Breve Análise da Marcha “Ocupa Brasília” de 24 de maio de 2017, do ponto de vista da Confederação dos Servidores Públicos do Brasil (CSPB)

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JOÃO DOMINGOS
Presidente da CSPB

Gostaria, de maneira muito objetiva, de analisar este que foi o maior manifesto da história de Brasília de todos os tempos e compartilhar desta análise com todos.

Me proponho a analisá-la sob três dimensões distintas.

Primeiro, sob o ato em si mesmo. A melhor definição é que ele superou todas as expectativas. O ato foi planejado pelas centrais para reunir o movimento social e sindical para se manifestarem contra as Reformas Trabalhista e Previdenciária e, por circunstâncias adjetivas, pelas eleições Diretas Já, dadas as consequências da hecatombe política e institucional ocorrida no Governo Temer uma semana antes do ato, que revelou atos e fatos que tornam o Governo Temer absolutamente incapaz, inviável, desacreditado, sem apoio institucional e parlamentar para governar o país.

É recomendável consultar a história dos grandes atos de mobilização popular ocorridos em Brasília ao longo de todos os tempos. Por exemplo, Constituinte de 1988, Diretas Já, Impeachment de Collor, Impeachment de Dilma. Nenhum desses, por maior importância histórica e conjuntural, nem de longe mobilizou a massa espontânea ou organizada ocorrida neste 24 de maio.

A má fé e a manipulação da imprensa comercial, assim como as instituições político-partidárias defensoras deste governo ilegítimo (ilegítimo nem tanto por ser oriundo de um processo de impeachment discutível, mas sim por propor e desenvolver uma pauta de reformas que significa uma fraude eleitoral) tiveram como consequência um evento que superou a mais otimista das expectativas.

A marcha “Ocupa Brasília” foi ousadamente organizada pelas Centrais Sindicais para reunir 90 mil pessoas. Estamos seguros hoje que mais de 200 mil pessoas ocuparam Brasília. Isso surpreendeu, de certa forma, aos próprios organizadores, mas, principalmente, às instituições que desacreditaram o poder de mobilização espontâneo do povo.

Em uma segunda dimensão, tenho a pretensão de assegurar que essa não foi mais uma mobilização exitosa no Brasil e em Brasília. Mas que isto foi um salto de qualidade do ponto de vista da dialética. O Brasil a partir desta marcha virou uma página da sua história e fecha uma ciclo de letargia em que se encontrava a sociedade desde o fim da Ditadura Militar, que durou de 1964 ao ano de 1987.

Este ato representa a percepção da sociedade brasileira de que só “o povo salva o povo”. Dito de outra forma, a sociedade entendeu que não deve esperar nenhum benefício deste Congresso Nacional, particularmente da Câmara dos Deputadas, que, sob a presidência do Deputado Rodrigo Maia, realiza a mais cruel das legislaturas naquela Casa, uma legislatura de vingança contra o povo, de destruição de todo o sistema de proteção social conquistado pela sociedade brasileira ao longo de mais de um século ao custo de lutas, suor, exílio, sangue, prisões, mortes, enfim, da luta social da classe trabalhadora.

Este momento, portanto, projeta despertar de uma aurora de reconquista do povo sob sua soberania, tendo como base indutora a mobilização e a luta social.

Uma terceira dimensão é analisar este ato a partir de seus resultados práticos e reais. Não cabe dúvida de que este ato colossal, gigantesco e plural foi uma reação da sociedade civil organizada, na medida em que estavam presentes massivamente as organizações sociais, os conselhos profissionais, as lideranças religiosas organizadas, as organizações de ações transversais, os desvalidos da sociedade, como os sem-teto, sem-terra, etc., certamente incentivados pela mobilização a partir das centrais sindicais.

Também é legítimo creditar ao movimento “Ocupa Brasília” ações e reações inesperadas. Ao mesmo tempo em que se realizava a marcha, ocorreram fatos absolutamente inesperados e improváveis, não fosse a força do povo batendo à porta dos palácios.

Por exemplo, em tempo real ao desenvolvimento da marcha, ocorria no Palácio do Planalto a decretação do fim do Governo Temer, quando se discutia apenas quem seria seu substituto na hipótese de uma eleição indireta em caso de renúncia ou de cassação de seu mandato.

Como efeito colateral, a justiça se movimentou decretando pedido de prisão de figuras de alto coturno da política nacional.

Porém, a reação mais significativa, mais dramática mais equivocada e mais surreal possível foi o Decreto Presidencial editado pelo Presidente da República a pedido do Presidente da Câmara Rodrigo Maia, estabelecendo o Estado de Exceção em Brasília, permitindo que as FORÇAS ARMADAS ocupem as ruas de Brasília, a capital federal, em nome de um ridícula manutenção da ordem pública no Distrito Federal, desde a data de hoje, 24 de maio, até 31 de maio do corrente ano.

Ora, cabem aqui algumas análises.

Senão vejamos. A função constitucional das Forças Armadas é a ação de defender o país em estado de guerra ou de grave crise institucional. Portanto, o Decreto do Governo equivale a decretar estado de sítio no Distrito Federal, por exemplo.

Algumas perguntas indispensáveis: terá o Governo decretado guerra contra o povo? Terá o Governo entendido que não são suficientes a repressão violentíssima e cotidiana da polícia federal parlamentar, da polícia militar, das bombas de efeito moral e lacrimogêneas lançadas sobre o povo, muitas vezes a partir de helicópteros, para impedir o acesso do povo à Casa do povo – o Congresso Nacional – ou será o ímpeto incontrolável do Governo de aplicar oportunisticamente golpes sobre golpes? Seria a intervenção para permitir que o Governo vote, sob as sombras de uma intervenção militar, as nefastas reformas previdenciária e trabalhista em um ambiente de “assepsia popular”, covardemente escondido do povo?

À guisa de conclusão, alguns alertas são necessários. A marcha “Ocupa Brasília” deste 24 de maio sem dúvida traduz uma vitória da mobilização popular sobre o julgo da tirania governamental, mas não é, nem de longe, motivo para regozijo final. A visão inocente e de boa fé pode levar à conclusão de que a luta se encerra com “Fora Temer”, já que isso será conseguido. Ledo engano.

A sociedade brasileira caiu na armadilha do “Fora Dilma”, sem analisar quem, por quê e a que propósitos substituiria o governo. Não podemos cair no mesmo golpe do “Fora Temer” com eleições indiretas. A eleição indireta, feita pelo Congresso Nacional que temos, com seu perfil ultra liberal, do ponto de vista econômico, ignorante do ponto de vista analítico, subserviente do ponto de vista partidário, oportunista do ponto de vista da ação parlamentar e servil do ponto de vista individual, salvo as honrosas exceções que não atingem um terço do Congresso Nacional, seria a gloriosa concretização do golpe dentro do golpe. Uma eleição indireta nestas condições poderá significar a oportunidade de o mercado substituir o gerente que colocou na Presidência da República, o intermediário que colocou na Presidência da República, pelo próprio patrão. Seria substituir um governo cambaleante, sem condições de entregar os compromissos feitos ao mercado, por alguém com força política para fazê-lo.

Alertamos, concluímos e sugerimos que a consigna da luta muda a partir de hoje. A luta continua sendo Diretas Já, porém com um novo ingrediente tão importante quanto a causa: GREVE GERAL POR DIRETAS JÁ!

Força e luta sempre.