivo crescimento da dívida interna em decorrência da transformação de juros em nova dívida tem exigido volume cada vez mais elevado de recursos para o pagamento de serviço da dívida pública interna, superiores ao valor destinado a todas as demais despesas públicas, como demonstrado nos gráficos 8 a 17.

Adicionalmente, devem ser aprofundadas as investigações sobre o efetivo montante dos juros incorporados ao estoque da dívida (pois o valor de R$ 852,3 bilhões informado pela STN resulta de cálculo minimizado pela utilização da metodologia da DLSP. Além disso, devem ser aprofundados os aspectos legais relacionados a essa prática de anatocismo explícito.

 

IV.4 – DEMAIS FATORES

Os demais fatores que influenciaram o crescimento da dívida serão analisados detalhadamente ao final do presente capítulo, cabendo ressaltar que parte da dívida interna teve como contrapartida a emissão de títulos para diversos fins, especialmente para viabilizar o processo de privatizações, saneando as empresas antes de sua transferência ao setor privado; para “socorro” aos bancos; assunção da dívida dos estados e municípios, dentre outros.

A presente análise parte de 1987, como antes mencionado, mas o expressivo crescimento da Dívida Interna ocorreu a partir de sua utilização para “sustentar” o Plano Real. Esse fato é ressaltado pelo Tribunal de Contas da União, conforme citações a seguir, extraídas de trabalhos disponibilizados à CPI que indicam o crescimento da dívida interna a partir do Plano Real:

 “ … o Parecer [de 1999] também chama atenção para o crescimento da dívida pública mobiliária de 1994 a 1999 da ordem de 571%, o que só comprova a necessidade de canalizar esforços para o controle da dívida mobiliária federal.”. (…) “O Parecer chama atenção para o fato de que o exacerbado crescimento da dívida pública líquida nos últimos anos é fator que deve preocupar as autoridades da administração pública brasileira, particularmente do Governo Federal, que são responsáveis pela maior parcela dessa dívida. Na seqüência da preocupação, frisa que o montante da dívida, proveniente dos sucessivos déficits financeiros anuais, das variações cambiais ocorridas, da assunção pela União de dívidas das esferas de Governo subnacionais e dos elevados níveis de inflação e de taxas de juros aplicadas à rolagem da mesma, entre outros, compromete os níveis de crescimento e de desenvolvimento do País, além de inviabilizar o atingimento do equilíbrio das contas públicas, afetando, inclusive, gerações futuras.”.

 

“68. A dívida pública mobiliária federal permaneceu em escalada crescente na década atual, Os Pareceres Prévios demonstram que, no período de 2000 a 2008, o tema ganha notória presença nas Contas de Governo, sendo objeto de constantes recomendações ao Poder Executivo, a despeito de permanecer a fixação de limite para a referida dívida por parte do Congresso Nacional.”.

 

O Parecer Prévio das contas de 2005 ressaltou a “… necessidade de geração de superávits primários para evitar que ele assuma explosiva trajetória de crescimento. Registra que tais recursos, voltados aos juros, deixam de ser aplicados em borás de infra-estrutura ou em políticas sociais, ressaltando a importância de se adotar uma administração consistente da dívida pública como meio de restabelecer a capacidade de investimento do Estado.

 

 

IV.5 – A UTILIZAÇÃO DAS ELEVADAS TAXAS DE JUROS INTERNAS COMO SUSTENTAÇÃO DO PLANO REAL E A LIBERALIZAÇÃO DE MOVIMENTAÇÃO DE CAPITAIS

 

O Plano Real se sustentou, inicialmente, na grande entrada de capital estrangeiro especulativo para o financiamento dos déficits em transações correntes, decorrente da maciça importação de toda espécie de produtos estrangeiros[90].  O principal instrumento de atração de capitais era a alta taxa de juros interna, que implicava diretamente no aumento da dívida pública.

Outro fator de atração de capital estrangeiro foi a venda de ações de empresas estatais, estratégicas e lucrativas, no processo de privatizações mais agressivo do mundo, como se comentará adiante.

Esta situação pode ser visualizada no Gráfico 19, que mostra o grande aumento do Investimento Estrangeiro em Carteira (IEC) nos anos 90, posteriormente reduzido com as crises financeiras do final da década. Verifica-se também que nos últimos anos houve forte afluxo de recursos em carteira, interrompido pela crise global de 2008.

 

Gráfico 19

Fonte: Balanço de Pagamentos – Banco Central – disponível em http://www.bcb.gov.br/ftp/notaecon/balpaga.zip

 

 

Analisando-se mais detalhadamente o Balanço de Pagamentos, verifica-se que uma grande parte do IEC nos anos 90 se deveu à tomada de empréstimos externos por empresas privadas. Cabe ressaltar que o Banco Central não atendeu aos requerimentos de informações que solicitaram dados sobre as dívidas externas privadas que foram transferidas para o Estado. Ao mesmo tempo, nota-se um grande aumento na dívida externa privada, de US$ 9,5 bilhões em 1990 para US$ 116 bilhões em 1998[91]. Este constitui mais um aspecto a ser investigado, pois as limitações impostas ao trabalho da CPI e a ausência de acesso a dados impossibilitaram a conclusão das investigações.

O forte pico indicado no gráfico no ano de 1994 poderia ser atribuído à renegociação da Dívida Externa nos moldes do Plano Brady. Cabe ressaltar que, naquela negociação não houve ingresso de recurso algum, tendo em vista que a mesma se limitou apenas à troca de dívida externa anterior, contratual, por dívida externa representada por títulos emitidos no âmbito do Plano Brady[92].

Este processo de entrada de capital especulativo, também por meio do endividamento externo privado, teve como contrapartida o crescimento da dívida interna[93]. As altas taxas de juros estimulavam as empresas a tomarem empréstimos no exterior, em boa parte para aplicar em títulos da dívida interna. Além do mais, a compra destes dólares pelo Banco Central – para o acúmulo de reservas, sustentação do Plano Real – implicava em aumento da base monetária, que deveria ser esterilizada por meio do lançamento de títulos da dívida interna.

Este processo é descrito pelo economista Paulo Nogueira Batista Jr, atual representante do Brasil no FMI:

“Os acontecimentos seguiram um padrão familiar, recorrente em economias onde se procura sustentar um regime de ancoragem cambial com recurso a taxas de juro elevadas e restrições ao crédito doméstico. (…) Em princípio, sempre há alguma taxa de juro doméstica muito alta que pode manter as metas cambiais com as quais as autoridades monetárias se comprometeram. O problema é o preço que a economia nacional paga durante a fase de juros altos. (…) Aumentam também o déficit fiscal, devido ao custo mais alto de refinanciamento da dívida pública”.[94]

“Naturalmente, o setor público também pagou um preço elevado pela correção do desequilíbrio das contas externas. (…) A política de juros altos ampliou substancialmente o custo das dívidas de curto prazo do Tesouro, do Banco Central, dos estados e municípios. (…) A partir de julho [de 1995], a esterilização do impacto monetário das operações cambiais contribuiu para uma rápida expansão da dívida mobiliária federal fora da carteira do Banco Central. Em apenas 5 meses, o estoque de títulos federais, de emissão do Tesouro e do Banco Central, aumentou 57%, passando de R$ 69,5 bilhões em fins de junho para R$ 109 bilhões em fins de novembro.”[95]

 

Portanto, verifica-se que a origem da atual dívida interna se deve à política de atração de capitais financeiros internacionais, e não em um suposto gasto exagerado em áreas sociais ou com pessoal ou previdência pública.

Esta visão é corroborada por Paulo Sérgio Souto, Presidente do Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro, que em seu depoimento à CPI dia 18/11/2009, também mostrou que a dívida interna começou a crescer nos anos 90 devido à política de atração de capitais externos, implementada a partir de finais dos anos 80, por meio de altas taxas de juros, para se manter o regime de câmbio fixo:

 

“Esse processo não teria sido possível, sem que anteriormente não estivessem já em curso sucessivas medidas que buscaram remover os mecanismos de controles legais sobre a movimentação de recursos estrangeiros no país, criando as condições à livre movimentação de capitais.

O ponto a se destacar é que para que isso viesse a ocorrer, foi necessária a alteração substantiva da Lei nº. 4131, de 1962, que estabeleceu as regras para o capital estrangeiro no país e que se encontrava em pleno vigor.

De acordo com as procuradoras da República Valquíria Nunes e Raquel Branquinho, este foi um processo absolutamente irregular e provocou, por parte das mesmas, a apresentação na Justiça Federal, no dia três de setembro de 2003, de uma acusação formal, por crime de improbidade administrativa, contra ex-dirigentes do Banco Central, do Banco do Brasil e de outras instituições financeiras. O fato foi inclusive objeto de matéria jornalística, assinada por Raimundo Rodrigues Pereira, e veiculada pela Revista Reportagem, em sua edição de fevereiro de 2004. As procuradoras, diz a matéria, “acusam quinze executivos de terem participado destacadamente de uma manipulação extraordinária que transformou, na surdina, sem nenhum debate no foro apropriado que é o Congresso Nacional, o sistema de rígido controle das divisas em moeda forte brasileiras que ainda persiste, pela vigência da Lei 4131, no seu oposto – um sistema no qual prevalece uma amplíssima liberdade para a saída de divisas do país, determinado por circulares, cartas circulares e uma cartilha cambial do Banco Central”.

A citada matéria lembra que “a legislação estabelece que quem regulamenta as leis do Sistema Financeiro Nacional é o Conselho Monetário Nacional, através de resoluções. Estabelece também que o Banco Central publica essas resoluções. E que, em algumas matérias, o CMN pode delegar competência ao Banco Central para que este edite através de sua diretoria colegiada normas complementares a essas resoluções, as circulares. A lei diz também que Departamentos do Bacen, através de suas chefias, podem editar cartas-circulares para esclarecer aspectos já regulamentados por resoluções ou circulares”.

Desse modo, as procuradoras sustentam na sua acusação que o CMN não pode criar leis financeiras e que a direção do Banco Central não pode regulamentá-las, muito menos uma chefia de Departamento do banco. Conforme diria um famoso comentarista de arbitragem de jogos de futebol, por sinal, empresário do setor financeiro, a regra é clara: o Congresso faz as leis financeiras; o CMN produz regulamentos para essas leis; e o Bacen deve limitar-se a um papel complementar e de esclarecimento ao trabalho regulamentador do CMN.”

 

Na Ação, as Procuradoras da República sustentam que, a partir de finais da década de 80, alterações significativas foram sendo feitas no sentido de liberalizar os fluxos de capital:

 

“A legislação brasileira, aprovada pelo Congresso Nacional, possui a característica de rigidez no controle do mercado de câmbio e no fluxo de capitais, principalmente analisando a principal lei que disciplina tal matéria, a Lei nº 4.131/62.

Observa-se, no entanto, que a partir de 1988 foi realizada uma alteração significativa nessa orientação, capitaneada pelos dirigentes do Banco Central e membros do Conselho Monetário Nacional, por meio da edição de Resoluções e Circulares disciplinadoras do mercado de câmbio que, apesar da aparência de rigidez e legalidade, atuaram de forma a deixar lacunas nessa normatização, estimulando a desenfreada entrada e saída de recursos do país, sem qualquer controle sobre a sua origem. Essa normatização padece de vício de origem, considerando que somente uma lei ordinária, aprovada pelo Congresso Nacional, teria o condão de alterar a sistemática contida na Lei nº 4.131/62.

(…)

A criação do Mercado de Câmbio de Taxas Flutuantes (MCTF), pela Resolução do CMN nº 1552, de 22.12.1988, foi um abrandamento nas rígidas normas de controle do câmbio, ampliando o limite para compra e venda de moeda estrangeira (U$ 4000,00 para compra, U$ 8000,00 para cartão de crédito, e venda livre e sem identificação do vendedor), mediante negociação a preços livremente pactuados.

 

O MCTF foi criado com a finalidade de incorporar ao mercado de câmbio operações anteriormente cursadas no mercado paralelo e que não se enquadravam no mercado oficial. Segundo declarado pelas autoridades governamentais, tinha a finalidade de atrair para o País moeda estrangeira (não necessariamente de estrangeiros) depositada no exterior.

Pressuposto básico para o sucesso do mecanismo era a liberdade de ingresso de divisas no país e liberdade do seu retorno ao exterior, a qualquer tempo e sem necessidade de autorizações prévias.

(…)

Foi somente a partir de fevereiro de 1992 que o BACEN ampliou as possibilidades de utilização do instrumento, com a sua vinculação ao “Mercado de Câmbio de Taxas Flutuantes” – MCTF (Resolução CMN nº 1552/88), criando a denominação “Transferências Internacionais de Reais”- TIR – para tais operações, conforme os termos da Circular nº 2242/92.

Nessa ocasião, com a edição de outra Carta Circular, a de número 2259, de 20.02.92, o BACEN, de forma inusitada, adicionou uma terceira situação permissiva de transferência de recursos, abrindo a possibilidade para que instituições financeiras estrangeiras, não autorizadas a funcionar no país, pudessem ter conta de depósitos de livre movimentação em bancos brasileiros. Isso se deu mediante a inserção no plano de contas das instituições financeiras (COSIF) do título contábil  “Depósitos de Domiciliados no Exterior” – sub-conta  “contas de Livres – De Instituições Financeiras – Mercado de Câmbio de Taxas Flutuantes”.

Assim, a CC5 passou a permitir as seguintes situações para contas de não-residentes:

  1. a) contas livres provenientes de vendas de câmbio;
  2. b) contas livres de outras origens
  3. c) contas de Livres – De Instituições Financeiras – Mercado de Câmbio de Taxas Flutuantes.

Por esse mecanismo, em total confronto com as regras das Leis nº 4.131/62 e 4595/64, qualquer pessoa jurídica constituída no exterior como instituição financeira, ainda que segundo a nossa legislação não se caracterizasse como tal, como é o caso, por hipótese, das chamadas “off shore”, poderia receber créditos em conta corrente mantida em banco brasileiro e movimentar esses recursos independentemente de qualquer controle ou autorização de remessa para o exterior.

A criação do artifício teve o declarado propósito de ampliar o fluxo de capitais estrangeiros movimentáveis pelo câmbio flutuante, livre de qualquer controle e independente de autorização de qualquer espécie.”

 

Portanto, diante da denúncia apresentada pelas procuradoras quanto à ilegalidade das alterações procedidas ao arrepio da Lei 4.131/62, que permitiram total liberdade de capitais para sustentar a política de atração de capitais externos, por meio de altas taxas de juros, o que provocou forte impacto na dívida interna do país, resta questionada a legalidade da origem dessa parte da atual dívida interna brasileira. A CPI deve recomendar o aprofundamento das investigações para se apurar os danos ao Patrimônio Público decorrentes deste fato.

Ainda segundo Paulo Sérgio Souto, as altas taxas de juros determinaram a explosão da dívida interna, visto que desde 1995 até o presente momento, quando a dívida interna saltou de R$ 59,4 bilhões para mais de R$ 2 trilhões, o governo federal realizou superávits primários vigorosos, e somente apresentou reduzido déficit primário no ano de 1997.

Dessa forma, não cabe o argumento de que a dívida teria crescido devido ao excesso de gastos sociais e outros gastos não financeiros geralmente arrolados como os principais responsáveis pelo endividamento público.

Na realidade, a maior parte da dívida pública brasileira é de origem financeira, ou seja, dos juros que lhe são incorporados a cada período. Isso fica claro pelo simples fato de que ainda que se realizem sistemáticos superávits primários (receitas não financeiras menos despesas não financeiras), em termos nominais os resultados têm sido sistematicamente deficitários. Ou seja, é a conta de juros que tem provocado o crescimento da dívida interna.

 

Segundo Souto:

 

“Como podemos observar, em dezembro de 1994, a dívida mobiliária era de R$ 59,4 bilhões. Até 1998, como é do conhecimento de todos, tivemos, no âmbito da execução desse referido Plano [Real], a adoção da chamada âncora cambial, e a tentativa de se manter a paridade de um para um entre a nova moeda nacional – o Real – e o dólar.

O custo para o país foi altíssimo, e sua melhor tradução são esses números, que apontam que ao final de 1998 a dívida em títulos da União já alcançava a cifra de R$ 343,82 bilhões. Um crescimento, portanto, de quase 480%, em apenas quatro anos.

Uma das razões que em geral é apontada para esse aumento foi o processo de renegociação das dívidas de Estados e Municípios junto à União, com a conseqüente federalização das mesmas.

Contudo, essa é apenas uma parte da explicação do problema, e decorrência direta dos próprios efeitos macroeconômicos da política econômica em curso à época. Administrando a dívida pública com altas taxas de juros reais, com o objetivo maior de atrair poupança externa para o país; e tornando extremamente rentável as aplicações financeiras de estrangeiros – e mesmo de brasileiros, com recursos em dólares – no país, o Banco Central tinha como objetivo o acúmulo de divisas, como forma de garantir a não volatilidade do Real frente à moeda americana, e manter o compromisso de assegurar a paridade de um para um entre essas moedas.

Essa estratégia adotada, entre outras conseqüências, impôs um crescimento elevadíssimo não somente à dívida pública federal, mas, também, às dívidas dos Estados e Municípios. Com as altas taxas de juros praticadas pelo Banco Central, a rolagem dessas dívidas para as finanças de estados e municípios tornou-se algo inadministrável.”

Souto também apresentou a esta CPI quadro com a evolução do Resultado Primário desde 1995:

 

 

Tabela 6

Evolução Fiscal do Governo Federal

Critério – Banco Central (por competência)

R$ milhões / % do PIB

 

 

 

 

 

 

(*) Valores 2009 até setembro                                          Fonte: BCB – DEPEC

 

Cabe registrar que os juros nominais divulgados pelo Banco Central encontram-se minimizados, pois são calculados sobre a dívida líquida, e não sobre a dívida federal interna, sobre a qual incidirão os juros que terão que ser pagos efetivamente.

A partir do quadro apresentado por Paulo Souto, houve superávit primário em todos os anos, com exceção de 1997, que apresentou déficit muito pequeno. Com os vultosos pagamentos de juros, o resultado nominal se transforma em um grande déficit todos os anos. Portanto, o principal fator de crescimento da dívida interna decorreu da prática de elevadas taxas de juros reais.

Esta afirmação também consta do depoimento a esta CPI do ex-deputado federal Sérgio Miranda, que ressalta a importância das decisões tomadas pela equipe econômica em 1992:

 

A dívida atual é basicamente financeira; não é dívida fruto de projetos ou, em contrapartida, de financiamentos ao Estado para desenvolver obras. Nada disso. Nós temos… A dívida, a partir de 1992, é uma dívida financeira.

Podemos compreender a dívida por 2 aspectos. A dívida atual é o custo da política econômica, é o custo. Ela decorre de uma política deliberada de juros reais, sempre altos, e decorre de um subsídio implícito na construção de um mercado financeiro como forma de base ao financiamento da economia, que, pelas características do nosso País, quem assume os riscos do mercado financeiro é o Estado nacional.

A política de juros altos se dá, esse início, a partir de 1992, com a ascensão do Ministro Marcílio Marques Moreira ao Ministério da Fazenda e, no Banco Central, do Sr. Francisco Gros como Presidente e o Sr. Armínio Fraga como Diretor da Área Externa do Banco Central. A partir daí, define-se uma orientação de juros altos como uma forma de atrelar o Brasil, o trem Brasil, à locomotiva da globalização financeira e atrair capital para o País. Esse capital serviria de lastro posteriormente para a construção do Plano Real.

Como é que aparece essa questão dos juros como determinante da construção da dívida? Os dados, a que já assisti aqui na CPI, são dados que são correntes. Nós temos aqui, por exemplo, um dos gráficos que apresento para… É isso. Se você observar de 1996 até os dias de hoje, nós só tivemos déficit primário em um ano, que foi em 1997. Não por acaso, o déficit primário se dá no ano onde se vota aqui no Congresso a reeleição, a alteração constitucional da reeleição. No restante do período, tivemos sempre superávit.

Então, não são os gastos públicos primários os responsáveis pelo crescimento da dívida. O responsável pelo crescimento da dívida é os juros reais altíssimos que se dão no Brasil a partir de 1992. Antes de 1992, os juros eram baixos e, muitas vezes, negativos — negativos! Juros reais negativos.

Nesse sentido, acho que essa compreensão é fundamental: nós dividirmos as etapas. O endividamento recente é fruto dessa política de juros altos para atrair capital e se complementa com a liberalização do fluxo de capitais.

É relevante mencionar que o ano de 1992 foi um ano “chave” também para as negociações da dívida externa, quando foram pactuadas certas renúncias que podem ter sérias implicações inclusive em relação à prescrição da dívida externa, conforme mencionado no Capítulo II da análise preliminar nº. 5, sobre a dívida externa. A CPI não teve acesso a tais acordos pactuados em 1992, no Canadá, embora tenha requisitado e reiterado o pedido diversas vezes junto ao Banco Central e Ministério da Fazenda. O Senado disponibilizou à CPI apenas minuta resumida. As negociações da dívida externa eram comandadas, na época, por Pedro Sampaio Malan, e integravam a comissão negociadora Armínio Fraga Neto, Murilo Portugal Filho, dentre vários outros[96].

A análise da dívida dos estados será comentada mais adiante na presente análise preliminar, demonstrando-se também o impacto dos juros sobre essa dívida. Em resumo, é a conta de juros que tem provocado o crescimento da dívida interna.

 

IV.6 – O SISTEMA DE METAS DE INFLAÇÃO

 

IV.6.1. – Questionamentos sobre o marco legal:

 

Após 1999, apesar da entrada em vigor do câmbio flutuante, as altas taxas de juros internas continuaram sendo praticadas no Brasil, desta vez sob a justificativa de se atingir as metas de inflação.

O Regime de Metas de Inflação é citado nos documentos oficiais a partir da edição do Decreto 3.088/1999, cujo Art. 1º assim dispõe:

“Fica estabelecida, como diretriz para fixação do regime de política monetária, a sistemática de “metas para a inflação”.

 

O fundamento legal citado no referido Decreto é o art. 4º da Lei nº 4.595, de 31 de dezembro de 1964, e o art. 14, inciso IX, alínea “a”, da Lei nº 9.649, de 27 de maio de 1998. Referido Decreto dispõe que o Banco Central teria a função de “executar as políticas necessárias para cumprimento das metas fixadas das metas de inflação”. Dessa forma, o instrumento utilizado para tanto passou a ser principalmente a taxa de juros, ou seja, a partir dali os juros passaram a ser o vetor considerado essencial para colocar a inflação dentro da meta estabelecida periodicamente pelo Conselho Monetário Nacional.

Porém, o Art. 4º da Lei nº 4.595 traz as competências do Conselho Monetário Nacional, em nada respaldando que a diretriz da política monetária seria a sistemática das metas de inflação, por meio da taxa de juros.

Pelo contrário, o Art. 3º, II, da Lei nº 4.595 estabelece como função do Conselho Monetário Nacional:

“Regular o valor interno da moeda, para tanto prevenindo ou corrigindo os surtos inflacionários ou deflacionários de origem interna ou externa, as depressões econômicas e outros desequilíbrios oriundos de fenômenos conjunturais;”

Portanto, o Decreto 3.088/1999 conflita com a Lei acima descrita, por eliminar, na política de regular o valor interno da moeda (inflação), a prevenção ou correção de depressões econômicas e outros desequilíbrios conjunturais, elegendo as taxas de juros como política principal para o controle da inflação, o que definitivamente não corresponde aos ditames da Lei nº 4.595.

Em ofício encaminhado à CPI[97], o Diretor de Política Econômica do Banco Central, Mario Mesquita, questiona e afirma:

Mas, como o Banco Central, sendo o executor da política monetária, controla a taxa de inflação? Em outras palavras, como funciona o mecanismo de transmissão da política monetária?

(…)

A Política monetária, através do controle da taxa nominal de juros de curto prazo, afeta a economia por diferentes canais. Entre os principais canais de transmissão da política monetária encontram-se os seguintes: a) demanda agregada; b) taxa de câmbio; c) crédito; e d) expectativas.

(…)

Ou seja, ao elevar a taxa nominal de juros o banco central produz um arrefecimento do nível de atividade econômica que, por sua vez, produz a queda da inflação. Entre outros fatores, isso ocorre porque ao se depararem com o aumento da taxa real de juros os empresários passam a ter maiores incentivos para postergar seus ganhos com investimento, sejas porque a rentabilidade relativa do investimento diminui, no curto prazo, ou pelo fato de que elevações na taxa de juros reduzirão a demanda e, portanto, a necessidade de expansão de capacidade torna-se menos premente. De fato, ao se depararem com o aumento da taxa real de juros, os consumidores passam a ter mais incentivo em postergar seu consumo, isto é, poupar, visando comprar mais bens e serviços no futuro. Além disso, note-se que vários gastos de consumo – como gastos com a compra de bens duráveis e de imóveis – são, na verdade, decisões de investimento, e como tal respondem de maneira similar. Face à menor demanda de consumidores e empresários as firmas passarão, temporariamente, a produzir menos. Neste insterstício, os estoques podem se mostrar maiores que os desejados, o que também enseja redução da produção. Como resultado, pressões para a queda nos preços, ou, mais frequentemente, por redução na sua taxa de variação, se disseminarão pelos vários setores da economia. Note, ainda, que o menor nível de produção levará à menor pressão sobre os salários, diminuindo as pressões de custos.

 

Do exposto acima, resta evidente a predominância da utilização das taxas de juros no sistema de controle de metas de inflação por parte do Banco Central, o que não atende ao disposto na lei 4.595, como antes mencionado.

 

Segundo Marcelo Luiz Curado e José Luis Oreiro[98]:

 

“O modelo de previsão da inflação utilizado pelo Banco Central tem como referencial básico o modelo IS-LM com Curva de Phillips. Este é um ponto que deve ser compreendido e que tem sido pouco explorado pela literatura que trabalha com a análise do regime. Ao supor que as variáveis macroeconômicas fundamentais da economia, entre elas os mecanismos de transmissão da política monetária, encontram-se sintetizados pelo modelo básico IS-LM com Curva de Phillips, o Banco Central assume que o controle do processo inflacionário será realizado através de políticas de contração da demanda agregada via alterações da taxa de juros.

O regime de metas de inflação tem, portanto, como instrumento básico de controle da inflação as elevações da taxa de juros que restrinjam a demanda agregada. Trata-se, portanto, do ponto de vista dos mecanismos de controle da inflação, de uma opção muito próxima dos ajustes tradicionalmente sugeridos nos programas de combate a inflação do Fundo Monetário Internacional e que, de um modo geral, foram ineficientes no combate aos processos de inflação inercial dos anos 80 na América Latina.”

 

IV.6.2 – Deficiências do sistema de metas de inflação

 

Segundo os pesquisadores Marcelo Luiz Curado e José Luis Oreiro, nos anos de 2001 a 2004, as metas estabelecidas inicialmente não foram cumpridas, o que mostra as deficiências do sistema de metas de inflação:

 

“Chama atenção o fato de que o não cumprimento das metas em três anos seguidos não afetou a credibilidade do sistema na condução da política monetária, nem promoveu o descontrole do processo inflacionário, demonstrando que a fixação de metas de inflação tão baixas e declinantes foi, na melhor das hipóteses, um equívoco do CMN.”

 

Adicionalmente, um dos principais argumentos do governo para o controle de inflação – anunciada como condição para o crescimento econômico – também é questionado pelos pesquisadores, pois desde que o regime de metas foi implantado, o Brasil cresceu bem menos que os demais países em desenvolvimento.

Nesse sentido, o debate desta CPI nos faz apontar para a necessidade de rediscutir o papel do Banco Central, questionando a sua tamanha liberdade de ação, até porque os custos de suas decisões têm sido arcados integralmente pelo Tesouro Nacional[99]. No sentido de que mais anseios da sociedade possam estar representados num órgão que é parte orgânica do Estado, entendemos que o desenvolvimento econômico do conjunto da sociedade e os níveis de endividamento do estado deveriam ser também parte dos objetivos almejados pela autoridade monetária.

É importante lembrar ainda que ao liberar o controle sobre o câmbio a partir de 1999, o argumento do governo era de que a sua flutuação poderia dar mais autonomia à política monetária, dado que não se faria mais tão necessária a manutenção de altas taxas de juros para atrair capital e impedir a desvalorização cambial. Tal argumento não se verificou na prática, pois apesar da liberdade cambial as taxas de juros permaneceram elevadíssimas.

O Sistema de Metas de Inflação não considera, em sua formulação, os custos impostos à sociedade, traduzidos pelos impactos que provocam aumento das despesas financeiras com o endividamento público, constantemente repassados ao Tesouro Nacional. Por esta razão, os seus relevantes impactos fiscais – aumentando excessivamente a despesa com os juros da dívida – sequer são consideradas.

Os autores Marcelo Luiz Curado e José Luis Oreiro concluíram o seguinte:

 “Acreditamos que os resultados pífios obtidos pela economia brasileira nos últimos anos em termos de crescimento e estabilidade macroeconômica se devem ao fato de que a atual estrutura de governança da política monetária brasileira não é a estrutura mais adequada para o funcionamento do sistema de metas de inflação. Isso porque na atual estrutura:

(i) Não há uma clara separação entre a instituição responsável pela fixação das metas inflacionárias e a instituição responsável pela sua obtenção. Isso ocorre porque o Presidente do Banco Central do Brasil tem voz e voto no Conselho Monetário Nacional, que é a instituição responsável pela fixação das metas inflacionárias. Como, nas regras atuais, o Conselho Monetário Nacional é composto por apenas três membros – sendo os outros dois, o Ministro da Fazenda e o Ministro do Planejamento – segue-se que a capacidade do Banco Central de influenciar a fixação das metas inflacionárias é bastante elevada;

(ii) O processo de fixação das metas inflacionárias no âmbito do Conselho Monetário Nacional não obedece ao requisito de representatividade das preferências sociais por inflação e desemprego que se espera da instituição responsável pela fixação das metas da política monetária. A teoria da política econômica, tal como elaborada pioneiramente por Tinbergen (1952), prevê que os objetivos da política econômica sejam fixados como resultado de uma ampla discussão entre os segmentos representativos da sociedade. No caso específico da política monetária, os objetivos desta devem refletir um equilíbrio obtido por consenso entre o “grau de aversão social” à inflação e o “grau de aversão social” às perdas de produção e emprego decorrentes de toda a política de desinflação. Contudo, na estrutura atual, as metas inflacionárias não refletem um consenso social a respeito da “taxa ótima de inflação” a ser obtida no longo-prazo e, muito menos, a respeito da velocidade com a qual essa meta de longo-prazo deve ser obtida.

(iii) Existe pouco espaço para a autoridade monetária acomodar choques de oferta. (…) Para acomodar a ocorrência de choques de oferta, alguns Bancos Centrais de países que adotaram o regime de metas de inflação optaram por “expurgar”, do cálculo do índice de inflação de referência do sistema, a variação de preços dos bens e serviços mais diretamente afetados por esses choques. Esse é o caso, por exemplo, do Banco Central da Nova Zelândia (Ibid, p.290). No caso brasileiro, o Banco Central do Brasil utiliza o “índice cheio” do IPCA como referência para o sistema de metas de inflação. Dessa forma, toda a ocorrência de choques de oferta gera uma pressão imediata para a elevação da taxa de juros por parte do Banco Central, quando a política recomendada nesse caso seria acomodar esses choques por intermédio de um aumento temporário da taxa de inflação.

(iv). A decisão de fixação da taxa de juros é influenciada por expectativas de inflação que não refletem a percepção dos agentes com efetivo poder de formação de preços a respeito da evolução futura da inflação, mas sim as opiniões vigentes entre os analistas do mercado financeiro sobre esse tema. Com efeito, como se observa no Relatório de Inflação de setembro de 2004 do Banco Central do Brasil, as expectativas de mercado desempenham um papel importante na decisão do COPOM a respeito do valor da taxa básica de juros. No entanto essas expectativas de mercado nada mais são do que as expectativas dos departamentos de análise econômica dos bancos e agentes do sistema financeiro. Dessa maneira cria-se um mecanismo perverso no qual o sistema financeiro brasileiro pode influenciar a decisão do Banco Central a respeito da fixação da taxa de juros, pois se os bancos entrarem em acordo entre si eles podem “forçar” um aumento da taxa de juros por intermédio de uma “revisão para cima” de suas expectativas de inflação. Em função das fortes evidências de comportamento oligopolista por parte dos bancos brasileiros (cf. Belaisch, 2003), a ocorrência de um “conluio” para forçar um aumento da taxa de juros não pode ser encarada como uma simples “curiosidade teórica”[100].

Essas características da atual estrutura de governança da política monetária no Brasil geram os seguintes problemas:

  1. i) O Banco Central do Brasil tem, na atual estrutura, autonomia para fixar os objetivos da política monetária, e não apenas autonomia no uso dos instrumentos necessários a operacionalização dessa política. Tal como afirma Blinder (1998, p.54), a decisão a respeito dos objetivos da política monetária deve caber aos representantes democraticamente eleitos pelo povo. Se o Banco Central tem poder para determinar ou influenciar a determinação da taxa de inflação que ele deve obter por intermédio do uso dos instrumentos da política monetária; então o princípio fundamental da democracia está sendo violado, qual seja: “Todo o poder emana do povo e em seu nome deve ser exercido”.
  2. ii) As metas de inflação tendem a ser fixadas em “patamares irrealistas”, ou seja, em níveis que não refletem adequadamente o grau de aversão social a inflação e o grau de aversão social ao trade-off de curto-prazo entre inflação e desemprego. Esse fenômeno se observa nas freqüentes declarações dos representantes da Indústria e dos Sindicatos em favor de uma “política mais realista de combate à inflação”.

iii) A taxa real de juros efetiva tende a permanecer num patamar “excessivamente elevado” não só com respeito ao valor observado em outros países – de fato, o Brasil é o país com a mais alta taxa de juros real do mundo – mas também com respeito a qualquer estimativa minimamente plausível do valor de equilíbrio da referida taxa. O “problema dos juros” decorre da fixação de metas declinantes de inflação – em função do objetivo de se obter uma taxa de inflação de 4.0% ao ano no longo prazo – em conjunto com a ausência de qualquer tipo de mecanismo de “expurgo” dos efeitos sobre a inflação da ocorrência de choques de oferta. Além disso, o setor financeiro brasileiro, por intermédio do “mecanismo das expectativas inflacionárias”, pode exercer uma forte pressão no sentido de impedir uma queda da taxa real de juros abaixo de um patamar considerado “razoável” para os integrantes desse setor.”

 

Diante disso, é recomendável a revisão da política de metas de inflação ora praticada, especialmente devido o fato de que a dívida pública federal constitui um ativo privilegiado, cuja atualização monetária tem sido garantida e tratada como parcela do “principal” da dívida interna, provocando seu crescimento exponencial e comprometendo cada vez volume mais significativo de recursos para o pagamento de seu serviço.

 

IV.6.3 – Definição das taxas de juros e a possibilidade de conflito de interesses

A taxa de juros básica – Selic – é definida pelo COPOM – Comitê de Política Monetária – cujos membros possuem fortes relações com o mercado financeiro.

A Tabela 7, obtida a partir de respostas[101] ao Requerimento de Informações nº 12/2009 da CPI e de outras fontes[102], lista todos os membros deste Comitê, mostrando que muitos deles, especialmente os presidentes do Banco Central, são egressos do mercado financeiro. Além disso, chama a atenção que nada menos que 17 dos 26 ex-integrantes do COPOM, ou seja 65% de seus ex-membros, assumiram cargos em bancos ou grupos gestores de investimentos privados após terem deixado o Banco Central.

Embora haja uma legislação prevendo uma “quarentena” de 4 meses para os Diretores do Banco Central – período no qual ex-membros não poderiam assumir cargos no setor privado – isto não impede que membros do COPOM – que possam ter sido bastante favoráveis ao mercado financeiro – assumam cargos em bancos e grupos gestores de investimentos privados após estes 4 meses, conforme evidenciado pelo elevado percentual de 65% acima indicado.

A Tabela 7 demonstra que a ampla maioria dos ex-membros do COPOM – 65% – assumiram vínculos com instituições financeiras. Cabe ressaltar que justamente as instituições financeiras são diretamente interessadas em altas taxas de juros, o que aponta para a possibilidade de conflitos de interesses de parte da burocracia econômica. Isso porque tal parcela da burocracia ora serve ao Estado – que define as taxas e paga os juros – e ora serve às instituições financeiras – que usufruem das elevadas taxas de juros, o que demanda o aprofundamento das investigações por parte do Ministério Público.

 

 

Tabela 7 – Membros do COPOM (Comitê de Política Monetária)

Membro do Copom Diretoria ocupada no Bacen* Início* Fim* Quantidade de reuniões Formação (grau mais alto) Vínculos anteriores ao Banco Central do Brasil** Vínculo posterior ao Bacen***
Carlos Eduardo Tavares de Andrade Administração 06/04/1993 04/03/1999 10 Bacharel em administração (Centro Unificado de Brasília, 1978) Banco Central do Brasil (1966-1993); Banco do Brasil (1964-1966). Instituto de Resseguros do Brasil
Francisco Lafaiete de Pádua Lopes Política econômica (1995-1999); Política monetária (1996-1999) 12/01/1995 04/03/1999 11 Doutor em economia (Universidade de Harvard, 1972) Macrométrica Pesquisas Econômicas (1988****-1994); PUC-RJ (1977-1986); Ministério da Fazenda (1987); Secretaria de Planejamento da Presidência da República (1986); IPEA (1979); Fundação Getúlio Vargas (1974-1977). Macrométrica
Cláudio Ness Mauch Fiscalização 30/06/1995 04/03/1999 9 Bacharel em contabilidade (Faculdade Camaquense de Ciências Contábeis e Administrativas, 1973) Banco Central do Brasil (1976-1985); Sistema [Banco] Meridional (1985-1993*****). Banco CCF
Paolo Enrico Maria Zaghen Liquidações e controle de operações do crédito rural 02/12/1996 29/07/1999 15 Doutor em economia (Universidade da Califórnia, Berkeley, 1981) Paranapanema Mineração, Indústria e Construção (1994-1996); Banespa Corretora da Câmbio e Valores (1991-1994); Lucro DTVM (1988-1991); Distribuidora de Valores do Estado de São Paulo (1983-1988); Secretaria de Fazenda de São Paulo (1971-1972, 1979-1983); Universidade de São Paulo (1970-1993). Banco do Brasil
Gustavo Henrique de Barroso Franco Presidente 20/08/1997 04/03/1999 9 Doutor em economia (Universidade de Harvard, 1986) Banco Central do Brasil (1993); Ministério da Fazenda (1993); PUC-RJ (1986-1993). Rio Bravo Investimentos
Demósthenes Madureira de Pinho Neto Assuntos internacionais 03/09/1997 04/03/1999 5 Doutor em economia (Universidade da Califórnia, Berkeley, 1991) Unibanco (1991-1997*****, interrompida por passagem pelo Ministério da Fazenda em 1993); Fundação Getúlio Vargas (1991- ); PUC-RJ (1984-1986); Itaú Seguradora (1984-1985). Banco Dredsner
Sérgio Darcy da Silva Alves Normas e organização do sistema financeiro 03/09/1997 20/04/2006 88 Bacharel em economia (UFRJ, 1968) Banco Central do Brasil (1967-1997) Banco Santander
               
Armínio Fraga Neto Presidente 04/03/1999 02/01/2003 45 Doutor em economia (Universidade de Princeton, 1985) Soros Gestão de Fundos (1993-1999*****); Banco Central do Brasil (1991-1992); Salomon Brothers (1989-1991); Banco Garantia (1985-1988); PUC-RJ (1985-1988); Fundação Getúlio Vargas (1985-1988). Gávea Investimentos; Banco Unibanco
Sérgio Ribeiro da Costa Werlang Estudos especiais (2000-2002); política econômica (1999-2000) 04/03/1999 11/01/2002 18 Doutor em economia (Universidade de Princeton, 1986) Banco BBM (1997-1999); Banco Liberal (1990-1992); Fundação Getúlio Vargas (1990-1993); Ministério da Fazenda (1990). Banco Itaú
Daniel Luiz Gleizer Assuntos internacionais (1999-2002); estudos especiais (2002-2003) 04/03/1999 17/03/2003 32 Doutor em economia (Universidade da Califórnia, Berkeley, 1990) Banco Crédit Suisse First Boston Garantia (1998-99); Banco Garantia (1996-1998); FMI (1991-1996). Banco Unibanco
Edison Bernardes dos Santos Administração 04/03/1999 17/03/2003 46 Bacharel em administração e em economia (CEUB, 1976 e 1982) Banco Central do Brasil (1972-1998); Banco do Brasil (1972). n/d
Luiz Fernando Figueiredo Política monetária (1999-2003) 04/03/1999 26/06/2003 50 Bacharel em administração (Fundação Armando Álvares Penteado, 1989) Banco BBA Creditanstalt (1993-99); Banco Nacional (1992-1993); JP Morgan (1988-1992); Magliano Corretora (19878-1988); Supra DTVM (1986-1987); Patente Corretora (1984-1986). Gávea Investimentos
Luiz Carlos Alvarez Fiscalização 04/03/1999 29/11/1999 8 Especialização em contabilidade (USP, 1982) Banco Central do Brasil (1973-1999); Banco do Brasil (1972-1973). Guaraniana
Carlos Eduardo de Freitas Liquidações e controle de operações do crédito rural (1999-2003); fiscalização (1999-2000) 12/08/1999 08/05/2003 44 Mestre em economia (FGV, 1970) Fundação Getúlio Vargas (1994-1999); Asoc. de Ensino Unificado do DF (1974-1978); Banco Central do Brasil (1965-1999, afastado de 1969 a 1971); Banco do Brasil (1963-1965). Valora (consultoria na área de petroquímica)
Tereza Cristina Grossi Togni Fiscalização 30/03/2000 17/03/2003 28 Bacharel em contabilidade e em administração (Universidade Católica de Minas Gerais, 1977) Banco Central do Brasil (1984-2000*****); Samarco Mineração (1975-1978, 1982-1984); Arthur Andersen (1978-1982); Samitri (1973-1975); Usiminas (1973). Banco Itaú
Ilan Goldfajn Política econômica 14/09/2000 02/07/2003 35 Doutor em economia (Instituto de Tecnologia de Massachussetts, 1995) PUC-RJ (1991, 1999-2000); FMI (1996-1999); Universidade de Brandeis (1995-1996). Gávea Investimentos
Beny Parnes Assuntos internacionais 11/01/2002 03/11/2003 23 Créditos de doutorado em economia (Universidade da Pennsylvania, 1990) Banco BBM (1995-2001); Banco Matrix (1994-1995); BBM Corretora/Trading (1991-1993). Banco BBM
               
Henrique de Campos Meirelles Presidente 02/01/2003   60 Mestre em administração (UFRJ, 1978) Banco de Boston (1974-2002).  
Paulo Sérgio Cavalheiro Fiscalização 17/03/2003 19/12/2007 48 Especialização em auditoria (USP, 1979) Banco Central do Brasil (1976-2003); Banespa (1970-1976). Banco Safra
Luiz Augusto de Oliveira Candiota Política monetária 17/03/2003 29/07/2004 17 Gestão Financeira (Harvard, 2001); Bacharel em economia (PUC Rio, 1990) Grupo Lacan [consultoria financeira] (2000-2003*****); Banco Fibra e Grupo Vicunha (1999-2000); Citibank (1993-1999); Unibanco (1992-1993); Banco Mantrust (1990-1992). Grupo Lacan [consultoria financeira]
João Antônio Fleury Teixeira Administração 17/03/2003 31/10/2006 41 Pós-graduação em análise de sistemas da informação, organização sistemas e métodos e formação gerencial em nível estratégico (FGV) Banco Central do Brasil (1977-2003). Secretaria de Fazenda de Minas Gerais
Afonso Sant’Anna Bevilaqua Política econômica (2003-2007) 26/06/2003 07/03/2007 40 Doutor em economia (Universidade da Califórnia, Berkeley, 1993) PUC-RJ (1995-2003, 1986-1987); FMI (1993-95). Banco Opportunity
Eduardo Henrique de Mello Motta Loyo Estudos especiais 21/08/2003 03/06/2005 21 Doutor em economia (Princeton, 1999) PUC-RJ (2001-2003); Universidade de Harvard (1998-2001); Tribunal de Contas do Estado do RJ (1993); Secretaria da Infra-estrutura e Desenvolvimento Urbando de PE (1990-1991). FMI, representando o Brasil
Alexandre Schwartsman Assuntos internacionais 03/11/2003 28/04/2006 29 Doutor em economia (Universidade da Califórnia, Berkeley, 2000) Unibanco (2003, 1985-1986); BBA Corretora (2001-2002); Indosuez W.I. Carr Securities DTVM (1999-2001); Crédit Agricole Indosuez DTVM (1995-1999); USP (1990-1991); PUC-SP (1987-1988, 1989-1991); Grupo Pão de Açucar (1986-1987). Banco ABN Amro
Rodrigo Telles da Rocha Azevedo Política monetária 20/10/2004 26/04/2007 25 Doutor em economia (Universidade de Illinois, Urbana-Champaign, 1999) Banco Credit Suisse First Boston (1999-2004); Banco Garantia (1994-1998). Grupo JGP, gestor de fundos de investimentos
Paulo Vieira da Cunha Assuntos internacionais 14/06/2006 14/01/2008 12 Doutor em planejamento regional/economia (UC Berkeley, 1979) HSBC Securities (2002-2006); Lehman Brothers (1998-2003); Banco Mundial (1986-1998); Governo do Estado de SP (1984-1986); Ipea (1977-1983); UFRJ (1978-1983); USP (1976-1977). Fundo de mercados emergentes Tandem Global Partners, Nova Iorque
Mário Gomes Torós Política monetária 25/04/2007 16/11/2009 13 Mestre em administração (UFRJ, 1989) Thassos Fundo de Investimento Multimercado (2007); Banco Santander (1992-2006); Banco ING (1990-1992); Aracruz Celulose (1986-1987). Quarentena
               
Antônio Gustavo Matos do Vale Liquidações e controle de operações do crédito rural (2003-atual); administração (2006-2007) 08/05/2003   56 Especialização em análise de sistemas de informação (Fundação João Pinheiro, 1979) Banco do Brasil (2001-2003); Banco Central do Brasil (1984-2001); Banco Mercantil do Brasil (1979-1984); IBM (1974-1978); Siderúrgica Montana (1974); BMG Seguros (1973-1974); Banco de Minas Gerais (1971-1973).  
Alexandre Antonio Tombini Normas e organização do sistema financeiro (2006-atual); estudos especiais (2005-2006) 03/06/2005   31 Doutor em economia (Universidade de Illinois, Urbana-Champaign, 1991) FMI (2001-2005); Banco Central do Brasil (1998-2001); Casa Civil da Presidência da República (1995-1998); Ministério da Fazenda (1991-1995).  
Mário Magalhães Carvalho Mesquita Política econômica (2007-atual); estudos especiais (2006-2007) 01/06/2006   20 Doutor em economia (Universidade de Oxford, 1997) Banco ABN Amro (2000-2006); Banco ING (2000); FMI (1997-2000).  
Anthero de Moraes Meirelles Administração 06/12/2007   8 Doutor em administração (UFMG, 2003) Banco Central do Brasil (1994-2007).  
Alvir Alberto Hoffmann Fiscalização 19/12/2007   8 Especialização em Auditoria Interna e Externa (Instituto de Capacitação Tecnológica, Brasília, 1985) FMI (2005-2007); Banco Central do Brasil (1978-2005); Siderúrgica Guaíra (1973-1978).  
Maria Celina Berardinelli Arraes Assuntos internacionais 21/01/2008   8 Mestre em economia (UnB, 1979) PNUD (1999-2007); Banco Central do Brasil (1973-1998, com passagem pelo FMI (1992-1995) e pela Secretaria Geral da Presidência da República (1990-1991).  

Obs.: Todas as informações para as quais não há indicacão explícita de fonte foram extraídas dos currículos de membros do Copom disponiblizados à CPI da Dívida Pública, no Ofício 841-5/2009-BCB-Secre, de 13 de outubro de 2009, em Resposta ao Requerimento de Informações nº 12/2009.

* Desconsideradas passagens por diretoria que, pela brevidade, indicam ocupação temporária. As informações foram extraídas do documento intitulado “Presidentes e Diretores do Banco Central do Brasil responsáveis por decisões de taxas de juros”, encaminhado pelo Bacen à CPI

** Não consideradas atividades de consultor, membro de conselhos, auxiliar de pesquisa, professor ou pesquisador visitante e outras consideradas como vínculo temporário ou esporádicas.

*** Informações obtidas de veículos de imprensa, Bacen, e organizações do sistema financeiro.

**** Data obtida do sítio Internet da empresa

***** Datas presumidas a partir de informações contidas nos currículos disponibilizados à CPI da Dívida.

 

IV.6.4 – Semelhança entre os juros esperados pelo mercado e os definidos pelo Banco Central

 

Outro questionamento que se pode fazer ao Regime de Metas de Inflação é a recorrente semelhança entre os juros esperados pelos atores de mercado que são ouvidos pelo Banco Central e as taxas de juros definidas pelo Copom.

 

Reproduzimos a seguir trechos da fala do economista Dércio Garcia Munhoz, professor da Universidade de Brasília, em depoimento à CPI dia 25 de novembro de 2009, que traz sua análise sobre o processo de definição das taxas de juros:

 

“Agora, sobre questão dos juros, que é outra coisa que o Deputado tratou. Pergunta-se: os juros podem cair? Eu digo: olha, é difícil. Quando eu começo com a SELIC em 9% e coloco títulos no curto prazo, títulos de prazo curto, e os coloco pagando 12%, 13% e 14%, como é que vou conseguir uma redução na taxa de juros lá na ponta, lá na frente? É muito difícil assim. Então, a questão dos juros está no ambiente, que é toda uma farsa. Começa pela autonomia do Banco Central, depois passa por um negócio que eles criaram, o tal do COPOM, que é um clube. O COPOM se reúne depois que os bancos falam como é que está a situação. O que eles estão pensando aí? O Banco Central então pega: “Ah! o mercado está pensando isso aí.” E, a partir daí, ele se reúne e estabelece ao COPOM que ele faça assim. Perguntam: vocês estão trabalhando com juros? Eu digo: Não. Nós estamos apenas sinalizando. O COPOM diz que a taxa vai ser 9%. Chega a noite, nas operações interbancárias para se fechar posição, os bancos falam assim: “Eu empresto para você, mas você me dá os títulos por 24 horas. Qual a rentabilidade?” Aí ouvem que o COPOM sugeriu 9%. “Então, muito bem. Vamos fazer a 8,98%”. E fazem as operações a 8,98%. No outro dia, à tarde, o Banco Central e o COPOM falam assim: “O mercado está atuando com 8,98%; então nós vamos remunerar os títulos públicos por 8,98%”.

 

“Mas isso é uma farsa! É uma coisa! Repugna — entendem? — um negócio desses aí. Vejam bem. De manhã eu digo que subiu a taxa; à noite, os bancos trocam posição e sempre pegam uma taxa um pouco abaixo. Depois vem o Banco Central, mais tarde, e fala assim: “Se eles estão operando ali, que é na taxa sugerida de manhã, eu remunero os títulos públicos também naquela taxa”. Essa é a SELIC; é uma taxa tabelada, com todo o jeitão de que o mercado está mesmo formando taxas.”

 

“Pior! Se eles fizessem essas brincadeiras, tudo bem. Agora, você pegar um estoque de dívida que você tem… Por exemplo, no total de títulos públicos, você tem quase quarenta e tantos por cento — não no mercado total, mas em SELIC. No mercado tem menos, mas, no total, remunera assim. E passa a remunerar tudo com base naquilo. Acaba tendo-se taxas prefixadas para atrair… Então isso é um absurdo! É de uma rigidez!

 

Então, a pergunta do Deputado é seguinte: “Posso reduzir juros?” Eu digo: é muito difícil, a partir disso aí.

 

(…)

 

Uma entidade governamental não pode ser administrada a partir de uma indicação do mercado. As regras têm que dizer que certos cargos não se podem ter, trazer de fora, assim, as pessoas. O problema, hoje menos, é que o comando está assim. Mas o mercado é quem faz, quem influencia, quem toma decisões. É o mercado que fala se gosta ou não gosta. Eu acho que a questão institucional é isto: tem que ser profissionalizada. O Banco Central é um instrumento auxiliar da Administração. Essa é uma das questões que colocam. A segunda é sobre o COPOM. O COPOM dá um poder de ditadura ao Banco Central. E por quê? Quem deu esses poderes a ele a partir dali? Por que a taxa tem de ser de tanto e tudo mais? Esse é o problema. Posso ter piso salarial? Não pode. O piso salarial é um absurdo, não pode. Mas há tabela de juros. Por que não posso defender para salários, se eu defendo para os juros? Então existem umas questões institucionais assim. (…) Claro, quando o Banco Central com a política monetária, com a política cambial e com a política do capital estrangeiro determina e dá os parâmetros, a Fazenda tem de se adaptar. A Fazenda é a coadjuvante, e isso está invertido. Política fiscal, como? Política fiscal só depois que o Banco Central fizer algo e isso ter efeito. Quem sabe o custo dos encargos? Quem sabe quanto vai se perder com essas operações compromissadas? Só Deus.

 

Então, tudo mais fica subordinado a essa questão. O que significa ser esse um problema de transparência e independência. E há ainda o problema de se ter dado ao Banco Central o comando das políticas macroeconômicas. O Banco toma certas decisões e amarra a política macroeconômica. Como posso ter a política macroeconômica ditada por uma instituição que tem, por formação inclusive, estrutura para tratar só do financeiro? E tratar do financeiro não pode vir à frente da política, não pode se colocar assim.”

 

 

 

São graves as colocações do renomado economista Dércio Garcia Munhoz. Diante disso, as investigações devem ser aprofundadas a partir de suas sugestões, inclusive com encaminhamento dessas questões ao Ministério Público, pois podem configurar conflito de interesses entre o mercado financeiro e o Banco Central.

 

IV.6.5 – O inexplicável elevado patamar das taxas de juros brasileiras e o processo de decisão do COPOM:

 

Tomando outro dado relevante, o Gráfico 20 compara a Taxa Selic brasileira com duas taxas internacionais (Libor e Prime), desde 1994 a 2009. Verifica-se que as taxas brasileiras sempre estiveram muito acima das demais. No período atual, há uma grande diferença, resultante da redução dos juros nos países centrais, como medida anti-crise.

 

 

Gráfico 20 – Taxas de Juros – Comparativo Internacional

Fonte: Banco Central (Selic) e Ipeadata (Libor e Prime)

 

 

O Requerimento de Informações nº 42/2009 solicitou ao Banco Central “detalhamento da gama ampla de variáveis, analisadas pelos economistas do BC, que são servidores da instituição, para a tomada de decisões de política monetária, com a fundamentação técnica para o estabelecimento das taxas de juros, tais como fórmulas ou demais dados objetivos”.

 

Em sua resposta[103], o Banco Central encaminhou à CPI texto que não informa objetivamente como se chegou às taxas definidas, deixando também de informar eventual fórmula utilizada para a definição das taxas.

 

Informou inicialmente o Banco Central à CPI[104] que o COPOM se reúne por dois dias, sendo que “o segundo dia de reunião inicia-se com a apresentação feita pelo chefe do Depep, com a análise das projeções atualizadas para a inflação, baseadas em diferentes hipóteses para as principais variáveis econômicas. Após essa análise, os membros do Copom avaliam a estratégia de política monetária e decidem, por votação, o patamar da taxa básica de juros bem como as principais mensagens e o tom geral da comunicação da decisão (comunicado e nota).”

 

Essa informação sugeria que tais taxas acabam por ser definidas de acordo com critérios não matemáticos, dependendo, portanto, de opinião pessoal dos integrantes do COPOM.

 

A CPI reiterou novamente o pedido de informações ao Banco Central[105], solicitando informar objetivamente acerca da utilização de “fórmulas ou demais dados objetivos utilizados para o estabelecimento das taxas de juros”.

 

Em resposta, o diretor de Política Econômica do Banco Central, Sr. Mário Magalhães Carvalho Mesquita, informou à CPI[106] que “as decisões do Copom são tomadas depois de apresentações técnicas de diferentes departamentos desta Autarquia e de exaustiva discussão sobre as condições macroeconômicas correntes e futuras, baseando-se em uma ampla gama de variáveis, as quais fazem parte de documentos anexados àqueles ofícios. As decisões não decorrem da aplicação de uma fórmula que definiria qual deveria ser a decisão do Comitê sobre a meta da taxa Selic.”  (grifo nosso)

 

Constata-se que o Banco Central confirmou que a decisão sobre a taxa de Selic decorre de critérios não matemáticos, ou seja, depende da interpretação de cada membro do Copom acerca das condições macroeconômicas expostas.

 

É relevante citar também a informação prestada pelo Banco Central à CPI[107] a respeito da não publicação dos votos de seus membros, o que pode ensejar o descumprimento do princípio da transparência das decisões do setor público:

 

“As decisões do Copom são tomadas depois de realizadas apresentações por parte de diferentes departamentos desta Instituição e exaustivas ponderações entre seus membros. Nesse contexto, embora os membros do Copom possam inicialmente ter interpretações diferentes dos cenários e/ou estratégias diversas, o Comitê atua de forma colegiada e a decisão relevante para a condução da política monetária é a decisão resultante da reunião. Assim sendo, este Banco Central não mantém registros sobre o voto de cada integrante do Copom. A posição relevante, divulgada à sociedade, representa a visão do Comitê, não sendo atribuída individualmente a qualquer de seus integrantes. Cumpre salientar que não há, no regulamento das reuniões do Copom, preceito que imponha o registro dos votos de cada integrante do colegiado.”

 

Esse é um importante aspecto a ser discutido pelos parlamentares integrantes da CPI.

 

IV.6.6 – Captação das expectativas de mercado 

 

Cabe citar também um trecho de outra resposta enviada à CPI[108]:

 

Segundo, dada a defasagem entre mudanças nas taxas de juros e variações na inflação, para mitigar o ciclo econômico e aumentar o bem estar social o banco central precisa se antecipar a movimentos esperados na taxa de inflação. Ou seja, se o banco central conseguir prever aumentos da taxa de inflação com a necessária antecedência e precisão, ele poderá tomar as medidas cabíveis, seja para minimizar ou evitar a perda de poder aquisitivo da moeda.

 

 

A questão que se coloca então é como o Banco Central capta tais expectativas de inflação.

 

Nesse sentido, a CPI aprovou o Requerimento de Informações nº 49/2009, que solicitou ao Banco Central a “Relação completa das reuniões realizadas entre a Diretoria do Banco Central com analistas de mercado, desde 1994, com a respectiva data, nomes dos participantes, finalidade das reuniões e resultados obtidos com as mesmas”.

 

Em resposta, o Banco Central encaminhou Ofício[109] informando:

 

As reuniões do Banco Central com analistas independentes visam coletar informações e análises, de forma complementar às já disponíveis e utilizadas pela instituição e pelo Comitê de Política Monetária (Copom) na elaboração do Relatório de Inflação.”

 

Cabe ressaltar que, segundo o Art. 5º do Decreto 3.088/1999, “O Banco Central do Brasil divulgará, até o último dia de cada trimestre civil, Relatório de Inflação abordando o desempenho do regime de “metas para a inflação”, os resultados das decisões passadas de política monetária e a avaliação prospectiva da inflação.”

 

Portanto, verifica-se, a partir das informações prestadas, que para a “avaliação prospectiva da inflação” (ou seja, a expectativa de inflação), são realizadas as reuniões entre as autoridades que definirão as taxas de juros com “analistas independentes”.

 

O Ofício supracitado informou os nomes dos convidados às reuniões ocorridas desde 2000. Dada a grande quantidade de reuniões e de participantes, somente foi possível analisar, até o momento, os convidados à última reunião, ocorrida em setembro de 2009.

 

A Tabela 8 lista os nomes dos convidados e o seu respectivo cargo, que foi obtido a partir de pesquisas em páginas web na internet. O ideal neste caso seria a obtenção, junto ao Banco Central, da informação exata sobre tal cargo. Porém, dada a escassez de tempo para se aprovar e ver atendido tal requerimento de informações, utilizou-se a pesquisa em páginas disponíveis na internet.

 

Tabela 8 – Convidados à reunião de setembro de 2009

Nome do convidado Cargo
Cristiano Oliveira Economista-chefe do banco Schahin
Diego Donadio Analista senior para América Latina no BNP Paribas
Fábio Hashizume Economista-chefe do JP Morgan – Brasil
Fernando Fix Economista-chefe da Votorantim Asset Management
Ivan Dumont Silva Diretor tesoureiro do Banco Alfa
Leonardo Sapienza Economista-chefe do Banco Votorantim
Marcelo Carvalho Economista-chefe do Morgan Stanley do Brasil
Mauricio Molan Economista sênior do Banco Santander
Nilson Teixeira Economista-chefe para Brasil do Credit Suisse First Boston
Octávio de Barros Economista-chefe do Bradesco
Pedro Jobim Ferreira Banco Itaú BBA
Rubens Sardenberg Economista-chefe da Federação Brasileira de Bancos (Febraban)
Alessandro Del Drago Banco ABN AMRO Real
Alexandre de Ázara Economista-chefe do Itaú BBA
Fernanda Batolla Credit Suisse Hedging-Griffo
Flavio Serrano Economista-sênior do Banco BES Investimento
José Luciano da Silva Costa Itaú Unibanco Asset Management
Marcelo Salomon Economista-chefe e diretor de pesquisas macroeconômicas do Unibanco
Marco Maciel Economista-chefe – Banco Pine
Maristela Ansanelli Economista do Banco Fibra
Ricardo Denadai Economista sênior do Santander Asset Management
Virgílio Castro Cunha Jr Economista do BofA Merrill Lynch Global Research
Zeina Abdel Latif Economista-chefe do Banco ABN AMRO Real S/A
Ana Cristina Gonçalves da Costa Economista chefe da Bradesco Asset Management (Bram)
Dalton Gardimam Economista-chefe da Bradesco Corretora
Eduardo Yuki Economista-chefe do BNP Paribas Asset Management
Gina Bacelli Banco Itaú
José Francisco de Lima Gonçalves Economista-chefe do Banco Fator
Luis Otávio Souza Leal Economista-chefe do Banco ABC Brasil
Luiz Alberto Rabi Jr Gerente de indicadores de mercado da Serasa Experian
Robério Neves Pelinca da Costa Economista-chefe do Santander Banespa
Roberto Padovani Estrategista sênior do banco WestLB do Brasil
Silvio Campos Neto Economista-chefe do Banco Schahin
Marcelo Kfoury Muinhos Economista Chefe do Citibank
Tomás Brisola Economista-Chefe do Banco BBM
Uilson Melo Araujo Economista-chefe do Banco do Brasil
Yann Grandjean Banco Icatu
Ariane Di Iorio Bradesco BBI
Marcos Vivacqua Analista do Opportunity
Ricardo Hingel Diretor financeiro do Banrisul
Antonio Madeira MCM Consultores
Braulio Borges LCA Consultoria
Juan Jensen Sócio da consultoria Tendências
Sérgio Rodrigo Vale Economista da Consultoria MB Associados, MB, Brasil
Stefanie Birman Economista da Rosenberg Associados
Mônica de Bolle Galanto Consultoria
Paulo Medas Representante do FMI no Brasil
Adauto Lima Legg Mason – Gestora de fundos norte-americana
Fernando Monteiro Economista-chefe da corretora Convenção
Luiz Fernando Lopes Pátria Investimentos
Mariam Dayoub Estrategista- chefe da Arsenal Investimentos
Paulo Pereira Miguel Economista da Quest Investimentos
Alexandre Soriano de Alencar Kondor Invest
Cassiana Fernandez Economista da Mauá Investimentos
Fausto José Araújo Vieira Rio Bravo Investimentos S.A
Mateus Cavallari Economista chefe do Claritas (gestão de investimentos)
Newton Rosa Economista-chefe da Sul América Investimento
Pedro Paulo Silveira Economista-chefe da Gradual Corretora
Arthur Carvalho Filho Economista-chefe da corretora Ativa
Elson Aguiar Teles Economista-chefe da corretora Concórdia
Felipe Monteiro de Salles Ciano Investimentos
José Marcio Camargo Opus Gestão de Recursos
Marcelo Castello Branco Economista-chefe da BR Investimentos
Solange Srour Chachamovitz Economista-chefe da Mellon Global Investments
Tamara Wajnberg Paineiras Investimentos
Alexandre Maia Economista-chefe da Gap Asset Management
Alexandre Povoa Modal Asset Management
Andrei Dudus Spacov Economista da Gávea Investimentos
Carlos Thadeu de Freitas Gomes Filho Economista-chefe da SLW Asset Management
Eduardo Baczynski Economista da Platina Investimentos
Fernando Rocha JGP Gestão de Recursos
Gabriel Goulart Ferreira Mercatto Investimentos
Paulo Val Nobel Asset Management
Thomas Wu Ventura Gestão de Recursos
Luis Afonso Lima Economista-chefe do grupo Telefônica no Brasil.
Patrick Aguiar Carvalho Chefe de estudos econômicos da Firjan
João Carlos Gomes Coordenador do Núcleo Econômico da Federação do Comércio do Rio de Janeiro (Fecomércio)
Ernani Teixeira Torres Filho Superintendente da área de pesquisa do BNDES
José Carlos de Faria Jr Não identificado
Tatiana Gomes Não identificado
Debora Nogueira Não identificado
Eduardo José Ferreira Jarra Não identificado
Heloise Vieira Não identificado
Marcelo Gonçalves da Silva Fonseca Não identificado
Thiago Carlos Não identificado
Thais Marzola Zara Não identificado
Monica Ferreira Oliveira Não identificado
Antônio Vianna Não identificado
Claudio Ferraz Não identificado
Elisa Silva Não identificado
Manuel Jeremias Caldas Não identificado
Marcelo Gusmão Arnosti Não identificado

Fonte: Ofício 969.1/2009-BCB/Diret, de 25/11/2009 (nomes dos convidados) e pesquisas na internet (cargos). Nota: pelo fato da pesquisa dos cargos ter se dado na internet, em alguns casos o cargo apontado pode ser anterior ao cargo que a pessoa exercia no momento da reunião, o que não invalida a pesquisa, dado que mostra a orientação de visão econômica dos participantes.

 

Dentre os 92 convidados, foi possível identificar os cargos de 78 deles. Dentre estes, constatou-se que 40 são representantes de bancos, 27 são representantes de gestores de fundos de investimentos (“Gestão de Ativos”), 6 são consultores, somente 3 são do setor produtivo, e 1 do setor do público. Observou-se, também, a presença do representante do FMI no Brasil.

 

O gráfico a seguir mostra a distribuição dos diferentes segmentos nesta reunião, demonstrando a supremacia da participação de agentes do setor financeiro:

 

 

 

Gráfico 21 – Convidados à 36ª Reunião do Banco Central com analistas independentes

Fonte: Ofício 969.1/2009-BCB/Diret, de 25/11/2009 (nomes dos convidados) e pesquisas na internet (cargos). Não inclui os 14 participantes cujos cargos não foram identificados.

 

 

Portanto, resta claro que o segmento absolutamente preponderante na reunião foi exatamente aquele diretamente interessado em altas taxas de juros, ou seja, bancos e gestores de fundos de investimento. Assim, fica tendenciosamente influenciada a formação das expectativas de inflação, tendo em vista que é interessante ao segmento preponderante que sejam estabelecidas expectativas de altas taxas de inflação, para que, conseqüentemente, o Banco Central mantenha altas taxas de juros.

 

Dada a sua importância, repetimos aqui o trecho supracitado dos pesquisadores Marcelo Luiz Curado e José Luis Oreiro:

 

 

A decisão de fixação da taxa de juros é influenciada por expectativas de inflação que não refletem a percepção dos agentes com efetivo poder de formação de preços a respeito da evolução futura da inflação, mas sim as opiniões vigentes entre os analistas do mercado financeiro sobre esse tema. Com efeito, como se observa no Relatório de Inflação de setembro de 2004 do Banco Central do Brasil, as expectativas de mercado desempenham um papel importante na decisão do COPOM a respeito do valor da taxa básica de juros. No entanto essas expectativas de mercado nada mais são do que as expectativas dos departamentos de análise econômica dos bancos e agentes do sistema financeiro. Dessa maneira cria-se um mecanismo perverso no qual o sistema financeiro brasileiro pode influenciar a decisão do Banco Central a respeito da fixação da taxa de juros, pois se os bancos entrarem em acordo entre si eles podem “forçar” um aumento da taxa de juros por intermédio de uma “revisão para cima” de suas expectativas de inflação. Em função das fortes evidências de comportamento oligopolista por parte dos bancos brasileiros (cf. Belaisch, 2003), a ocorrência de um “conluio” para forçar um aumento da taxa de juros não pode ser encarada como uma simples “curiosidade teórica”.

 

Por outro lado, instituições financeiras que se fazem representadas em tais reuniões também atuam na compra de títulos públicos, se credenciando como “dealers”, que são definidos, segundo o glossário da Secretaria do Tesouro Nacional, da seguinte forma:

 

“São as instituições financeiras mais ativas no mercado de títulos públicos credenciadas pela Secretaria do Tesouro Nacional e Banco Central do Brasil. As instituições têm acesso às operações especiais do Tesouro Nacional (1 – vendas de títulos públicos pelos preços médios apurados nas ofertas públicas e; 2 – compras de títulos públicos federais, a preços competitivos, restritas às instituições credenciadas). Atualmente, a participação nessas operações está relacionada ao desempenho mensal da instituição credenciada em uma série de metas estabelecidas pelo Tesouro Nacional.”[110]

 

 

A listagem destas instituições se encontra na página do Tesouro Nacional na internet[111], a qual reproduzimos a seguir:

 

 

 

As tabelas acima, contendo a identificação dos dealers, evidenciam que instituições financeiras que participam de reuniões com o Banco Central – para a definição de expectativas de inflação e outras variáveis econômicas – são em grande maioria, as mesmas que compram títulos públicos, o que pode caracterizar conflito de interesses. Esta CPI deve recomendar que os órgãos competentes aprofundem esta investigação, dado que o exíguo prazo de funcionamento da CPI e demais limitações impossibilitaram a realização da mesma. A CPI deve também recomendar o aprofundamento das investigações para se apurar os danos ao Patrimônio Público decorrentes deste fato.

 

 

IV.7 – INFLAÇÃO DE CUSTOS

 

 

Outro aspecto que deve ser considerado é que a inflação não possui condicionantes somente pelo lado da demanda, que é afetada pela taxa de juros. Um dos importantes fatores condicionantes do nível geral de preços é a oferta, ou a chamada “inflação de custos”, que jamais pode ser contida por meio de altas taxas de juros.

 

A inflação de custos possui vários fatores, especialmente:

 

  1. a) o próprio aumento das taxas de juros, que é aplicado no sentido de segurar a inflação, provoca um aumento no custo de financiamento das empresas, que é repassado para o preço de seus produtos, o que contribui para aumentar a inflação;

 

  1. b) os preços administrados pelo governo, que compõem cerca de 30% do principal índice que mede a inflação – IPCA. Esse é inclusive o índice utilizado pelo Banco Central para o sistema de Metas de Inflação. Os preços administrados – ou seja, o preço dos serviços de energia, telefonia, combustíveis, dentre outros que são controlados pelo governo – não caem quando ocorre uma elevação nas taxas de juros, diferentemente dos demais preços de mercado, ou preços livres. Enquanto o mecanismo de transmissão da política monetária para os preços livres se dá via queda da demanda, deprimindo os preços, os preços administrados são definidos pelo governo e não variam conforme as alterações de demanda. Portanto, as tarifas de telefone, energia elétrica, combustíveis, etc, exercem grande pressão sobre os custos das empresas e das famílias. Considerando-se o IPCA referente aos preços monitorados pelo governo, calculado pelo IPEA[112], verifica-se que o referido índice acumulou uma variação de 419% de julho de 1994 a setembro de 2009, enquanto os preços livres acumularam uma alta de 212% no mesmo período. Ou seja, a variação dos preços monitorados pelo governo foi praticamente o dobro dos preços livres no período, influenciando fortemente o aumento da inflação.

 

Portanto, o forte impacto do aumento dos preços administrados foge completamente do mecanismo de controle da inflação utilizado pelo Banco Central por meio do sistema de metas de inflação.

 

  1. c) Estrutura oligopolizada da economia brasileira, e a deficiência dos órgãos de defesa da concorrência, o que coloca na mão de poucas empresas o poder de determinar os preços, ainda que os juros estejam elevados.

 

 

Portanto, há que ser revista a política de controle da inflação focada no aumento ou manutenção das elevadas taxas de juros internas, tendo em vista os demais fatores que geram a inflação de custo, mencionados acima.

 

IV.8 – DÍVIDA: O CUSTO DA POLÍTICA ECONÔMICA

 

Conforme vimos nos itens anteriores, a dívida interna não é proveniente de um suposto excesso de gastos sociais (ou, poderia-se dizer, “primários”), mas de uma política monetária e cambial que elevou as taxas de juros e criou a necessidade da emissão de títulos para retirar do mercado os reais utilizados na compra de dólares pelo Banco Central (“esterilização do impacto monetário das operações cambiais”).

Adicionalmente, o volume de prejuízos registrados pelo Banco Central nos últimos anos foi bastante relevante, em decorrência da emissão de “swaps” de forma a garantir aos investidores a variação do dólar, tanto para cima – como nas crises financeiras, quando a cotação do dólar subia – como para baixo, nos momentos em que havia grande afluxo de moeda estrangeira para o país e o dólar cai.

Nestes últimos anos, o Banco Central tem acumulado grandes quantidades de reservas cambiais, conforme será discutido mais aprofundadamente no próximo capítulo. O que também tem causado enormes prejuízos ao BC, visto que ele compra um ativo que se encontra em desvalorização, ou seja, rendem juros negativos. Por outro lado, os investidores ficam com ativos em reais, indexados no mínimo à taxa Selic, às custas do Tesouro.

O prejuízo do BC com todas estas operações tem sido custeado pelo Tesouro, conforme determina a Lei de Responsabilidade Fiscal, em seu art. 7º:

 

Art. 7º O resultado do Banco Central do Brasil, apurado após a constituição ou reversão de reservas, constitui receita do Tesouro Nacional, e será transferido até o décimo dia útil subseqüente à aprovação dos balanços semestrais.

  • 1º O resultado negativo constituirá obrigação do Tesouro para com o Banco Central do Brasil e será consignado em dotação específica no orçamento.

 

Tais pagamentos do Tesouro ao Banco Central têm sido feitos na forma de emissão e entrega, ao BC, de títulos da dívida interna de responsabilidade do Tesouro Nacional, ou seja, acarretam o aumento da DPMFI, sem limite algum. Além do mais, é preciso ressaltar que o pagamento (do Tesouro para o Banco Central) de juros e amortizações referentes a estes títulos não representa meramente uma “passagem de recursos do bolso direito para o bolso esquerdo do setor público”. Isto porque a maioria esmagadora dos títulos do Tesouro em poder do Banco Central estão sendo repassados por este último ao mercado, por meio das chamadas “Operações de Mercado Aberto”. Desta forma, os pagamentos de juros e amortizações do Tesouro ao Banco Central são repassados ao mercado, que termina ganhando, em última instância, às custas do Tesouro.

Este processo recebeu um impulso adicional com a edição da Medida Provisória 435/2009, que permitiu a emissão de títulos do Tesouro, sem limite algum, para entregá-los ao Banco Central, para que este faça política Monetária, por meio de tais “operações de mercado aberto”. Tal Medida Provisória também previu a alteração na forma de divulgação do prejuízo do Banco Central, excluindo-se o custo das operações em moeda estrangeira (swaps e custo de carregamento das reservas).

A Tabela 9 mostra os grandes prejuízos do Banco Central, especialmente em decorrência do grande acúmulo de reservas cambiais em dólares, que apresentaram forte desvalorização no últimos anos, sendo que a mesma MP 435 determinou que tais prejuízos fossem cobertos pela União. Por outro lado, quando o BC apura resultado positivo, tal valor pode ser utilizado somente para pagamento de dívida pública:

Art. 6º O resultado financeiro das operações com reservas cambiais depositadas no Banco Central do Brasil e das operações com derivativos cambiais por ele realizadas no mercado interno, conforme apurado em seu balanço, será considerado:

     I – se positivo, obrigação do Banco Central do Brasil com a União, devendo ser objeto de pagamento até o décimo dia útil subseqüente ao da aprovação do balanço pelo Conselho Monetário Nacional; e

     II – se negativo, obrigação da União com o Banco Central do Brasil, devendo ser objeto de pagamento até o décimo dia útil do exercício subseqüente ao da aprovação do balanço pelo Conselho Monetário Nacional.

  • 3º Os valores pagos na forma do inciso I do caput deste artigo serão destinados exclusivamente ao pagamento da Dívida Pública Mobiliária Federal, devendo ser paga, prioritariamente, aquela existente junto ao Banco Central do Brasil.

 

Tabela 9 – Resultados do Banco Central – 1995 – 2009

Ano Valor
1995          (2.914.276,04)
1996              (167.728,08)
1997          (1.875.388,68)
1998                     3.227,50
1999        (13.041.763,00)
2000            1.617.624,00
2001            3.073.412,00
2002        (17.193.699,00)
2003          31.318.352,00
2004            2.537.429,00
2005        (10.494.963,00)
2006        (13.167.048,00)
2007        (47.514.139,00)
2008        126.617.756,00
2009 (1º sem)        (93.787.316,00)
   
TOTAL        (34.988.520,29)

Fonte: Balanços do Banco Central, disponíveis em http://www.bcb.gov.br/?BALANCETE

 

 

Portanto, a CPI deve recomendar o aprofundamento das investigações para se apurar os danos ao Patrimônio Público decorrentes deste fato.

 

 

OUTRA OPERAÇÃO DE PREJUÍZO DO BANCO CENTRAL VERIFICADA PELO TCU

O Tribunal de Contas da União enviou à CPI cópia do Relatório do Acórdão 509/2004, relativo à verificação, dentre outros aspectos, de prejuízos apurados pelo Banco Central em 2002, da ordem de R$ 3,2 bilhões com a área bancária, R$ 32,8 bilhões com operações com o Tesouro Nacional (TN) e R$ 15,4 bilhões com o mercado aberto.

É importante transcrever trechos do referido Relatório, pois o mesmo denuncia a ilegalidade de operações de swap cambial:

 

 – Q4: Quais fatores contribuíram para a ocorrência de prejuízos de R$ 3,2 bilhões com a área bancária, R$ 32,8 bilhões com operações com o Tesouro Nacional (TN) e R$ 15,4 bilhões com o mercado aberto?

 

 – Q14: Qual o custo das reservas internacionais e como é calculado?

 

2.1.2.10. Constatamos, portanto, que o banco ofertou títulos ao mercado, provavelmente com intuito de fornecer hedge cambial, atividade já contestada no TC 012.015/2003-0.

 

2.1.2.21. Em relação às demais contas, verificamos o aumento do passivo relacionado às operações compromissadas com LFT. Uma das possíveis razões para o aumento decorre da oferta de títulos de curto prazo com altas taxas feita pelo Tesouro Nacional em outubro. Com isso, os 8 detentores dos títulos recorreram ao Bacen para realizar operações compromissadas, entregando títulos e recebendo moeda, provavelmente utilizada para formar posições especulativas em swap, sobre as quais já está sendo instruído o TC 012.015/2003-0, no qual se afirma a ilegalidade de tais operações com derivativos.

 

2.1.3.5. É importante lembrar que as despesas e receitas se acumulam até junho, sendo, então, transferidas ao resultado. O saldo de julho reflete, portanto, o acumulado naquele mês, e não o acumulado no ano. Para avaliar-se o total do déficit nas contas, é necessário somar-se os resultados, o que leva à conclusão de um resultado negativo de 9.034 + 6.362 = R$ 15.396 milhões.

 

2.1.3.6. Dentro desse resultado, verificou-se que as despesas foram, fundamentalmente, decorrentes de atualização cambial negativa de NBC-E e de operações com derivativos – swap, além dos ajustes a mercado de NTN-D que possui em sua carteira.

2.1.3.8. Destacamos que o saldo das operações com derivativos foi negativo em R$ 14.190 milhões.

 

2.1.4.Conclusão acerca das operações do Bacen

 

2.1.4.1. Diante dos dados apresentados, concluímos que o resultado negativo de R$ 17,2 bilhões do Bacen, no ano de 2002, foi devido, principalmente, às operações com derivativos, swaps, responsáveis por perdas da ordem de R$ 14,19 bilhões, não fazendo sentido argumentar-se que a perda com os derivativos foi compensada com os ganhos com as ativos em moeda estrangeira.

2.1.4.2. Tais ganhos são compensados em parte por perdas com os passivos em moeda estrangeira, além de estarem relacionados com operações da área externa, enquanto os swaps são operações de mercado aberto, só havendo correspondência com operações do mesmo grupo.

2.1.4.3. Ademais, constatamos uma perda líquida de R$ 14,2 bilhões com os swaps. Neste caso, a existência de ganhos em operações que não tenham correspondência direta com os swaps não pode ser utilizada para minimizar a responsabilidade pelos prejuízos.

2.1.4.4. No TC 012.015/2003-0, a questão da legalidade das operações de swap é analisada em detalhe, existindo proposta para realização de audiência da Diretoria do Bacen, bem como dos membros do Conselho Monetário Nacional, não sendo necessária uma análise mais aprofundada do tema neste Relatório.

 

2.4.2.4.Conclusão da equipe de auditoria

2.4.2.4.1. Entendemos que os lucros e deságios obtidos na compra de NBC deveriam ter sido lançados diretamente nas contas já mencionadas, uma vez que em janeiro de 2002 já existia a conta 6909 – ‘Receitas a apropriar de operações com títulos de responsabilidade própria’, inclusive com as subcontas específicas de NBC-E. O que parece ter ocorrido foi um lançamento incorreto em alguma outra conta, uma vez que o balancete analítico daquele mês não apresenta saldos nessas contas.

2.4.2.4.2. Dessa forma, o balancete publicado deveria ter levado em conta o balancete analítico e apresentado o valor atribuído em ‘Receitas antecipadas ou a apropriar’ na conta compatível do balancete analítico. Entretanto, é compreensível que na fase de adaptação do Sistema Selic, o Banco tenha preferido publicar o valor correto da conta de receitas a apropriar, ainda que o balancete analítico não apresentasse a referida conta.

 

2.4.3.4.Conclusão da equipe de auditoria

2.4.3.4.1.Consideramos que tal falha, mesmo sendo de natureza formal e tendo sido corrigida em seqüência, demonstra um ponto fraco do controle de lançamentos contábeis, o que deve ser verificado em auditoria futuras.

 

2.4.6.4.Conclusão da equipe de auditoria

2.4.6.4.1.Houve falha grave na apresentação pública dos Demonstrativos Contábeis no mês de agosto de 2002.

 

2.4.7.4.Conclusão da equipe de auditoria

2.4.7.4.1.Houve falha grave na apresentação pública dos Demonstrativos Contábeis no mês de agosto de 2002.

 

2.4.8.4.Conclusão da equipe de auditoria

2.4.8.4.1.Houve falha grave na apresentação pública dos Demonstrativos Contábeis no mês de agosto de 2002.

 

2.4.9.4.Conclusão da equipe de auditoria

2.4.9.4.1.Houve falha grave na apresentação pública dos Demonstrativos Contábeis no mês de agosto de 2002.

 

2.4.10.4.Conclusão da equipe de auditoria

2.4.10.4.1.Houve falha grave na apresentação pública dos Demonstrativos Contábeis no 3º trimestre de 2002.

 

2.6.Obtenção dos custos das reservas internacionais

2.6.2.10. De posse desse valor (-R$ 16.887.973.984,53), dividimo-lo pelo valor médio trimestral das reservas (R$ 132.237.364.685,91) para chegarmos ao valor da rentabilidade bruta das reservas de -12,7710%. Guardemos esse resultado.

2.6.2.11. O custo de carregamento das reservas é representado pelo custo de captação de todo o passivo do Banco e é calculado pelo Deafi.

 

2.6.2.18. Finalmente, do custo de carregamento das reservas (1,7142%) subtrai-se a rentabilidade bruta das reservas (-12,7710%), obtendo-se 14,4852%, número final informado semestralmente ao Congresso Nacional por força da LRF.

 

Q4: Quanto ao resultado de mercado aberto, constatou-se que decorreu, quase totalmente, de perdas com operações de swap.

 

Q5: Foram implementadas as rotinas de revisão do processo contábil? (2.4)

Devido à constatação de grande número de falhas de contabilização, concluímos que tais rotinas não estão adequadas ao propósito de transparência e exatidão contábil.

25.Com respeito ao subitem 9.1.3. do Acórdão 378/2003 – Plenário, que determinou ao Bacen que ‘inclua, nos votos encaminhados à apreciação pela Diretoria e pelo Conselho Monetário Nacional, bem como em suas notas explicativas, avaliação mais precisa sobre as causas do resultado obtido no período’ (grifo nosso), e não obstante o detalhamento feito pelo Banco, em notas explicativas, acerca das perdas com operações de swap (subitem 2.9.4.26 do relatório), entendemos que referida determinação não deva ser considerada cumprida, haja vista que ainda foram identificadas falhas nas notas explicativas sobre as Operações da Área Bancária (2.1.3.21 do relatório – fl. 2.771), com poucos esclarecimentos acerca da atividade do Bacen nesse segmento.

26.Ademais, causou-nos estranheza a grande quantidade de erros contábeis detectados pela equipe de auditoria, alguns bastante significativos, posto que as demonstrações financeiras do Banco Central são auditadas por uma empresa de auditoria independente, que, no entanto, não fez qualquer referência a tais inconsistências. Assim é que, a despeito da argumentação do Banco Central de que a determinação constante do subitem 9.1.6 do Acórdão 470/2003 – Plenário – ‘implementar rotinas de revisão do processo contábil, informando ao Tribunal nas próximas contas o resultado das medidas implementadas’ – constitui uma atividade permanente naquela Autarquia, entendemos que a medida deva ser considerada como ainda não atendida, devendo constituir objeto de verificação na auditoria nas contas referentes ao exercício de 2003.

  1. Um dos fatos contábeis mais significativos do ano de 2002, para o Bacen, foi a experimentação de um prejuízo geral de cerca de 17,2 bilhões de reais, devido, sobretudo, a operações com derivativos do tipo swap cambial, acarretando uma perda aproximada de 14,2 bilhões de reais. Tal assunto, todavia, constitui objeto de apuração específica no TC 012.015/2003-0, motivo pelo qual deixou de ser aprofundado no presente processo.
  2. Da mesma forma, o Bacen desempenha apropriadamente as competências e exigências definidas na Lei de Responsabilidade Fiscal, segundo apurado. Uma das exigências relaciona-se ao cálculo do custo das operações do Banco, por causa dos efeitos sobre o Tesouro Nacional, a quem é transferido o resultado contábil da autarquia, e por representar uma medida do esforço de preservação do poder da moeda. E entre esses custos está o de manutenção das reservas internacionais, cuja forma de cálculo foi objeto de estudos nesta auditoria, para aplicações nas fiscalizações seguintes.

 

 

OPERAÇÕES DE SWAP

 

 

“Outra atuação do TCU que merece destaque foi a realização de auditoria de conformidade no BACEN apreciada pelo Acórdão nº 509/2004-Plenário. Por meio dessa auditoria foi feita a avaliação da confiabilidade das demonstrações contábeis. Constatou-se também a expressiva tomada de empréstimo junto ao FMI para recomposição das reservas internacionais. De acordo com Relatório e Voto do relator, um dos fatos contábeis mais significativos do ano de 2002, para o BACEN, foi a experimentação de um prejuízo geral de cerca de R$ 17,2 bilhões, devido, sobretudo, a operações com derivativos do tipo swap cambial, acarretando uma perda aproximada de R$ 14,2 bilhões (apurado no TC 012.015/2003-0). Destaca, ainda, que, no transcurso de 2002, foi expressiva a tomada de valores em empréstimo junto ao FMI, em torno de R$ 60 bilhões, empregados na recomposição das reservas internacionais, gastas no esforço de contenção da forte desvalorização da moeda (35%) e desamparadas ante o parco desempenho da balança comercial.”

 

Consta do Acórdão 509/2004, do TCU :

 

 

 – Q4: Quais fatores contribuíram para a ocorrência de prejuízos de R$ 3,2 bilhões com a área bancária, R$ 32,8 bilhões com operações com o Tesouro Nacional (TN) e R$ 15,4 bilhões com o mercado aberto?

 

 – Q14: Qual o custo das reservas internacionais e como é calculado?

 

2.1.2.10. Constatamos, portanto, que o banco ofertou títulos ao mercado, provavelmente com intuito de fornecer hedge cambial, atividade já contestada no TC 012.015/2003-0.

 

2.1.2.21. Em relação às demais contas, verificamos o aumento do passivo relacionado às operações compromissadas com LFT. Uma das possíveis razões para o aumento decorre da oferta de títulos de curto prazo com altas taxas feita pelo Tesouro Nacional em outubro. Com isso, os 8 detentores dos títulos recorreram ao Bacen para realizar operações compromissadas, entregando títulos e recebendo moeda, provavelmente utilizada para formar posições especulativas em swap, sobre as quais já está sendo instruído o TC 012.015/2003-0, no qual se afirma a ilegalidade de tais operações com derivativos.

 

2.1.3.5. É importante lembrar que as despesas e receitas se acumulam até junho, sendo, então, transferidas ao resultado. O saldo de julho reflete, portanto, o acumulado naquele mês, e não o acumulado no ano. Para avaliar-se o total do déficit nas contas, é necessário somar-se os resultados, o que leva à conclusão de um resultado negativo de 9.034 + 6.362 = R$ 15.396 milhões.

2.1.3.6. Dentro desse resultado, verificou-se que as despesas foram, fundamentalmente, decorrentes de atualização cambial negativa de NBC-E e de operações com derivativos – swap, além dos ajustes a mercado de NTN-D que possui em sua carteira.

2.1.3.8. Destacamos que o saldo das operações com derivativos foi negativo em R$ 14.190 milhões.

 

2.1.4.Conclusão acerca das operações do Bacen

2.1.4.1. Diante dos dados apresentados, concluímos que o resultado negativo de R$ 17,2 bilhões do Bacen, no ano de 2002, foi devido, principalmente, às operações com derivativos, swaps, responsáveis por perdas da ordem de R$ 14,19 bilhões, não fazendo sentido argumentar-se que a perda com os derivativos foi compensada com os ganhos com as ativos em moeda estrangeira.

2.1.4.2. Tais ganhos são compensados em parte por perdas com os passivos em moeda estrangeira, além de estarem relacionados com operações da área externa, enquanto os swaps são operações de mercado aberto, só havendo correspondência com operações do mesmo grupo.

2.1.4.3. Ademais, constatamos uma perda líquida de R$ 14,2 bilhões com os swaps. Neste caso, a existência de ganhos em operações que não tenham correspondência direta com os swaps não pode ser utilizada para minimizar a responsabilidade pelos prejuízos.

2.1.4.4. No TC 012.015/2003-0, a questão da legalidade das operações de swap é analisada em detalhe, existindo proposta para realização de audiência da Diretoria do Bacen, bem como dos membros do Conselho Monetário Nacional, não sendo necessária uma análise mais aprofundada do tema neste Relatório.

 

 

 

Q4: Quanto ao resultado de mercado aberto, constatou-se que decorreu, quase totalmente, de perdas com operações de swap.

Q5: Foram implementadas as rotinas de revisão do processo contábil? (2.4)

Devido à constatação de grande número de falhas de contabilização, concluímos que tais rotinas não estão adequadas ao propósito de transparência e exatidão contábil.

25.Com respeito ao subitem 9.1.3. do Acórdão 378/2003 – Plenário, que determinou ao Bacen que ‘inclua, nos votos encaminhados à apreciação pela Diretoria e pelo Conselho Monetário Nacional, bem como em suas notas explicativas, avaliação mais precisa sobre as causas do resultado obtido no período’ (grifo nosso), e não obstante o detalhamento feito pelo Banco, em notas explicativas, acerca das perdas com operações de swap (subitem 2.9.4.26 do relatório), entendemos que referida determinação não deva ser considerada cumprida, haja vista que ainda foram identificadas falhas nas notas explicativas sobre as Operações da Área Bancária (2.1.3.21 do relatório – fl. 2.771), com poucos esclarecimentos acerca da atividade do Bacen nesse segmento.

 

26.Ademais, causou-nos estranheza a grande quantidade de erros contábeis detectados pela equipe de auditoria, alguns bastante significativos, posto que as demonstrações financeiras do Banco Central são auditadas por uma empresa de auditoria independente, que, no entanto, não fez qualquer referência a tais inconsistências. Assim é que, a despeito da argumentação do Banco Central de que a determinação constante do subitem 9.1.6 do Acórdão 470/2003 – Plenário – ‘implementar rotinas de revisão do processo contábil, informando ao Tribunal nas próximas contas o resultado das medidas implementadas’ – constitui uma atividade permanente naquela Autarquia, entendemos que a medida deva ser considerada como ainda não atendida, devendo constituir objeto de verificação na auditoria nas contas referentes ao exercício de 2003.

  1. Um dos fatos contábeis mais significativos do ano de 2002, para o Bacen, foi a experimentação de um prejuízo geral de cerca de 17,2 bilhões de reais, devido, sobretudo, a operações com derivativos do tipo swap cambial, acarretando uma perda aproximada de 14,2 bilhões de reais. Tal assunto, todavia, constitui objeto de apuração específica no TC 012.015/2003-0, motivo pelo qual deixou de ser aprofundado no presente processo.
  2. Da mesma forma, o Bacen desempenha apropriadamente as competências e exigências definidas na Lei de Responsabilidade Fiscal, segundo apurado. Uma das

\exigências relaciona-se ao cálculo do custo das operações do Banco, por causa dos efeitos sobre o Tesouro Nacional, a quem é transferido o resultado contábil da autarquia, e por representar uma medida do esforço de preservação do poder da moeda. E entre esses custos está o de manutenção das reservas internacionais, cuja forma de cálculo foi objeto de estudos nesta auditoria, para aplicações nas fiscalizações seguintes.

 

IV.9 – DEMAIS FATORES QUE INFLUENCIARAM O CRESCIMENTO DA DÍVIDA INTERNA

 

 

Diante do grande volume de recursos destinados ao endividamento, cabe a esta CPI  a investigação da origem desta dívida.

 

Conforme explicitado no item “Limitações”, não foi respondido satisfatoriamente o Requerimento de Informações Nº 9/09, que solicitou ao Ministério da Fazenda e ao Banco Central a disponibilização a esta Comissão dos saldos anuais da Dívida Interna desde janeiro de 1994 até dezembro de 2008, incluindo-se as “Operações de Mercado Aberto” do Banco Central, mencionando-se em cada ano os valores contratados/recebidos, as amortizações pagas; os juros devidos e os juros pagos, bem como a demonstração do saldo final anual.”

 

O Requerimento também solicitou o detalhamento de todos os fatores que implicaram em crescimento da dívida interna (assunção de outras dívidas, variação cambial, juros acumulados, etc), quantificando o impacto de cada um desses desde janeiro de 1994 até dezembro de 2008, o que não foi respondido.

 

A ausência de resposta à CPI das informações solicitadas permite questionarmos um argumento constantemente repetido por membros do governo, alguns acadêmicos e da grande mídia: o de que a dívida interna teria origem preponderante na assunção de outras dívidas e esqueletos.

 

O Tribunal de Contas da União chegou a mencionar os fatores que influenciaram o crescimento da dívida pública, embora não tenha realizado auditoria específica para quantificar tais fatores[113]:

 

 “59. Além de manter o foco do controle na dívida mobiliária federal, o Parecer de 1997 aborda aspectos do impacto do refinanciamento da dívida de Estados e do Distrito Federal pela União, em face da edição da Lei nº 9.496, de 1997. Tal operação teve impacto direto sobre a dívida pública federal, em face da necessidade de emissão de títulos do Tesouro Nacional (LFT-A e LFT-B).”

 

“ … o Parecer [de 1999] também chama atenção para o crescimento da dívida pública mobiliária de 1994 a 1999 da ordem de 571%, o que só comprova a necessidade de canalizar esforços para o controle da dívida mobiliária federal.”. (…) “O Parecer chama atenção para o fato de que o exacerbado crescimento da dívida pública líquida nos últimos anos é fator que deve preocupar as autoridades da administração pública brasileira, particularmente do Governo Federal, que são responsáveis pela maior parcela dessa dívida. Na seqüência da preocupação, frisa que o montante da dívida, proveniente dos sucessivos déficits financeiros anuais, das variações cambiais ocorridas, da assunção pela União de dívidas das esferas de Governo subnacionais e dos elevados níveis de inflação e de taxas de juros aplicadas à rolagem da mesma, entre outros, compromete os níveis de crescimento e de desenvolvimento do País, além de inviabilizar o atingimento do equilíbrio das contas públicas, afetando, inclusive, gerações futuras.”.

 

“68. A dívida pública mobiliária federal permaneceu em escalada crescente na década atual, Os Pareceres Prévios demonstram que, no período de 2000 a 2008, o tema ganha notória presença nas Contas de Governo, sendo objeto de constantes recomendações ao Poder Executivo, a despeito de permanecer a fixação de limite para a referida dívida por parte do Congresso Nacional.”.

 

O Parecer Prévio da contas de 2005 ressaltou a “… necessidade de geração de superávits primários para evitar que ele assuma explosiva trajetória de crescimento. Registra que tais recursos, voltados aos juros, deixam de ser aplicados em borás de infra-estrutura ou em políticas sociais, ressaltando a importância de se adotar uma administração consistente da dívida pública como meio de restabelecer a capacidade de investimento do Estado.

 

De fato, ao observar a Tabela dos “Fatores Condicionantes do Crescimento da Dívida do Setor Público” enviada pela STN à CPI[114], constata-se que todo o superávit primário produzido no período de 1996 a julho de 2009, no montante de R$ 678,3 bilhões foi destinado ao pagamento de juros. A mesma tabela indica que os juros nominais do mesmo período somaram R$ 1.530,6 bilhões, ou seja, todo o superávit primário do período não cobriu nem a metade dos juros do mesmo período, o que demonstra o elevado patamar das taxas de juros praticadas nos últimos anos.

Em janeiro de 2009, o Ministério da Fazenda encaminhou à CPI o Aviso nº 30/MF, de 22 de janeiro de 2010, que trouxe o Memorando nº 23/2010/COGER/GABIN/STN/MF-DF[115], que traz tabela com fatores que implicaram em crescimento da dívida interna. Tal Memorando foi encaminhado após ter sido reiterado pela segunda vez[116] o Requerimento de Informações nº 9/2009 desta CPI, aprovado em setembro de 2009.

O documento trouxe tabela reproduzida a seguir, em seu trecho referente a 1995 a 2008 (Tabela 11). Em seu item 5, o documento afirma:

 “5. Oportuno referir que o quadro citado acima apresenta dados completos a partir de 1999, ano em que o STN começou a calcular e publicar os fatores de variação da dívida pública. Para os anos anteriores, o quadro ainda apresenta algumas informações consideradas como “não disponíveis”, uma vez que prosseguem os trabalhos de pesquisa na vasta documentação pertinente, que não se encontra em meio eletrônico.

 

Ou seja: a tabela enviada ainda não conta com informações definitivas sobre os fatores que influenciaram o crescimento da dívida, o que representa uma séria limitação a esta CPI.

A Tabela 10 (resumo da Tabela 11) informa que, no período de 1995 a 2008, a dívida interna em poder do público (ou seja, excluindo-se os títulos do Tesouro em poder do Banco Central) cresceu R$ 1,239 trilhão (de R$ 35 bilhões para R$ 1,275 trilhão). Esse crescimento da dívida teria sido dividido entre os seguintes fatores:

 

 

Tabela 10 – Fatores de Variação da Dívida Interna, em Poder do Público, no período de 1995 a 2008

Fator de variação da dívida Valor (R$ mil)
Emissões em Oferta Pública 3.692.781.226
Pagamentos -3.562.907.869
Emissões por Colocação Direta 531.350.617
Transferência de carteira – (Bacen/Mercado) 39.547.846
Cancelamentos -576.312.856
Juros Competência 1.246.912.844
Outros -131.621.181
Total do crescimento da dívida 1.239.750.627

Fonte: Memorando nº 23/2010/COGER/GABIN/STN/MF-DF

 

Inicialmente, cabe ressaltar que as “Operações de Mercado Aberto”, ou seja, a dívida de  R$ 300 bilhões (em 31.12.2008) do Banco Central com o mercado (que é paga, em última instância, pelo Tesouro Nacional), não se encontram incluídas na tabela.

Adicionalmente, itens relevantes não se encontram adequadamente esclarecidos, como as linhas referentes a “Cancelamentos” (que soma R$ 576 bilhões negativos no período), “Trocas” (que soma R$ 161 bilhões, dentro do item “Emissões por Colocação Direta), e Outros (R$ – 131 bilhões).

No que se refere à rubrica “Juros Competência”, ela se subdivide entre “inflação relevante” e “juros reais”, mas tal subdivisão não está disponível para os anos de 1995 a 1998. Analisando-se os valores informados no campo “Inflação Relevante”, e comparando-se com o estoque da dívida no início de cada ano, verificou-se a utilização do índice muito próximo ao IGP-M que, por medir os preços do atacado e guardar estreita relação com a variação do dólar, acusou historicamente uma inflação bem mais alta que os índices de preços ao consumidor. Isto termina por inflar fortemente o montante da “inflação relevante”, deprimindo, por conseqüência, o montante dos “juros reais”. No período de 1995 a 2008, o IGP-M acusou inflação de 282,87%, enquanto o IPCA apresentou variação de apenas 184,60%, ou seja, uma diferença de quase 100%.

Adicionalmente, em 2002, constam nada menos que R$ 401 bilhões de “inflação relevante” e R$ 269 bilhões negativos de juros reais, o que reduz fortemente o montante dos “juros reais” acumulados durante o período, e não guarda relação alguma com o índice utilizado (IGP-M).

Diante destas incoerências, adicionamos à tabela enviada pelo Tesouro Nacional algumas linhas e colunas (sombreadas em cinza), de modo a calcularmos qual seria o montante dos “juros reais”, caso fosse utilizado o índice IPCA, incidente sobre o estoque da dívida no início de cada ano. Verificou-se que, desta forma, a inflação relevante teria ficado em R$ 467 bilhões de 1995 a 2008, enquanto os juros reais somariam R$ 779 bilhões. Desta forma, os juros apresentam-se como o fator mais relevante para o crescimento da dívida interna.

 

A CPI encaminhou ao Ministério da Fazenda o Ofício 161/10-P, de 8 de fevereiro de 2010, solicitando no prazo de cinco dias, a “Explicitação do Índice de Inflação utilizado para se determinar os montantes constantes no item “Inflação Relevante”, tendo em vista que o valor de “R$ 401.186.092 mil”, apontado no ano de 2002, não correspondeu a nenhum índice conhecido de inflação. Adicionalmente, em decorrência desse valor majorado de atualização monetária, a tabela indica o valor negativo de “-269.157.735 mil” a título de “juros reais” em 2002”.

Apesar do ofício da CPI ter estabelecido prazo de 5 dias para resposta, o Ministério da Fazenda respondeu um mês depois:[117]

“De fato, há uma discrepância nos valores informados no ano de 2002, provavelmente causado por um “link” indevido quando da consolidação das informações. Em conseqüência, estamos enviando novo demonstrativo em substituição ao enviado anteriormente, ajustando os valores relativos ao período mencionado.

Portanto, o Ministério não somente reconheceu o erro das informações prestadas anteriormente à CPI, como também não explicitou o índice de inflação utilizado para o cálculo do campo “Inflação Relevante”.

O Ofício 161/10-P, de 8 de fevereiro de 2010 também solicitou ao Ministério da Fazenda a “Explicitação da natureza e detalhamento dos valores que compuseram os montantes indicados no sub-item “Trocas”, sendo que o Ministério informou que se referiam a operações de trocas de títulos por oferta pública e, em alguns casos específicos, operações de troca sob a forma direta, para finalidades autorizadas em lei”.

O Ofício da CPI também solicitou “Informação sobre aonde foi alocado o fator variação cambial”, sendo que o Ministério respondeu que “A metodologia utilizada pelo Tesouro Nacional nos títulos de dívida pública mobiliária interna não apura, de forma isolada, a variação cambial”. Assim sendo, os efeitos da variação cambial estão contidos no item “Juros Competência”.

Portanto, apesar de ter sido solicitado no Requerimento de Informações nº 9/2009 – aprovado em setembro de 2009, com prazo de 15 dias para resposta – os efeitos da variação cambial no crescimento da dívida interna, esta informação não foi proporcionada pelo Ministério da Fazenda.

A CPI também enviou ao Ministério da Fazenda o Ofício 160/10-P, de 1º de fevereiro de 2010, solicitando, no prazo de 10 dias:

  1. Relativamente aos valores informados a título de “Pagamento” de “Principal” e “Encargos”, requer-se:

a.1) desmembrar os valores dos “pagamentos” efetuados mediante emissão de novos títulos tanto para o principal como para os encargos;

a.2) indicar os valores dos “pagamentos” efetuados com a utilização de outras fontes (que não seja a emissão de títulos), identificando a natureza dessas fontes;

a.3) identificar a natureza dos “Encargos” indicados no campo dos “Pagamentos” (ou seja, seriam referentes a Juros reais, ou atualização monetária, ou comissões, ou outros gastos, etc)

  1. Informar a natureza dos “Cancelamentos” indicados na referida planilha e sua relação com as emissões de DPMF;
  2. Além dos “Juros Competência” (Parcela dos Juros Reais e Inflação) já informados, se requer informar adicionalmente os valores dos JUROS efetivamente pagos pelo regime de CAIXA em cada ano (Reais e Inflação).

 

Apesar do ofício da CPI ter estabelecido prazo de 10 dias para resposta, o Ministério da Fazenda respondeu mais de um mês depois[118], e com informações referentes apenas aos itens “a.1” e “a.2”.

 

 

TABELA 11 – SALDOS ANUAIS E FATORES DE VARIAÇÃO DA DÍVIDA INTERNA, EM PODER DO PÚBLICO, NO PERÍODO DE 1990 a 2008

ITEM TOTAL

1995-2008

2008 2007 2006 2005 2004 2003 2002 2001 2000 1999 1998 1997 1996 1995
                               
Estoque anterior   1.236.540.420 1.100.959.613 980.208.144 801.217.046 705.176.635 558.882.930 507.514.288 429.641.056 383.273.575 244.456.543 207.349.055 96.861.018 59.139.302 35.330.754
                               
Emissões líquidas DPMFi

(A) – (B)

129.873.354 -58.835.278 117.186.947 91.836.877 90.632.187 -18.878.549 40.970.829 -101.605.362 -58.771.230 -39.823.321 39.307.143 974.517 14.957.170 12.481.577 -560.153
    (A) Emissões Oferta Pública 3.692.781.226 298.128.924 491.664.147 471.215.440 466.991.490 274.113.274 332.601.888 138.901.354 163.662.071 241.474.188 275.641.714 187.072.607 141.789.291 124.181.473 85.343.365
    (B)Pagamentos (-) 3.562.907.869 356.964.202 374.477.200 379.378.562 376.359.303 292.991.823 291.631.059 240.506.716 222.433.300 281.297.509 236.334.570 186.098.090 126.832.121 111.699.896 85.903.518
       Principal 3.054.478.492 284.924.139 282.507.140 290.144.450 325.693.255 257.745.278 270.761.667 214.479.079 195.440.861 259.624.611 210.472.483 167.570.602 116.697.224 100.645.748 77.771.955
       Encargos 508.429.377 72.040.063 91.970.060 89.234.112 50.666.049 35.246.545 20.869.392 26.027.637 26.992.439 21.672.898 25.862.087 18.527.487 10.134.896 11.054.149 8.131.563
                               
                               
Emissões por Colocação Direta 531.350.617 31.100.524 11.753.140 5.471.047 7.019.750 19.338.558 15.194.355 114.981.803 90.114.619 28.828.509 48.678.875 72.304.262 78.173.345 6.000.289 2.391.541
        Novação de dívidas do FCVS 40.169.882 2.901.132 4.039.950 1.166.152 77.200 8.175.330 609.090 1.235.189 13.573.742 675.996 165.080 7.551.021      
        Outras dívidas Securitizadas 24.028.138 0 7.578 35.990 1.576.836 206.889 85.606 1.014.529 6.456.410 561.844 4.095.210 1.930.997 783.266 5.600.414 1.672.569
        PROEF 40.336.484 0 0 0 0 0 0 845.640 39.490.844 0 0        
        TDA 8.324.998 549.676 1.106.712 1.085.061 1.113.145 774.429 276.508 208.990 181.644 195.219 399.907 596.885 717.975 399.875 718.972
        FUNAD 21.827 0 0 4.674 4.101 2.752 117 426 253 9.464 40 0 0    
        PND 9.068.255 0 0 41.510 4.636 721 4.648 7.060 117.900 15.109 43.429 39.935 8.793.307    
        PROEX 7.423.248 285.102 354.624 419.919 575.853 443.508 882.457 756.639 1.400.220 796.156 740.684 565.436 202.650    
        PESA 858.254 0 0 0 0 3.236 95.580 131.588 75.778 172.704 169.585 209.783      
        BNDES 19.948.385 10.000.000 0 0 395.269 1.203.537 0 0 0 0 0 8.349.579      
        MP nº 2.181/01 14.218.315 0 1.900.000 0 0 44.948 889.051 1.008.879 2.425.573 1.724.740 0 6.225.124      
        Dívida Agrícola 10.465.237 0 0 0 0 0 3.424.352 4.777.831 525 270 662 948 2.260.649    
        FIES 4.892.136 701.287 697.868 696.343 594.418 600.668 535.003 511.612 247.677 307.260 0        
        Estados e Municípios 138.269.692 0 0 0 0 10.479 52.026 1.097.234 497.036 14.299.956 30.690.803 34.806.661 56.815.497    
        PROES 22.228.116 182.295 0 134.341 0 26.470 0 1.475.680 113.410 1.340.510 8.232.080 10.723.330      
        Fundo Soberano 14.244.000 14.244.000 0 0 0 0 0 0 0 0 0        
        Outros 15.759.931 0 0 0 0 0 0 700.592 4.771.839 382.936 0 1.304.564 8.600.000    
        Trocas 161.093.718 2.237.032 3.646.409 1.887.056 2.678.291 7.845.589 8.339.917 101.209.915 20.761.768 8.346.345 4.141.396        
                               
Transferência de carteira – (Bacen/Mercado) 39.547.846     -1.315.890 15.922.396 419.272 -56.502 -35.082.133   1.580.526 -5.490.433 65.810.590 -7.129.150 5.070.220 -181.050
                               
Cancelamentos (-) 576.312.856 89.525.490 136.746.389 118.148.860 73.830.945 25.214.933 23.698.086 58.954.023 28.437.289 10.089.615 11.667.226 N/D N/D N/D N/D
                               
Juros Compêtencia 1.246.912.844 155.801.203 143.387.109 142.908.294 139.247.710 120.376.063 113.883.109 132.028.357 74.967.133 65.871.381 67.988.673 29.639.300 24.486.672 14.169.631 22.158.209
   – Inflação Relevante 936.033.393 115.717.355 85.634.361 34.248.334 10.466.877 85.023.617 57.631.206 401.186.092 39.330.499 38.178.111 68.616.941        
   – Juros Reais 220.425.638 40.083.847 57.752.749 108.659.960 128.780.833 35.352.446 56.251.903 -269.157.735 35.636.634 27.693.269 -628.268        
                               
Outros -131.621.181                     -131.621.181      
                               
Estoque Final   1.275.081.379 1.236.540.420 1.100.959.613 980.208.144 801.217.046 705.176.635 558.882.930 507.514.288 429.641.056 383.273.575 244.456.543 207.349.055 96.861.018 59.139.302
                               
                               
Inflação, considerando o IPCA 467.051.522 72.955.885 48.992.703 30.778.536 45.509.128 53.593.424 51.920.224 63.591.540 32.953.469 22.881.432 21.829.969 3.421.259 5.056.145 5.653.717 7.914.089
Juros reais, considerando o IPCA 779.861.322 82.845.318 94.394.406 112.129.758 93.738.582 66.782.639 61.962.885 68.436.817 42.013.664 42.989.949 46.158.704 26.218.041 19.430.527 8.515.914 14.244.120
                               
                               
IPCA   5,90 4,45 3,14 5,68 7,60 9,29 12,53 7,67 5,97 8,93 1,65 5,22 9,56 22,40

Fonte: Memorando nº 23/2010/COGER/GABIN/STN/MF-DF

Nota: as colunas sombreadas de cinza não constam da tabela enviada pelo Ministério da Fazenda.

 

 

 

Outra consideração que deve ser feita à tabela é sobre o item “Emissões por colocação direta”, que somou R$ 531 bilhões. Segundo a Tabela, tais emissões são destinadas a atender finalidades específicas, definidas em Lei, e caracterizam-se pela colocação direta de títulos públicos sem a realização de leilões ou outro tipo de oferta pública. Portanto, tais emissões se referem a dívidas assumidas pela esfera federal, como os chamados “esqueletos”, as dívidas dos estados, e demais programas de governo.

Sobre este item, conforme colocado anteriormente, existe uma parcela relevante de R$ 161 bilhões alocada no item “trocas”, cuja natureza não foi informada a esta CPI. Adicionalmente, existem muitos itens que merecem uma análise mais aprofundada, a fim de identificarmos as razões pelas quais a dívida interna cresceu no período.

A seguir, analisaremos os principais itens das “emissões por colocação direta”.

 

IV.9.1 – Novação de dívidas do Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS)

 

Desde a década de 70, os reajustes das prestações dos financiamentos da casa própria eram reajustados com maior periodicidade que os salários, o que obrigou o governo a criar um fundo para cobrir essa diferença, permitindo que os mutuários continuassem pagando suas prestações com base no valor do reajuste salarial. Este Fundo passou, portanto, a acumular um passivo com as instituições financeiras, e na segunda metade da década de 90, o Governo Federal passou a emitir títulos da dívida interna para o pagamento destas dívidas com os bancos.

Segundo a Tabela constante no Memorando enviado a esta CPI, o FCVS causou a emissão de R$ 40 bilhões em títulos da dívida interna.

Sobre este item, cabe ressaltar que o reconhecimento de passivo existente há décadas configura-se uma decisão política, de priorizar o pagamento de determinada dívida em detrimento de outras, como, por exemplo, a gigantesca dívida social brasileira com a população mais carente. Cabe ressaltar também que os principais credores do FCVS fazem parte do setor financeiro, que tem sempre apresentado lucros expressivos.

Caberia a esta CPI questionar também qual era a cotação de mercado das dívidas do FCVS, que foram reconhecidos por seu valor nominal no momento em que o governo os assume completamente, emitindo títulos da dívida pública.

 

 

Dentre as verificações realizadas pela CGU[119] e informadas à CPI, uma delas é relativa à questão do FCVS:

293 Notas Técnicas De janeiro de 2002 a dezembro de 2009 Tratam-se de processos de novação de dívidas de responsabilidade do Fundo de Compensação de Variações Salarias – FCVS para com os agentes financeiros, cujos resíduos dos saldos remanescentes de contratos habitacionais com cobertura daquele fundo são pagos por meio da emissão de títulos públicos pelo Tesouro Nacional.
As Notas Técnicas emitidas pela Secretaria Federal de Controle Interno se tratam de pareceres sobre a manifestação da Caixa Econômica Federal (Agente Operador do FCVS) que reconheceu a titularidade, o montante, a liquidez e a certeza da dívida caracterizada, nos termos do disposto no inciso V do art. 3º da Medida Provisória nº 1.981-49, de 2.000. Após a manifestação da SFC os processos são encaminhados à STN.
Avaliação quanto à composição dos autos e quanto à conformidade da manifestação da CAIXA que reconhece a titularidade, o montante, a liquidez e a certeza da dívida caracterizada. Formalização dos processos de novação de dívidas Não se aplica. Os processos são analisados e, caso constatadas inconformidades, são devolvidos à Caixa Econômica Federal para ajustes. Caso contrário, o processo é encaminhado à STN. Não houve.

Fonte: Ofício nº 217/2010/GM/CGU-PR, de 7 de janeiro de 2010

 

IV.9.2 – Outras dívidas Securitizadas

Este item significou o acréscimo de R$ 24 bilhões na dívida interna. De acordo com o documento “Emissões Diretas de Títulos da DPMFI”[120], do Tesouro Nacional:

“Foram firmados vários contratos de securitização de dívidas, que podem ser divididos em dois grandes grupos de acordo com sua origem. No primeiro encontram-se aqueles oriundos de extinção, por força de lei, de empresas e outras entidades do Governo. No segundo, encontram-se os ativos oriundos da securitização de dívidas de responsabilidade direta da União ou daquelas obrigações cujo pagamento teve de ser efetuado, tendo em vista sua condição de avalista.

Portanto, entre tantos outros, foram emitidos os seguintes créditos securitizados pela União, no começo da década de 90:

– SIBR910701 – dívida da extinta Siderbrás junto à Cia. Vale do Rio Doce;

– NUCL910801 – dívida da extinta Nuclebrás junto ao sistema bancário;

– PORT911016 – dívida da extinta Portobrás junto ao BNDES;

– SOTV910901 – dívida da União referente à desapropriação de um porto fluvial em Belém do Pará.

Assim, a quitação das dívidas perante os credores processou-se por meio da emissão direta de títulos públicos, registrados em sistema escritural de custódia. Com características e possibilidades de utilização definidas, esses ativos são livremente negociados no mercado secundário e, em geral, podiam ser utilizados para aquisição de bens e direitos alienados no âmbito do Programa Nacional de Desestatização – PND.

 

Na tabela enviada pelo Tesouro, o montante de dívidas securitizadas não se encontra aberto por tipo de dívida, razão pela qual não se pode fazer uma análise mais aprofundada.

Portanto, a CPI deve recomendar um estudo mais aprofundado sobre estas dívidas.

 

IV.9.3 – Programa de Fortalecimento das Instituições Financeiras Federais (PROEF)

 

Segundo a tabela da STN, o PROEF implicou na emissão de R$ 40 bilhões em títulos públicos, pois o Tesouro Nacional assumiu dívidas de bancos federais: Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Basa (Banco da Amazônia) e BNB (Banco do Nordeste).

 

 

A Capitalização do Banco do Brasil

 

Publicação da Presidência da República, editada em 2002, alega que esse passivo foi resultado de créditos subsidiados e da “farra do crédito fácil” ocorrida historicamente nos bancos federais, que culminou com um enorme prejuízo do Banco do Brasil em 1996. Porém, de acordo com Vidotto (2000)[121], o principal e verdadeiro causador desse passivo foi o não pagamento de dívidas agrícolas por grandes produtores latifundiários, em meio à crise do setor rural ocasionada pela âncora verde do início do Plano Real (câmbio sobrevalorizado e importações massivas de produtos alimentícios).  Adicionalmente, segundo o autor, o governo ainda teria negociado com a bancada ruralista o refinanciamento das dívidas agrícolas em troca da aprovação das reformas constitucionais da época (que favoreceram as políticas de privatizações impostas pelo FMI).

 

Cabe ressaltar ainda que o jornalista Aloysio Biondi, em seu livro “O Brasil Privatizado”, denunciou que os prejuízos do Banco do Brasil em 1996 foram super-estimados pela equipe econômica – interessada em desmoralizar o banco diante da opinião pública – através da contabilização de dívidas (nas quais o Banco Central era credor) ainda não vencidas, ou vencidas e não pagas com apenas um dia de atraso. Pela norma do Banco Central, apenas podem ser considerados como prejuízo de um banco os empréstimos vencidos e não pagos há mais de 20 dias. Além disso, prossegue o autor, o Banco do Brasil, naquele momento, era credor de uma dívida com o governo (já vencida) de R$ 7,2 bilhões, o que anularia seu prejuízo.

 

Por todos esses motivos, caberia à CPI investigar a origem desta dívida, o que não será possível dada a exigüidade do seu prazo e à falta de funcionários especializados.

 

 

Outros Bancos Federais

 

O governo alegou, no documento da Presidência da República, que o dispêndio com os demais bancos federais se devia à cobertura da “farra de crédito fácil” e de créditos subsidiados e de difícil recuperação, nas áreas de saneamento, habitação, agricultura, pequenos e médios produtores e financiamentos de programas de desenvolvimento regional. Porém, não há, nos documentos oficiais do Programa, análises detalhadas sobre o montante e a causa de cada um desses passivos. Segundo o jornalista Aloysio Biondi, em seu livro “O Brasil Privatizado”:

 

No governo FHC, no entanto, a CEF tem sido utilizada para aumentar os lucros dos bancos privados, vergonhosamente obrigada a “engolir” bilhões e bilhões de prejuízos que, na prática, seriam dos banqueiros. Como? Na quebra do Banco Econômico, por exemplo, a CEF comprou a carteira imobiliária, isto é, os contratos de financiamento da casa própria que o Econômico havia concedido. Valor: 1,7 bilhão de reais. Na quebra do Bamerindus, a mesma coisa. Até aí a Caixa já estava sendo usada para “engolir” negócios “podres”, com alto nível de inadimplência, ou empréstimos que nunca seriam pagos, de bancos que quebraram. Beneficiando os futuros “compradores”. Mas, o pior, é que essa operação virou norma: a Caixa Econômica Federal passou a comprar permanentemente esses ativos podres – inclusive de grandes bancos que são lucrativos, aumentando seus lucros e ficando com os prejuízos… E tem mais: a partir de julho de 1996, a CEF passou a “comprar” não apenas os empréstimos concedidos dentro do Sistema Financeiro da Habitação, o antigo BNH, do qual é agente responsável. Não. Até empréstimos concedidos pelos bancos, em seus negócios normais – a chamada carteira hipotecária – foram transferidos para a Caixa, transformada, assim, em uma imensa lixeira dos negócios “podres”, capazes de provocar prejuízos para os bancos privados…”.

 

Faz-se necessário um esclarecimento da razão pela qual o governo gastou no PROEF quase R$ 40 bilhões, o que demanda o aprofundamento das investigações relacionadas a esse passivo.

 

 

IV.9.4 – TDA (Títulos da Dívida Agrária)

 

Segundo a Tabela fornecida pela STN, a emissão de Títulos da Dívida Agrária (por ocasião das desapropriações para a Reforma Agrária) aumentou a dívida interna em R$ 8 bilhões, valor este relativamente pequeno se comparado ao montante geral da dívida interna.

 

Cabe ressaltar, adicionalmente, que em todos os países desenvolvidos, a reforma agrária foi feita penalizando os grandes proprietários, e não os premiando com o pagamento da sua terra. Porém, no Brasil, o não cumprimento da função social da propriedade não tem gerado perda alguma para os latifundiários, pois o governo tem aumentado a sua dívida para desapropriar as áreas para a realização da reforma agrária, mesmo num país com uma das maiores concentrações de terra do mundo.

 

 

IV.9.5 –  Proex

 

Este programa destinou-se a financiar empresas que vendem para o mercado externo, como no caso da Embraer (a principal beneficiária do Programa). Cabe ressaltar que o governo teria começado a financiar as exportações da Embraer por meio do Proex após essa ser privatizada, o que demanda o aprofundamento das investigações. Segundo a tabela enviada pela STN, o governo emitiu R$ 7,4 bilhões em títulos da dívida interna para financiar o Programa.

 

 

IV.9.6 – BNDES

 

A Tabela da STN informa que foram emitidos R$ 20 bilhões em títulos da dívida interna para financiar o BNDES, permitindo-lhe fornecer empréstimos ao setor produtivo. Diante desta situação cabe ressaltarmos alguns aspectos:

 

– Os títulos da dívida interna pagam taxas de juros equivalentes ou maiores que a Taxa Selic, enquanto o BNDES recebe das empresas a TJLP, bem mais baixa;

 

– Emitir títulos da dívida interna para dispor dos recursos necessários ao financiamento do setor produtivo significa isentar o sistema financeiro privado de financiar a produção, garantindo-lhe o rendimento certo e bem mais alto dos títulos públicos.

 

 

 

IV.9.7 – Medida Provisória 2.181/2001

 

Esta Medida Provisória autorizou a emissão de títulos da dívida interna para diversos fins. Portanto, não é possível analisarmos este item, dado que não se conhece, detalhadamente, as dívidas geradas por meio deste ato legal.

 

Segundo a Tabela da STN, foram emitidos R$ 14 bilhões em títulos da dívida interna, no âmbito da MP 2.181/2001.

 

 

IV.9.8 – Dívida Agrícola

 

Novamente, o governo emitiu títulos para salvar, preponderantemente, o segmento da grande agricultura no Brasil. Consta da Tabela da STN a emissão de R$ 10 bilhões de dívida interna no período.

 

 

IV.9.9 – FIES – Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior

 

A tabela da STN informa que foram emitidos R$ 4 bilhões para o FIES. Este Fundo visa o financiamento ao estudante do pagamento de mensalidades de faculdades privadas. Portanto, o FIES representa uma forma de privatização do ensino superior, dado que, ao invés de investir na Universidade Pública, o governo opta por fazer nova dívida para viabilizar o ensino privado.

 

 

IV.9.10 – Estados e Municípios

 

A Tabela enviada pela STN informa que foram emitidos R$ 138 bilhões de títulos da dívida interna para a assunção das dívidas dos estados e municípios.

 

Diante deste dado, é necessário comentarmos que, em julho de 1994, a dívida líquida dos estados e municípios era de R$ 45,6 bilhões[122]. Dessa data até dezembro de 1997, incidiram sobre essa dívida juros nominais de R$ 69 bilhões[123], fazendo com que ela atingisse R$ 115,9 bilhões em dezembro de 1997. Portanto, a política de juros elevados implementada pelo Governo Federal foi a principal responsável por esse crescimento. Cabe ressaltar que o déficit público primário estadual e municipal, freqüentemente apontado como causador do crescimento das dívidas dessas esferas de governo, foi de apenas R$ 10 bilhões no período. A partir do final de 1997, essas dívidas foram renegociadas pelo Governo Federal, passando os estados e municípios a dever à União.

Cabe ressaltar, adicionalmente, que após as dívidas dos estados terem sido renegociadas pela União, estas passaram a ser reajustadas pelo índice IGP-DI acrescido de mais 6% ao ano.

 

Analisando-se o Memorando nº 1296/2009/COAFI/SECAD-IV/STN/MF-DF[124], enviado a esta CPI como resposta ao Requerimento de Informações nº 32/2009, de autoria da Deputada Jô Moraes, foi possível verificar, na Tabela “Haveres da União”, como se deu a evolução do saldo do endividamento dos estados com a União.

 

Tal tabela traz, em cada ano, o saldo inicial da dívida, o índice de atualização monetária (IGP-DI), o pagamento de juros e amortizações pelos estados, e o saldo da dívida ao final de cada ano. A tabela não contém dois dados relevantes para demonstrar os saldos ao final de cada ano: os juros devidos e as novas assunções de dívidas ocorridas. Porém, tais informações constam do Memorando, que informa a taxa de juros (6% ao ano) e traz outra tabela com todas as dívidas renegociadas pela União.

 

Acrescentando-se tais dados na tabela, considerando a taxa de juros de 6% ao ano, e alterando-se o índice de atualização monetária para o IPCA, verificou-se que a evolução do saldo desta dívida desde 1999 seria bastante diferente, e teria chegado a R$ 219 bilhões ao fim de 2008, ou seja, R$ 100 bilhões a menos do que o ocorrido na realidade – R$ 320 bilhões – valor inflado devido à utilização do IGP-DI (Tabela 12).

 

Considerando-se os dados calculados com base na correção pelo IPCA, realizou-se outra simulação, considerando-se a hipótese na qual os estados não teriam efetuado nenhum pagamento à União desde 2002. Verificou-se que o saldo devedor ao final de 2008 seria de R$ 326 bilhões, ou seja, praticamente igual ao saldo ocorrido (de R$ 320 bilhões). Tal simulação encontra-se na Tabela 13.

 

Essa distorção ocorreu em razão de o índice IGP-DI ter apresentado inflação bem maior que os demais índices de preços, pelo fato de refletir a inflação no atacado e a variação do dólar, variáveis estas que não guardam relação com a inflação efetivamente ocorrida no país, que é medida pelo IPCA, até mesmo para fins de política de controle de inflação do Banco Central.

 

Diante disso, propõe-se que esta Comissão recomende a alteração do índice de atualização monetária da dívida dos estados para o IPCA, e que a União reveja os pagamentos indevidamente majorados devido à utilização do índice IGP-DI, arcados pelos entes da federação nos últimos anos, devolvendo aos mesmos os pagamentos feitos a maior.

 

 

 

 

Tabela 12 – Simulação do estoque da dívida dos estados com a União, considerando o IPCA como índice de atualização monetária

Ano Saldo Devedor Anterior

(a)

Novas assunções de dívida

(b)

Atualização Monetária

(IPCA)

(c = a x h)

Juros (6% ao ano)

(d = a x 0,06)

Amortizações pagas

(e)

Juros pagos

(f)

Saldo Devedor ao final do ano

(g = a+b+c+d-e-f)

IPCA

(h)

1999                   83.702.085.289,92                   26.788.001.564,51                                            10.429.591.777,18                      5.825.765.164,33                5.217.191.131,49            2.956.711.471,20       118.571.541.193,25 8,94%
2000                 118.571.541.193,25                      2.147.709.593,28                                              7.212.177.754,99                      7.243.155.047,19                3.632.023.131,52            4.280.780.790,53       127.261.779.666,66 5,97%
2001                 127.261.779.666,66                         113.410.329,22                                              9.773.833.344,43                      7.642.511.399,75                1.534.640.840,68            5.333.199.269,04       137.923.694.630,35 7,67%
2002                 137.923.694.630,35                      1.476.125.359,56                                            17.467.267.333,06                      8.363.989.199,39                1.185.312.872,24            6.172.887.554,13       157.872.876.095,99 12,53%
2003                 157.872.876.095,99                                                   –                                            14.682.097.481,53                      9.472.372.565,76                1.254.538.519,72            7.453.220.023,39       173.319.587.600,17 9,30%
2004                 173.319.587.600,17                            31.476.900,00                                            13.175.797.522,20                   10.401.063.870,01                1.048.965.184,42            7.619.422.454,58       188.259.538.253,38 7,60%
2005                 188.259.538.253,38                                                   –                                            10.711.465.724,76                   11.295.572.295,20                1.449.370.773,36            9.348.168.129,37       199.469.037.370,61 5,69%
2006                 199.469.037.370,61                                                   –                                              6.266.868.285,63                   11.968.142.242,24                2.642.498.274,72         10.809.164.074,96       204.252.385.548,80 3,14%
2007                 204.252.385.548,80                                                   –                                              9.104.203.741,68                   12.255.143.132,93                3.505.375.068,48         10.931.710.995,47       211.174.646.359,45 4,46%
2008                 211.174.646.359,45                         182.295.308,17                                            12.474.949.126,92                   12.681.416.500,06                4.252.045.745,14         12.972.719.034,83       219.288.542.514,63 5,90%

Fonte: Memorando nº 1296/2009/COAFI/SECAD-IV/STN/MF-DF. Elaboração própria.

Nota 1: A atualização monetária e os juros informados nas colunas “c” e “d” incidiram também sobre as novas assunções de dívida constantes na coluna “b”.

Nota 2: No ano de 1999, a maior parte das novas assunções de dívida ocorreu ao final do mês de outubro. Portanto, neste caso, as dívidas renegociadas naquele ano foram reajustadas somente pelo IPCA ocorrido no segundo semestre de 1999. Os juros aplicados foram de 3% naquele ano.

 

Tabela 13 – Simulação do estoque da dívida dos estados com a União, considerando o IPCA como índice de atualização monetária e considerando o não pagamento da dívida pelos estados desde 2002

Ano Saldo Devedor Anterior

(a)

Novas assunções de dívida

(b)

Atualização Monetária

(IPCA)

(c = a x h)

Juros (6% ao ano)

(d = a x 0,06)

Amortizações pagas

(e)

Juros pagos

(f)

Saldo Devedor ao final do ano

(g = a+b+c+d-e-f)

IPCA

(h)

1999                   83.702.085.289,92                   26.788.001.564,51                                            10.429.591.777,18                      5.825.765.164,33                5.217.191.131,49            2.956.711.471,20       118.571.541.193,25 8,94%
2000                 118.571.541.193,25                      2.147.709.593,28                                              7.212.177.754,99                      7.243.155.047,19                3.632.023.131,52            4.280.780.790,53       127.261.779.666,66 5,97%
2001                 127.261.779.666,66                         113.410.329,22                                              9.773.833.344,43                      7.642.511.399,75                1.534.640.840,68            5.333.199.269,04       137.923.694.630,35 7,67%
2002                 137.923.694.630,35                      1.476.125.359,56                                            17.467.267.333,06                      8.363.989.199,39           165.231.076.522,36 12,53%
2003                 165.231.076.522,36                                                   –                                            15.366.406.392,73                      9.913.864.591,34           190.511.347.506,43 9,30%
2004                 190.511.347.506,43                            31.476.900,00                                            14.482.482.013,74                   11.432.569.464,39           216.457.875.884,56 7,60%
2005                 216.457.875.884,56                                                   –                                            12.315.875.943,94                   12.987.472.553,07           241.761.224.381,57 5,69%
2006                 241.761.224.381,57                                                   –                                              7.595.593.630,69                   14.505.673.462,89           263.862.491.475,15 3,14%
2007                 263.862.491.475,15                                                   –                                            11.761.223.134,42                   15.831.749.488,51           291.455.464.098,08 4,46%
2008                 291.455.464.098,08                         182.295.308,17                                            17.213.374.604,01                   17.498.265.564,38           326.349.399.574,63 5,90%

Fonte: Memorando nº 1296/2009/COAFI/SECAD-IV/STN/MF-DF. Elaboração própria.

Nota 1: A atualização monetária e os juros informados nas colunas “c” e “d” incidiram também sobre as novas assunções de dívida constantes na coluna “b”.

Nota 2: No ano de 1999, a maior parte das novas assunções de dívida ocorreu ao final do mês de outubro. Portanto, neste caso, as dívidas renegociadas naquele ano foram reajustadas somente pelo IPCA ocorrido no segundo semestre de 1999, e os juros aplicados foram de 3% naquele ano.

 

 

 

 

IV.9.11 – Programa de Incentivo à Redução do Setor Público Estadual na Atividade Bancária – PROES

Segundo a tabela enviada pela STN, o Governo Federal teve de emitir R$ 22 bilhões em títulos da dívida interna, para reestruturar e privatizar os bancos estaduais. Cabe ressaltar, neste aspecto, mais uma vez, que se trata da assunção de questionáveis dívidas, que deveriam ter sido submetidas a auditoria antes de terem sido renegociadas pelo Tesouro. Caberia a esta CPI investigar tais dívidas, porém, dado o prazo exíguo e o pessoal técnico insuficiente, não será possível se fazer esta análise. A CPI deve recomendar a auditoria de todas estas dívidas.

 

IV.9.12 – Fundo Soberano

 

A Tabela da STN informa que foram emitidos R$ 14 bilhões em títulos da dívida interna para se compor o chamado “Fundo Soberano”, que, segundo a Lei 11.887/2008, deve “promover investimentos em ativos no Brasil e no exterior, formar poupança pública, mitigar os efeitos dos ciclos econômicos e fomentar projetos de interesse estratégico do País localizados no exterior.”

Neste item, cabe ressaltar mais uma vez a impropriedade de se emitir títulos da dívida pública para se financiar a produção, visto que o estado assume todo o risco de financiar a produção, enquanto livra o setor financeiro privado de desempenhar esta tarefa.

Além do mais, cabe ressaltar a falta de transparência sobre as decisões de investimento deste Fundo, que poderá vir a financiar empresas brasileiras no exterior, sem um critério claro de prioridades.

 

IV.9.13 – O Programa Nacional de Desestatização (PND)

 

A Tabela da STN traz um campo denominado “PND”, onde constam R$ 9 bilhões de dívida emitida. De acordo com o documento “Emissões Diretas de Títulos da DPMFI”[125], do Tesouro Nacional:

 

“Os recursos recebidos por fundações, autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e quaisquer outras entidades controladas direta ou indiretamente pela União, em decorrência da alienação de participações societárias minoritárias, eram transferidos para o Tesouro Nacional em troca da emissão de Notas do Tesouro Nacional – Série P – NTN-P. Esses recursos eram utilizados para amortização da dívida pública mobiliária federal”.

 

Porém, a influência do processo de privatizações na dívida interna é bem mais complexa. Anunciadas como uma forma de resolver o problema do endividamento, as vendas das estatais não foram suficientes para impedir o crescimento da dívida, por diversas razões.

O Programa Federal de Desestatização foi instituído março de 1988, por meio do Decreto nº. 95.886 que incluiu, entre seus objetivos[126], “propiciar a conversão de parte da dívida externa do setor público federal em investimentos de risco, resguardado o interesse nacional”.

Em abril de 1990 a Lei nº. 8.031 instituiu o Programa Nacional de Desestatização. O art. 1º. da lei elencou seus objetivos fundamentais, destacando-se[127] o objetivo de contribuir para a redução da dívida pública, concorrendo para o saneamento das finanças do setor público.

A Lei nº. 8.088 determinou que o produto da alienação de bens imóveis de propriedade da União e de suas autarquias fosse “obrigatoriamente utilizado no resgate de títulos da dívida pública federal, preferencialmente junto ao Banco Central do Brasil[128].

Depreende-se que dentre os argumentos utilizados para a implementação do processo de privatizações no Brasil destacava-se o de se reduzir o montante da Dívida Mobiliária Federal. Na prática, não foi o que ocorreu, conforme argumentação contida na Decisão 400/1994 – Plenário do TCU:

 

 

Decisão 400/1994 – Plenário

(…)

  1. Em seguida, destaca o relatório que, entre agosto de 1990 e março de 1994, o BNDES procedeu à venda da participação da União em 25 (vinte e cinco) entidades, sendo 18 (dezoito) empresas controladas e 7 (sete) participações minoritárias, com predominância, em ambos os casos, de empresas dos setores de siderurgia, petroquímica e fertilizantes, o que permitiu a arrecadação aos cofres públicos de US$ 7,043,300,000.00 (sete bilhões, quarenta e três milhões, trezentos mil dólares norte-americanos), assim distribuídos: “VIDE QUADRO NO DOCUMENTO ORIGINAL”.

 

  1. No tocante às moedas empregadas nos processos de privatização já concluídos, demonstra o relatório que o Governo Federal vêm utilizando o PND como meio de reduzir sua dívida mobiliária, já que apenas US$ 379,100,000.00 (trezentos e setenta e nove milhões, cem mil dólares norte-americanos), correspondentes a apenas 5,4% (cinco inteiros e quatro décimos por cento) do valor total das participações alienadas, efetivamente ingressaram nos cofres públicos sob a forma de moeda corrente, como adiante se vê: “VIDE QUADRO NO DOCUMENTO ORIGINAL”.

 (…)

  1. O segundo ponto destacado pelo grupo de trabalho foi a participação da Companhia Vale do Rio Doce nos leilões realizados. Uma vez que o inciso XX do art. 37 da Constituição Federal prescreve a necessidade de autorização legislativa para que entidades da administração indireta participem de empresas particulares e que a conclusão dos leilões de privatização significam a passagem do controle acionário para o domínio particular, a CRVD somente poderia adquirir ações das empresas alienadas pelo Poder Público se contasse com o devido respaldo legislativo, o que não foi possível constatar somente com o exame dos elementos constantes dos autos.

 

(…)

 

  1. Contudo, diante de deficiências no exame individualizado de cada desestatização, uma vez que a fixação do preço mínimo de venda da empresa, ponto crucial do processo, somente era objeto de apreciação, na maioria das vezes, após a conclusão da transferência do controle acionário ao setor privado e, ainda, que, em alguns casos, os servidores desta Corte encarregados da análise da privatização não possuíam formação específica na área de atuação da entidade em alienação, foi adotado, a partir de 20.04.93, o procedimento de requisitar-se os serviços de técnicos especializados de outros setores da Administração Pública, em particular do BNDES, da STN/MF, da SEST/SEPLAN, do IPEA, da CISET/SEPLAN e da unidade de auditoria interna da empresa em privatização, para auxiliarem no trabalho de avaliação dos parâmetros utilizados na fixação do preço mínimo, cabendo destacar, em particular, a utilização dos préstimos de tais profissionais nos casos das desestatizações da AÇOMINAS, da ULTRAFÉRTIL e da Petroquímica União.

 

  1. Com respeito às decisões proferidas pelo Tribunal acerca de cada processo de privatização específico e sobre as respectivas prestações de contas dos dois exercícios anteriores à alienação da empresa e da fração de exercício remanescente sobre controle estatal, elaborou o grupo de trabalho os demonstrativos de fls. 16/20 e 24/28, que mostram que, não obstante algumas ressalvas, na maioria das vezes relativas a parâmetros adotados na determinação do preço mínimo de venda, todos os procedimentos adotados nos estágios examinados em cada processo foram considerados regulares e que nenhuma das prestações de contas das empresas alienadas foi julgada irregular até o presente momento ou foi objeto de ressalva de importância significativa, embora ainda haja alguns processos pendentes de um juízo de mérito e algumas entidades inadimplentes no dever de prestar contas.

 

 

(…)

 

  1. Também com respeito aos aspectos de redução da dívida pública e de saneamento das finanças estatais os resultados obtidos pelo PND devem ser encarados com reserva, ainda que estes não possam ser considerados objetivos primordiais do Programa. Como visto, apenas 5,4% (cinco inteiros e quatro décimos por cento) do total de recursos arrecadados correspondeu a moedas correntes e contribuiu, efetivamente, para minorar a grave situação fiscal da União, enquanto o restante do preço de venda das empresas privatizadas foi pago com títulos representativos da dívida pública, adquiridos com significativos deságios no mercado financeiro e entregues ao FND pelo seu valor de face ou adquiridos do próprio BNDES por meio de financiamentos em condições extremamente favoráveis aos mutuários (prazo de doze anos, carência de dois anos, juros de 6,5% ao ano, garantia consistindo nas ações das empresas adquiridas), o que, certamente, não auxiliou no saneamento financeiro do setor público.

 

  1. Ainda com relação a este aspecto, cabe ressaltar a questão da injeção de recursos públicos nas empresas incluídas no PND antes de sua transferência de controle, pois, ainda que se fizesse necessário, em alguns casos, aliviar as difíceis condições das empresas para torná-las atraentes para potenciais investidores, os aportes de capital feitos foram, em algumas oportunidades, várias vezes superiores aos valores efetivamente arrecadados com a venda, o que resultou não em melhoria, mas sim em agravamento da situação do Erário, ainda mais quando se constata que as despesas realizadas o foram, várias vezes, em moeda corrente, recebendo o Tesouro em troca, quando do pagamento do preço de venda, recursos que, como já foi destacado, compunham-se, na sua esmagadora maioria, das denominadas “moedas podres”.

 

  1. Além disso, deve ser registrado que os parcos recursos arrecadados não se encontravam vinculados a qualquer finalidade específica, o que impossibilita dizer que contribuíram para o desenvolvimento de atividades nas quais fosse fundamental a presença do Estado, como a construção de escolas e hospitais, a realização de obras de infra-estrutura, a aplicação em setores considerados estratégicos ou outras finalidades que pudessem implicar melhoria na qualidade de vida da população.

 

  1. Da mesma forma, a experiência mostra que, em alguns casos, foram frustradas as expectativas de se conseguir a retomada de investimentos nos setores privatizados, de se modernizar o parque industrial do país, de se ampliar a competitividade da economia e de se democratizar o capital das empresas privatizadas.

 

  1. Diante da inexistência de regras claras e definidas a respeito da condução dos processos de desestatização e da administração das entidades transferidas para o capital privado, o setor de fertilizantes, por exemplo, passou a ostentar, como se vê pelos dados constantes do relatório antecedente, um grau muito elevado de concentração de seu controle, enquanto no setor de siderurgia houve a formação de monopólios da fabricação de determinados produtos e, em um caso extremo, o fechamento puro e simples de uma das entidades alienadas como mera estratégia empresarial, procedimentos que desestimulam ou inviabilizam qualquer investimento ou modernização do parque industrial e que, certamente, não colaboraram para aumento da competitividade da economia ou para a democratização do capital.

 

  1. Além disso, a adoção da sistemática de venda de ações por lotes, a reduzida participação acionária assegurada aos empregados e a ausência de estímulos à participação de pequenos investidores, associadas à ausência de normas regulamentadoras das transferências posteriores de propriedade das ações alienadas, impediram a efetiva democratização do capital e possibilitaram, em algumas situações, até mesmo a aquisição de empresas por um único grupo econômico, contrariando os objetivos do PND.

 

  1. Tão grave quanto tais ocorrências é, ainda, a questão da fixação dos preços mínimos de venda das empresas a serem alienadas. Embora a quase totalidade dos editais de venda inclua como critérios na determinação dos preços o valor de reposição, o patrimônio líquido e o valor original dos investimentos realizados, tem havido exclusiva prevalência dos resultados obtidos em função da aplicação do método do valor presente do fluxo de caixa líquido esperado, o que implica a desconsideração, em vários casos, do imenso patrimônio amealhado pelas empresas ao longo de sua existência.

 

  1. Mesmo a aplicação da sistemática do valor presente do fluxo de caixa, universalmente aceita, merece algumas restrições em função da forma como vem sendo feita. Em diversos casos, tem-se constatado que os parâmetros utilizados na elaboração das projeções de longo prazo foram extremamente conservadores, contribuindo para deprimir as estimativas de receitas e para elevar as de despesas.

 

  1. Além disso, as taxas de desconto utilizadas, variáveis cruciais na obtenção do valor presente, têm sido superestimadas, utilizando-se valores incompatíveis com o setor de atuação da empresa ou superiores aos recomendados por instituições internacionais de crédito na análise de viabilidade de projetos. Agrava esta distorção, ainda, o fato de, na avaliação de cenários de longo prazo, envolvendo períodos que, às vezes, ultrapassam décadas, terem sido usadas, ao longo de todo o horizonte das projeções, as elevadíssimas taxas de remuneração de disponibilidades de curto prazo praticadas no país em períodos recentes, resultando no aviltamento ainda maior do valor das empresas alienadas.

 

  1. Deve ser chamada a atenção, ainda, para o fato de que, na quase totalidade dos casos de privatização examinados, tem se optado pela venda imediata de todo o controle acionário, o que acarretou duas conseqüências negativas: em primeiro lugar, o aumento da oferta de ações gerou uma desvalorização de seus preços, o que poderia ser evitado por meio da alienação parcelada ao longo de um determinado período de tempo; em segundo lugar, impediu-se que também o poder público viesse a auferir uma fração dos ganhos decorrentes de eventuais valorizações das ações posteriores à transferência do controle.

(…)

 

EXPERIÊNCIA DE PRIVATIZAÇÕES EM OUTROS PAÍSES

A mesma decisão do TCU comenta experiências de privatizações em outros países que seguiram uma metodologia bem mais voltada aos interesses do Estado:

 

Grã-Bretanha

 

  1. a) a imposição de limitações ao controle acionário das empresas, não podendo nenhum investidor, independentemente de ser britânico ou não, adquirir mais de 15% (quinze por cento) do controle;
  2. b) a obrigatoriedade de ser a diretoria eleita inteiramente integrada por cidadãos britânicos, não importando a composição acionária;
  3. c) a criação de ações especiais, as “golden shares”, com prazo de validade de cinco anos e sem valor comercial, conferindo poderes especiais ao Governo, que deve ser consultado antes da alienação de bens e pode intervir na administração para evitar aumentos abusivos de preços ou a formação de oligopólios;
  4. d) a obrigatoriedade, em alguns casos de privatização de empresas prestadoras de serviços públicos ou de utilidade pública, como, por exemplo, a British Telecom, da manutenção de serviços não rentáveis e de aumentos de preços em níveis inferiores à inflação; e
  5. e) a venda das ações diretamente ao público e não em blocos, o que possibilitou a participação de nove milhões de pessoas nos processos de privatização e, conseqüentemente, a elevação dos preços de venda e a ampla democratização do capital.

 

França

 

  1. a) a reserva de 10% (dez por cento) das ações para os empregados, de 20% (vinte por cento) a 30% (trinta por cento) para grupos empresariais e a oferta do capital restante em bolsa;
  2. b) a criação de “golden shares”, também com validade de cinco anos;
  3. c) a imposição de teto para a participação de capitais estrangeiros em cada empresa privatizada, limitada a 20% (vinte por cento);
  4. d) a possibilidade do Ministério da Economia restringir as aquisições individuais a, no máximo, 5% (cinco por cento) do capital;
  5. e) a atribuição de prioridade nas aquisições para investidores franceses ou residentes no país; e
  6. f) a proibição da realização, pelo Estado acionista, de aumentos de capital das empresas incluídas no programa de privatização.

 

 

Portugal

 

  1. a) A alienação das ações ocorreu em quatro fases: a primeira, reservada a trabalhadores da empresa privatizanda; a segunda, destinada a pequenos acionistas; a terceira, reservada a fundos de investimentos e de pensões; e a 4ª, destinada aos investidores em geral, inclusive estrangeiros;
  2. b) afetação das receitas obtidas a finalidades específicas;
  3. c) avaliação das empresas a serem alienadas, em alguns casos, por organismos públicos e não somente por empresas privadas; e
  4. d) concessão de incentivos fiscais aos pequenos investidores como forma de estimular sua participação nos processos de desestatização.

 

Espanha

 

A imposição, aos futuros compradores, de obrigações no tocante à manutenção do nível de emprego e à realização de aportes de tecnologia, exigências comuns também às desestatizações promovidas na Alemanha. Ressalte-se, ainda, que, na Espanha, houve a opção pela liquidação pura e simples das empresas tidas como economicamente inviáveis, evitando-se o desperdício de recursos públicos em duvidosas tentativas de saneamento.

 

Argentina

 

            O programa de privatização da Argentina, onde a crise fiscal semelhante à hoje enfrentada pelo Estado brasileiro fez com que, nos primeiros anos, somente fosse aceita moeda corrente em pagamento das estatais alienadas, passando-se a admitir o uso de títulos da dívida pública apenas em uma segunda etapa.

 

Todas as características acima apontadas são “indispensáveis para se reconhecer que as condições sociais, econômicas e políticas das nações mencionadas são muito diferentes das encontradas em nosso país, onde a economia é bastante oligopolizada, a distribuição de renda é a segunda pior do mundo, superando apenas a existente em Botswana, e as carências básicas da população são enormes”.

 

 

MARCO LEGAL DAS PRIVATIZAÇÕES

A seguir, listamos diversas leis que previram as privatizações, sendo que muitas delas autorizaram a assunção, pelo Estado, de dívidas das empresas que foram privatizadas, além de estabelecerem condições de privatização lesivas ao patrimônio público, admitindo-se por exemplo, títulos da dívida pública que eram negociados no mercado muito abaixo de seu valor de face, denominados “moedas podres”:

ATO LEGAL DESESTATIZAÇÃO
Decreto nº 95.886, de 29.03.1988 Instituiu o Programa Federal de Desestatização e dentre os objetivos destaca-se: “III – propiciar a conversão de parte da dívida externa do setor público federal em investimentos de risco, resguardado o interesse nacional”.
Decreto nº 96.621, de 31 de Agosto de 1988 – Dispõe sobre a dissolução da Nuclebrás Enriquecimento Isotópico S.A. NUCLEI e da Nuclebrás Auxiliar de Mineração S.A. NUCLAM e dá outras providências.
Decreto nº 96.623, de 31 de Agosto de 1988 – Dispõe sobre a inclusão da Nuclerbrás Equipamentos Pesados S.A. – NUCLEP e Nuclerbrás de Monazita e Associados Ltda. – NUCLEMON no Programa Federal de Desestatização e dá outras providências.
Decreto nº 96.915, de 3 de Outubro de 1988 – Dispõe sobre a liquidação de obrigações em moeda estrangeira devidas por entidades da Administração Federal e dá outras providências.
Decreto nº 97.161, de 6 de Dezembro de 1988 – Estabelece procedimentos para execução de Programa de Desimobilização de bens, inclusive participações societárias.

 

Medida Provisória nº 26, de 15 de Janeiro de 1989 – Autoriza a privatização de empresas estatais e dá outras providências.

 

Observa-se que as privatizações aqui autorizadas poderiam ser financiadas em até 70% pelo alienante, conforme o § 2º do art. 4º, ou seja, o Governo Federal vendeu suas empresas estatais e garantiu o empréstimo de quase totalidade do valor para o adquirente. Ao mesmo tempo dificultou a aquisição de ações dessas empresas pelos seus empregados, pois de acordo com o inciso I do art. 5º, somente 10% das ações poderiam ser reservadas para venda aos respectivos empregados e com financiamento máximo de 36 parcelas.

 

Decreto nº 97.455, de 15 de Janeiro de 1989 – Dispõe sobre a extinção e dissolução de entidades da Administração Federal, sobre a alienação de participação acionária da União nas empresas que menciona, e dá outras providências.

 

Lei nº 7.862, de 30 de Outubro de 1989 – Dispõe sobre a absorção, pela União, de obrigações da NUCLEBRÁS e de suas subsidiárias, da INFAZ, do BNCC e da RFFSA e dá outras providências.

 

Conforme o art. 2º desta lei, a União assumiu o saldo devedor de obrigações financeiras decorrentes de operação de crédito externo contraída pelo BNCC e de operações de crédito interno e externo contraídas pela RFFSA.

 

Medida Provisória nº 124, de 12 de Dezembro de 1989 – Faculta a utilização, nos exercícios seguintes, do remanescente de autorizações para operações de crédito.

Resolução nº 94, de 1989 – Dispõe sobre limites globais e condições para as operações de crédito interno e externo dos municípios e de suas respectivas autarquias e estabelece limites e condições para a concessão de garantias.

 

 Lei nº 8.031, de 12.04.1990 Instituiu o Programa Nacional de Desestatização, ressaltando-se, entre os objetivos: “II – contribuir para a redução da dívida pública, concorrendo para o saneamento das finanças do setor público.”

 

O art. 16 permitiu o pagamento das alienações previstas no Programa Nacional de Desestatização com títulos da dívida pública interna.

 

Decreto nº 99.464, de 16 de Agosto de 1990 – Dispõe sobre prioridades, inclusões no Programa Nacional de Desestatização e designação do Gestor do Fundo Nacional de Desestatização.

 

Lei 8.088, de 31.10.1990 Autorizou o pagamento, em cruzados novos, do valor de aquisição de bens imóveis de propriedade da União e de suas autarquias, determinando que o produto da alienação de tais bens deveria ser “obrigatoriamente utilizado no resgate de títulos da dívida pública federal, preferencialmente junto ao Banco Central do Brasil.”

 

Decreto nº 99.666, de 1º de Novembro de 1990 – Dispõe sobre inclusões no Programa Nacional de Desestatização.

 

Resolução nº 82, de 1990 – Estabelece condições para a renegociação da dívida externa brasileira.

 

Decreto de 5 de Março de 1991 – Dispõe sobre inclusões no Programa Nacional de Desestatização.

 

Lei 8.383, de 30.12.1991

 

Art. 65. Terá o tratamento de permuta a entrega, pelo licitante vencedor, de títulos da dívida pública federal ou de outros créditos contra a União, como contrapartida à aquisição das ações ou quotas leiloadas no âmbito do Programa Nacional de Desestatização.

 

§ 1º Na hipótese de adquirente pessoa física, deverá ser considerado como custo de aquisição das ações ou quotas da empresa privatizável o custo de aquisição dos direitos contra a União, corrigido monetariamente até a data da permuta.

 

§ 2º Na hipótese de pessoa jurídica não tributada com base no lucro real, o custo de aquisição será apurado na forma do parágrafo anterior.

 

§ 3º No caso de pessoa jurídica tributada com base no lucro real, o custo de aquisição das ações ou quotas leiloadas será igual ao valor contábil dos títulos ou créditos entregues pelo adquirente na data da operação.

 

§ 4º Quando se configurar, na aquisição, investimento relevante em coligada ou controlada, avaliável pelo valor do patrimônio líquido, a adquirente deverá registrar o valor da equivalência no patrimônio adquirido, em conta própria de investimentos, e o valor do ágio ou deságio na aquisição em subconta do mesmo investimento, que deverá ser computado na determinação do lucro real do mês de realização do investimento, a qualquer título.

 

MP 2159/2001 Complementa o artigo, permitindo também ações de empresas sobre o controle direto e indireto das ref. pessoas jurídicas de direito público, no caso de desestatização por elas promovidas.

 

Lei nº 8.388, de 30 de Dezembro de 1991 – Estabelece diretrizes para que a União possa realizar a consolidação e o reescalonamento de dívidas das administrações direta e indireta dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e dá outras providências.

 

Aqui a União renegociou as dívidas dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, com juros de 6% a.a. e saldo devedor atualizado pelo IGPM (art. 1º, § 3º), exceto a dívida mobiliária daqueles entes.

 

 

Decreto nº 423, de 14 de Janeiro de 1992

– Dispõe sobre inclusão, no Programa Nacional de Desestatização –  PND, da EMBRAER – Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A.

 

Decreto nº 426, de 16 de Janeiro de 1992 – Dispõe sobre a inclusão, no Programa Nacional de Desestatização – PND, da Companhia Siderúrgica Nacional – CSN, Companhia Siderúrgica Paulista – COSIPA, Aço Minas Gerais S.A. AÇOMINAS e Companhia Nacional de Alcalis – CNA.

 

Decreto nº 473, de 10 de Março de 1992 – Dispõe sobre inclusão, no Programa Nacional de Desestatização – PND, da Rede Ferroviária Federal S.A. – RFFSA, da AGEF – Rede Federal de Armazéns Gerais Ferroviários S.A. e da VALEC – Engenharia, Construções e Ferrovias S.A.

 

Decreto nº 480, de 25 de Março de 1992 – Dispõe sobre inclusão e exclusão de participações acionárias da Petrobrás Química S.A. – PETROQUISA no âmbito do Programa Nacional de Desestatização.

 

Decreto nº 522, de 18 de Maio de 1992 – Dispõe sobre inclusão, no Programa Nacional de Desestatização – PND, das participações acionárias da Petrobrás Química S.A. – PETROQUISA   na Companhia Química do Recôncavo – CQR e na POLIPROPILENO S.A.

 

Decreto nº 572, de 22 de Junho de 1992 – Dispõe sobre inclusão no Programa Nacional de Desestatização – PND, da Espírito Santo Centrais Elétricas S.A. – ESCELSA e Light Serviços de Eletricidade S.A.

 

Decreto nº 654, de 17 de Setembro de 1992 – Dispõe sobre inclusão, no Programa Nacional de Desestatização – PND, do Banco Meridional do Brasil S.A.

 

 

Decreto 712, de 23.12.1992 Altera dispositivo do Decreto 99.463, de 16.08.1990, e trata de laudo de avaliação, serviços de auditoria contábil e jurídica, avaliação patrimonial.

 

Art. 10. Os §§ 2° e 6° do art. 39 do Decreto n° 99.463, de 1990, passam a vigorar com a seguinte redação:

 

Art. 39…………………………………………………………………….

 

§ 2° Após a liqüidação de toda as suas dívidas, o alienante ou seu sucessor, exceto a União, aplicará o eventual saldo dos recursos recebidos na poderiam aquisição de títulos da dívida pública federal de longo prazo, de emissão especial.

 

 

O mesmo Decreto 712, revogou dispositivo do Decreto 96.915/88:

 

Art. 11. Ficam excluídas da vedação prevista pelo art. 1° e seu parágrafo único do Decreto n° 96.915, de 3 de outubro de 1988, todas as entidades da Administração Federal ou sob controle, direto ou indireto, da União Federal, incluídas no Programa Nacional de Desestatização, os termos da Lei n° 8.031, de 12 de abril de 1990.

 

Decreto nº 96.915, de 3 de Outubro de 1988 Art. 1º. É vedado o pagamento de dívidas contraídas em moeda estrangeira, por entidades da Administração Federal ou sob controle, direto ou indireto, da União Federal, sem a liquidação de contrato de câmbio, junto às instituições autorizadas, na forma estabelecida pelo Banco Central do Brasil.

 

Parágrafo único. Dependerão de autorização prévia do Banco Central do Brasil as alterações dos contratos firmados com pessoas sediadas no exterior de que sejam devedoras as entidades referidas neste artigo.

 

Ou seja, as entidades incluídas no PND poderiam efetuar o pagamento de dívidas contraídas em moeda estrangeira sem liquidação de contrato de câmbio!

 

Decreto nº 844, de 24 de Junho de 1993 – Dispõe sobre a exclusão do Programa Nacional de Desestatização, criado pela Lei n° 8.031, de 12.4.1990, da Petrobrás Fertilizantes S.A. PETROFÉRTIL  e da Fertilizantes Nitrogenados do Nordeste S.A. NITROFÉRTIL.

 

 

Decreto nº 1.068, de 2 de Março de 1994 – Dispõe sobre a inclusão no Programa Nacional de Desestatização – PND das participações societárias minoritárias, detidas pelas entidades da Administração Federal que menciona, e dá outras providências.

 

 

Decreto nº 1.204, de 29 de Julho de 1994  

– Altera e consolida a regulamentação da Lei nº 8.031, de 12 abril de 1990, que cria o Programa de Desestatização, com as alterações posteriores.

 

Decreto de 24 de Agosto de 1994 – Dispõe sobre a exclusão do Programa Nacional de Desestatização, criado pela Lei n° 8.031, de 12 de abril de 1990, da COBRA – Computadores e Sistemas Brasileiros S.A.

 

Decreto nº 1.322, de 2 de Dezembro de 1994 – Dispõe sobre a exclusão do Programa Nacional de Desestatização, criado pela Lei nº 8.031, de 12 de abril de 1990, da Companhia de Navegação Lloyd Brasileiro – LLOYDBRÁS.

 

Decreto nº 1.481, de 3 de Maio de 1995 – Inclui empresas no Programa Nacional de Desestatização – PND.

 

Decreto nº 1.485, de 9 de Maio de 1995 – Dispõe sobre a exclusão de participação acionária da Petrobrás Química S.A. (Petroquisa) do Programa Nacional de Desestatização.

 

Decreto nº 1.503, de 25 de Maio de 1995  

– Inclui empresas no Programa Nacional de Desestatização – PND.

 

 

Decreto nº 1.525, de 20 de Junho de 1995 – Dispõe sobre a exclusão do Programa Nacional de Desestatização – PND, criado pela Lei n° 8.031, de 12 de abril de 1990, das participações acionárias da Petrobrás Química S.A. PETROQUISA, na ALCLOR Química de Alagoas S A., na Companhia Alagoas Industrial CINAL e na FCC – Fábrica Carioca de Catalisadores, bem como da Nuclebrás Equipamentos Pesados S.A. NUCLEP.

 

Decreto nº 1.638, de 18 de Setembro de 1995 – Dispõe sobre a exclusão, do Programa Nacional de Desestatização, criado pela Lei nº 8.031 de 12.04.90, da participação acionária da Petrobrás Química S.A. – PETROQUISA na PETROCOQUE S.A. Indústria e Comércio.

Decreto nº 1.639, de 18 de Setembro de 1995 – Dispõe sobre a inclusão, no Programa Nacional de Desestatização – PND, da COMPANHIA DE NAVEGAÇÃO LLOYD BRASILEIRO – LLOYDBRÁS.

 

Decreto nº 1.746, de 14 de Dezembro de 1995 – Dispõe sobra a dissolução e extinção da Companhia de Navegação Lloyd Brasileiro – LLOYDBRÁS, e dá outras providências.

 

Medida Provisória nº 1.275, de 12 de Janeiro de 1996 – Dispõe sobre a Nota do Tesouro Nacional – NTN e sua utilização para aquisição de bens e direitos alienados no âmbito do Programa Nacional de Desestatização – PND, instituído pela Lei nº 8.031, de 12 de abril de 1990, consolidando as normas sobre a matéria constantes da Lei nº 8.177, de 01 de março de 1991, e da Lei n º 8.249, de 24 de outubro de 1991, e altera o artigo 3º da Lei n º 8.249/91.

 

Medida Provisória nº 1.314, de 9 de Fevereiro de 1996 – Dispõe sobre a Nota do Tesouro Nacional – NTN e sua utilização para aquisição de bens e direitos alienados no âmbito do Programa Nacional de Desestatização – PND, instituído pela Lei nº 8.031, de 12 de abril de 1990, consolidando as normas sobre a matéria constantes da Lei nº 8.177, de 1º de março de 1991, e da Lei nº 8.249, de 24 de outubro de 1991, e altera o art. 3º da Lei nº 8.249/91.

 

Medida Provisória nº 1.418, de 3 de Maio de 1996 – Autoriza o Poder Executivo a abrir ao Orçamento Fiscal da União, em favor de Encargos Financeiros da União – Recursos sob Supervisão do Ministério da Fazenda, crédito extraordinário até o limite de R$8.000.000.000,00, para os fins que especifica.

 

 

Medida Provisória nº 1.466, de 4 de Junho de 1996 – Autoriza o Poder Executivo a abrir ao Orçamento Fiscal da União, em favor de Encargos Financeiros da União – Recursos sob Supervisão do Ministério da Fazenda, crédito extraordinário até o limite de R$ 8.000.000.000,00, para os fins que especifica.

 

Medida Provisória nº 1.514, de 7 de Agosto de 1996 – Estabelece mecanismos objetivando incentivar a redução da presença do setor público estadual na atividade financeira bancária, dispõe sobre a privatização de instituições financeiras, e dá outras providências.

 

Decreto nº 1.990, de 29 de Agosto de 1996 – Dispõe sobre a inclusão, no Programa Nacional de Desestatização – PND, de oito empresas controladas pela União, responsáveis pela administração de portos marítimos e fluviais.

 

Resolução nº 69, de 1996 – Autoriza a União a realizar operações de recompra e de reestruturação dos títulos da dívida externa brasileira, contemplando a aquisição dos títulos, com deságio, no mercado secundário, a emissão de novos títulos para substituir os antigos ou outras modalidades de operações, com o objetivo de reduzir o estoque ou os encargos da dívida, alongar os prazos de pagamento ou ajustar o perfil do endividamento externo do setor público brasileiro.

 

Medida Provisória nº 1.560-1, de 17 de Janeiro de 1997 – Estabelece critérios para a consolidação, a assunção e o refinanciamento, pela União, da dívida pública mobiliária e outras que especifica, de responsabilidade dos Estados e do Distrito Federal.

 

Medida Provisória nº 1.586, de 11 de Setembro de 1997 – Dispõe sobre a recuperação de haveres do Tesouro Nacional e do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS e a utilização de Títulos da Dívida Pública, de responsabilidade do Tesouro Nacional, na quitação de débitos com o INSS, e dá outras providências.

 

Lei nº 9.491, de 09.09.1997 Altera procedimentos relativos ao Programa Nacional de Desestatização, revoga a Lei nº 8.031, de 12 de abril de 1990, e dá outras providências

 

Art. 1º O Programa Nacional de Desestatização – PND tem como objetivos fundamentais:

 

I – reordenar a posição estratégica do Estado na economia, transferindo à iniciativa privada atividades indevidamente exploradas pelo setor público;

 

II – contribuir para a reestruturação econômica do setor público, especialmente através da melhoria do perfil e da redução da dívida pública líquida;

 

III – permitir a retomada de investimentos nas empresas e atividades que vierem a ser transferidas à iniciativa privada;

 

IV – contribuir para a reestruturação econômica do setor privado, especialmente para a modernização da infra-estrutura e do parque industrial do País, ampliando sua competitividade e reforçando a capacidade empresarial nos diversos setores da economia, inclusive através da concessão de crédito;

 

V – permitir que a Administração Pública concentre seus esforços nas atividades em que a presença do Estado seja fundamental para a consecução das prioridades nacionais;

 

VI – contribuir para o fortalecimento do mercado de capitais, através do acréscimo da oferta de valores mobiliários e da democratização da propriedade do capital das empresas que integrarem o Programa.

 

Art. 13. Observados os privilégios legais, o titular dos recursos oriundos da venda de ações ou de bens deverá utilizá-los, prioritariamente, na quitação de suas dívidas vencidas e vincendas perante a União.

 

§ 1º Após as quitações a que se refere o caput deste artigo, o saldo dos recursos deverá ser objeto de permuta por Notas do Tesouro Nacional ou por créditos securitizados de responsabilidade do Tesouro Nacional, cujas características e prerrogativas serão definidas por decreto.

 

§ 2º O Tesouro Nacional poderá autorizar o titular dos recursos oriundos da venda de ações ou de bens a utilizar títulos recebidos, de emissão de terceiros, para pagamento a esses terceiros ou a outros alienantes, no âmbito do Programa Nacional de Desestatização.

 

§ 3º Os títulos e créditos recebidos no âmbito do Programa Nacional de Desestatização poderão ser atualizados e remunerados pelos mesmos índices das Notas do Tesouro Nacional ou dos créditos securitizados a serem utilizados na permuta a que se refere o § 1º, desde a data da liquidação financeira da respectiva alienação das ações ou bens.

 

Lei nº 9.496, de 11 de Setembro de 1997 – Estabelece critérios para a consolidação, a assunção e o refinanciamento, pela União, da dívida pública mobiliária e outras que especifica, de responsabilidade dos Estados e do Distrito Federal.

 

Decreto nº 2.444, de 30 de Dezembro de 1997 – Dispõe sobre a inclusão, no Programa Nacional de Desestatização – PND, das rodovias federais que menciona, e dá outras providências.

 

Decreto nº 2.469, de 21 de Janeiro de 1998 – Dispõe sobre a inclusão no Programa Nacional de Desestatização – PND, do Banco do Estado de São Paulo S.A. – BANESPA.

 

Decreto nº 2.478, de 29 de Janeiro de 1998 – Dispõe sobre a transferência de ações da Petróleo Brasileiro S.A. – PETROBRÁS depositadas no Fundo de Amortização da Dívida Pública Mobiliária Federal – FADPMF para o Fundo Nacional de Desestatização – FND.

 

Decreto nº 2.546, de 14 de Abril de 1998 – Aprova o modelo de reestruturação e desestatização das empresas federais de telecomunicações supervisionadas pelo Ministério das Comunicações.

 

Medida Provisória nº 1.717, de 11 de Setembro de 1998 – Autoriza o Poder Executivo a abrir ao Orçamento Fiscal da União, em favor de Refinanciamento da Dívida Pública Mobiliária Federal – Recursos sob Supervisão do Ministério da Fazenda, crédito extraordinário no valor de R$68.383.840.000,00, para reforço de dotações consignadas no vigente orçamento.

 

 

Decreto nº 3.019, de 6 de Abril de 1999

– Dispõe sobre a inclusão, no Programa Nacional de Desestatização PND, de aproveitamentos hidreléctricos

 

Decreto nº 3.275, de 6 de Dezembro de 1999 – Dispõe sobre a dissolução, liquidação e extinção da Rede Federal de Armazéns Gerais Ferroviários S.A. – AGEF.

 

Decreto nº 3.277, de 7 de Dezembro de 1999 – Dispõe sobre a dissolução, liquidação e extinção da Rede Ferroviária S.A. – RFFSA

 

Medida Provisória nº 1.974-74, de 10 de Dezembro de 1999 – Dispõe sobre os títulos da dívida pública de responsabilidade do Tesouro Nacional, consolidando a legislação em vigor sobre a matéria.

 

Decreto nº 3.286, de 14 de Dezembro de 1999 – Dispõe sobre a inclusão, no Programa Nacional de Desestatização – PND, do Banco do Estado do Ceará S.A. – BEC e do Banco do Estado de Goiás S.A. – BEG

 

Decreto nº 3.292, de 15 de Dezembro de 1999 – Dispõe sobre a inclusão de imóveis de domínio da União no Programa Nacional de Desestatização – PND.

 

Lei nº 9.931, de 17 de Dezembro de 1999 – Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor do Refinanciamento da Dívida Pública Mobiliária Federal, crédito suplementar no valor de R$ 17.200.000.000,00, para reforço de dotações consignadas no vigente orçamento.

 

Decreto nº 3.367, de 22 de Fevereiro de 2000 – Dispõe sobre o processo de desestatização das empresas do setor elétrico, incluídas no Programa Nacional de Desestatização – PND.

 

Decreto nº 3.393, de 28 de Março de 2000  

– Dispõe sobre a inclusão, no Programa Nacional de Desestatização – PND, de aproveitamentos hidrelétricos, e dá outras providências.

 

Decreto nº 3.407, de 10 de Abril de 2000 – Dispõe sobre a inclusão de bens móveis da União no Programa Nacional de Desestatização – PND.

 

Decreto nº 3.655, de 7 de Novembro de 2000 – Dispõe sobre a inclusão, no Programa Nacional de Desestatização – PND, do Banco do Estado de Santa Catarina S.A. – BESC.

 

 

Decreto nº 3.656, de 7 de Novembro de 2000 – Dispõe sobre a inclusão, no Programa Nacional de Desestatização – PND, do Banco do Estado do Piauí S.A. – BEP.

 

Decreto nº 3.660, de 14 de Novembro de 2000 – Dispõe sobre a inclusão, no Programa Nacional de Desestatização – PND, do Banco do Estado do Maranhão S.A. – BEM.

 

Lei nº 10.072, de 18 de Dezembro de 2000 – Autoriza o Poder Executivo a abrir ao Orçamento Fiscal da União, em favor de Refinanciamento da Dívida Pública Mobiliária Federal – Recursos sob Supervisão do Ministério da Fazenda, crédito extraordinário no valo de R$ 68.383.840.000,00, para reforço de dotações consignadas no vigente orçamento.

 

MP nº 2.071-26, de 27.12.2000 Dá nova redação a dispositivos da Lei nº 9.491, de 9 de setembro de 1997, que altera procedimentos relativos ao Programa Nacional de Desestatização, revoga a Lei nº 8.031, de 12 de abril de 1990, e dá outras providências.
Decreto 3.727, de 12.01.2001 Autoriza depósito de ações de propriedade da União no Fundo de Amortização da Dívida Pública Mobiliária Federal, na forma estabelecida no art. 30 da Lei nº 9069, de 29 de junho de1995, no art. 3º do Decreto nº 1312, de 18 de novembro de 1994.

 

O referido Decreto trata das ações de dezenas de empresas de telecomunicações.

Decreto nº 3.748, de 8 de Fevereiro de 2001 – Dispõe sobre a inclusão, no Programa Nacional de Desestatização – PND, de empreendimentos de transmissão da Rede Básica do Sistema Elétrico Interligado, e dá outras providências.
MP 2.161-33, de 28.06.2001 Dá nova redação a dispositivos da Lei nº 9.491, de 9 de setembro de 1997, que altera procedimentos relativos ao Programa Nacional de Desestatização, revoga a Lei nº 8.031, de 12 de abril de 1990

 

Art. 2º Fica o Poder Executivo autorizado a desvincular do Fundo de Amortização da Dívida Pública Mobiliária Federal, de que trata o art. 29 da Lei nº 9.069, de 29 de junho de 1995, as ações necessárias ao cumprimento do disposto no art. 192 da Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997.

 

MP 2.162-70, de 28.06.2001

 

Art. 1º Fica o Poder Executivo autorizado a:

 

III – alienar, ao Banco do Brasil S.A., ações vinculadas ao Fundo Nacional de Desestatização, de que trata a Lei nº 9.491, de 9 de setembro de 1997, e ao Fundo de Amortização da Dívida Pública Mobiliária Federal, de que trata a Lei nº 9.069, de 29 de junho de 1995, até o montante de R$ 2.880.000.000,00 (dois bilhões, oitocentos e oitenta milhões de reais);

 

§ 2º O pagamento do preço das ações alienadas na forma do inciso III deste artigo poderá ser efetuado com os títulos da dívida pública federal de que trata o inciso I.

 

 

Decreto de 1º de Outubro de 2001 – Abre ao Orçamento Fiscal da União crédito suplementar no valor global de R$ 3.983.559.709,00, em favor de Encargos Financeiros da União e Refinanciamento da Dívida Pública Mobiliária Federal, para reforço de dotações consignadas no orçamento vigente.

 

Lei nº 10.644, de 14 de Março de 2003 – Abre crédito extraordinário, em favor de Encargos Financeiros da União e Refinanciamento da Dívida Pública Mobiliária Federal, no valor global de R$ 17.084.740.385,00, para os fins que especifica.

 

Resolução nº 20, de 2004 – Autoriza a União a executar Programa de Emissão de Títulos e de Administração de Passivos de Responsabilidade do Tesouro Nacional no Exterior e dá outras providências.

 

Decreto nº 5.427, de 19 de Abril de 2005 – Dispõe sobre a inclusão, no Programa Nacional de Desestatização – PND, das rodovias federais que menciona, e dá outras providências.

 

Decreto nº 5.477, de 24 de Junho de 2005 – Dispõe sobre a inclusão, no Programa Nacional de Desestatização – PND, de empreendimentos de transmissão de energia elétrica integrantes da Rede Básica do Sistema Interligado Nacional – SIN, determina à Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL a promoção e o acompanhamento dos processos de licitação dessas concessões, e dá outras providências.

 

 

 

Cabe aqui citarmos também o livro “O Brasil Privatizado”, de Aloysio Biondi (Fundação Perseu Abramo, 2003, Coleção Brasil Urgente). Em seu livro, com dados até dezembro de 1998, Biondi questiona o argumento oficial, à época, de que as privatizações teriam proporcionado R$ 68,7 bilhões aos cofres públicos, além de terem transferido aos compradores das estatais dívidas de R$ 16,5 bilhões, totalizando um ganho de R$ 85,2 bilhões.

Por meio das tabelas que reproduziremos a seguir, Biondi mostra as perversas condições das privatizações, que provocaram, na verdade, o aumento da dívida do governo (trechos extraídos das páginas 66 a 68):

 

 

 

Como visto, boa parte do valor da venda das estatais foi recebido a prazo, ou por meio das chamadas “moedas podres”, ou seja, títulos de dívidas que já vinham sendo negociados pelo mercado a preços bem mais baixos que os de face. Isto gerou grandes ganhos àqueles que compraram tais títulos no mercado secundário.

Apesar de tais títulos representarem uma dívida contra a União, cabe ressaltar que, ao admitir tais “moedas podres”, o estado brasileiro fez uma opção de pagar determinadas dívidas – que o mercado já assumia como perdidas – em detrimento de outras, como, por exemplo, a dívida social.

À luz das informações levantadas neste item, e principalmente das análises trazidas pelo TCU, faz-se necessário uma auditoria completa das privatizações, visto que a venda de empresas estatais serviu para o pagamento de apenas uma ínfima parte da dívida pública, dado que os preços e condições das privatizações foram extremamente lesivas ao Estado, como constou da Decisão 400/1994 – Plenário do TCU.

A CPI deve também recomendar o aprofundamento das investigações para se apurar os danos ao Patrimônio Público decorrentes destes fatos.

 

 

IV.9.14 – O Crescimento da Dívida Interna em 2009 e o empréstimo de R$ 100 bilhões ao BNDES

A tabela enviada pela STN possui dados até 2008. Porém, cabe fazermos aqui uma rápida consideração sobre o acentuado crescimento da dívida pública em 2009.

De acordo com a tabela do Banco Central, referente à Nota para imprensa “Mercado Aberto” (que inclui as “Operações de Mercado Aberto” do Banco Central, Quadro 11), a dívida pública mobiliária federal interna aumentou R$ 261 bilhões em 2009.

Da tabela, depreende-se que R$ 127 bilhões deste aumento se deveram ao aumento das Operações de Mercado Aberto, tema que será abordado mais detalhadamente no próximo capítulo. Os restantes R$ 134 bilhões se deveram a outros fatores.

Um destes fatores foi a emissão de R$ 100 bilhões em títulos da dívida pública para a obtenção de recursos para a concessão, pela União, de empréstimo ao BNDES, conforme autorizado pela Lei 11.948, de 2009:

 

Medida Provisória nº 453, de 22.01.2009, Convertida na Lei 11.948, de 16.06.2009

Art. 1º Fica a União autorizada a conceder crédito ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, no montante de até R$ 100.000.000.000,00 (cem bilhões de reais), em condições financeiras e contratuais a serem definidas pelo Ministro de Estado da Fazenda.

  • 1º Para a cobertura do crédito de que trata o caput , a União poderá emitir, sob a forma de colocação direta, em favor do BNDES, títulos da Dívida Pública Mobiliária Federal, cujas características serão definidas pelo Ministro de Estado da Fazenda.
  • 2º Sem prejuízo do atendimento das finalidades específicas previstas em lei, o superávit financeiro existente no Tesouro Nacional no encerramento do exercício financeiro de 2008 poderá ser destinado à cobertura de parte do crédito de que trata o art. 1º desta Medida Provisória.
  • 3º No caso de emissão de títulos, será respeitada a equivalência econômica com o valor previsto no caput .
  • 4º Em contrapartida ao crédito concedido nos termos do caput , o BNDES poderá utilizar, a critério do Ministério da Fazenda, créditos detidos contra a BNDESPAR – BNDES Participações S.A.

 

Conforme notícia divulgada pelo Jornal Valor Econômico, em 23/01/2009, esta operação não é nula, do ponto de vista fiscal, dado que o governo capta recursos pagando a Taxa Selic, ou mais, enquanto receberá do BNDES a TJLP, mais baixa:

 

A operação não será isenta de custos para os cofres públicos. “O custo de oportunidade do Tesouro é a taxa Selic”, disse Mantega. O Tesouro paga a Selic (12,75% ao ano), quando capta recursos no mercado pela emissão de títulos. Ou deixa de receber a Selic na aplicação de suas disponibilidades financeiras. Mantega não fez os cálculos de quanto seria o custo fiscal, ponderando que ele tende a mudar, já que a taxa Selic está em queda. Assumindo a hipótese de que a Selic fique estável em 12,75% ao ano ao longo de 2009, o custo do empréstimos seria de R$ 4,770 bilhões. Se a Selic cair na velocidade prevista pelo último boletim Focus, ficando na média de 11,78% em 2009, o subsídio implícito do Tesouro para o BNDES seria de R$ 3,8 bilhões no ano. 

Portanto, verifica-se que esta emissão de títulos representa ônus para o setor público, e revela uma opção de política econômica do governo: assumir o risco do financiamento ao setor produtivo, enquanto o setor financeiro privado, que deveria cumprir este papel, financia o governo à Taxa Selic, recebendo rendimentos garantidos.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

V – A ACUMULAÇÃO DE RESERVAS CAMBIAIS E AUMENTO DA DÍVIDA INTERNA

 

V – A ACUMULAÇÃO DE RESERVAS CAMBIAIS E AUMENTO DA DÍVIDA INTERNA

 

Outro importante fator de crescimento da dívida interna nos últimos anos, não explicitado nos itens anteriores, é a dívida feita pelo Banco Central junto ao mercado, que também é, em última instância, coberta pelo Tesouro Nacional.

Conforme depoimento dado a esta CPI pelo Presidente do Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro, Sr. Paulo Sérgio Souto:

 

“A Dívida Interna hoje já ultrapassa a marca de R$ 1,8 trilhão. Porém, o governo costuma divulgar que o estoque desta dívida é de R$ 1,3 trilhão. Isso ocorre porque as estatísticas divulgadas não incluem as chamadas Operações de Mercado Aberto, que nada mais são do que dívida do Banco Central com os bancos, que recebem títulos remunerados pela taxa Selic da mesma forma, e em prazos curtíssimos. Estou inclusive repassando ao Presidente e ao Relator desta CPI a tabela, divulgada pelo Banco Central, que mostra o estoque desta dívida, incluída as Operações de Mercado Aberto. (Anexo II)

Conforme os Srs. podem observar, tais operações têm crescido nos últimos anos, como resultado da grande entrada de dólares no país, devido às altíssimas taxas de juros brasileiras. Agora, em setembro deste ano, essas operações somavam mais de R$ 429 bilhões, representando 23,7% dos títulos da dívida, O Banco Central compra dólares, pagando em reais, e expandindo a base monetária, o que, na visão do BC, causaria inflação. Para enxugar esses reais, o BC lança no mercado títulos emitidos pelo Tesouro, mas que já se encontram em poder do Banco Central.

 E por que tais títulos do Tesouro se encontram em poder do Banco Central? São títulos recebidos do Tesouro, como pagamento pelos enormes prejuízos do BC, contraídos por força da aquisição de dólares, para a formação de reservas, em um quadro em que o dólar se desvaloriza em relação ao Real. Além do mais, os Srs. Parlamentares aprovaram, no ano passado, a Medida Provisória 435/2008, que permitiu ao Tesouro emitir, sem limite algum, títulos para serem repassados ao Banco Central, para que este possa fazer, também sem limite algum, tais Operações de Mercado Aberto.

Isto significa que o Banco Central continua a fazer dívida, com o estoque dessas operações tendo alcançado, agora em outubro, MEIO TRILHÃO DE REAIS, conforme matérias publicadas nos jornais Valor Econômico e Estado de São Paulo, também anexas, que repasso aos Srs. Parlamentares.(Anexo 3 e 4, respectivamente)

O Tesouro, quando paga ao Bacen os juros referentes aos títulos detidos pela instituição, está, na verdade, remunerando os rentistas, pois o Banco Central repassa esses pagamentos de juros para os detentores dos títulos dessas Operações de Mercado Aberto.

Além do mais, gostaria aqui de trazer uma denúncia, que não é minha, mas de um analista, com 45 anos de experiência no mercado financeiro, segundo o qual as compras de dólares pelo Banco Central não contribuem para deter a desvalorização do dólar. Pelo contrário, a estimula ainda mais. Ou seja: a principal justificativa para a compra de dólares, que é deter a valorização do Real, não se sustenta. Essa dívida colossal, proveniente das compras de dólares, deve ser questionada por esta CPI. Deixo com os Srs. Parlamentares, também, notícia do Jornal do Brasil que mostra esta denúncia. (Anexo 5)

Outro motivo pela qual as Operações de Mercado Aberto crescem é o pagamento, em dinheiro, de algumas partes da dívida interna pelo Tesouro, o que também aumenta a base monetária. Assim, o BC realiza também mais Operações de Mercado Aberto para esterilizar esta expansão.

O que tudo isso indica? Simplesmente que esta dívida continuará existindo ad infinitum. Pois, quando o Tesouro paga a dívida, o Banco Central faz mais dívida!

Outra importante informação: o capital estrangeiro, que entrou no Brasil no início do ano para ganhar com títulos da dívida interna, ganhou quase 50% com os juros mais a valorização do câmbio no período. Importante ressaltar que, somente nos 12 primeiros dias de novembro, o Tesouro já emitiu R$ 12,6 bilhões em títulos da dívida interna, sendo R$ 10 bilhões a taxas de juros pré-fixadas, o que poderia parecer uma melhora na administração da dívida. Porém, o Tesouro emitiu tais títulos a uma taxa média de 11% ao ano, ou seja, muito mais que a já altíssima taxa Selic. No dia 12, a taxa paga pelos títulos chegou a mais de 13% ao ano. Isto também deve ser investigado pela CPI, dado que isto mostra o poder do mercado na definição das taxas de juros da dívida interna, que podem ser bem maiores que a Selic. Encaminho também em anexo a tabela demonstrativa deste cálculo, baseada na própria tabela do Tesouro Nacional. (Anexo 6)

Quero aqui frisar que esta dívida, que já se aproxima de R$ 2 trilhões, não decorre de excesso de gastos sociais, investimentos produtivos ou em infra-estrutura. Desde 1995, até hoje, não houve déficit primário. Pelo contrário: houve pesados superávits primários, conforme aqui demonstramos, que não foram suficientes para compensar o verdadeiro motivo da explosão desta dívida: as altíssimas taxas de juros, a forma como é gerida a dívida e a compra de dólares pelo Banco Central.

Pergunto aos Srs. Parlamentares: como justificar o crescimento de uma dívida de R$ 60 bilhões, no final de 1994, para quase R$ 2 TRILHÕES, em 2009? Dizer que a culpa é dos R$ 60 bilhões, lá de trás, é no mínimo uma aberração.

Também é falso o argumento de que o principal fator de crescimento da dívida interna federal foi a assunção da dívida dos estados e municípios, o principal “esqueleto” assumido pelo governo federal.  Isto porque tais dívidas já explodiam antes mesmo de serem assumidas pela União, devido exatamente às altíssimas taxas de juros estabelecidas pelo próprio governo federal, conforme aqui também lembramos.

Em suma: a dívida interna atual é explosiva, e quando se tenta pagá-la, o Banco Central faz mais dívida. Ou seja: é uma política suicida para o país. Mas, extremamente rentável a alguns setores”.

 

Portanto, o economista Paulo Sérgio Souto fez graves denúncias sobre o endividamento interno, cuja investigação deve ser aprofundada.

O Gráfico 22, apresentado pelo Sr. Souto, também merece uma reflexão:

 

Gráfico 22

 

Este gráfico mostra que o acúmulo de reservas cambiais se deu às custas da explosão das Operações de Mercado Aberto, que fazem parte da dívida interna.

Cabe ressaltar também que os títulos que o Banco Central lança no mercado representam dívida feita sem autorização legislativa, dado que o Art. 34 da Lei Complementar 101/2000 proibiu a emissão de títulos pelo BC:

“O Banco Central do Brasil não emitirá títulos da dívida pública a partir de dois anos após a publicação desta Lei Complementar.”

Posteriormente, o BC passou a apresentar seguidos prejuízos, que eram cobertos com o recebimento de títulos do Tesouro, que por sua vez poderiam ser usados pela  autoridade monetária para se endividar no mercado financeiro. Adicionalmente, a partir da edição da Medida Provisória 435/2008, convertida na Lei 11.803/2008, o Tesouro passou a emitir, sem limite algum, títulos em favor do BC, sem contrapartida financeira, simplesmente para “assegurar ao Banco Central do Brasil a manutenção de carteira de títulos da dívida pública em dimensões adequadas à execução da política monetária” (Art. 2º).

Ou seja: violou-se o espírito do Art. 34 da Lei Complementar 101/2000, ao se permitir a entrega ao BC de títulos do Tesouro, sem limite e sem contrapartida financeira, para que a autoridade monetária continuasse se endividando junto ao setor financeiro, a taxas de juros altíssimas, às custas do Erário.

É importante mencionar também o depoimento do renomado economista Dércio Garcia Munhoz à CPI da dívida Pública em 25.11.2009, ressaltando-se especialmente a disparidade entre o volume de reservas brasileiras e as de países de primeiro mundo como Alemanha, França, Itália e até os Estados Unidos:

“Mas o fato é que estamos trabalhando, então, depois de 2002, com taxas de juros elevadas, e com taxas de juros elevadas a dívida cresce. E não adianta a gente trabalhar, usar o argumento de que a dívida pública deve ser contada apenas pelo o que está no mercado. Não, os títulos que estão no Banco Central têm que ser honrados pelo Tesouro, e o Tesouro paga os encargos financeiros dele. Então, estamos com uma dívida perto de 2 trilhões. O que devemos tirar dele? Devemos tirar o saldo do Tesouro no Banco Central. E quanto que o Tesouro tem em caixa no Banco Central? Apenas algo como 400 bilhões de reais, quase receitas de 1 ano, receitas fiscais de 1 ano.

Por que o Tesouro tem tanto dinheiro lá? Se eu sou devedor eu só tenho direito depositado porque emiti títulos a mais. E realmente essa é uma incógnita. Você tem 400 bilhões, perto disso, o Banco Central tem do Tesouro mais ou menos igual o montante com títulos públicos, que ele comprou. Então, eu tenho aqui 400 bilhões de reais de títulos públicos emitidos a mais e 400 bilhões em depósito que não têm justificativa, lá no Banco Central. E as coisas vão se embaralhando mais. Por quê? Por que, na medida em que eu tenho reservas muitos grandes…  Sabe que hoje eu estou com 200 e poucos bilhões de reservas. Para a Alemanha ter o que o Brasil tem ela teria que multiplicar as reservas por 3; a Itália por 4; a França por 4; os Estados Unidos por 2,5 vezes. Ou seja, as nossas reservas são absurdas. Claro que a gente tira a China e tira o Japão porque eles fizeram reservas que eram superávits contra o mundo.

Uma coisa é eu ter dinheiro no banco porque eu gasto menos do que ganho ou  ganho mais do que gasto. A outra é ter dinheiro no banco e quando vou ver o cheque especial estou devendo mais lá. Então, eu posso até chegar de carro, de gravata, no banco, e tudo lá, mas eu sou devedor. Então, a China tem reservas elevadas e o Japão porque têm superávit assim. O Brasil não tem superávit. Ele é devedor. Ele tem uma dívida externa hoje de 270 bilhões de dólares. Então, se eu tenho 213 de reserva, minha dívida podia ser 100 bilhões menor. E custa muito caro. Por quê? Porque eu pago juros internos hoje da ordem de uns 9, 10% sobre a dívida pública de 1,6 trilhão, tirando os 400 bilhões de depósito no Banco Central, porque ele me devolve. Por que eu estou dizendo 10% e não estou falando da SELIC? Porque o custo médio da dívida é maior que a SELIC, inclusive porque o Governo faz colocações de títulos no curto prazo e pagando pré-fixado, com taxas altíssimas, que ninguém sabe quanto.

Então, nós estamos no pior dos mundos, por quê? Ao invés de a gente ir tornando mais claro isso aí, para se poder discutir no âmbito do Congresso e poder formular, reformular a política poderíamos verificar que sobraria muito dinheiro para políticas econômicas alternativas, políticas sociais complementares se nós fizéssemos uma mudança nisso. Ao invés disso, o que é que se fez? Há pouco mais de 6 meses, em meados do ano passado — desculpe —, um pouco mais de um ano, se colocou uma regra em que você agora não precisa mais jogar toda a despesa do Banco Central como despesa no balanço. Falam assim: se o Banco Central tem um recurso aplicado em dólares e o preço do dólar cai tem uma perda. Essa perda não jogo no balanço. Então, ficou uma coisa… em um balanço em que você joga despesas diretamente na conta do Tesouro e outras despesas você joga diretamente no patrimônio do Banco Central. Ora, não é por aí que se faz.”

 

O fato de o Banco Central ficar com as reservas em dólares em seu ativo, e com títulos da dívida interna em seu passivo representa enorme transferência de recursos do setor público para o setor privado, dado que o dólar vem se desvalorizando (ou seja, com taxas de juros negativas), enquanto o setor privado fica com ativos em reais, e que rendem altas taxas de juros, às custas do Tesouro. Some-se a isso que com a recente crise financeira que atingiu seu auge em outubro de 2008, as taxas de juros internacionais reduziram-se drasticamente, o que não ocorreu no Brasil.

Apenas no primeiro semestre de 2009, este processo gerou um prejuízo de R$ 93 bilhões ao Banco Central, que segundo a “Lei de Responsabilidade Fiscal” tem de ser coberto pelo Tesouro Nacional.

O Governo tem afirmado que a acumulação de reservas é importante para fazer face a crises financeiras, ou seja, poder financiar fugas de capital. Porém, esta argumentação pressupõe a total liberdade de fluxos de capitais, estabelecida de modo ilegal, conforme a denúncia das Procuradoras Federais, detalhada no item IV.5.

Cabe ressaltar também que a mesma Medida Provisória 435/2008 (convertida na Lei 11.803/2008), em flagrante violação ao Art. 8º da Lei Complementar 101/2000, permitiu que cerca de R$ 50 bilhões de recursos legalmente vinculados a diversas áreas[129],  pudessem ser destinados ao pagamento da dívida, pois estabeleceu que:

 

“Art. 11. O superávit financeiro das fontes de recursos existentes no Tesouro Nacional em 31 de dezembro de 2007 poderá ser destinado à amortização da Dívida Pública Mobiliária Federal interna.” 

 

Esse dispositivo conflita flagrantemente com o Art. 8º da Lei Complementar 101/2000, que assim dispõe, em seu Parágrafo Único:

 

“Os recursos legalmente vinculados a finalidade específica serão utilizados exclusivamente para atender ao objeto de sua vinculação, ainda que em exercício diverso daquele em que ocorrer o ingresso.”

 

Tal mecanismo foi perpetuado por dispositivo da Medida Provisória 450/2008 (convertida na Lei 11.943/2009), que assim dispõe:

 

“Art. 13.  O excesso de arrecadação e o superávit financeiro das fontes de recursos existentes no Tesouro Nacional poderão ser destinados à amortização da dívida pública federal.” 

 

O dispositivo revela o privilégio do endividamento público sobre todos os demais gastos públicos, e demanda análise jurídica aprofundada e respectivas providências para reparação do dano social e os danos ao Patrimônio Público provocado por essas flagrantes irregularidades.

O economista Dércio Garcia Munhoz comentou, em seu depoimento à CPI em 25.11.2009, outro aspecto da Medida Provisória 435, ligado à ausência de contrapartida financeira dos títulos colocados pelo Banco Central – as denominadas operações de mercado aberto:

“Outra medida que se tomou: o Banco Central ele colocava títulos na rua para recolher dinheiro para comprar os dólares. Agora tem uma norma que diz — nunca ninguém soube que pudesse se fazer uma cosia assim — que você dá títulos do Tesouro ao Banco Central sem contrapartida financeira, ou seja, ele não te paga. Ora, se você emite um título da dívida, você tem que registrar como dívida e alguém que comprou tem que pagar. Então, a Medida Provisória nº 435 diz que você não precisa pagar, que você não dá contrapartida financeira. Ora, perdi o controle. Então, chega-se ao balanço do Banco Central e o que se vê? Vê-se que o Banco Central tem 450 bilhões de títulos públicos e ele está cobrindo isso hoje com os depósitos do Tesouro no Banco Central e está cobrindo também com mais o meio circulante, o papel moeda emitido, que não custa nada a ele. Quando a gente pega a parte de cima verifica que os dólares têm como contrapartida a colocação de títulos internamente, agora os títulos colocados em moeda nacional. Então, o Banco Central cobre as reservas com títulos que ele coloca com o compromisso de recompra em moeda nacional e com prefixação da rentabilidade. Ora, qualquer mexida no dólar, e no sentido de valorização, o que acontece? Eu tenho uma perda, porque eu garanti ao comprador do título uma rentabilidade. Quanto é a perda? Não se sabe, porque agora nem o balanço mais diz quanto é. O que a gente sabe é que, quando terminou o semestre, neste ano, o Banco Central falou assim para o Tesouro: “Tem uma conta adicional para você aqui de 94 bilhões de reais em 6 meses”. Ora, quando chega setembro, o que a gente descobre? Que baixou para 74 milhões. Você não tem mais controle contábil da dívida, o que é uma coisa preocupante.

Na verdade, quando o dólar sobe ou desce, não deveríamos ter, no âmbito do Governo, nenhum impacto. Por que quando o dólar caiu de preço o Tesouro era obrigado a emitir títulos e entregar para o Banco Central? Não tinha muito sentido. Mas emitia e entregava para o Banco Central. E não é coisa assim… são coisas de dezenas e dezenas de bilhões. Quando foi o ano passado, a coisa inverteu, o dólar subiu, foi muito difícil descobrir no relatório do Banco Central — são 58 páginas do relatório e balanço demonstrativo —, que, quando subiu, o Tesouro tinha um crédito com o Banco Central. Depois, o Banco Central passou esse crédito. Agora, surpreendentemente, quando deu prejuízo, o Tesouro emitiu títulos e deu ao Banco Central. Quando deu o sinal inverso, que o Banco Central tinha que vir e você liquidar os títulos, você não liquidou. Por isso que estou com 400 bilhões ali. Emiti títulos, a dívida subiu, dei ao Banco Central, quando o dólar valorizou… quando a moeda nacional valorizou. Quando ocorreu o inverso, eu creditei ao Tesouro, mas não liquidei os títulos. Então, de repente, eu passei, quando fizeram a operação, que foi neste ano, os depósitos do Tesouro de 270 bilhões para quatrocentos e tantos bilhões de reais, o que criou uma excrescência. Como é que eu tenho um volume desse recurso?

Além disso, eu estou, então, com um problema seríssimo. O que é? É um problema que já havia sido detectado, que eu falei para os senhores, no início dos anos 80. Eu tinha haveres com uma correção, obrigações com outra. Eu estou nessa situação hoje. O Banco Central usou uma série de critérios agora, como custo de amortização, preço justo do mercado, uma série de coisas que significa assim: alguns, eu contratei a condição, a remuneração no início; outros, eu faço a remuneração pela taxa de inflação; alguns poucos pelo dólar; e os depósitos em moeda estrangeira. os haveres em moeda estrangeira dependem da taxa de câmbio. Então, eu estou com uma anomalia total ali que não permite que eu tenha controle.

Ora, o que temos que fazer ali é o seguinte: reservas do Tesouro têm que figurar, no balanço do Banco Central, como um depósito do Tesouro em dólares, e do outro lado aplicações do Banco Central nas reservas. Ele fica assim: apliquei em títulos americanos 100 bilhões de dólares, há um depois do Tesouro de 100 bilhões de dólares em moeda nacional. Quando um sobe ou desce, eles se anulam, zeram as coisas. Porque nós temos que dar transparência, senão não é possível que a gente possa fazer algumas coisas.

Eu sei que meu tempo já passou, mas eu diria o seguinte: a questão das reservas. Por exemplo, estou com 213 bilhões, estou com 2, 3, 4 vezes acima dos grandes países industrializados do mundo, não tenho necessidade nenhuma. Se eu cortasse essas reservas pela metade, eu estaria com uma economia, mais ou menos, mínima de uns 9, 10 bilhões de dólares. Ora, 9, 10 bilhões de dólares é uma redução de despesa de 30 bilhões de reais, é um recurso para o Orçamento. Se eu, em vez de pagar essas taxas de juros elevadíssimas que eu estou pagando… porque taxas de juros em que eu tenha a inflação e IGP-DI igual a zero, se o dólar não alterar de preço, eu estou pagando, por aplicação de quem traz dólares, estou pagando 9%, puro. Quando valoriza a moeda aumenta. Ora, o mundo está pagando 1%; por que eu estou pagando 9? Se eu reduzo a remuneração média de 3% sobre 1 trilhão e 600, por aí, eu estou reduzindo a despesa de 50 bilhões de reais. Então, é uma coisa fantástica para a gente que precisa da remodelação de hospital, que precisa implantar o sistema de transporte urbano nas cidades, um programa habitacional amplo. Nós não temos recursos para isso.

O PAC Investimento no Orçamento é de 20 bilhões de reais. Imaginem o que são 20 milhões de reais. Não é nada, é 0.65 do PIB, menos de 1% do PIB. E eu tenho recursos assim. Agora, só vou conseguir realmente se eu conseguir dar transparência nessas questões, nas relações do Tesouro com o Banco Central, dizer que a partir de agora não posso mais subsidiar o Banco Central, que são as emissões e meio circulante a custo zero. Não pode, não tem sentido isso. E começar o Banco Central a abrir o jogo. Não posso dar títulos para o Banco Central fazer política monetária. Ele tem de fazer política monetária com títulos próprios para a gente saber quanto custa. Quando se colocou na Lei de Responsabilidade Fiscal que o Banco Central não pode emitir títulos, fazer política monetária. Ele vai ao Tesouro. Muita gente pensou que aquilo lá era restritivo ao Banco Central. Não era, não! Faz política monetária à vontade, põe a juros onde quiser, porque o Tesouro paga a conta, e não aparece para o Banco Central, aparece na conta do Tesouro. Foi isso. Ele tem de fazer política monetária com títulos próprios. Então, nós temos de fazer um reordenamento nisso aí.

E quanto à questão da taxa de juros que está ligada a tudo isso e à dívida externa, é o seguinte: vemos que sobre as taxas de juros que estamos praticando para atrair dólares diz-se que é por causa dos capitais de curto prazo. Ora, os capitais de curto prazo entram e saem, eles não dão base para as reservas brasileiras. Dizer que eu tenho taxas de juros internas altas ou que permitam a especulação cambial porque precisam dos dólares… Não! Não precisam dos dólares. Por quê? Porque o capital de curto prazo entra e sai rapidamente. E nesses últimos anos quando a especulação mundial e no Brasil se tornou algo incontrolável o que aconteceu? Em 2007 o volume de capitais de curto prazo que ingressou no Brasil foi 7 vezes maior do que o de 2004 e foi maior do que nos 8 anos de Plano Real. No ano de 2008 foi uma loucura, mais de 200 bilhões num único ano. Precisa desses dólares? Ora, precisa o quê? Eles entram e saem.

E outra coisa: é um capital volátil. Agora, não é um capital bobo, não. Quando a crise chegou, eles tinham deixado naquele ano de 2007 acho que em torno de 30 bilhões de dólares aqui. Mas os dados indicavam que os papéis que eles possuíam na Bolsa de Valores era mais ou menos da ordem de 350 bilhões de dólares, e só tinham o ingresso líquido de 30, que tinham ingressado no ano de 2007. Ele entra e sai, câmbio para baixo, coisa para cima. Pega os dados que são publicados pelo Banco Central sobre posição de investimentos e verifica. Agora, por exemplo, veio a crise e caiu um pouco… Já subiu. Com essas taxas de juros, você vai trazer o mundo para aplicar no Brasil. Agora, qual a base que eu tenho, real, para remunerar isso? A remuneração de capital qualquer que seja eu tenho uma base real que é o PIB. E o PIB tem de gerar o quê? Uma rentabilidade de capital para eu poder remunerar o capital qualquer que seja. Mas eu estou remunerando capital especulativo sem base no real, então a dívida vai subindo de forma assim, como está, e eu vou tentar comprimir o Orçamento e fazer os tais superávits primários para poder fazer com que o mercado mantenha a confiança. Se mantém a confiança, não pressiona o Governo. E não pressionando o Governo… porque se o Governo mantiver taxas de juros altas… liberdade de movimentação.

O que dá estabilidade às reservas? Investimentos diretos. Parte deles é capital financeiro, mas é um investimento direto. Tem tido um saldo razoável. O que mais? Uma verba que é meio enigmática: empréstimos intercompanhia. É um tipo de investimento que não é investimento; é uma operação bancária que se alguém fizer aqui dentro é preso. E as empresas estrangeiras podem fazer. Então, você tem tido um volume crescente de empréstimo financeiro e tem também um volume razoável, não muito grande, em títulos públicos e muito pouco na bolsa. Então, o que garante as reservas é basicamente o investimento direto, ainda que seja capital financeiro, o que significa que eu não dependo de manter liberdade de movimentação de capitais, a não ser para apoio político.

Então, eu queria finalizar, embora esse assunto seja muito vasto e que se pode discutir mais outras coisas, dizendo que eu acho que nós precisamos chegar a uma fórmula que é a redução dos custos financeiros e controle sobre a autoridade monetária. Porque não é possível que você tenha a faculdade do Banco Central de receber títulos do Tesouro para aplicar… vender os títulos em condições de custos pré-fixados, assumindo reservas internacionais, de preços voláteis e sem nem registrar, porque os títulos podem ser entregues sem contrapartida financeira. Então, eu acho que a questão vai por aí. Verificar os recursos que estão indo para o Banco Central sem controle orçamentário, porque emissões não têm controle orçamentário, sem custo nenhum e sem a remuneração do meio circulante e essas outras relações, as relações interfinanceiras Tesouro/Banco Central. Com isso podemos reduzir bastante o custo da dívida pública e podemos também colocar uma forma de racionalidade no fluxo de recursos externos, porque recursos externos não é importante para o País.

 

Consta do Acórdão 470/03[130], relato sobre as dificuldades enfrentadas pelo TCU para ter acesso às aplicações das Reservas Internacionais, tendo o BC impetrado mandado de segurança[131] alegando a questão do SIGILO BANCÁRIO de forma a impedir o TCU de ter acesso a tais informações.

Embora a expectativa do TCU, conforme constou do precitado Acórdão, fosse no sentido de que “ante as competências atribuídas ao Tribunal de Contas da União pela Carta Magna de 1998, resta ao STF apenas julgar o pleito, conferindo à lide interpretação conforme a Constituição Federal, qual seja, os dispositivos da Lei 4.595/64 não se aplicam ao TCU no exercício de suas funções jurisdicionais”, o Supremo decidiu favoravelmente ao Banco Central:

 

EMENTA Mandado de Segurança. Tribunal de Contas da União. Banco Central do Brasil. Operações financeiras. Sigilo.

  1. A Lei Complementar nº 105, de 10/1/01, não conferiu ao Tribunal de Contas da União poderes para determinar a quebra do sigilo bancário de dados constantes do Banco Central do Brasil. O legislador conferiu esses poderes ao Poder Judiciário (art. 3º), ao Poder Legislativo Federal (art. 4º), bem como às Comissões Parlamentares de Inquérito, após prévia aprovação do pedido pelo Plenário da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do plenário de suas respectivas comissões parlamentares de inquérito (§§ 1º e 2º do art. 4º). 2. Embora as atividades do TCU, por sua natureza, verificação de contas e até mesmo o julgamento das contas das pessoas enumeradas no artigo 71, II, da Constituição Federal, justifiquem a eventual quebra de sigilo, não houve essa determinação na lei específica que tratou do tema, não cabendo a interpretação extensiva, mormente porque há princípio constitucional que protege a intimidade e a vida privada, art. 5º, X, da Constituição Federal, no qual está inserida a garantia ao sigilo bancário. 3. Ordem concedida para afastar as determinações do acórdão nº 72/96 – TCU – 2ª Câmara (fl. 31), bem como as penalidades impostas ao impetrante no Acórdão nº 54/97 – TCU – Plenário.[132]

Relator: Ministro Menezes Direito

 

É importante destacar o fato de que, se nem o TCU pode ter acesso à destinação das reservas cambiais, como promover a transparência sobre o verdadeiro custo de se acumular tamanha quantidade de moeda estrangeira, por meio da emissão de títulos da dívida interna, sobre a qual incidem taxas de juros altíssimas?

Cabe mencionar trechos do Relatório do TCU correspondente ao Acórdão 470/03, enviado à CPI:

 

V – As operações da Área Externa

 

  1. As operações contempladas neste agrupamento contábil são, em sua maioria, conduzidas pelo Departamento de Operações das Reservas Internacionais – Depin.

 

  1. O Banco Central adota como diretriz contábil o ajustamento das operações da área externa pela taxa cambial vigente na data do balanço, utilizando as cotações de compra para o ajuste do ativo e de venda para o do passivo.

 

V.3. O Gerenciamento das Reservas Internacionais

 

  1. Vale ressaltar, que está destacado nesse mesmo voto existem dificuldades de se realizar uma avaliação objetiva do desempenho das aplicações: “Na ausência de uma definição institucional precisa com relação à administração das reservas internacionais, o diagnóstico atual do gerenciamento desses recursos revela a falta de uma contabilidade gerencial padronizada, prejudicando seriamente a mensuração adequada do desempenho das aplicações, resultando, finalmente, em baixo grau de transparência.”.

 

VII. A questão do Sigilo Bancário no STF

 

  1. Um fato relevante e que merece atenção, relacionado ao problema do sigilo bancário, diz respeito ao Mandado de Segurança nº 22801/DF, impetrado pelo Banco Central junto ao Supremo Tribunal Federal, em 18.04.1997, contra o Acórdão/TCU nº 054/97 – Plenário que determinou a apresentação de informações requisitadas em processo de fiscalização, bem como afastamento do Presidente do Banco Central, questionando a constitucionalidade do art. 44 da Lei 8.443/92 (fls. 222/225, Vol. 1). Exsurge do aludido Mandado o incidente de inconstitucionalidade ante a concessão de liminar, suspendendo a eficácia e a execução do decisum prolatado pelo TCU.

 

  1. Ocorre que após transcorridos mais de 5 (cinco) anos da concessão da liminar, até a presente data, não houve julgamento do mérito. Esta equipe entende que esta situação vem prejudicando os trabalhos de fiscalização que rotineiramente são desenvolvidos no Bacen e, por conseguinte, o julgamento das contas, de forma que a demora no julgamento do mencionado Mandado vem causando a inversão tumultuária do processo.

 

  1. Urge consignar que, ante as competências atribuídas ao Tribunal de Contas da União pela Carta Magna de 1998, resta ao STF apenas julgar o pleito, conferindo à lide interpretação conforme a Constituição Federal, qual seja, os dispositivos da Lei 4.595/64 não se aplicam ao TCU no exercício de suas funções jurisdicionais.

 

  1. Desta forma, entendemos que o caso requer a adoção de providências desta Corte de Contas, por intermédio da Consultoria Jurídica, com vistas a provocar o regular andamento do processo, impulsionando a ação por meio de instrumento eficaz disponível para o caso sub examine, alcançável, dentre outros meios, por reclamação (correição parcial).

 

Outra verificação procedida pelo TCU (Decisão 275/2001) demonstrou a existência de registros referentes a Reservas Internacionais classificados como “Extra-Caixa”:

 

3.De início, o Relatório traz considerações a respeito das dificuldades encontradas pela equipe encarregada da fiscalização para obter informações durante os trabalhos, o que foi atribuído, principalmente, ao instituto do sigilo bancário. Em seguida, registra a falta de consistência de algumas das informações prestadas pelo Bacen, que não dispunha “de controle automatizado com facilidades de recuperação de informações em tempo real, acesso a bancos de dados com informações das operações como remuneração, taxa de juros, custos envolvidos, rentabilidade, contas envolvidas, instituição financeira, entre outras informações gerenciais”.

 

4.Sobre as reservas cambiais classificadas no “Extra-Caixa”, esclarece-se que são compostas por contas que, devido a questões administrativas ou à característica das operações, necessitaram de um tratamento diferenciado por parte do Banco Central. São diferenciadas daquelas classificadas como “Caixa” pela origem (empréstimos concedidos), ou mesmo pela destinação (recursos para cumprimento de acordo da dívida externa, operações de aplicações de recursos em agências de bancos brasileiros no exterior).

 

A mesma Decisão do TCU mencionou a vinculação de parte do valor das reservas internacionais à aquisição das garantias colaterais do Plano Brady:

 

4.1.Assim, conforme o Relatório, há recursos registrados no “Extra-Caixa” vinculados a acordos da dívida externa brasileira (“Vinculado a Garantias Colaterais”) (…) destinação dos recursos provisionados na conta “Vinculado – Garantias Colaterais” para compor caução no BIS – Bank for International Settlements na Suíça. Os valores ali registrados chegaram a atingir o montante de US$ 3.200.000.000,00 em dezembro de 1993. Trata-se de provisão instituída com a finalidade de compra de títulos do tesouro americano para compor garantia relacionada ao acordo da dívida externa.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CAPÍTULO VI – CONCENTRAÇÃO DO PODER DECISÓRIO E FRAGILIDADE DOS CONTROLES EFETUADOS PELO TCU, CGU E SENADO FEDERAL

 

A CPI da Dívida Pública buscou verificar os controles que tem sido efetuados pelos órgãos que detêm atribuições legais de auditar o endividamento público – Tribunal de Contas da União, Controladoria Geral da União – bem como pelo Congresso Nacional e Senado Federal – tendo requerido informações ao Tribunal de Contas da União e à Controladoria Geral da União.

Conforme síntese descrita no presente capítulo, os controles do endividamento público encontram-se muito aquém do necessário, restando descumpridos dispositivos legais e até constitucionais, conforme breve resumo constante da presente análise preliminar.

Diante da relevância dos gastos com o endividamento público da União – que chegaram a consumir 36% do Orçamento da União Executado – tornam-se ainda mais graves as deficiências de controle detectadas, especialmente quando se verifica a falta de normativos que estabeleçam limites para o endividamento interno da União, em flagrante desacato à Constituição Federal.

Diante da enorme escassez de recursos para atender a carências sociais crônicas de grande parcela da população brasileira, a deficiência de controle do endividamento público constitui contundente prova de que muito há que avançar.

A seguir, breve resumo dos controles efetuados, conforme informação disponibilizada à CPI.

 

VI.1 – TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO

 

Ao Tribunal de Contas da União – TCU – foram requeridas as informações objeto dos Requerimentos Nº. 48/09, 58/09 e 68/09.

Conforme Requerimento Nº. 48/09, de autoria do deputado federal Virgílio Guimarães e presidente da CPI da Dívida Pública, foi solicitada relação dos relatórios de auditoria da dívida pública realizados por aquele órgão, bem como informação sobre a “existência de eventual avaliação do padrão de auditoria da dívida pública por parte de alguma entidade internacional, a exemplo da INTOSAI.

Em resposta, o TCU encaminhou à CPI o Aviso nº. 1435-GP/TCU, de 14 de dezembro de 2009, por meio do qual encaminhou quadro sintético sobre os trabalhos realizados e informou que os relatórios anuais elaborados anualmente contém tópico específico sobre a dívida pública. Esclareceu, adicionalmente, “que a Intosai (International Organization of Supreme Audit Institutions) – organização não governamental que congrega Entidades de Fiscalização Superiores de 193 países – não realiza avaliações do padrão de auditoria da dívida pública de seus países-membros e que inexistem avaliações por parte de outras entidades internacionais congêneres”.

O TCU encaminhou também à CPI o Aviso nº 1447, de 17.12.2009, em resposta ao Requerimento Nº. 58/09, de autoria do deputado federal Ivan Valente, no qual citou as principais normas constitucionais e infraconstitucionais que definem o marco regulamentar brasileiro, resumindo o conteúdo dos principais trabalhos relacionados ao endividamento público no período de 1990 a 2009[133].

Em relação à Dívida Interna, merecem destaque os alertas do TCU em relação à falta de regulamentação do art. 30, incisos I e II da Lei de Responsabilidade Fiscal[134], no que concerne aos limites globais para o montante da dívida consolidada da União e para o montante da dívida mobiliária federal, cuja preocupação é levantada pelo TCU em vários documentos:

  • Por meio do Aviso nº 1447, de 17.12.2009, o TCU destacou o seguinte:

Embora o Poder Executivo da União tenha encaminhado as propostas para as três esferas de governo, não foram fixados limites e condições para a União”, e, complementou: “a falta de normas que limitem a dívida pública da União sempre foi objeto de preocupação para esta Corte de Contas, tendo sido objeto de destaques especificamente encaminhados ao Congresso Nacional nos seguintes termos do item 9.5 do Acórdão nº 1.573/2006-Plenário referente ao Relatório de Gestão Fiscal da União do 3º quadrimestre de 2005, de relatoria do Ministro VALMIR CAMPELO:

9.5.1 aos Presidentes da República e do Congresso Nacional, em face do que estabelece art. 30 da Lei Complementar n. 101/2000, ressaltando os seguintes fatos preocupantes:

9.5.1.1 a Dívida Líquida do Setor Público atingiu ao final de 2005 o montante de 1,002 trilhão de reais;

9.5.1.2 o crescente endividamento cria a necessidade de geração de superávits primários cada vez maiores, cujos recursos, voltados ao pagamento de juros, deixam de ser aplicados em obras de infra-estrutura ou em políticas sociais, o que vem comprometendo o desenvolvimento nacional;

9.5.1.3 se encontram em tramitação no âmbito:

9.5.1.3.1 do Congresso Nacional, o Projeto de Lei n. 3.431/2000, que “estabelece limites para a dívida pública mobiliária federal”;

9.5.1.3.2 do Senado Federal, a Mensagem n. 154/2000, que cuida da “proposta de limites globais para o montante da dívida consolidada da União, de que trata o inciso I do art. 30 da Lei Complementar n. 101, de 4 de maio de 2000”;

9.5.1.4 a necessidade de legislação específica, prevista no art. 30 da LRF, que defina os limites de endividamento da União (grifou-se)”

  • No mesmo documento[135] o TCU, frisou a necessidade de fixar os limites exigidos pela LRF, bem como a necessidade de “controlar de perto” a dívida pública:

…permanece pendente a fixação de limite para a dívida consolidada e mobiliária da União, a primeira a cargo do Senado Federal e a segunda do Congresso Nacional” (…) “… a dívida pública, por vezes inevitável e necessária, deve ser controlada de perto, pois seu saldo é fluido, suscetível a alterações que, muitas vezes, são ocasionadas por variáveis que não são objetivamente apuráveis e controláveis. Considerando que a capacidade de tributar do Estado é limitada por imperativo constitucional, a elevação da dívida pública e a necessidade de pagamentos segundo o cronograma pactuado geram , no outro lado, redução de receita disponível para fazer frente a outras despesas necessárias ao funcionamento da máquina e ao desenvolvimento econômico e social da Nação. O comprometimento da receita fiscal  com o pagamento da dívida. Por representar passivo de prestações sucessivas numa trajetória de longo prazo é dado do regime financeiro público que demanda cuidado e atenção específicos.

Dentre as cópias dos trabalhos realizados pelo TCU enviados à CPI, destacaram-se os Acórdãos 1.573/2006 e 451/2009-Plenário nos quais foram consignados empecilhos enfrentados por aquela Corte para cumprir sua atribuição constitucional[136], conforme se depreende dos seguinte trecho:

…permitem identificar desafios enfrentados pela administração pública no controle das operações de crédito, cuja realização impacta diretamente na trajetória almejada para a dívida pública. O Acórdão nº 1.573/2006-Plenário determina a realização de estudos pela STN no sentido de dirimir, para esfera federal – e conseqüentemente para as demais esferas de governo -, um modelo de estruturação de contas contábeis mais preciso, cuja descrição espelhe de forma mais clara os novos conceitos de operações de crédito previstos no § 1º do art. 29 da LRF, com especial destaque para a contabilização das operações provenientes de assunção, reconhecimento e confissão de dívida que não impliquem ingresso de recursos orçamentários, como ocorre com os parcelamentos de débito preexistentes. Por sua vez, o Acórdão n º 451/009 reitera a determinação do primeiro, no sentido de fixar prazo para apresentação de cronograma para a definição das contas, assim como do sistema de transparência da dívida pública do país previsto nos artigos 31 e 32, §§ 4 da LRF e artigo 27 da Resolução do Senado Federal nº  43, de 2001, sistema este ainda pendente de implementação pelo Ministério da Fazenda.

Comunicou o TCU à CPI que os artigos 31 e 32 § 4º não têm sido cumpridos, na medida em que o sistema eletrônico exigido pela Lei de Responsabilidade Fiscal que deverá garantir transparência às contratações encontra-se pendente de implantação, o que tem sido acompanhado por recentes acórdãos daquela Corte:

“As auditorias do TCU têm buscado observar a transparência das contratações de operações de crédito por entes públicos, assim como verificar se tais entes têm observado a obrigatoriedade de autorização prévia para realização dessas operações por parte do Ministério da Fazenda, do BACEN e do Senado Federal. Os artigos 31 e 32, § 4º da Lei Complementar nº 101, de 2000, como dito, avançam no sentido de exigir a total transparência da dívida pública contraída pelos entes das três esferas de governo, por meio da institucionalização e manutenção de sistema eletrônico centralizado e atualizado das dívidas interna e externa, garantido amplo e irrestrito acesso ao público, inclusive por meios eletrônicos, dos encargos e condições de contratação e saldos atualizados e limites relativos às dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito e concessão de garantias. Porém, a implementação desse sistema permanece pendente, questão que vem sendo acompanhada pelo TCU conforme se observa do teor dos Acórdãos nº 1.573-20056 e 451/2009-Plenário e destacado no Voto do Relator ao relatar o TC que resultou no Acórdão nº 314/2009-Plenário.”.

“Outras ações relacionadas aos instrumentos facilitadores da gestão da dívida pública apontados na ISSAI 5440 podem ser encontradas nos Acórdãos nº 435/2009-1ª Câmara e 5403/2009-1ª Câmara, que reiteram determinações anteriores no sentido de que os demonstrativos sintético e analítico da dívida consolidada da União passem a ser elaborados a partir das informações do SIAFI, visto que as informações disponíveis no sistema de controle do BACEN não espelham todas as situações consideradas no conceito de operação de crédito e dívida pública definido pela Lei Complementar nº 101, 2000.”

 

Em relação ao acompanhamento dos gastos com a dívida interna pelo TCU, constou, do Relatório Prévio sobre as Contas do governo de 2001, análise do “Impacto da Dívida Pública Federal”, conforme item 2.8.2., colado a seguir:

 

 

 

 

Os dados expostos no precitado item 2.8.2, aparentam que os dispêndios com Juros e Encargos da Dívida estariam aquém dos dispêndios com Pessoal ou Previdência. Entretanto, tais dispêndios encontram-se traduzidos em grandezas distintas, tendo em vista que enquanto todos os demais gastos comparados pelo TCU, tanto na tabela como no gráfico acima, englobam a variação de preço neles embutidos (por exemplo, reajustes salariais decorrentes de inflação, atualização de tabelas dos serviços de saúde, atualização de benefícios previdenciários, etc), o valor dos “Juros e Encargos da Dívida” considera somente a parcela dos juros que supera o IGP-M[137]. Tal fato decorre de metodologia utilizada no Balanço Orçamentário da União, que considera como “Juros” somente a parcela que supera o IGP-M, e computa a atualização monetária da dívida pública juntamente com a rubrica “Amortização”.

Caso fosse considerado o montante efetivo dos juros nominais da dívida pública federal (DPF)[138], a despesa correspondente aos rendimentos pagos pelo Tesouro seria muito superior aos demais gastos com pessoal ou previdência.

Esse comparativo de gastos que constou do Relatório publicado em 2002, não aparece nos relatórios dos anos seguintes.

Podemos estimar o valor dos juros nominais tomando-se o estoque da dívida mobiliária federal interna[139] no início de cada ano, e aplicando-se o índice IGP-M. Desta forma, o gráfico seria o seguinte (Gráfico 23):

 

Gráfico 23 –  ESTIMATIVA DE JUROS NOMINAIS SOMANDO-SE O IGP-M

Dispêndio de várias áreas (R$ milhões correntes)

Fonte: Relatório Prévio sobre as Contas do governo de 2001, análise do “Impacto da Dívida Pública Federal”, item 2.8.2. Os juros nominais foram estimados aplicando-se o IGP-M ao estoque da dívida do início de cada ano, constante na Tabela 1, e somando-se os juros reais apresentados na publicação do TCU.

 

 

Tabela 14 – Dispêndio de várias áreas (R$ milhões correntes)

  1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001
Estoque inicial da Dívida (a)                           85.755                         133.942                         197.880                         290.970                         448.529                         527.526                         641.599
 

IGP-M (%) (b)

15,24 9,19 7,74 1,79 20,10 9,95 10,37
Atualização Monetária

(c = a x b)

                          13.068                           12.306                           15.314                             5.203                           90.163                           52.499                           66.549
Juros reais (d)                           16.873                           19.492                           21.033                           30.812                           45.356                           38.835                           52.816
Juros Nominais (c+d)                           29.941                           31.798                           36.347                           36.015                         135.519                           91.334                         119.365
Educação e Cultura                             9.373                             9.495                           10.428                           14.938                           16.160                           10.854                           11.915
Saúde e Saneamento                           14.782                           14.727                           17.986                           16.657                           19.250                           20.431                           23.867
Previdência e Assistência Sociais                           52.576                           63.957                           69.991                           81.169                           88.844                           97.849                         112.842
Pessoal                           37.889                           40.901                           44.530                           47.947                           51.571                           58.241                           65.449

Fonte: Relatório Prévio sobre as Contas do governo de 2001, análise do “Impacto da Dívida Pública Federal”, item 2.8.2. Os juros nominais foram estimados aplicando-se o IGP-M ao estoque da dívida do início de cada ano, constante na Tabela 1, somando-se os juros reais apresentados na publicação do TCU.

 

Verifica-se, portanto, que os gastos com juros estariam bem maiores, até ultrapassando todos os gastos sociais em 1999 e permanecendo próximo ao maior gasto social (Previdência e Assistência Social).

No documento remetido à CPI[140], referindo-se ao início do Plano Real, o TCU assinalou o forte crescimento da dívida mobiliária representada pelos títulos emitidos pelo Tesouro Nacional, que apresentaram um aumento de 42,7% em 1995: “Foram gastos para o pagamento dos títulos da dívida pública, vencidos ao longo de 1995, valores da ordem de R$ 100,2 bilhões, sendo R$ 89,7 bilhões a título do pagamento do principal e R$ 10,5 bilhões a título de encargos.”

Considerando que o montante da dívida mobiliária federal em janeiro de 1995 era de R$ 62 bilhões e a dívida externa nesse período estava em cerca de U$ 143 bilhões, o montante de pagamentos de principal e encargos indicados pelo TCU, da ordem de R$ 100,2 bilhões em 1995 recomendam a realização de profunda auditoria da dívida mobiliária, especialmente devido ao fato de que o volume de recursos correspondentes a todo o superávit primário produzido pelo país desde 1996, no montante de R$ 678,3 bilhões, foi destinado exclusivamente ao pagamento de parte dos juros da dívida, conforme informado à CPI pela Secretaria do Tesouro Nacional.[141]

A maioria dos trabalhos de auditoria elaborados pelo TCU sobre o endividamento público e disponibilizados à CPI, é relativa a aspectos do endividamento externo, tema tratado na Análise Preliminar Nº. 5 desta CPI. Sobre a dívida interna, destacam-se os trabalhos listados a seguir:

TC

e

Decisão/Acórdão

Objeto da Auditoria Critérios de Auditoria Utilizados

e

Aspectos Auditados

Principais Providências (recomendações ou determinações)
 TC nº 008.385/2000-7

 

AC-470/2003 TCU Plenário. Data da Sessão: 07/05/2003.

Aperfeiçoamento dos demonstrativos do BACEN. Exame dos demonstrativos contábeis do Banco Central do Brasil no exercício de 2001.

Avaliação dos resultados obtidos pelo Banco Central em confronto com as variáveis macroeconômicas e políticas que predominaram em 2001.

Determinação ao Banco Central para que adote providências com vistas a: realizar conciliações entre os registros contábeis da carteira de títulos públicos e os correspondentes valores divulgados pelo Banco à imprensa; e instituir e manter banco de dados com registro individual de cada operação realizada com recursos das reservas internacionais, sem exceção, contendo as informações necessárias para se calcular o resultado de cada operação e para avaliar os estoques a preços de custo e de mercado.
 TC nº 006.919/2003-3

 

AC-509/2004 TCU Plenário. Data da Sessão: 05/05/2004.

Demonstrações contábeis do Bacen. Detecção de algumas inconsistências no provisionamento de créditos e nos balancetes publicados em 2002. Regularidade na administração de riscos. Obediência aos deveres listados na Lei de Responsabilidade Fiscal. Auditoria de conformidade.

Exames nas demonstrações contábeis do BCB de junho e dezembro de 2002.

Determinação ao Banco Central do Brasil para que promova o acerto dos valores provisionados relativamente aos créditos a receber do Banco Nacional (R$ 1,53 bilhão, a menor), do Banco Bamerindus (R$ 69 milhões, a menor) e do Banco Econômico (R$ 40 milhões, a maior), instituições em liquidação extrajudicial.
 TC nº 018.988/2005-0

 

 

AC-415/2007 TCU Plenário. Data da Sessão: 21/3/2007.

Registro da Dívida Pública Federal no SIAFI. Levantamento de Auditoria na Secretaria do Tesouro Nacional e em outros órgãos e entidades com o objetivo de apurar o montante e a composição da dívida pública federal, bem como o fluxo de incorporação e desincorporação de ativos e passivos no demonstrativo da dívida consolidada do Relatório de Gestão Fiscal – RGF.

Averiguação do registro da Dívida Pública Federal no Siafi. Divergências entre os dados registrados no Siafi e os apresentados no Relatório de Gestão Fiscal.

Determinação à STN/MF para que, em 60 dias, faça a correção das diferenças apontadas no relatório e seus anexos para os passivos e ativos do quadro demonstrativo da dívida consolidada, constante do RGF, cotejando-os com os registros do Sistema Integrado de Administração Financeira – SIAFI.
 TC nº 026.695/2008-7

 

AC-435/2009  – TCU – 1ª Câmara. Sessão: 17/02/2009.

Monitoramento do Acórdão nº 415/2007 TCU Plenário. Monitoramento do Relatório de Gestão Fiscal – RGF.

Averiguação do registro da Dívida Pública Federal no Siafi.

Determinação à STN e a SFCI para que, no prazo de 90 dia, passem a utilizar os dados do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal – SIAFI para a elaboração do quadro demonstrativo da Dívida Consolidada Líquida do Governo Federal.
 TC nº 024.703/2008-1

 

AC-315/2009 TCU Plenário. Data da Sessão: 4/3/2009.

Registro em Separado de Juros e Encargo da Dívida. Levantamento Auditoria, realizado na Secretaria do Tesouro Nacional – STN –, com o objetivo original de verificar os critérios de enquadramento das operações especiais nos dispositivos das leis orçamentárias, quanto às fontes das ações refinanciamento da dívida pública mobiliária federal interna.

Enfoque nos critérios e na metodologia utilizados para enquadramento da operações de gestão da dívida pública mobiliária federal.

Determinação ao Ministério da Fazenda para que adote as providências necessárias para que os valores relativos ao refinanciamento da
dívida pública mobiliária interna sejam contabilizados no Siafi segregando-se, efetivamente, em
subelementos distintos da respectiva conta, as parcelas correspondentes a valor principal, correção
monetária e outros encargos.
 TC nº 026.703/2008-7

 

AC-451/2009 TCU Plenário. Data da Sessão: 18/3/2009.

Análise da Dívida Pública,
Garantias e Contragarantias da União.
Acompanhamento dos Relatórios de Gestão Fiscal referente ao 2ºQ de 2008.

Verificação da conformidade dos Relatórios de Gestão Fiscal do 2º Quadrimestre de 2008 com as normas legais pertinentes.

Determinação à STN para que, no prazo de 90 dias, apresente estudos e proposta de implantação de sistema informatizado para evidenciar o controle centralizado e atualizado, a cargo da União (Ministério da Fazenda), sobre as dívidas públicas interna e externa da União, dos Estados, do Distrito  Federal e dos Municípios.
 TC nº 026.695/2008-7

 

AC-5403/2009 – TCU – 1ª Câmara. Data da Sessão: 29/09/2009.

Monitoramento do Acórdão nº 435/2009 TCU Plenário. Verificação do cumprimento de determinação do TCU.

Averiguação do registro da Dívida Pública Federal no Siafi.

Reiteração de determinação à STN e à SFCI para que, a partir do RGF referente ao 1º Q de 2010, passem a utilizar em definitivo dados do SIAFI para a elaboração do quadro demonstrativo da Dívida Consolidada Líquida do Governo Federal.
 TC nº 026.703/2008-0

 

AC-2541/2009 TCU Plenário. Data da Sessão: 4/11/2009.

Relatórios de Getão Fiscal da LRF. Acompanhamento dos Relatórios de Gestão Fiscal. Verificação da conformidade dos Relatórios de Gestão Fiscal do 2º Quadrimestre de 2008 com as normas legais pertinentes.

Sistema Eletrônico Centralizado.

Fixação de prazo de 30 dias para a STN encaminhar ao TCU cronograma (ou plano de ação), com as ações detalhadas e respectivos prazos que o órgão entender necessários para a realização das etapas de planejamento, desenvolvimento e implantação do sistema eletrônico centralizado referido no item 9.5.2 do Acórdão nº 451/2009-Plenário.

 

Depreende-se, dos trabalhos mencionados, que o próprio TCU tem enfrentado dificuldades e limitações, tanto devido à falta de normatização – especialmente limites para a dívida pública federal – bem como devido ao descumprimento do disposto nos artigos 31 e 32, § 4º, da Lei de Responsabilidade, no que tange à implantação do sistema eletrônico exigido pela referida Lei, que deverá garantir transparência às contratações e operações relacionadas ao endividamento público.

A atual CPI da Dívida Pública pode atuar no sentido de exigir o cumprimento das referidas normas legais, recomendando ao próprio Legislativo que cumpra .

Do exame das decisões e acórdãos que foram enviados à CPI pelo TCU, relativos à dívida interna, constata-se que não foram realizadas auditorias para verificar a origem do estoque da dívida pública, ou seja, não se investigou a contrapartida da dívida mobiliária federal, que já ultrapassou a marca de R$ 2 trilhões em dezembro/2010.

Adicionalmente, não foram realizadas auditorias para levantar o montante dos rendimentos efetivamente pagos a título de juros da dívida mobiliária federal, sendo importante frisar que os dados mencionados nos acórdãos e decisões disponibilizados à CPI se basearam nos dados divulgados pelo Banco Central e Tesouro Nacional, que consideram apenas os juros chamados “reais” (que corresponde apenas à parcela que excede ao valor do IGP-M), ou os juros “nominais” (calculados com base na dívida líquida) , ou seja, nem um nem outro refletem o verdadeiro custo do endividamento. Cabe ressaltar que em vários acórdãos o TCU expediu determinações para que fossem segregados os valores pagos a título de principal, juros e encargos, o que ainda não foi devidamente atendido.

Também não foram localizados trabalhos de auditoria do TCU relativos às diversas operações de transformação, substituição e troca de dívida externa em dívida interna, e vice-versa.

Diante disso, é recomendável que a dívida interna seja submetida a completa auditoria, que deveria ser realizada conjuntamente com a auditoria da dívida externa, devido às inúmeras operações de transformação, substituição e troca de dívida externa em dívida interna, e vice-versa.

 

VI.2 – CONTROLADORIA GERAL DA UNIÃO

Por meio do Requerimento Nº. 48/09, de autoria do deputado federal Virgílio Guimarães e presidente da CPI da Dívida Pública, foi solicitada também à Controladoria Geral da União (CGU) a relação dos relatórios de auditoria da dívida pública correspondentes aos trabalhos realizados por aquele órgão, no período de 1989 a 2008, bem como a informação sobre a “existência de eventual avaliação do padrão de auditoria da dívida pública por parte de alguma entidade internacional”, a exemplo da INTOSAI.

Em resposta, a CGU enviou à CPI o Ofício 217/2010/GM/CGU-PR, datado de 07.01.2010, acompanhado da relação de trabalhos realizados por aquele órgão, referentes ao período de 2002 a 2009, esclarecendo que referido levantamento fora feito pela área técnica daquela Controladoria-Geral que “identificou auditorias realizadas com o objetivo de conhecer os mecanismos de gerenciamento da Dívida Pública Federal, de acompanhar a execução do Projeto de Fortalecimento do Gerenciamento Fiscal e Financeiro – PROGER, bem como emissão de opinião em processos de novação de dívidas do Fundo de Compensação de Variações Salariais – FCVS junto aos agentes financeiros”.

De fato, conforme tabela anexa ao Ofício enviado pela CGU à CPI, dos 15 trabalhos listados, a grande maioria (13) das auditorias relacionadas a endividamento público realizados pela CGU se restringiram a exame do cumprimento do PROGER. Tal projeto, no montante de US$ 8,88 milhões de dólares (conforme Resolução 35/2001 do Senado Federal), foi co-financiado pelo BIRD , conforme página do Ministério do Planejamento na internet[142]:

  1. Componente PPA/PROGER – Projeto de Assistência Técnica para o Gerenciamento Fiscal e Financeiro: Co-financiado pelo Banco Mundial – BIRD, o PPA/PROGER visa consolidar o modelo de gestão voltada para resultados, de modo a melhorar a transparência do gasto público, mantendo o foco no atendimento as prioridades da sociedade e a eliminação das ações nas quais os custos e benefícios não sejam compatíveis.

Dentre as auditorias listadas no anexo ao Ofício 217/2010/GM/CGU-PR, apenas duas são relativas ao endividamento interno, sendo uma relativa a processos de novação de dívidas de responsabilidade do Fundo de Compensação de Variações Salariais – FCVS, e outra referente a dívidas de responsabilidade do ex-território de Roraima, ambas objeto de Notas Técnicas.

De acordo com o artigo 74 da Constituição Federal, as competências do sistema de controle interno, do qual a CGU é parte, relativas ao endividamento público, são bastante amplas:

Art. 74 – Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle interno com a finalidade de:

I – avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual, a execução dos programas de governos e dos orçamentos da União;
II – comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado;

III – exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem como dos direitos e haveres da União;

IV – apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional.”

 

Por sua vez, consta do Regimento da Controladoria Geral da União, as competências daquele órgão, no que se refere ao controle do endividamento, ressaltando-se os seguintes dispositivos:

REGIMENTO DA CGU

Art. 26. À Secretaria Federal de Controle Interno – SFC compete:

(…)

XI – verificar a adoção de providências para recondução dos montantes das dívidas consolidada e mobiliária aos limites de que trata o art. 31 da Lei Complementar no 101, de 2000;

(…)

Art. 41. Além das competências estabelecidas no artigo anterior, compete à Coordenação-Geral de Auditoria da Área Fazendária – DEFAZ:

(…)

II – verificar, junto à Secretaria do Tesouro Nacional do Ministério da Fazenda, a adoção de providências para recondução dos montantes das dívidas consolidada e mobiliária aos limites de que trata o art. 31 da Lei Complementar no 101, de 2000

 

Os poucos trabalhos relacionados ao endividamento público realizados pela CGU e disponibilizados à CPI reforçam a necessidade de realização da ampla auditoria da dívida pública.

 

VI.3 – CONGRESSO NACIONAL

De acordo com a Constituição Federal, artigos 48 e 49, são atribuições do Congresso Nacional:

DAS ATRIBUIÇÕES DO CONGRESSO NACIONAL

Art. 48. Cabe ao Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República, não exigida esta para o especificado nos arts. 49, 51 e 52, dispor sobre todas as matérias de competência da União, especialmente sobre:

(...)

 II – plano plurianual, diretrizes orçamentárias, orçamento anual, operações de crédito, dívida pública e emissões de curso forçado;

 (…)

XIV – moeda, seus limites de emissão, e montante da dívida mobiliária federal.

(…)

Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:

IX – julgar anualmente as contas prestadas pelo Presidente da República e apreciar os relatórios sobre a execução dos planos de governo;

 

Até o momento não foi estabelecido o limite para o endividamento interno da União, o que constitui não apenas um desrespeito do Legislativo à Constituição Federal, mas também representa um limitador aos trabalhos do Tribunal de Contas da União, que fica sem parâmetro para questionar o preocupante crescimento exponencial do endividamento interno brasileiro.

A ausência de realização de procedimento mais amplo de auditoria da dívida pública constitui, do mesmo modo, uma omissão do Legislativo ao art. 71, inciso IV, da Carta Magna, tendo em vista sua obrigação constitucional de exercer o controle externo, com auxílio do TCU:

Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete:

(...)

IV – realizar, por iniciativa própria, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de Comissão técnica ou de inquérito, inspeções e auditorias de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, nas unidades administrativas dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, e demais entidades referidas no inciso II;

 

Por fim, cabe ressaltar que o Decreto 3.859, de 04.07.2001, que estabelece as características dos Títulos da Dívida Pública Mobiliária Federal interna, faculta ao Ministério da Fazenda decidir isoladamente, sem debate parlamentar ou social, as condições dos títulos, como juros e prazo. O Decreto ainda prevê que no caso das LFT`S,  a remuneração será a Taxa Selic, que é definida pelo Comitê de Política Monetária (COPOM), o que impede um controle efetivo do endividamento pelo Congresso Nacional, e mais amplamente, pela sociedade.

 

 

 

VI.4 – SENADO FEDERAL

A Constituição Federal estabelece, art. 52, inciso VI:

 

Seção IV

DO SENADO FEDERAL

 

Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:

(…)

V – autorizar operações externas de natureza financeira, de interesse da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios;

VI – fixar, por proposta do Presidente da República, limites globais para o montante da dívida consolidada da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

VII – dispor sobre limites globais e condições para as operações de crédito externo e interno da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de suas autarquias e demais entidades controladas pelo Poder Público federal;

VIII – dispor sobre limites e condições para a concessão de garantia da União em operações de crédito externo e interno;

IX – estabelecer limites globais e condições para o montante da dívida mobiliária dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

 

         Até o momento, foi fixado somente o limite para o endividamento dos Estados, DF e Municípios, restando pendente de fixação o limite para o endividamento da União.

 

Diante do exposto, depreende-se que os controles realizados não condizem com a relevância dos gastos com o endividamento público da União – que chegaram a consumir 36% do Orçamento da União Executado.

Adicionalmente, a CPI da Dívida precisa atuar no sentido de exigir o cumprimento da Constituição Federal, para que sejam editadas as normas que estabeleçam limites para o endividamento interno da União.

Além disso, não basta estabelecer limites para o estoque da dívida, se a única forma de manter a dívida dentro de tais limites for a destinação cada vez maior de recursos para o pagamento de juros e amortizações. Por isso, devem também ser estabelecidos limites para o fluxo de pagamentos da dívida.

Da mesma forma, a CPI deve diligenciar no sentido de exigir o cumprimento da LRF – artigos 31 e 32, § 4º – no que tange à implantação do sistema eletrônico exigido pela referida Lei, que deverá garantir transparência às contratações e operações relacionadas ao endividamento público.

Recomenda-se a instituição de comissão permanente de acompanhamento do endividamento público no Congresso Nacional, a fim de suprir os parlamentares de informações atualizadas, de forma permanente, a fim de que estes possam exercer sua função de controle externo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

VII – RESUMO DAS ILEGITIMIDADES DA DÍVIDA INTERNA

 

 

VII – RESUMO DAS ILEGITIMIDADES DA DÍVIDA INTERNA

Da análise preliminar realizada sobre a Dívida Interna brasileira, apesar das diversas limitações impostas ao trabalho, conforme antes mencionado, foram detectadas as seguintes ilegitimidades, cujas investigações devem ser aprofundadas, inclusive com vistas à apuração dos possíveis danos ao Patrimônio Público e aos Direitos Sociais:

– Falta de informação à CPI, por parte dos órgãos competentes, sobre os fluxos de pagamentos (juros e amortizações) e recebimentos (ingressos decorrentes da emissão de títulos) da dívida interna, e a relação desses fluxos com os saldos da dívida a cada ano, o que indica séria deficiência de controle interno sobre a dívida pública (ver item I);

– Falta de informação à CPI sobre os credores da dívida interna a cargo do Tesouro Nacional e respectiva distribuição de freqüência, o que também indica deficiência de controle interno sobre a dívida pública (ver item I);

– Denúncia de ilegalidade, formulada por procuradoras federais, referente à liberalização dos fluxos de capitais, por meio da qual surgiu importante parcela da dívida interna atual (ver item IV.5);

– Conflito entre o disposto no Decreto 3.088/1999 (que estabelece o Sistema de Metas de Inflação) e o disposto no Art. 3º, II, da Lei 4.595/1964, tendo em vista que o referido decreto elegeu as taxas de juros como sendo a principal política para o controle da inflação, eliminando, no exercício da política de regular o valor interno da moeda (inflação), a prevenção ou correção de depressões econômicas e outros desequilíbrios conjunturais previstos na citada Lei (ver item IV.6);

– As taxas de juros Selic são definidas pelos 8 (oito) membros do Copom com base em critérios não matemáticos, pois a decisão é tomada a partir de apresentações técnicas e discussões e “não decorrem da aplicação de uma fórmula que definiria qual deveria ser a decisão do Comitê sobre a meta da taxa Selic”, cabendo ressaltar ainda que os votos de seus membros não são divulgados.

– Os membros do Copom que definem as taxas de juros e demais autoridades do Banco Central realizam reuniões com “analistas independentes”, tendo a CPI apurado que estes constituem – em sua imensa maioria – representantes dos segmentos financeiros diretamente interessados, o que pode caracterizar conflito de interesses. Adicionalmente, a CPI constatou que a maior parte dessas autoridades foi trabalhar no setor financeiro privado após deixar o Banco Central (ver item IV.6);

– Ao mesmo tempo em que as autoridades monetárias defendem a elevação das taxas de juros sob a justificativa de controle inflacionário, as mesmas autoridades permitem grandes aumentos nos preços administrados (tarifas de energia, telefone, combustível, entre outros), que é um total contra-senso (ver item IV.7). Adicionalmente, os órgãos de defesa da livre concorrência não têm conseguido combater adequadamente os cartéis privados que também afetam a formação dos preços.

– Aumento excessivo do estoque da dívida dos estados com a União devido à escolha de índice IGP-DI, que se mostrou extremamente oneroso e volátil decorrente da inclusão da variação do câmbio em sua composição (ver item IV.5.10);

– Excessiva acumulação de reservas e conseqüente elevação acelerada do estoque do endividamento interno. A principal justificativa do governo para a compra de dólares tem sido a de evitar a valorização da moeda nacional, mas depoimentos à CPI mostram que essa justificativa não se sustenta (ver item V);

– O fato de o Banco Central manter elevadas reservas em dólares em seu ativo, e títulos da dívida interna em seu passivo representa enorme transferência de recursos do setor público para o setor financeiro privado, dado que o dólar vem se desvalorizando (ou seja, com rendimento negativo para o governo), enquanto o setor privado fica com os ativos em reais, e que rendem altas taxas de juros, o que tem provocado elevados prejuízos operacionais ao Banco Central, cujo custo é transferido ao Tesouro Nacional e arcado pela sociedade como um todo. Isso caracteriza violação do princípio republicano em sentido de adequado trato da coisa pública pelos agentes do Estado (ver item V);

– Quando o Tesouro Nacional paga a dívida, o Banco Central tem lançado títulos no mercado, sob a justificativa de conter o aumento da base monetária (por meio das “Operações de Mercado Aberto”), e não há nenhuma contrapartida financeira dessa dívida emitida pelo Banco Central (ver item V);

– Os títulos que o Banco Central lança no mercado (por meio das “Operações de Mercado Aberto”) representam dívida feita sem autorização legislativa, tendo em vista que a Lei Complementar 101/2000 proibiu a emissão de títulos pelo Banco Central. (ver item V);

– A Medida Provisória 435/2008, em flagrante violação ao Parágrafo Único do Art. 8º da Lei Complementar 101/2000, permitiu que cerca de R$ 50 bilhões de recursos legalmente vinculados a outras áreas específicas (Royalties do petróleo, FUNDAF, entre outras) pudessem ser destinados ao pagamento da dívida pública. Tal mecanismo foi perpetuado por dispositivo da Medida Provisória 450/2008, apesar da Constituição proibir a edição de MPs sobre matéria orçamentária.

– A Dívida interna tem subtraído recursos que deveriam se destinar ao atendimento das necessidades sociais prioritárias da sociedade, o que caracteriza desrespeito a fundamentos constitucionais da República Federativa do Brasil: a soberania (Art. 1º, I) e a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III).

– Ao subtrair vultosos recursos das áreas sociais, a dívida interna também representa violação de objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: a erradicação da pobreza (art. 3º, III) e, adicionalmente, representa a violação do próprio princípio republicano no sentido de adequado trato da coisa pública pelos agentes do Estado, violando ainda o disposto no artigo 6º. da Constituição Federal.

Conforme mostra a conclusão do Parecer jurídico da Dra. Flávia Piovesan, citado no Capítulo III desta Análise Preliminar:

 

“A elevada dotação orçamentária destinada ao pagamento da dívida pública constitui grave ofensa ao dever do Estado Brasileiro de implementar os direitos sociais consagrados pela ordem normativa internacional e constitucional. Tal pagamento simboliza afronta do Estado Brasileiro aos deveres assumidos no plano internacional e constitucional relativamente à implementação dos direitos sociais. Viola, ademais, a necessidade de assegurar a tais direitos absoluta prioridade, mediante a preservação de seu núcleo essencial (“minimum core obligation”), com a observância do princípio da aplicação progressiva dos direitos sociais, a vedar o retrocesso social. Afronta, ainda, o Estado Brasileiro a obrigação jurídica de investir o máximo dos recursos disponíveis para alcançar, progressivamente, a plena efetividade dos direitos econômicos, sociais e culturais – obrigação decorrente do Pacto Internacional de Direitos Econômicos Sociais e Culturais e do Protocolo de San Salvador em matéria de direitos sociais.

Concluí-se, portanto, que a execução do orçamento federal em 2008, sob o prisma da distribuição de recursos, caracteriza grave inconstitucionalidade, configurando, ainda, ilícito internacional, em violação direta aos dispositivos enunciados nos artigos 3o, III, 6o, 196, 198, 205 e 212   da Constituição Brasileira, bem como nos artigos 2o, 11, 12 e 13 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos Sociais e Culturais e nos artigos 1o, 10, 13 do Protocolo de San Salvador em matéria de direitos sociais, ambos ratificados pelo Estado Brasileiro.

 

– O setor financeiro tem sido altamente beneficiado com a política de endividamento brasileiro, enquanto a sociedade arca com a subtração de direitos sociais além da elevada carga tributária, a fim de garantir o cumprimento das metas de superávit primário e o pagamento dos elevados compromissos decorrentes do endividamento interno e externo.

 

– O valor inserido no Balanço Orçamentário da União a título de “JUROS e Encargos da Dívida” compreende somente a parcela dos JUROS que supera o valor correspondente à aplicação do IGP-M. A outra parte é alocada como amortização, distorcendo o volume efetivo das despesas correntes e de capital, conforme definições clássicas de contabilidade pública.

– Tal fato é extremamente relevante, pois quando são comparadas as despesas de Juros da Dívida com as demais despesas com Pessoal, Previdência, dentre outros, há uma grande distorção, pois tais dispêndios encontram-se traduzidos em grandezas distintas. Além do mais, esta prática aumenta o limite para a emissão de novos títulos (operações de crédito), pois infla o montante das despesas de capital, na chamada “Regra de Ouro”.

 

 

A principal conclusão do exame do endividamento interno do período leva à NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DA AUDITORIA DA DÍVIDA PREVISTA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988[143], tendo em vista a necessidade de elucidar os aspectos fundamentais do endividamento público que não puderam ser desvendados pela atual CPI, dado o exíguo prazo de seu funcionamento e as diversas limitações indicadas.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

VIII – CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

 

 

VIII – CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

Diante das ilegitimidades apontadas, é recomendável que investigações sejam aprofundadas, a fim de determinar práticas passíveis de ilegalidade, dano ao Patrimônio Público e respectiva responsabilização. As denúncias já apresentadas podem ser encaminhadas, pela Câmara dos Deputados, ao Ministério Público.

Outras sugestões foram apresentadas em depoimentos prestados à CPI pelo Presidente do Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro, Sr. Paulo Sérgio Souto, que traça um importante ponto de partida para a atuação do governo frente à dívida, e pelo economista Dércio Garcia Munhoz, que propôs a redução dos custos financeiros e o controle sobre a autoridade monetária.

Trechos do depoimento do Sr. Paulo Sérgio Souto:

Os Srs. poderiam me perguntar: mas, então, qual é a saída?

(…) Trata-se de mudar a política macroeconômica. Implicaria inicialmente restabelecer rígidos mecanismos de controle cambial, reduzir as taxas de administração da dívida e ampliar os investimentos públicos, além de promover, de fato, as reformas tributária e fiscal.

Em relação à dívida propriamente, o Parlamento brasileiro deve atender ao disposto no artigo 26, das Disposições Transitórias da Constituição Federal, que determina a realização da auditoria da dívida externa, fixando o prazo de uma ano após a promulgação da Constituição, e que jamais se realizou. Hoje, um trabalho dessa natureza implicaria um exame das próprias condições em que o endividamento interno atual é constituído.

Com relação à dívida externa, como exemplo, podemos nos referenciar no recente caso equatoriano, que provou com dados e documentos que sua dívida com os bancos privados internacionais era produto de juros sobre juros, e já havia sido paga várias vezes. Desta forma, o governo chamou os credores e anunciou que não pagaria mais de 35% de tal dívida. Se alguém exigisse mais, o Equador iria entrar com processos na Justiça contra tais credores, embasados nas provas da auditoria. Resultado: 91% dos credores aceitaram prontamente a proposta equatoriana.

Este precedente equatoriano foi de fundamental importância, para mostrar que é possível impor as conclusões de uma auditoria da dívida aos bancos privados e demais rentistas do mercado financeiro, que também são os credores da dívida interna brasileira.

Em relação à dívida interna brasileira, é preciso que esta Comissão tenha algumas informações básicas, em qualquer auditoria dessa natureza. Tenho conhecimento que já foram solicitadas aos órgãos competentes (Ministério da Fazenda e Banco Central), mas ainda não enviadas a essa CPI. Uma delas é o fluxo de recebimentos/pagamentos das dívidas interna e externa, com a demonstração do saldo final anual. Outra é o perfil dos credores da dívida interna, por tipo e tamanho, especificando-se os grandes e pequenos credores da dívida interna, inclusive aplicações bancárias, através dos Fundos de Investimento.

 

Trechos do depoimento do Prof. Dércio Garcia Munhoz:

“Então, eu queria finalizar, embora esse assunto seja muito vasto e que se pode discutir mais outras coisas, dizendo que eu acho que nós precisamos chegar a uma fórmula que é a redução dos custos financeiros e controle sobre a autoridade monetária. Porque não é possível que você tenha a faculdade do Banco Central de receber títulos do Tesouro para aplicar… vender os títulos em condições de custos pré-fixados, assumindo reservas internacionais, de preços voláteis e sem nem registrar, porque os títulos podem ser entregues sem contrapartida financeira. Então, eu acho que a questão vai por aí. Verificar os recursos que estão indo para o Banco Central sem controle orçamentário, porque emissões não têm controle orçamentário, sem custo nenhum e sem a remuneração do meio circulante e essas outras relações, as relações interfinanceiras Tesouro/Banco Central. Com isso podemos reduzir bastante o custo da dívida pública e podemos também colocar uma forma de racionalidade no fluxo de recursos externos, porque recursos externos não é importante para o País.

Agora, eu não posso ter como agora uma taxa de câmbio ultravalorizada, porque eu vou repetir o ciclo dos anos 90, que era de endividamento externo. E quando eu tenho endividamento externo crescente isso fragiliza o Governo, politicamente, e a Nação. Então, a política cambial não pode ser vista como algo fora do contexto, como se faz. A política cambial é um preço. Se é um preço, as empresas exportadoras e importadoras têm que saber quanto custa quando compro carvão, petróleo ou trigo. E quando eu vender um sapato ou uma tonelada de soja, eu saber qual é a minha rentabilidade. Ou seja, eu vou depender do mercado externo. Então é o meu custo de produção. Não posso colocar no meio um componente que pode quebrar todo mundo, como está quebrando, porque o câmbio está 1.60 e todo mundo fica festejando, porque com isso a inflação fica baixa. De que vale um País parado com inflação baixa? Basta a gente olhar, e os dados estão aí, quanto que nós gastamos com o FAT. É importante o FAT? É importante, mas gastamos 2 vezes e meia com o FAT do que gastamos com educação, pura e simplesmente por quê? Porque a economia não tem como crescer. Salvo essa puxada que a China deu, a economia não tem como crescer.

Então, nós temos que rever essas questões aí para poder exatamente redirecionar a aplicação de recursos. E sempre que eu me debruço sobre os dados aí, o que eu descubro? Que você tem recurso demais para investir no Brasil. Agora, eles estão mal alocados, eles estão centrados. E não é uma questão ideológica, a questão é simples; a renda do salário é gasta… em torno de 92% é gasta. Aciona a renda do trabalho, aciona a economia, cria emprego, as empresas ganham dinheiro, investem etc.. E a renda financeira ela tem uma propensão a gasto praticamente zero. Ninguém viu o Setúbal, do Itaú, depois que aumentou lucro, no mercado comprando coisas; ou o Presidente da PREVI alegre e falando: “Agora vou comprar…” Não, renda financeira, essas rendas, elas têm uma propensão praticamente zero. Sempre que eu realoco, como temos feito no Brasil, tirando renda do trabalho e botando diretamente como encargo financeiro ou subsidiando as coisas do Banco Central, que a gente não sabe bem como funciona, nós estamos segurando a economia real e o emprego, e aí temos que aumentar as verbas do salário desemprego.”

 

Adicionalmente, é recomendável verificar a possibilidade de enfrentar cada um dos aspectos a seguir:

 

Controle sobre os fluxos de capital:

– Revisão de todas as normas infra-legais que, violando a Lei 4.131/1962, estabeleceram a livre movimentação de capitais no Brasil;

– Criação de mecanismos de controle de capitais que inibam o ingresso de capitais voláteis, permitindo maior autonomia à política econômica e à soberania nacional na definição das taxas de juros

 

Redução das Taxas de Juros e Revisão do atual Regime de Metas de Inflação:

– Redução das Taxas de Juros brasileiras ao patamar médio praticado no mundo, próximo de zero;

– Revisão do Decreto 3.088/1999, que estabelece as “Metas de Inflação”, em respeito às demais variáveis previstas na Lei 4.595, que não são consideradas pelo referido decreto;

– Garantir a participação equitativa dos demais setores representativos da sociedade no processo de definição das taxas de juros;

– Criação de mecanismos de controle que garantam a imparcialidade das autoridades que definirão as taxas de juros, impedindo, por exemplo, que estas autoridades sejam egressas de instituições financeiras privadas, escolhendo-se pessoas comprometidas com o interesse público para tal função. Há que se prever, adicionalmente, uma longa quarentena de vários anos após sua participação no Copom, a fim de inibir a participação dessas autoridades em instituições financeiras privadas, evitando-se, assim, o conflito de interesses com o setor público;

– Revisão da indexação dos preços administrados, promovendo-se ampla redução dos mesmos, tendo em vista seu forte impacto na formação dos preços das empresas em geral, sua repercussão no processo inflacionário e, conseqüentemente, na elevação da taxa de juros Selic;

– Fortalecimento dos órgãos de defesa da concorrência;

 

Dívida dos Estados e demais esqueletos:

– Realização de Auditoria sobre a origem de todas as dívidas renegociadas pela União que aumentaram a dívida interna federal, principalmente com o objetivo de segregar o impacto dos juros no processo de formação dessas dívidas;

– Revisão do mecanismo de financiamento aplicado pela União à dívida dos estados e municípios, promovendo-se a alteração do índice de atualização monetária IGP-DI para o IPCA, e recalculando-se a evolução anterior da dívida dos últimos anos de acordo com esse índice e devolvendo-se aos entes federados os pagamentos feitos a maior;

 

Revisão da Política de Acumulação de Reservas Cambiais e o conseqüente Aumento da Dívida Interna:

– Revisão do Art. 2º da Lei 11.803/2008 (originária da Conversão da Medida Provisória 435), que permitiu que o Tesouro passasse a emitir, sem limite algum, títulos em favor do Banco Central, sem contrapartida financeira, simplesmente para “assegurar ao Banco Central do Brasil a manutenção de carteira de títulos da dívida pública em dimensões adequadas à execução da política monetária”;

– Revisão do Art. 11 da Lei 11.803/2008 e do Art. 13 da Lei 11.943/2009, que permitiram, em flagrante violação ao Parágrafo Único do Art. 8º da Lei Complementar 101/2000, que em 2008 cerca de R$ 50 bilhões de recursos legalmente vinculados a diversas áreas específicas fossem destinados ao pagamento da dívida pública. A revisão visa a evitar que esse desvio de recursos se repita no ano de 2009 e seguintes.

– Revisão da política de compra de dólares pelo Banco Central, recomendando-se que essa política seja implementada conjuntamente à instituição de controles sobre a entrada de capitais financeiros, condicionando-os à geração de empregos no país, distribuição de renda, inibindo-se a especulação financeira.

 

Priorização dos recursos para as áreas sociais:

 

– Revisão dos dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal que promovem a priorização da formação do superávit primário e o pagamento da dívida (conforme listado no item III)

– Criação da “Lei de Responsabilidade Social”, que obrigue os governos a priorizarem os investimentos nas áreas sociais e a preservação da vida humana em detrimento do pagamento da dívida financeira.

– O setor financeiro tem sido altamente beneficiado com a política de endividamento brasileiro, enquanto a sociedade arca com a subtração de direitos sociais além da elevada carga tributária, a fim de garantir o cumprimento das metas de superávit primário e o pagamento dos elevados compromissos decorrentes do endividamento interno e externo.

 

 

Necessidade de maior transparência na divulgação dos dados sobre o endividamento público, tanto sobre o estoque da dívida como fluxos de pagamentos de juros e amortizações.

 

 

– Mudanças na forma de divulgação dos dados pelo governo, considerando-se a totalidade dos juros – e não somente os “juros reais”, que ultrapassam o IGP-M – e explicitando-se a metodologia utilizada para tais dados.

 

– Divulgação do estoque efetivo da dívida interna, sem a exclusão das chamadas “Operações Compromissadas”, ou dos títulos do Tesouro em poder do Banco Central, dado que é sobre todo o estoque efetivo que o Governo Federal – ou seja, a população brasileira – paga juros e amortizações.

 

 

Necessidade de maior controle sobre o endividamento

 

A legislação atual (Decreto 3.859, de 04.07.2001) permite que o Ministério da Fazenda decida, isoladamente, sem debate parlamentar ou social, sobre a quantidade e as condições dos títulos emitidos, como juros e prazo. Portanto, esta legislação deve ser alterada, no sentido de ampliar a participação social sobre tais decisões. Os órgãos fiscalizadores (TCU, CGU, Senado e Congresso) devem ampliar seus instrumentos de fiscalização sobre a dívida, que consome a maior parcela do orçamento.

 

Além do mais, o Congresso e o Senado devem estabelecer os limites para a dívida, para os quais têm a prerrogativa, segundo a Constituição Federal e a Lei de Responsabilidade Fiscal.

 

 

 

 

AUDITORIA DA DÍVIDA

 

– Criação de uma Comissão Permanente de Auditoria da Dívida no Congresso Nacional, conforme proposto por integrantes da CPI da Dívida Pública durante os debates. Tal medida se justifica pelo fato de que a dívida tem sido permanente e os órgãos de controle demonstraram grande fragilidade no trato do tema, conforme detalhado no item das limitações da presente análise preliminar.

A principal conclusão do exame do endividamento interno do período leva à NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DA AUDITORIA DA DÍVIDA PREVISTA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988[144], tendo em vista a necessidade de elucidar os aspectos fundamentais do endividamento público que não puderam ser desvendados pela atual CPI, dado o exíguo prazo de seu funcionamento e as diversas limitações indicadas.

 

Diante das ilegitimidades apontadas, é recomendável que investigações sejam aprofundadas, a fim de determinar práticas passíveis de ilegalidade e respectiva responsabilização. As denúncias já apresentadas podem ser encaminhadas, pela Câmara dos Deputados, ao Ministério Público.

 

Brasília, 26 de março de 2010

 

 

Maria Lucia Fattorelli Carneiro

Auditora Fiscal da Receita Federal do Brasil

Requisitada para Assessorar a CPI da Dívida Pública

 

 

 

Aldo Olmos Molina Júnior

Auditor Interno da Caixa Econômica Federal

Requisitado para Assessorar a CPI da Dívida Pública

 

 

[1] Tabela dos Fatores Condicionantes do Crescimento da Dívida do Setor Público elaborada pela Secretaria do Tesouro nacional e fornecida à CPI mediante Aviso n º  342/MF, de 28.09.2009

[2] Artigo 2º da MP 435 de 26.06.2008, que promoveu alteração nos artigos 1º e 3º da Lei 10.179/2001

[3] Esse ganho é calculado multiplicando-se a desvalorização do dólar frente ao real (1,36) pela taxa de juros média praticada no período (1,1)

[4] Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal

[5] Requerimento de Informações Nº 9/09, reiterado por meio de diversos Ofícios, a exemplo do Ofício 160/10-P, de 01.02.2010, letra “c” que solicitou expressamente “informar os valores dos JUROS efetivamente pagos pelo regime de Caixa em cada ano (juros reais e inflação), não respondido até o momento”.

[6] Conforme o “Manual de Estatísticas Fiscais” do Banco Central (pág 10), “No conceito primário, as Necessidades de Financiamento correspondem ao componente não financeiro do resultado fiscal do setor público. O cálculo se dá excluindo do resultado nominal os juros nominais apropriados por competência, incidentes sobre a Dívida Líquida”. Documento disponível em http://www.bcb.gov.br/ftp/infecon/Estatisticasfiscais.pdf

[7] Aviso nº 1447, de 17.12.2009

[8] Aviso nº 1447, de 17.12.2009

[9] Enviado à CPI com o Aviso Nº. 324/MF, de 28 de setembro de 2009.

[10] Ofício 841.1/2009-BCB-Secre, de 13/10/2009 e Ofício 0937/2009-BCB/Secre, de 13/11/2009.

[11] Documento de 18/01/2010, assinado pelo Subsecretário do Tesouro Nacional, Liscio Fabio de Brasil Camargo.

[12] Por meio do Ofício 144/2009-P, de 17 de dezembro de 2009.

[13] Enviada juntamente com Aviso nº 323/MF, de 28/09/2009 e Ofício 789/2009-BCB-Secre, de 25/11/2009

[14] Enviada à CPI por meio do Aviso nº. 372/MF, de 15/10/2009

[15] Enviada à CPI com o Aviso nº. 323/MF, de 28/09/2009 e Ofício 789/2009-BCB-Secre.

[16] Os principais conceitos de dívida pública divulgados no Brasil são os seguintes:

  • Dívida Pública Federal (DPF): engloba a dívida mobiliária e contratual, interna e externa, de responsabilidade do Tesouro Nacional. Atualmente, o valor da dívida contratual é insignificante se comparado com a dívida mobiliária.
  • Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG): esse conceito é divulgado mensalmente pelo BACEN, na Nota para a Imprensa – Política fiscal. Recentemente houve alteração na metodologia de apuração desse conceito, que passou a excluir a carteira de títulos do Tesouro em posse do Banco Central e, em troca, passou a incluir o passivo de Operações Compromissadas do Banco Central. Com essa alteração, o conceito deixou, na prática, de refletir a abrangência exata do Governo Geral, de modo que a DBGG perde sua comparabilidade com os dados de outros países (o conceito de Governo Geral é o mais utilizado internacionalmente).
  • Dívida Líquida do Setor Público (DLSP): é o conceito mais utilizado no Brasil quando se avalia a sustentabilidade da dívida, embora tal conceito não seja utilizado por outros países, devido às distorções que pode provocar. A DLSP abrange passivos e ativos do setor público não financeiro mais o Banco Central. Dentre os ativos destacam-se o FAT, os créditos concedidos às instituições financeiras oficiais e as Reservas Internacionais; no passivo os itens mais relevantes são a Dívida Pública Federal e as Operações Compromissadas do BACEN.

[17] A “rolagem” da dívida corresponde à parcela das amortizações que é paga mediante a emissão de novos títulos.

[18] Lei Complementar nº. 101, de 04.05.2000, denominada de Lei de Responsabilidade Fiscal

[19] Requerimento de Informações Nº 9/09, reiterado por meio de diversos Ofícios, a exemplo do Ofício 160/10-P, de 01.02.2010, letra “c” que solicitou expressamente “informar os valores dos JUROS efetivamente pagos pelo regime de Caixa em cada ano (juros reais e inflação), não respondido até o momento”.

[20] Conforme o “Manual de Estatísticas Fiscais” do Banco Central (pág 10), “No conceito primário, as Necessidades de Financiamento correspondem ao componente não financeiro do resultado fiscal do setor público. O cálculo se dá excluindo do resultado nominal os juros nominais apropriados por competência, incidentes sobre a Dívida Líquida”. Documento disponível em http://www.bcb.gov.br/ftp/infecon/Estatisticasfiscais.pdf

[21] A Medida Provisória que amparou estas operações, continuou sendo reeditada em função de outras disposições. Sua última reedição se deu sob o número 2.185-35, de 24.8.2001.

[22] Para refinanciar a dívida dos estados foram emitidos títulos públicos (Letras Financeiras do Tesouro – séries A e B – LFT-A e LFT-B, e títulos da dívida securitizada) para a quitação das dívidas com os referidos credores. Para refinanciar a dívida dos municípios foram emitidos títulos denominados Letras Financeiras do Tesouro, série B – LFT-B.

[23] Nota Técnica Demab-2009/004, de 08.10.2009, enviada à CPI da Dívida Pública com Ofício 841-1/2009-BCB-Secre, de 13.10.2009.

[24] Nota Técnica Demab-2009/001, de 23.09.2009, enviada à CPI da Dívida Pública com Ofício 789/2009-BCB-Secre, de 25.09.2009 e Aviso 323/MF, de 28.09.2009.

[25] Nota Técnica Demab-2009/001, de 23.09.2009, enviada à CPI da Dívida Pública com Ofício 789/2009-BCB-Secre, de 25.09.2009 e Aviso 323/MF, de 28.09.2009.

[26] Art. 2º. da MP-435, que promoveu alteração nos artigos 1º. e 3º. da Lei  10.179/2001

[27] Conforme Notas para a Imprensa de Política Fiscal, do Banco Central do Brasil, disponível em http://www.bcb.gov.br/?ECOIMPOLFISC

[28] De acordo com a definição geral, os juros nominais correspondem ao rendimento pago pelos títulos da dívida pública, englobando tanto a parcela da atualização monetária, como a parcela que ultrapassa tal atualização, chamada de “juros reais”.

[29] Tabela enviada à CPI mediante Aviso n º  324/MF, de 28.09.2009

[30] Resultado do Tesouro em agosto/95

[31] MANUAL TÉCNICO DE CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PÚBLICO – Volume II – Manual de Despesa Orçamentária. Aplicado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios. Válido para o exercício de 2009 (Portaria Conjunta STN/SOF nº 3, de 2008) – Página 45

 

[32] Dados divulgados segundo a metodologia adotada no Balanço Orçamentário da União, que exclui dos juros a parcela do IGP-M – Item 2.8.2 do Relatório do TCU de 2002.

[33] Requerimento de Informações Nº 9/09, reiterado por meio de diversos Ofícios, a exemplo do Ofício 160/10-P, de 01.02.2010, letra “c” que solicitou expressamente “informar os valores dos JUROS efetivamente pagos pelo regime de Caixa em cada ano (juros reais e inflação), não respondido até o momento”.

[34] Conforme o “Manual de Estatísticas Fiscais” do Banco Central (pág 10), “No conceito primário, as Necessidades de Financiamento correspondem ao componente não financeiro do resultado fiscal do setor público. O cálculo se dá excluindo do resultado nominal os juros nominais apropriados por competência, incidentes sobre a Dívida Líquida”. Documento disponível em http://www.bcb.gov.br/ftp/infecon/Estatisticasfiscais.pdf

[35] O grande volume de cálculos necessários para o estudo objeto do presente item contou com a colaboração do voluntário Luiz Cordioli.

 

[36] Tabela em formato Excel, disponível na página http://www.stn.fazenda.gov.br/divida_publica/leiloes/downloads/resultados/banco_de_dados.xls

[37] Tabela em formato Excel, disponível na página http://www.stn.fazenda.gov.br/divida_publica/leiloes/downloads/resultados/banco_de_dados.xls

[38] A inflação do período, medida pelo IPCA, foi de 89,95%.

[39] Fonte: Ipeadata. Considerou-se a taxa de juros Overnight / Selic, cuja fonte é o Banco Central do Brasil, Boletim, Seção mercado financeiro e de capitais (BCB Boletim/M. Finan.).

[40] Considerou-se o estoque divulgado no Quadro 11 da Nota para a Imprensa “Mercado Aberto”, do Banco Central, disponível em http://www.bcb.gov.br/htms/infecon/demab/ma201001/NImprensa.zip , excluindo-se as Operações de Mercado Aberto.

[41] Esse é mais um dado conservador da presente estimativa, ou seja, considerou-se somente o estoque inicial como base para o cálculo, sem computar as novas emissões ocorridas durante o ano.

[42] Aplicado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios

Válido para o exercício de 2009 (Portaria Conjunta STN/SOF nº 3, de 2008)

 

[43] Aplicado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a partir da elaboração e execução da lei orçamentária de 2009. 1ª Edição. Portaria Conjunta STN/SOF nº 3, de 2008.

[44] Art. 8º. da Resolução CFC nº. 750-93, ato anterior ao Plano Real

[45] Lei 9.249, de 26.12.1995

  Art. 4º Fica revogada a correção monetária das demonstrações financeiras de que tratam a Lei nº 7.799, de 10 de julho de 1989, e o art. 1º da Lei nº 8.200, de 28 de junho de 1991.

        Parágrafo único. Fica vedada a utilização de qualquer sistema de correção monetária de demonstrações financeiras, inclusive para fins societários.

(…)

Art. 17. Para os fins de apuração do ganho de capital, as pessoas físicas e as pessoas jurídicas não tributadas com base no lucro real observarão os seguintes procedimentos:

        I – tratando-se de bens e direitos cuja aquisição tenha ocorrido até o final de 1995, o custo de aquisição poderá ser corrigido monetariamente até 31 de dezembro desse ano, tomando-se por base o valor da UFIR vigente em 1º de janeiro de 1996, não se lhe aplicando qualquer correção monetária a partir dessa data;

        II – tratando-se de bens e direitos adquiridos após 31 de dezembro de 1995, ao custo de aquisição dos bens e direitos não será atribuída qualquer correção monetária.

 

[46] Lei Complementar 101/2000

[47] Dívida Refinanciada corresponde à dívida “rolada”, ou seja, a parcela da dívida vencida no ano e paga mediante a emissão de novos títulos públicos.

[48] Dispositivo da LDO de cada ano, que trata do LIMITE para atualização da Dívida Mobiliária refinanciada da União: Lei nº 10.266, de 24.07.2001, LDO 2002, IGP – Art. 49; Lei nº 10.524, de 25.07.2002, LDO 2003, Art. 68; Lei nº 10.707, de 30.07.2003, LDO 2004, IGP – Art. 73; Lei nº 10.934, de 11.08.2004, LDO 2005, IGP – Art. 76; Lei nº 11.178, de 20.09.2005, LDO 2006, IGP – Art. 80; Lei nº 11.439, de 29.12.2006, LDO 2007, IGP – Art. 80; Lei nº 11.514, de 13.08.2007, LDO 2008, IGP Art. 76; Lei nº 11.768, de 14.08.2008, LDO 2009, IGP – Art. 73, Lei nº 12.017, de 12 de Agosto de 2009, LDO 2010, IGP – Art. 72.

[49] Memorando enviado por meio do Aviso 324/MF, de 28 de setembro de 2009, assinado pelo Ministro da Fazenda Guido Mântega.

[50] Ofício 148/09-P, de 29/12/2009, assinado pelo Presidente da CPI da Dívida Pública, Dep. Virgílio Guimarães.

[51] Nota STN/CODIV/Nº. 55/2010, enviada à CPI com Aviso Nº 29, de 22/01/2010.

[52] http://www.tesouro.fazenda.gov.br/tesouro_direto/rentabilidade.asp

[53] Aplicado à União e aos Estados, Distrito Federal e Municípios, Válido para o exercício de 2010

(Portaria STN nº 462, de 2009), 2ª edição, disponível na página do Tesouro Nacional: http://www.stn.gov.br/legislacao/download/contabilidade/MDF_VolumeII_2edicao.pdf

 

[54] A interpretação utilizada pelo Banco Central é de que o valor do rendimento dos títulos é separado entre “Atualização Monetária” e “Juros”, sendo considerada como “Atualização Monetária” a parcela correspondente ao rendimento correspondente ao índice IGP-M e os “Juros” o rendimento que supera o referido índice. Conforme regra inserida no Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público, essa parcela de “Atualização Monetária” está sendo informada juntamente com as “Amortizações” e não com os Juros. Tal fato tem implicações em relação ao cumprimento da Constituição Federal, que serão comentadas posteriormente, na presente Análise Preliminar.

[55] Serviço da dívida compreende pagamento de juros e amortizações

[56] Ver Análise Preliminar sobre a Dívida Externa

[57] As despesas estão subdivididas por função. No caso da função “Encargos Especiais”, esta foi desmembrada, entre 4 itens:

  • Juros e Amortizações da Dívida: representa a soma do Grupo de Natureza de Despesa (GND) 1 (Juros e Encargos da Dívida) com o GND 6 (Amortizações da Dívida), nas Sub-funções “Serviço da Dívida Externa” e “Serviço da Dívida Interna”.
  • Refinanciamento da Dívida: GND 6 (Amortizações da Dívida), nas Sub-funções “Refinanciamento da Dívida Externa” e “Refinanciamento da Dívida Interna”.
  • Transferências a Estados e Municípios: Modalidades de Aplicação 30 e 40.
  • Outros encargos especiais: todas as demais despesas da Função “Encargos Especiais”

[58] http://www.stn.fazenda.gov.br/contabilidade_governamental/execucao_orcamentaria_do_GF/Despesa_Funcao.xls e

http://www.stn.fazenda.gov.br/contabilidade_governamental/execucao_orcamentaria_do_GF/Despesa_Grupo.xls

[59]  Adriano Benayon, doutor em economia, diplomata, advogado, consultor legislativo da Câmara Federal e do Senado, professor de economia política na Universidade de Brasília (UnB). Pedro Antônio Dourado de Rezende, matemático, professor de Ciência da Computação na UnB, Coordenador do Programa de Extensão em Criptografia e Segurança Computacional da UnB, ex-representante da sociedade civil no Comitê Gestor da Infra-estrutura de Chaves Públicas brasileira. O inteiro teor deste estudo se encontra na página http://extra.novojornal.com/fraude-a-constituicao-federal-jobim.pdf

[60] Fonte: IETS – Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade – http://www.iets.org.br/article.php3?id_article=915

[61] Professora doutora em Direito Constitucional e Direitos Humanos da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Professora de Direitos Humanos dos Programas de Pós Graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, da Pontifícia Universidade Católica do Paraná e da Universidade Pablo de Olavide (Sevilha, Espanha); visiting fellow do Human Rights Program da Harvard Law School (1995 e 2000), visiting fellow do Centre for Brazilian Studies da University of Oxford (2005), visiting fellow do Max Planck Institute for Comparative Public Law and International Law (Heidelberg – 2007 e 2008), sendo atualmente Humboldt Foundation Georg Forster Research Fellow no Max Planck Institute (Heidelberg – 2009-2011); membro do Conselho Nacional de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana e membro da UN High Level Task Force on the implementation of the right to development.

[62] Joaquín Herrera Flores, Direitos Humanos, Interculturalidade e Racionalidade de Resistência, mimeo, p.7.

[63] Norberto Bobbio, Era dos Direitos, trad. Carlos Nelson Coutinho, Rio de Janeiro, Campus, 1988.

[64] Hannah Arendt, As Origens do Totalitarismo, trad. Roberto Raposo, Rio de Janeiro, 1979. A respeito, ver também Celso Lafer, A Reconstrução dos Direitos Humanos: Um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt, Cia das Letras, São Paulo, 1988, p.134. No mesmo sentido, afirma Ignacy Sachs: “Não se insistirá nunca o bastante sobre o fato de que a ascensão dos direitos é fruto de lutas, que os direitos são conquistados, às vezes, com barricadas, em um processo histórico cheio de vicissitudes, por meio do qual as necessidades e as aspirações se articulam em reivindicações e em estandartes de luta antes de serem reconhecidos como direitos”. (Ignacy Sachs, Desenvolvimento, Direitos Humanos e Cidadania, In: Direitos Humanos no Século XXI, 1998, p.156). Para Allan Rosas: “O conceito de direitos humanos é sempre progressivo. (…) O debate a respeito do que são os direitos humanos e como devem ser definidos é parte e parcela de nossa história, de nosso passado e de nosso presente.” (Allan Rosas, So-Called Rights of the Third Generation, In: Asbjorn Eide, Catarina Krause e Allan Rosas, Economic, Social and Cultural Rights, Martinus Nijhoff Publishers, Dordrecht, Boston e Londres, 1995, p. 243).

 

[65] Asbjorn Eide, Social Rights, In: Rhona K.M. Smith e Christien van den Anker. The essentials of Human Rights, Londres, Hodder Arnold, 2005, p.234.

 

 

[66]. Hector Gros Espiell, Los derechos económicos, sociales y culturales en el sistema interamericano, San José, Libro Libre, 1986, p. 16-17.

[67] A respeito, consultar Human Development Report, UNDP, New York/Oxford, Oxford University Press, 2007.

 

[68] “O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais consagra três previsões que podem ser interpretadas no sentido de sustentar uma obrigação por parte dos Estados-partes ricos de prover assistência aos Estados-partes pobres, não dotados de recursos para satisfazer as obrigações decorrentes do Pacto. O artigo 2 (1) contempla a frase “individualmente ou através de assistência internacional e cooperação, especialmente econômica e técnica. A segunda é a previsão do artigo 11 (1), de acordo com a qual os Estados-partes concordam em adotar medidas apropriadas para assegurar a plena realização do direito à adequada condição de vida, reconhecendo para este efeito a importância da cooperação internacional baseada no livre consenso. Similarmente, no artigo 11 (2) os Estados-partes concordam em adotar “individualmente ou por meio de cooperação internacional medidas relevantes para assegurar o direito de estar livre da fome.” (Philip Alston e Gerard Quinn, The Nature and Scope of Staties Parties’ obligations under the ICESCR, 9 Human Rights Quartley 156, 1987, p.186, apud Henry Steiner e Philip Alston, International Human Rights in Context: Law, Politics and Morals, second edition, Oxford, Oxford University Press, 2000, p.1327).

 

[69] A expressão “aplicação progressiva” tem sido frequentemente mal interpretada. Em seu “General Comment n.03” (1990), a respeito da natureza das obrigações estatais concernentes ao artigo 2o, parágrafo 1o, o Comitê sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais afirmou que, se a expressão “realização progressiva” constitui um reconhecimento do fato de que a plena realização dos direitos sociais, econômicos e culturais não pode ser alcançada em um curto período de tempo, esta expressão deve ser interpretada à luz de seu objetivo central, que é estabelecer claras obrigações aos Estados-partes, no sentido de adotarem medidas, tão rapidamente quanto possível, para a realização destes direitos. (General Comment n.3, UN doc. E/1991/23).

 

[70] David Bilchitz, Poverty and Fundamental Rights: The Justification and Enforcement of Socio-Economic Rights, Oxford/NY, Oxford University Press, 2007, p.185.

 

[71] José Joaquim Gomes Canotilho,  Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Livraria Almedina, Coimbra, 1998.

[72] David Bilchitz, Poverty and Fundamental Rights: The Justification and Enforcement of Socio-Economic Rights, Oxford/NY, Oxford University Press, 2007, p.183-184.

 

[73] Asborn Eide, Economic, Social and Cultural Rights as Human Rights, In: Eide, A, C. Krause and A. Rosas (eds), Economic, Social and Cultural Rights: a textbook. 2nd revised edition, Dordrecht: Martinus Nijhoff Publishers, 2001, p.27

[74] Quanto ao direito à educação, dispõe o artigo 212 da Constituição: “A União aplicará, anualmente, nunca menos de 18, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios 25%, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e no desenvolvimento do ensino”. Quanto ao direito à saúde, os recursos orçamentários serão dispostos em conformidade com os critérios estabelecidos no artigo 198 da Constituição.

 

[75] José Joaquim Gomes Canotilho,  Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Livraria Almedina, Coimbra, 1998.

 

[76] A respeito da necessária aplicação progressiva dos direitos sociais e econômicos e da consequente cláusula da proibição do retrocesso social, ver artigo 2o , parágrafo 1o do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, bem como o General Comment n.03 do Comitê sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (General Comment n.3, UN doc. E/1991/23).

 

 

[77] Paulo Bonavides, Curso de Direito Constitucional, Ed. Malheiros, São Paulo, 2000.

[78] Dentre eles, destacam-se: a) a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, em 20 de julho de 1989; b) a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, em 28 de setembro de 1989; c) a Convenção sobre os Direitos da Criança, em 24 de setembro de 1990; d) o Pacto Internacional dos Direitos Ci­vis e Políticos, em 24 de janeiro de 1992; e) o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, em 24 de janeiro de 1992; f) a Convenção Americana de Direitos Humanos, em 25 de setembro de 1992; g) a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradi­car a Violência contra a Mulher, em 27 de novembro de 1995; h) o Protocolo à Convenção Americana referente à Abolição da Pena de Morte, em 13 de agosto de 1996; i) o Protocolo à Convenção Americana em matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Protocolo de San Salvador), em 21 de agosto de 1996; j) o Estatuto de Roma, que cria o Tribunal Penal Internacional, em 20 de junho de 2002; k) o Protocolo Facultativo à Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher, em 28 de junho de 2002; e l) os dois Protocolos Facultativos à Convenção sobre os Direitos da Criança, referentes ao envolvimento de crianças em conflitos armados e à venda de crianças e prostituição e pornografia infantis, em 24 de janeiro de 2004.  A estes avanços, soma-se o reconhecimento da jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos, em dezembro de 1998.

 

[79] Ver Auditoria Cidadã da Dívida, boletim n.19, www.divida-auditoriacidada.org.br

 

[80] Fonte: SIAFI – Orçamento Geral da União – Sistema Access da Câmara dos Deputados. Não inclui o “refinanciamento” da dívida, ou seja, o pagamento de amortizações realizado por meio da emissão de novos títulos.

 

[81] Ver E/CN.4/2005/WG.18/2, para 48.

[82] Em seu General Comment n.02, o Committee on Economic, Social and Cultural Rights observa: “international measures to deal with the debt crisis should take full account of the need to protect economic, social and cultural rights through, inter alia, international cooperation. In many situations, this might point to the need for major debt relief initiatives”.

 

[83] Ver E/CN.4/2005/WG.18/TF/3, para 63.

[84] Ver E/CN.4/2005/WG.18/TF/3, para 62.

[85] Aviso nº. 29/MF, de 22.01.2010, Nota STN/CODIV/Nº.55/2010 à qual foi anexado Quadro intitulado “Saldos Anuais e Fatores de Variação da Dívida Interna, em Poder do Público, no Período de 1990 a 2008”

[86] http://www.stn.fazenda.gov.br/servicos/faq/faq_dp_programas.asp

[87] http://www.cgu.gov.br/Publicacoes/PrestacaoContasPresidente/index.asp

[88] Tabela enviada à CPI mediante Aviso n º  324/MF, de 28.09.2009

[89] Conforme antes mencionado, os juros “nominais” divulgados pelo BC e pela STN são calculados sobre a dívida líquida do setor público e não sobre a dívida bruta, ou seja, tais dados encontram-se minimizados ante o montante dos juros nominais efetivos.

[90] É importante recordar o forte impacto social provocado pela abertura internacional e completa liberação para importação sem restrições, levando inúmeras indústrias nacionais à falência e milhares de brasileiros ao desemprego.

[91] Séries Temporais do Banco Central, série nº 3566 – Dívida externa registrada – Por setor – Privada – anual.

[92]  Conforme capítulo III da Análise Preliminar nº 5, sobre a dívida externa.

[93] Os atos legais mencionados previamente demonstram claramente essa transformação de dívida externa em dívida interna.

[94] “Plano Real: Estabilização Monetária e Desequilíbrio Externo”, pág 33. Texto para discussão nº 50, do Departamento de Economia da FGV. Janeiro de 1996.

[95] Idem, pág 34.

[96] CERQUEIRA, CERES AYRES – Dívida Externa Brasileira: Processo Negocial 1983-1996. Banco Central do Brasil, 1977, páginas 12 e 13

[97] Ofício 895/2009-BCB/Diret, de 3/11/2009, encaminhado pelo Ofício 896/2009-BCB/Secre, de 3/11/2009

[98] Metas de Inflação: uma avaliação do caso brasileiro. Março de 2005. Disponível em http://www.economia.ufpr.br/publica/textos/2005/Marcelo%20Curado_Oreiro.pdf

[99] Esse custo das atividades do Banco Central mencionado no texto é referente ao impacto financeiro provocado pelas altas taxas de juros no montante da dívida interna, causando o contínuo aumento das obrigações do Estado e o aumento da própria dívida, cujo custo é arcado pelo Tesouro Nacional e pela sociedade como um todo. Adicionalmente, é importante recordar que de acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal, o prejuízo operacional apurado pelo Banco Central (que podem resultar das escolhas de políticas monetária e cambial) deve ser integralmente coberto pelo Tesouro Nacional, ou seja, o ônus também recai sobre o conjunto da sociedade brasileira. Assim verifica-se que não existe “Independência do Banco Central” na hora deste repassar os custos à sociedade.

[100] A respeito da influencia do sistema financeiro brasileiro nas decisões de política monetária do Banco Central do Brasil ver Weber e Lírio (2003). WEBER, L. A; LIRIO, S. (2003). “O BC e o Jogo de Espelhos”. Carta Capital, N° 264, 29 de Outubro.

[101] Ofício 784/2009-BCB-Secre, de 25.09.2009 e Ofício 841.5-BCB/Secre, de 13.10.2009

[102] Pesquisas realizadas em páginas web na internet

[103] Ofício 895/2009-BCB/Diret, de 3/11/2009, encaminhado pelo Ofício 896/2009-BCB/Secre, de 3/11/2009

[104] Ofício 784/2009-BCB-Secre, de 25.09.2009, e Nota Técnica Depep-2009/228

[105] Ofício 114/09-P, de 19.11.2009

[106] Ofício 1007/2009-BCB-Secre, de 09.12.2009 e Ofício 999/2009-BCB-Diret

[107] Ofício 980.5/2009-BCB/Secre, de 27.11.2009, e Ofícios 969.1 e 969.2/2009-BCB/Diret, de 25.11.2009.

[108] Ofício 895/2009-BCB/Diret, de 3/11/2009, encaminhado pelo Ofício 896/2009-BCB/Secre, de 3/11/2009

[109] Ofício 969.1/2009-BCB/Diret, de 25/11/2009, encaminhado por meio do Ofício 980.5/2009-BCB/Secre, de 27/11/2009.

[110] http://www.tesouro.gov.br/servicos/glossario/glossario_d.asp

[111] http://www.tesouro.fazenda.gov.br/hp/downloads/dealers/Dealers_Primarios_1Sem10.pdf e http://www.tesouro.fazenda.gov.br/hp/downloads/dealers/Dealers_especialistas_1Sem10.pdf

[112] O índice de preços monitorados engloba: IPTU, taxa de água e esgoto, gás de bujão, gás encanado, energia elétrica residencial, ônibus urbano, ônibus intermunicipal, ônibus interestadual, ferry-boat, avião, metrô, navio, barco, táxi, trem, emplacamento e licença, pedágio, gasolina, álcool, óleo, óleo diesel, plano de saúde, cartório, jogos lotéricos, correios, telefone fixo, telefone público e telefone celular.

[113] Aviso nº 1447, de 17.12.2009

[114] Tabela enviada à CPI mediante Aviso n º  324/MF, de 28.09.2009

[115] Documento de 18/01/2010, assinado pelo Subsecretário do Tesouro Nacional, Liscio Fabio de Brasil Camargo.

[116] Por meio do Ofício 144/2009-P, de 17 de dezembro de 2009.

[117] Memorando nº 86/2010/COGER/GABIN/STN/MF-DF, de 2/3/2010, encaminhado com o Aviso 78/MF, de 8 de março de 2010.

[118] Nota STN/CODIV/Nº227/2010, de 5/3/2010, encaminhado com o Aviso 83/MF, de 10 de março de 2010.

[119] Ofício nº. 217/2010/GM/CGU-PR, de 07.01.2010

[120] Documento disponível em http://www.stn.gov.br/divida_publica/downloads/emissoes_d.pdf .

[121] Vidotto, Carlos Augusto (2000). Condições Sociais e Competitividade. Crise e Reestruturação de uma Estatal Financeira: O Banco do Brasil, do Cruzado ao Real. Revista de Economia da UFPR, n. 24.

[122] Conforme as Séries Temporais do Banco Central, no item Finanças Públicas – “Dívida Líquida do Setor Público – Saldos em R$ milhões – Governos estaduais e municipais”

[123] Conforme as Séries Temporais do Banco Central, no item Finanças Públicas – “Necessidades de Financiamento do Setor Público – com desvalorização cambial – Juros nominais – Governos estaduais e municipais – R$ (milhões)

[124] Enviado à CPI com o Aviso nº. 350/MF, de 08.10.2009.

[125] Documento disponível em http://www.stn.gov.br/divida_publica/downloads/emissoes_d.pdf .

[126] Decreto 95.886, de 29 de março de 1988, art. 1º., inciso III. Revogado em 25/04/1991, Decreto s/nº.

[127] Lei 8.031, de 12 de abril de 1990, art. 1º., inciso II.

[128] Lei 8.088, de 31 de outubro de 1990, art. 8º., parágrafo 1º.

[129] As principais rubricas afetadas pela Medida Provisória 435 foram os Royalties do Petróleo (cerca de R$ 20 bilhões) e o FUNDAF (Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização), que perdeu cerca de R$ 5 bilhões.

[130] TC 008,385/2000-7 – Relatório de Auditoria do TCU

[131] Mandado de Segurança nº 22801/DF, impetrado pelo Banco Central junto ao Supremo Tribunal Federal

[132] Mandado de Segurança nº 22801/DF, impetrado pelo Banco Central junto ao Supremo Tribunal Federal.

[133] O Requerimento 68 (Ofício 125/09-P) foi respondido pelo TCU em 04.02.2010, mediante Aviso nº. 68, por meio do qual foram enviadas cópias de partes dos Relatórios anuais do período de 1970 a 1990, não tendo sido informada a realização de auditorias específicas sobre o endividamento público no período.

[134] Lei Complementar no. 101/2001

[135] Aviso nº 1447, de 17.12.2009

[136] Constituição Federal, art. 71.

[137] Ver detalhamento dessa questão no item II.3 da presente Análise Preliminar.

[138] Cabe ressaltar que o valor dos “Juros Nominais” informado pelo Banco Central, nas tabelas disponibilizadas em sua página na internet, não são calculados sobre a dívida pública federal (DPF), mas sim sobre a “Dívida Líquida do Setor Público” (DLSP), conceito advindo de Metodologias do FMI (A Manual on Government Finance Statistics – 1986 e Government Finance Statistics Manual – 2001, conforme citado em http://www.bcb.gov.br/ftp/infecon/Estatisticasfiscais.pdf ), que deduz do montante da Dívida Pública Federal os ativos do setor público, a fim de verificar a sustentabilidade da dívida. Ou seja, a DLSP corresponde a um dado meramente estatístico e não reflete o montante da dívida que de fato terá que ser remunerada pelo Tesouro , correspondente à DPF.

[139] Valor obtido nas Séries Temporais do Banco Central, código 2213 – Dívida mobiliária (Saldos) – Títulos do Tesouro Nacional – Total emitido.

[140] Aviso no. 1447-GP/TCU, TC-027.218/2009-9, de 17 de dezembro de 2009.

[141] Tabela dos Fatores Condicionantes do Crescimento da Dívida do Setor Público elaborada pela Secretaria do Tesouro nacional e fornecida à CPI mediante Aviso n º  342/MF, de 28.09.2009

[142] http://www.planejamento.gov.br/ucp/conteudo/programas/programas.htm

 

[143] Embora a Constituição Federal preveja a auditoria da dívida externa, considerando os diversos episódios de transformação de dívida externa em interna e tendo em vista que grande parte da atual dívida “interna” encontra-se nas mãos de estrangeiros, o entendimento do dispositivo constitucional deve abranger tanto a dívida externa quanto a dívida interna.

[144] Embora a Constituição Federal preveja a auditoria da dívida externa, considerando os diversos episódios de transformação de dívida externa em interna e tendo em vista que grande parte da atual dívida “interna” encontra-se nas mãos de estrangeiros, o entendimento do dispositivo constitucional deve abranger tanto a dívida externa quanto a dívida interna.