CPI da Dívida – Análise Técnica Preliminar Nº 5 – Dívida Externa – Capítulo 1

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 CPI DA DÍVIDA PÚBLICA

ANÁLISE PRELIMINAR Nº 5

DÍVIDA EXTERNA BRASILEIRA

ÍNDICE

Apresentação

Introdução

  1. Objeto
  2. Metodologia
  3. Deficiências e limitações
  4. Objetivos

CAPÍTULO I – ORIGEM DAS NEGOCIAÇÕES DA DÍVIDA EXTERNA – PERÍODO DE 1970 A 1982

I.1 – ANTECEDENTES – Marco Legal – Resumo

I.1.1 – Atos Legais autorizativos de operações de crédito externo

I.1.2 – Formalidades legais – Contratos e Registros

I.2 – EVOLUÇÃO DO ENDIVIDAMENTO EXTERNO BRASILEIRO – PERÍODO 1970 A 1982

  1. 2.1 – CONJUNTURA

I.2.2. – ANÁLISE DA COMPOSIÇÃO DA DÍVIDA NO PERÍODO

I.2.2.1 – ANÁLISE ESTATÍSTICA

I.2.2.2 – ANÁLISE DA NATUREZA DA DÍVIDA EXTERNA – 1970-1982

I.2.2.3 – CONCLUSÕES SOBRE A NATUREZA DA DÍVIDA NO PERÍODO 1970-1982

I.3 – RELAÇÃO ENTRE O CRESCIMENTO DA DÍVIDA INTERNA NA DÉCADA DE 70, EM DECORRÊNCIA DA ACELERAÇÃO DO ENDIVIDAMENTO EXTERNO, E A VIABILIZAÇÃO DE GANHOS ESPECULATIVOS

I .4 – IMPACTO DO AUMENTO UNILATERAL DAS TAXAS DE JUROS

I .4.1 – CPI DA DÍVIDA DE 1983 – Relatório Dep. Sebastião Nery

I.4.2 – Comissão Especial do Senado Federal – Relatório Senador Fernando Henrique Cardoso

I.4.3 – Comissão Mista do Congresso Nacional – Relatório Senador Severo Gomes

I.4.4 – Comissão Mista do Congresso Nacional – Relatório Dep. Luiz Salomão

I .5 – OUTROS ASPECTOS RELEVANTES

I .5.1 – DESVALORIZAÇÃO DOS PRODUTOS NACIONAIS

I .5.2 – CO-RESPONSABILIDADE DOS CREDORES

I .6 – ARTICULAÇÃO DOS BANCOS PRIVADOS – FORMAÇÃO DO COMITÊ ASSESSOR

I.7 – ILEGITIMIDADES OBSERVADAS NO CAPÍTULO I

I . 8 – CONCLUSÃO e RECOMENDAÇÃO

CAPÍTULO II – RENEGOCIAÇÕES DA DÍVIDA EXTERNA – PERÍODO 1983-1992

APRESENTAÇÃO

II.1 – ANÁLISE DE ASPECTOS RELEVANTES DOS ACORDOS DE RENEGOCIAÇÃO DA DÍVIDA EXTERNA COM BANCOS COMERCIAIS

  1. 2 – INDÍCIOS DE ILEGALIDADES DOS REFINANCIAMENTOS DE 1983
  2. 3 – CONDIÇÕES PACTUADAS

II .4 – CLÁUSULAS ILEGÍTIMAS

II .5 – CONJUNTURA

II .6 – ASPECTOS RELEVANTES DOS ACORDOS PACTUADOS NA DÉCADA DE 80

II.6.1 – INTERFERÊNCIA EXPRESSA DO FMI

II.6.2 – BANCO CENTRAL ASSUME O PAPEL DE DEVEDOR NOS ACORDOS

II.6.3 – RELAÇÃO ENTRE A DISPONIBILIZAÇÃO DOS RECURSOS PELOS BANCOS PRIVADOS E A EXIGÊNCIA DOS PAGAMENTOS DOS COMPROMISSOS

II.6.4 – RELAÇÃO ENTRE PAGAMENTOS DIRETOS NO EXTERIOR, RECEBIMENTO DE DÍVIDAS PELO BANCO CENTRAL EM “CRUZEIROS” E AUMENTO DA INFLAÇÃO INTERNA

II.6.5 – FALTA DE TRANSPARÊNCIA

II.6.6 – TRANSFORMAÇÃO DE DÍVIDA PRIVADA EM DÍVIDA PÚBLICA

II.6.7 – TRANSFORMAÇÃO DE DÍVIDA EXTERNA EM DÍVIDA INTERNA

II.7 – SUCESSIVAS NEGOCIAÇÕES DA DÉCADA DE 80

II.7.1 – Fase II – 1984

II.7.2 – Fase III – 1986

II.8 – MORATÓRIA TÉCNICA DE 1987

II.8.1 – EVIDÊNCIAS ACERCA DO BAIXO VALOR DA DÍVIDA EXTERNA BRASILEIRA NO MERCADO SECUNDÁRIO

II.8.2 – EVIDÊNCIAS ACERCA DA EXISTÊNCIA DE OUTRAS TESES PARA RENEGOCIAÇÃO DA DÍVIDA EXTERNA BRASILEIRA, QUE NÃO FORAM CONSIDERADAS

II.9 – FASE IV – NEGOCIAÇÕES COM BANCOS PRIVADOS EM 1988

II.9.1 –INDÍCIO DE NULIDADE DE ACORDOS CUJA ASSINATURA SÓ SE APERFEIÇOOU APÓS A CONSTITUIÇÃO FEDERAL, CONFORME DOCUMENTO DA NOTARIA PÚBLICA DE NOVA IORQUE

II.9.2 – AUSÊNCIA DE CONCILIAÇÃO DE CIFRAS

II.9.3 – MANIFESTAÇÕES DA PGFN

II.9.4 – DÍVIDA INTERNA E MYDFA

II.9.5 – ABORDAGEM DA COMISSÃO ESPECIAL DO SENADO SOBRE O MYDFA

II.9.6 – ANÁLISE DOS DOCUMENTOS ENVIADOS PELO TCU À CPI

II.10 – OBSERVAÇÕES ADICIONAIS SOBRE OS INSTRUMENTOS PACTUADOS NA DÉCADA DE 80

II.10.1 – INSTRUMENTOS CONTRATUAIS NÃO DISPONIBILIZADOS À CPI

II.11 – NEGOCIAÇÕES REALIZADAS EM 1991 – 1992

II.11.1 – MANIFESTAÇÃO DA PGFN

II.11.2 – NEGOCIAÇÕES SIMULTÂNEAS COM O CLUBE DE PARIS

  1. 11.3 – SOLICITAÇÃO DE RENÚNCIA

II . 12 – ANÁLISE ESTATÍSTICA – Período 1983 a 1992

 

II .13 – ANÁLISE DA NATUREZA DA DÍVIDA EXTERNA – 1983-1992

II . 14 – ACORDOS COM O FMI

  1. 15 – ILEGITIMIDADES OBSERVADAS NO CAPÍTULO II
  2. 16 – CONCLUSÃO e RECOMENDAÇÃO

CAPÍTULO III – NEGOCIAÇÃO COM BANCOS COMERCIAIS QUE RESULTOU NA EMISSÃO DOS DENOMINADOS “BÔNUS BRADY” / EMISSÕES DE TÍTULOS DA DÍVIDA EXTERNA E TROCAS POR DÍVIDA EXTERNA E INTERNA, REALIZADAS LOGO APÓS O PLANO BRADY / DIFERENÇA DE US$ 32,7 BILHÕES NO ESTOQUE DA DÍVIDA EXTERNA ANUNCIADA PELO BANCO CENTRAL EM 2001

III.1 – NEGOCIAÇÃO COM BANCOS COMERCIAIS QUE RESULTOU NA EMISSÃO DOS DENOMINADOS “BÔNUS BRADY”

III.1.1 – CONJUNTURA

III.1.2 –  OUTRAS LIMITAÇÕES À INVESTIGAÇÃO DO PLANO BRADY

III.1.3 – ATUAÇÃO DA COMISSÃO NEGOCIADORA BRASILEIRA

III.1.4 – AUSÊNCIA DE CONTRATOS ASSINADOS

III.1.5 – AUSÊNCIA DE REGISTRO NA SEC – DESCUMPRIMENTO DE FORMALIDADES LEGAIS

III.1.6 – VALOR DA DÍVIDA NO MERCADO SECUNDÁRIO

III.1.7 – DESCONTO APARENTE

III.1.8 – FALTA DE TRANSPARÊNCIA EM RELAÇÃO À “DÍVIDA AFETADA”

III.1.9 – FALTA DE TRANSPARÊNCIA EM RELAÇÃO ÀS GARANTIAS COLATERAIS

III.1.10 – FALTA DE TRANSPARÊNCIA DAS NEGOCIAÇÕES PREPARATÓRIAS OCORRIDAS EM 1992

III.1.10.1 – SOLICITAÇÃO DE RENÚNCIA

III.1.11 – CARACTERÍSTICAS DO BRADY BRASILEIRO

III.1.12 – BÔNUS EMITIDOS

III.1.13 – CONDIÇÕES DOS BÔNUS EMITIDOS

III.1.14 – COMISSÕES E GASTOS

III.1.15 – CLÁUSULAS ILEGÍTIMAS

III.1.16 – MANIFESTAÇÃO DA PROCURADORIA DA FAZENDA NACIONAL

III.1.17 – ANÁLISE DA EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS DO MINISTRO DA FAZENDA AO VICE-PRESIDENTE DA REPÚBLICA EM EXERCÍCIO – E.M. Nº 436, de 13 de novembro de 1992

III.1.18 – TRANSFERÊNCIA DO PASSIVO EXTERNO DO BANCO CENTRAL PARA O TESOURO NACIONAL

III.1.19 – TRECHOS DE VERIFICAÇÕES PROCEDIDAS PELO TCU, QUE MENCIONAM TEMAS RELACIONADOS À NEGOCIAÇÃO DO PLANO BRADY

III.2 – EMISSÕES DE TÍTULOS DA DÍVIDA EXTERNA E TROCAS POR DÍVIDA EXTERNA E INTERNA, REALIZADAS LOGO APÓS O PLANO BRADY

III.2.1 – MECANISMO TEMERÁRIO – “OVER-ALLOT”

III.2.2 – COMPROMISSO DE PAGAMENTO DE PRÊMIO ADICIONAL

III.2.3 – MARCO LEGAL DA EMISSÃO ACELERADA DE TÍTULOS DA DÍVIDA EXTERNA APÓS O PLANO BRADY e TROCA POR DÍVIDA INTERNA e VICE-VERSA

III.2.4 – NECESSIDADE DE ANÁLISE DE CADA OPERAÇÃO POR PARTE DO SENADO

III.2.5 – VERIFICAÇÃO DE CUMPRIMENTO DE FORMALIDADES

III.3 – DIFERENÇA DE US$ 32,7 BILHÕES NO ESTOQUE DA DÍVIDA EXTERNA ANUNCIADA PELO BANCO CENTRAL EM 2001

III.4 – ILEGITIMIDADES OBSERVADAS NO CAPÍTULO III

CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÃO

CAPÍTULO IV – INTRODUÇÃO DA CLÁUSULA DE AÇÃO COLETIVA: Substancial alteração das condições de negociação dos Títulos da Divida Externa Brasileira a partir de 2003 / PAGAMENTOS ANTECIPADOS DA DÍVIDA EXTERNA COM ÁGIO a partir de 2005

APRESENTAÇÃO

IV.1 – INCLUSÃO DA CLÁUSULA DE AÇÃO COLETIVA NOS TÍTULOS DA DÍVIDA EXTERNA BRASILEIRA

IV.1.1 – ANÁLISE DA CLÁUSULA DE AÇÃO COLETIVA – CAC

IV.1.2 – NECESSIDADE DE ESTUDO JURÍDICO APROFUNDADO

IV.1.3 – AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO DO SENADO

IV.1.4 – PRONUNCIAMENTO DA PROCURADORIA GERAL DA FAZENDA NACIONAL SOBRE A CLÁUSULA CAC

IV.2 – ANÁLISE DE OPERAÇÕES DE TROCA DE TÍTULOS E RESGATES ANTECIPADOS REALIZADOS A PARTIR DE 2005

IV.2.1 – TROCA DE TÍTULOS C-BOND POR A-BOND E RESGATE ANTECIPADO DE OUTROS BÔNUS BRADY

IV.2.2 – DEMAIS CUSTOS E GASTOS COM AS OPERAÇÕES DE TROCA E RESGATE ANTECIPADO

IV.2.3 – FONTE DOS RECURSOS PARA OS RESGATES ANTECIPADOS do C-Bond e demais bônus Brady em 2006:

IV.3 – “O PROGRAMA DE RESGATE ANTECIPADO DE TÍTULOS DA DÍVIDA EXTERNA”

IV.4 – O PAGAMENTO  ANTECIPADO AO FMI

IV.4.1 – Fonte dos recursos para o Pagamento antecipado ao FMI: nova dívida externa e interna, ambas bem mais onerosas

IV.5 – ILEGITIMIDADES OBSERVADAS NO CAPÍTULO IV

CAPÍTULO V – DÍVIDA EXTERNA, IMPACTOS SOCIAIS E DIREITOS HUMANOS / IMPACTO DA DÍVIDA PÚBLICA NAS POLÍTICAS SOCIAIS E NO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO PAÍS

V.1 – INTRODUÇÃO

V.2 – O ENDIVIDAMENTO EXTERNO E SEU IMPACTO NO CRESCIMENTO ECONÔMICO BRASILEIRO

V.3 – O ENDIVIDAMENTO EXTERNO E AS EXIGÊNCIAS DO FMI

V.4 – IMPACTOS DA DÍVIDA NO ORÇAMENTO PÚBLICO E NA CARGA TRIBUTÁRIA

V.5 – IMPACTOS DA DÍVIDA NAS POLÍTICAS SOCIAIS

V.5.1 – SAÚDE

V.5.2 – PREVIDÊNCIA SOCIAL E SALÁRIO MÍNIMO

V.5.3 – EDUCAÇÃO

V.5.4 – REFORMA AGRÁRIA E AGRICULTURA

V.5.5 – TRANSPORTES

V.6 – IMPACTOS AMBIENTAIS DO ENDIVIDAMENTO

V.7 – PRINCIPAIS ILEGITIMIDADES DECORRENTES DOS IMPACTOS DA DÍVIDA PÚBLICA SOBRE AS POLÍTICAS SOCIAIS E O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO PAÍS

V.8 – RECOMENDAÇÕES

CAPÍTULO VI – CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

 

CPI DA DÍVIDA PÚBLICA
ANÁLISE PRELIMINAR Nº 5
 DÍVIDA EXTERNA BRASILEIRA – 1970 a 2008

 APRESENTAÇÃO

Análise Preliminar elaborada em cumprimento à designação do Presidente da CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito, deputado Virgílio Guimarães, para prestar assessoria à CPI da Dívida Pública instalada na Câmara dos Deputados, criada para “investigar a dívida pública da União, Estados e Municípios, o pagamento de juros da mesma, os beneficiários destes pagamentos e o seu impacto nas políticas sociais e no desenvolvimento sustentável do país”.

A CPI da Dívida foi instalada em 19 de agosto de 2009, com prazo regimental inicial de 120 dias, tendo sido prorrogada por mais 60 dias, com previsão de encerramento em 28 de março de 2010. Posteriormente, em 16 de março de 2010, foi novamente aprovada na CPI a prorrogação por mais 60 dias, com encerramento previsto para 26/05/2010, dependendo ainda de referendo do Plenário da Câmara. Cabe esclarecer que o trabalho objeto da presente análise contou com a seguinte equipe técnica: Maria Lucia Fattorelli Carneiro, Auditora Fiscal da Receita Federal do Brasil (a partir de 29.09.2009 até 26.03.2010), Aldo Olmos Molina Júnior, Auditor Interno da Caixa Econômica Federal (a partir de 23.11.2009 até 26.03.2010), além do apoio técnico de 2 auditores do Tribunal de Contas da União por algumas semanas. Contou também com o apoio de Raimunda Nonata Carlos Ferreira, Assistente Social da Funasa (a partir de 16.11.2009), e dois funcionários de apoio do MPU (Laércio Bernardes dos Reis e Cristine Barbosa Maia) por duas semanas.

Reuniões formais da CPI da Dívida Pública realizadas em 26/08/2009 e 09/09/2009 debateram amplamente a metodologia dos trabalhos da CPI. Ficou estabelecido que, em relação à Dívida Externa, o marco inicial das investigações partiria de 1970, conforme requerimentos aprovados em 09/09/2009. Assim, a presente análise preliminar abrangeu a análise da dívida externa brasileira a partir de 1970, dividida nos seguintes capítulos:

  • Introdução
  • Capítulo I – Origem das Negociações da Dívida Externa – Período de 1970 a 1982
  • Capítulo II – Renegociações da Dívida Externa – Período de 1983 a 1992
  • Capítulo III – Negociação com bancos privados que resultou na emissão dos denominados Bônus Brady em 1994 e Emissões aceleradas de Dívida Externa pós-Brady no período de 1995 a 2002. Diferença de US$ 32,7 bilhões anunciada pelo Banco Central em 2001.
  • Capítulo IV – Introdução da Cláusula de Ação Coletiva nos Títulos da Divida Externa Brasileira a partir de 2003. Pagamentos Antecipados da Dívida Externa com Ágio a partir de 2005
  • Capítulo V – Dívida Externa, Impactos Sociais e Direitos Humanos
  • Conclusões e Recomendações

INTRODUÇÃO

Os trabalhos da CPI foram marcados por uma série de limitações, conforme exposto mais adiante na presente Introdução.
As investigações do endividamento externo brasileiro abrangeram o período de 1970 a 2008, tendo o saldo da dívida externa total apresentado a trajetória indicada no quadro a seguir, que mostra seu início em 1970 no patamar de US$ 5,4 bilhões, alcançando US$ 267 bilhões em 2008.

Fonte: Banco Central – Séries Temporais

Os dados para a construção do referido gráfico foram extraídos das séries temporais publicadas pelo Banco Central[1].

Em relação às limitações do trabalho, cabe ressaltar, inicialmente, a ausência de dados estatísticos segregados por tipo de dívida externa (Multilateral, Bilateral, Comercial e Privada)[2] desde 1970 – correspondentes aos ingressos e pagamentos de juros e amortizações, o que indica séria deficiência de controle e falta de transparência por parte dos órgãos responsáveis pelo controle do endividamento externo brasileiro, em relação ao solicitado pela CPI.

O Banco Central informou a esta CPI que “não é possível reconstruir a série histórica da Dívida Externa Federal com Multilaterais, Bilaterais e Banco Privados a partir de 1975, desagregação possível somente a partir de 1997”.

Os dados estatísticos desagregados por tipo de dívida desde 1970 foram solicitados também ao Ministério da Fazenda que informou à CPI que “a STN somente possui informações sobre saldos, movimentação financeira de contratos, pagamento de principal e juros a partir de 1993”. Acrescentou ainda que “informações anteriores ao período mencionado somente podem ser fornecidas pelo Banco Central, com base em seus registros estatísticos da movimentação de capital estrangeiro no país.

Apesar de o Banco Central não ter fornecido à CPI os dados da dívida externa por tipo de credor, analisando-se os Relatórios anuais publicados pelo Banco Central, foi possível identificar tabelas contendo dados da posição do estoque da dívida em cada ano. Entretanto, tais relatórios não contêm a informação acerca do fluxo de pagamentos de juros e amortizações, nem os ingressos a título de amortizações, o que significou grande limitação aos trabalhos da CPI.

Verificou-se que no período compreendido entre 1970 e 1994, as tabelas publicadas nos Relatórios Anuais do Banco Central contendo a posição do estoque da dívida em cada ano seguiam um padrão semelhante de disposição dos dados, o que permitiu a esta equipe de trabalho elaborar uma série histórica do estoque da dívida externa registrada pelo Banco Central.

A Tabela construída com base nos dados dos Relatórios Anuais do Banco Central encontra-se no anexo VI à presente análise preliminar, sendo que a mesma tabela permitiu a elaboração do gráfico a seguir, que mostra que a parcela mais relevante da dívida externa brasileira foi a dívida contratada com bancos privados internacionais[3].

Dívida Externa Registrada no Banco Central – US$ milhões – 1969 a 1994

Fonte: Relatórios Anuais do Banco Central disponibilizados à CPI da Dívida.

Nota: O gráfico permite visualizar nitidamente que, a partir do início da década de 90, iniciou-se o processo de substituição da dívida contratual por bônus (operações indicadas em azul no gráfico), com o lançamento do IDU Bonds e BIB. Em 1994 essa dívida foi transformada nos bônus Brady. O mesmo gráfico também evidencia que não houve redução na dívida externa total quando da negociação nos moldes do Plano Brady, em 1994.

A partir da análise dos dados, constatou-se que a parcela mais relevante da dívida externa brasileira (indicada na cor vermelha no gráfico acima) correspondeu, historicamente, aos chamados “Empréstimos em Moeda” realizados ao amparo da Resolução 63, de 21/08/67; Resolução 289, de 14/01/65; e principalmente a Lei 4.131, de 03/09/62. Tais empréstimos em moeda correspondiam fundamentalmente a empréstimos obtidos junto a bancos comerciais – em sua maioria bancos privados internacionais – e eram autorizados, controlados e registrados pelo Banco Central.

Essa dívida externa com bancos privados internacionais passou a crescer aceleradamente a partir dos anos 70, devido à abundância de recursos existentes nesses bancos estrangeiros em decorrência da elevação do preço do petróleo, tendo esse excesso de liquidez sido canalizado para empréstimos aos países considerados de Terceiro Mundo, com atrativos aparentes de período de carência e taxas de juros baixas, porém, flutuantes.

Essa parcela da dívida externa comercial foi também a mais afetada, a partir de 1979, pela alta unilateral das taxas de juros internacionais[4] procedida pelo Federal Reserve Bank de Nova Iorque e pela Associação de Bancos Privados de Londres, quando essas taxas saltaram de cerca de 6 para 20,5% ao ano, provocando excessivo aumento nos compromissos da dívida contratada com esses bancos privados. Essa elevação das taxas internacionais constituiu uma das principais causas da crise financeira de 1982, que afetou todo o mundo. O Brasil foi fortemente afetado também devido à redução do preço dos produtos de exportação brasileiros.

Cálculos projetados pela CPI, conforme gráfico a seguir, mostram uma estimativa do dano ao patrimônio público de cerca de US$ 223 bilhões, provocado pela mencionada elevação unilateral da taxa de juros internacionais, cujo ressarcimento deveria ser buscado pelos órgãos competentes:

Dívida Externa Total (Pública e Privada) – US$ Milhões

O gráfico mostra que a dívida externa atual é resultado de contundente indício de ilegalidade: a violação do princípio do Direito Internacional constante no Artigo 62 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados. Segundo o mencionado artigo, uma mudança fundamental de circunstâncias, ocorrida em relação às condições existentes no momento da conclusão de um tratado, e não prevista pelas partes, pode ser invocada como causa para extinguir um tratado ou dele retirar-se, caso a existência dessas circunstâncias tiver constituído uma condição essencial do consentimento das partes em obrigarem-se pelo tratado; e essa mudança tiver por efeito a modificação radical do alcance das obrigações ainda pendentes de cumprimento em virtude do tratado.

Na década de 80, os onerosos acordos com os bancos privados internacionais – nos quais o Banco Central assumiu o papel de devedor – fizeram com que a dívida externa aumentasse ainda mais, sem que o país recebesse qualquer parcela nova de recursos, pois os acordos com bancos comerciais significaram, basicamente, a renegociação de dívidas anteriormente contraídas, conforme comentado mais adiante.

O ponto de partida das investigações realizadas pela CPI foi o endividamento externo da década de 1970, que coincide com o período de grande crescimento da dívida externa, que era de apenas US$ 5,4 bilhões em 1970 e chega aos US$ 85,5 bilhões em 1983.

A investigação da dívida externa desse período ficou fortemente limitada pela ausência de acesso aos registros completos da dívida junto ao Banco Central, que era justamente o órgão responsável pela autorização e registro das operações de empréstimo em moeda realizadas ao amparo da Lei 4.131/62 (e Resoluções 289/65 e 63/67), que foram as mais expressivas do período, conforme indicado em vermelho no gráfico antes mencionado.

É importante ressaltar que o Banco Central apresentou à CPI apenas planilhas digitadas contendo dados parciais sobre os registros dos empréstimos externos existentes naquela autarquia, enviadas com os Ofícios 945 e 975-BCB/Secre, e posteriormente complementados com outras informações por meio do Ofício 049/2010-BCB/Secre e Nota Técnica Desig/Gabin-03/2010. Tais planilhas demonstraram a inconsistência das dificuldades inicialmente alegadas pelo Banco Central à CPI, por meio do Ofício 894-BCB/Secre, segundo o qual teria que “envolver 800.000 processos” em todo o país para obter os referidos dados dos registros de empréstimos externos, que resultariam em “2.400.000 folhas impressas”. Na realidade, as informações sintetizadas foram parcialmente prestadas em meio magnético, demonstrando-se a inconsistência do anteriormente alegado. Entretanto, apesar de o Banco Central ter enviado à CPI as informações parciais resumidas em meio magnético, em momento algum foi confirmada nem disponibilizada à CPI a informação sobre a existência de livros nos quais deveriam se registrar os diversos acordos e contratos do endividamento externo no período de 1970 em diante, apesar de reiteradamente solicitada tal informação.

 

Como mencionado, os empréstimos em moeda representavam a parte mais relevante da dívida externa brasileira e a CPI teve acesso apenas a alguns contratos dessa modalidade, pois esse tipo de dívida era diretamente autorizado pelo Banco Central, que emitia os respectivos Certificados de Registro.

Recorrendo a outras fontes de informações, verificou-se que o endividamento externo representado pelos empréstimos em moeda iniciou-se na década de 70 como um endividamento eminentemente Privado, tendo em vista que no ano de 1972 a dívida externa privada correspondia a 75% dos empréstimos em moeda. Adicionalmente, essa modalidade de endividamento externo era utilizada pelo setor privado internacional, ou seja, por empresas multinacionais e bancos que tinham facilidade de acesso ao crédito externo.

Livros e outras publicações registram que as empresas multinacionais também utilizavam a modalidade de empréstimos intercompanhias para remeter lucros ao exterior, escapando da então vigente tributação sobre tais remessas. Esse dado demonstra a relevância dos empréstimos intercompanhias na formação do endividamento externo brasileiro, bem como a necessidade de aprofundar as investigações.

Analisando-se os contratos disponibilizados pelo Ministério da Fazenda e pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional à CPI, constatou-se, inicialmente, que tais contratos representavam apenas 7,92% dos empréstimos externos no período de 1970 a 1982. De acordo com tais contratos, o endividamento externo nesse período se deu predominantemente por meio de empresas estatais, que responderam por cerca de 64% do valor dos empréstimos representados pelos contratos disponibilizados à CPI. Verificando-se os 5 (cinco) contratos de maior valor entre os recebidos, constatou-se tratar de vultosos empréstimos contratados por estatais junto a bancos privados internacionais, sendo que em 4 desses contratos sequer era mencionado o projeto financiado, ou seja, tratava-se de empréstimos de caráter meramente financeiro. Recorrendo aos pareceres jurídicos da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional que autorizaram referidos empréstimos, constatou-se que a destinação dos recursos era informada apenas de forma genérica, como por exemplo, “para aplicação no financiamento parcial da construção de usinas hidrelétricas no Brasil”, sem identificar o local. Os contratos previam a cobrança de taxas onerosas de compromisso, de contratação e de crédito, sobre o montante dos empréstimos, além de prever renúncias à jurisdição e às leis brasileiras, sendo regidos por leis estrangeiras. Grande parte dos contratos foram enviados somente em língua estrangeira à CPI.

A CPI também buscou informações sobre os empréstimos e respectiva destinação dos recursos tomados pelas empresas estatais, desde 1970 até 2000, junto ao Ministério do Planejamento, tendo em vista a atribuição legal da Secretaria Especial de Controle das Empresas Estatais – SEST, que reunia amplos poderes de controle sobre as fontes e os usos dos recursos das estatais. Em atendimento ao Requerimento de Informações 55/09, aquele Ministério informou à CPI que “este Departamento dispõe das informações requeridas somente a partir de 1995, data da implantação do Programa de Dispêndios Globais – PDG no Sistema de Informação das Estatais – SIEST”, acrescentando que “os controles exercidos por este Departamento sobre os empréstimos tomados por estatais restringem-se apenas ao aspecto orçamentário anual, não dispondo, assim, do valor da moeda estrangeira nem das justificativas para os empréstimos contraídos.

Essa deficiência nos arquivos da Secretaria Especial de Controle das Empresas Estatais – SEST – constituiu uma das importantes limitações ao aprofundamento da investigação sobre o endividamento das estatais nas décadas de 70 e 80, período em que a participação dessas empresas estatais (que na década seguinte foram submetidas ao processo de privatização) no crescimento do endividamento público foi extremamente relevante, o que justifica a necessidade de realização da auditoria da dívida prevista na Constituição Federal, para a apuração de danos ao patrimônio público.

Durante as investigações, detectou-se que na década de 70 o Brasil emitiu títulos da dívida externa, cujos contratos foram parcialmente enviados à CPI, pelo Ministério da Fazenda, somente em 11 de dezembro de 2009. A maioria dos contratos enviados não se encontrava assinada e em alguns casos foram enviadas apenas minutas da oferta dos títulos no exterior ou apenas o termo de contratação do agente, mas não o contrato da emissão dos títulos. Essas emissões haviam sido autorizadas por decretos que indicavam que tais títulos seriam controlados pelo Banco Central, instituição que prestou a seguinte informação à CPI: “uma vez que os registros de títulos da dívida externa na contabilidade não foram realizados de forma segregada para cada um dos decretos discriminados no ofício, não foi possível estabelecer correspondência entre os decretos e cada uma das contas.

Revisando-se as condições pactuadas nos contratos de emissão de títulos enviados pela PGFN, constatou-se a contratação das emissões abaixo do valor de face; exigência de diversas comissões além das taxas de juros, assumindo o Brasil todos os gastos com as emissões e despesas dos agentes, inclusive despesas com honorários de advogados dos credores. Além disso, todos os contratos da década de 70 eram regidos por leis estrangeiras e continham cláusulas de renúncias à jurisdição e imunidade, tendo sido disponibilizados somente em língua estrangeira à CPI, à exceção de uma única tradução. Tais aspectos também demandam o aprofundamento das investigações e apuração de danos ao patrimônio público.

Conforme comentado, a elevação unilateral das taxas de juros internacionais significou alteração fundamental das circunstâncias e constitui um forte indício de ilegalidade no processo de formação da dívida, pois não foi observado o princípio Rebus sic Stantibus previsto no Direito Internacional, nem o artigo 62 da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, de 1969. Tais dispositivos prevêem que o devedor poderia até se retirar do acordo quando tal mudança de circunstâncias tenha por efeito a transformação radical da natureza das obrigações ainda pendentes de cumprimento em virtude dos acordos.

Na prática, aquelas obrigações contratadas com bancos privados na década de 70 se tornaram extremamente onerosas com a elevação das taxas de juros internacionais até os 20,5% ao ano, passando a exigir grandes somas de recursos para o cumprimento de tais obrigações, o que constituiu uma das principais causas da crise financeira do início da década, além de resultar em subtração de recursos que deveriam ser destinados a investimentos e às áreas sociais, provocando graves conseqüências sociais desde a década de 80 – a chamada “década perdida” – quando o Brasil se transformou em exportador líquido de capitais ao exterior.

A co-responsabilidade dos credores já foi objeto de questionamento por comissões anteriores do Congresso Nacional[5], no entanto, historicamente, todo ônus das opções equivocadas em relação ao endividamento público tem recaído unicamente sobre o país e a sociedade, que arca com o pagamento dos tributos e não recebe o retorno adequado em serviços públicos e políticas sociais. Diante disso, é necessário resgatar essa tese da co-responsabilidade dos credores e, com fundamento nos instrumentos de Direito Internacional, adotar medidas concretas nos fóruns competentes, aprofundando-se as investigações realizadas pela CPI que, de acordo com a simulação efetuada, apontam para enorme dano ao patrimônio público, que deve ser ressarcido ao Brasil.

Adicionalmente, cabe questionar a legitimidade do próprio governo que optou pelos empréstimos externos a juros flutuantes, dado que representavam Governos de Fato, e não de Direito, pois se mantinham pela força das armas e da repressão aos que contra ele se insurgiam. Tal fato também deve ser apresentado aos fóruns competentes, considerando que danos ao patrimônio público e aos direitos humanos não prescrevem.

Em meio à crise financeira de 1982 os bancos cerraram as linhas de crédito ao país, aumentando ainda mais as dificuldades de cumprimento das obrigações externas. No início de 1983 houve reunião do Clube de Paris, que recomendava acordo do Brasil com o FMI e ressaltava a importância de acordo com os credores privados. Nesse contexto, o Banco Central celebrou, em fevereiro de 1983, acordos com os bancos privados internacionais, assumindo o papel de “tomador” no acordo Credit and Guaranty Agreement – Acordo de Crédito de Garantia – CGA-1983, de US$ 4,4 bilhões, tendo sido parte também no Deposit Facility Agreement – DFA-1983 (apresentado à CPI somente em língua estrangeira), no valor de US$ 4,3 bilhões.

Há forte indício de ilegalidade desses contratos, pois somente em dezembro de 1983 foi editado o Decreto-lei 2.070/83, que passou a permitir que o Tesouro Nacional pudesse contratar ou garantir créditos com o fim de promover “consolidações” e “refinanciamentos” de créditos obtidos no exterior, sendo que os contratos acima foram firmados em fevereiro de 1983, meses antes da referida alteração.

Adicionalmente, o parecer jurídico da PGFN que autorizou a operação fundamentava-se em dispositivo legal que destinava os recursos para a formação de reservas internacionais, não tendo sido obedecida essa destinação, pois as investigações realizadas pela CPI apontaram que cláusula contratual determinava a destinação dos recursos para o pagamento de outras dívidas assumidas anteriormente, e não para as reservas internacionais.

Esses empréstimos tomados pelo Banco Central em 1983 criaram um mecanismo que possibilitava que ao mesmo tempo em que tomava recursos junto aos bancos privados internacionais e se comprometia, por meio de “instruções irrevogáveis” a aplicar os recursos recebidos no pagamento de outros empréstimos externos, o Banco Central acatava internamente o depósito “em cruzeiros” dos devedores do setor público e privado.

Tal fato demanda o aprofundamento das investigações, pois constitui forte indício de pagamento de vultosos montantes diretamente no exterior, o que significa inclusive uma mudança fundamental na história do endividamento brasileiro no período. Não foi possível comprovar adequadamente os pagamentos efetuados pelo Banco Central em decorrência dos acordos de 1983 porque o mesmo não respondeu a requerimento de informações que solicitava o detalhamento das dívidas anteriores que foram objeto dos referidos acordos, ou seja, a conciliação das cifras, bem como a destinação dos recursos, e também não localizou as Notas Promissórias firmadas por ocasião desses acordos.

Os mecanismos criados pelos acordos negociados com os bancos privados internacionais em 1983 e que foram recorrentes na década de 80, se repetindo em 1984, 1986 e 1988, exerceram forte impacto na evolução do endividamento público brasileiro até o seu estágio atual e demandam o aprofundamento das investigações e a realização da auditoria da dívida prevista na Constituição Federal, especialmente diante do fato de que tais acordos não foram submetidos ao Congresso Nacional, e, adicionalmente, diante da ausência de conciliação dos valores envolvidos em cada negociação, ou seja, não se sabe que dívidas – públicas e privadas – foram objeto das vultosas negociações que fizeram a dívida se multiplicar por ela mesma, apesar de o Brasil ter se transformado em exportador líquido de capitais a partir da década de 80.

 

Comissões parlamentares contemporâneas aos acordos celebrados com bancos privados internacionais na década de 80 denunciaram a ausência de transparência nas referidas negociações, conforme relatórios resgatados[6] para subsidiar os trabalhos da atual CPI da Dívida Pública. Entretanto, tais comissões parlamentares não chegaram a investigar a conciliação das cifras envolvidas, o que demanda o aprofundamento das investigações.

Outro aspecto relevante é o fato de que as negociações da dívida externa com bancos privados realizadas na década de 80 não contemplavam o necessário equilíbrio entre as partes, pois de um lado ficava o Brasil e de outro o Comitê de Bancos, que reunia centenas de bancos privados internacionais e contava com o apoio do FMI, que por sua vez também participava das negociações simultâneas que aconteciam com credores no âmbito do Clube de Paris.

Nessas circunstâncias, foram pactuadas cláusulas contratuais dispondo sobre aceitação de foro estrangeiro; expressa renúncia à impenhorabilidade de bens por parte do Banco Central do Brasil; renúncia à imunidade, renúncia às leis brasileiras; renúncia ao direito de demandar contra erros; aceitação do acordo como título executivo extrajudicial; submissão a arbitragem desequilibrada, entre outras, além de condições onerosas de taxas de juros e demais comissões e taxas de compromisso, de agenciamento, de facilidade, gastos e “despesas de qualquer espécie” do comitê de bancos e dos bancos privados, que eram assumidas pelo Brasil.

Considerando que o Banco Central assumiu o papel de tomador nesses contratos e que houve a conversão de dívidas tanto do setor público como do setor privado, a CPI solicitou ao Banco Central o detalhamento de tais conversões de dívidas de responsabilidade do setor privado que foram transformadas em dívida pública a cargo do Banco Central, tendo o mesmo respondido à CPI que “a unidade de informática do Bacen está avaliando a possibilidade de reativação dos sistemas e ainda não concluiu sua análise.”

 Posteriormente, em relação à assunção de dívidas privadas, o Banco Central prestou[7] à CPI as seguintes informações, com a sugestão de constituição de grupo de trabalho:

“Com referência ao Ofício nº. 162/10-P, informo que as parcelas de dívida externa privada que foram transformadas em dívida pública a cargo deste BCB são aquelas que permaneceram em depósito sob o Acordo MYDFA e foram trocadas por bônus em abril de 1994. Dado o tempo decorrido e dificuldades já descritas em notas anteriores, não há como realizar, no curto prazo, pesquisa para identificar as milhares de parcelas em suas diferentes moedas, que foram convertidas em bônus. Ademais, os dados estão registrados em sistemas informatizados que já foram desativados, cuja operação é complexa e para a qual esta Autarquia não dispõe de especialistas com os conhecimentos necessários. Haveria que se constituir grupo de trabalho para se estudar os termos dos contratos e a seguir proceder à pesquisa, tarefa que não é possível desenvolver com os atuais recursos da Unidade.”

Dada a relevância da confirmação de que dívidas privadas foram transformadas em dívida a cargo do Banco Central, e considerando os montantes envolvidos no Acordo MYDFA (US$ 61 bilhões) e na troca por bônus em abril de 1994 (quase US$ 50 bilhões), constata-se que de fato é necessário constituir o grupo de trabalho sugerido pelo Banco Central para o aprofundamento das investigações e quantificação exata das dívidas privadas assumidas pelo Estado, a fim de buscar o devido ressarcimento ao país.

Adicionalmente, em base aos acordos celebrados com bancos comerciais – dentre os quais a imensa maioria era formada por bancos privados internacionais – verificou-se a existência de cláusula contratual que previa que o controle das obrigações do Banco Central em tais acordos seria efetuado pelo Banco Agente, no exterior. Além disso, os bancos detentores de qualquer parcela da dívida externa brasileira poderiam transferir para outras instituições seus direitos e obrigações sob os acordos, bastando, para tanto, uma simples comunicação ao Banco Central. Dessa forma, ocorriam negociações da dívida externa brasileira em mercado secundário. A CPI verificou que também não se considerou o baixo valor de mercado da dívida externa, apesar de existirem propostas em discussão inclusive no Senado norte-americano nesse sentido, conforme denunciado no relatório final da Comissão do Senado em 1989[8]. Tal fato é extremamente relevante, pois a dívida possuía um valor no mercado secundário e esse preço não foi considerado em nenhuma das negociações da década de 80, o que também significou perda ao patrimônio público, que deve ser devidamente quantificada por meio do aprofundamento das investigações e ressarcida ao país.

A partir da análise dos sucessivos acordos pactuados com bancos comerciais nas décadas de 80 e 90, constatou-se que não foi argüida a ilegalidade da elevação unilateral das taxas de juros efetuada por tais instituições desde 1979, apesar das recomendações expedidas por comissões parlamentares anteriores do Congresso Nacional. Relativamente a esse aspecto foram relevantes as declarações do Sr. Armínio fraga à CPI da dívida Pública, conforme detalhado no Capítulo III da presente análise.

A fim de confirmar a assinatura de determinados acordos com bancos privados que teriam sido firmados poucos dias antes da promulgação da Constituição Federal de 1988, a CPI solicitou cópias dos referidos acordos originais em inglês, tendo o Banco Central apresentado apenas minutas sem assinaturas. As cópias de tais contratos foram solicitadas à Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, que inicialmente respondeu à CPI que o Banco Central já havia enviado as cópias solicitadas. A CPI reiterou o pedido junto à PGFN e obteve cópias assinadas, acompanhadas de cópia de documento da Notaria Pública de Nova Iorque, datado de 28/11/1988, com firma reconhecida em 13/01/1989, cujo conteúdo atesta que a assinatura dos contratos teria se iniciado em 22/09/1988 e finalizado em 03/11/1988, data posterior à promulgação da Constituição Federal Brasileira de 1988.

Tais acordos da fase IV das negociações com bancos comerciais em 1988 conformavam um pacote de 10 (dez) instrumentos contratuais que envolveram soma superior a US$ 80 bilhões. Considerando que a assinatura de um contrato só se aperfeiçoa quando todas as partes assinam o mesmo, constitui forte indício de nulidade a formalização dos acordos de 1988 após a promulgação da Constituição Federal de 1988, e sem a autorização do Senado Federal, o que demanda o aprofundamento das investigações de forma a determinar as implicações decorrentes desse fato.

É relevante mencionar que desde 1991, com a edição da Lei nº 8.249, foi permitida a emissão de títulos da dívida interna (NTN) para troca voluntária por Bônus da Dívida Externa Brasileira emitidos por com base em um dos acordos da Fase IV das negociações de 1988 – “Brazil Investment Bond Exchange Agreement” – ou seja, há evidências explícitas da transformação de questionável dívida externa por dívida interna, o que constitui mais um aspecto cuja investigação deve ser aprofundada.

Em 1991 e 1992 foram realizadas negociações preparatórias para a transformação da dívida com bancos privados internacionais nos denominados bônus Brady. Dentre essas negociações preparatórias, verificou-se a conversão de juros atrasados em títulos da dívida externa brasileira – IDU Bonds – o que configurou prática de anatocismo explícito, proibido pelas leis brasileiras e manifestações do STF, pois juros foram explicitamente transformados em capital, sobre o qual incidiriam novos juros.

Ainda em 1992 foram pactuadas outras medidas preparatórias, sendo que os contratos relativos a tais negociações – Solicitação de Renúncia, Waiver and Amendment Request – não foram disponibilizados à CPI, que teve acesso apenas a minutas resumidas proporcionadas pelo Senado Federal.  A PGFN enviou à CPI uma cópia em inglês, assinada, do “Waiver Request” de 1991, mas não dos documentos de 1992, que haviam sido solicitados, especialmente “os numerosos contratos de empréstimos aditados”, que teriam sido retificados e assinados em Toronto, no Canadá, solicitados por meio do Ofício 171/10-P, não foram disponibilizados à CPI.

Sobre tais contratos relativos a renúncias pactuadas em 1992, o Banco Central informou que ainda não havia concluído as pesquisas para localizá-los, o que indica deficiência de controle interno, falta de transparência e a guarda deficiente de documentos de grande importância para o país, constituindo motivo relevante para justificar o aprofundamento das investigações a fim de verificar se não teriam renegociadas dívidas que já poderiam estar prescritas.

Os contratos relativos à emissão dos bônus “Brady” em 1994 contêm cláusula que menciona a referida “Solicitação de Renúncia”. Livro editado por autoridades do Banco Central[9] também menciona tal renúncia e demais acertos que teriam sido acordados em “numerosos contratos” em Toronto, Canadá, em 1992, cujos instrumentos foram negados à CPI, apesar de requisitados e reiterados os pedidos.

Analisando-se os termos de uma das cláusulas dos contratos “Brady”, que mencionam a “Solicitação de Renúncia”, conjuntamente com as cláusulas existentes nos acordos da década de 80, que continham cláusulas relacionadas a “Eventos de Inadimplência”, verifica-se a necessidade de aprofundamento das investigações a fim de certificar se não teria havido a negociação de dívidas que já se encontravam prescritas, pois desde 1985 os bancos privados internacionais haviam cessado a disponibilização de “Dinheiro Novo” que viabilizasse o cumprimento de obrigações externas a que havia se comprometido o Banco Central desde 1983. Adicionalmente, há o indício de nulidade dos contratos de 1988, cuja formalização se aperfeiçoou somente após a vigência da Constituição de 1988 e não foram autorizados pelo Senado[10].

Todos os acordos da década de 80 eram regidos pelas Leis de Nova Iorque, das quais faz parte o Estatuto de Limitações, que prevê que depois de seis anos de não pagas as dívidas são consideradas prescritas.

Considerando que na ocorrência de qualquer das hipóteses referidas como “Eventos de Inadimplência” nos contratos pactuados com bancos privados internacionais, os vencimentos de todas as dívidas externas são antecipados para a data daquele evento, ainda que não tenham sido negociadas dívidas prescritas, seria necessário aprofundar as investigações para verificar se houve exigência antecipada de outras dívidas a partir de 1985, ou o pagamento de juros em excesso devido a eventual antecipação de vencimentos, pois tais ocorrências também representariam dano ao patrimônio público. A ausência de informações detalhadas por parte do Banco Central sobre os pagamentos efetuados a título de juros – por tipo de dívida externa – impediu tal verificação.

Na década de 80, o Brasil se transformou em exportador líquido de capitais, apesar de os acordos com bancos privados internacionais se revestirem basicamente de renegociações de dívidas antigas, sem nenhum benefício ao país. A interferência do FMI foi expressa, em todas as renegociações com os bancos privados internacionais como também na economia do país, exercendo sua ingerência em várias áreas de assuntos internos, evidenciando-se especialmente a preparação para o processo de privatizações de empresas brasileiras a cada Carta de Intenções. Cabe ressaltar que todos os tipos de créditos referentes à dívida externa foram acatados no processo de privatizações de empresas estatais, exatamente aquelas que haviam sido endividadas nas décadas de 70 e início dos anos 80.

Relativamente à investigação da troca de grande parte da dívida externa comercial[11] por títulos conhecidos como bônus “Brady” em 1994, os órgãos responsáveis pelo controle do endividamento externo – Banco Central e Ministério da Fazenda – não enviaram, até o momento, documentos essenciais para a análise da operação, tais como cópia de contratos devidamente assinados e informações essenciais que foram requeridas pela CPI, especialmente as relativas às conciliações entre as dívidas anteriores (incluídas na renegociação Brady) e as dívidas decorrentes do acordo, o que denota falta de transparência na referida transformação. Tal fato enseja o aprofundamento das investigações e a realização da auditoria da dívida prevista na Constituição Federal. Cumpre ressaltar que tal operação envolveu cerca de US$ 50 bilhões – considerando-se o valor da dívida e as garantias que foram exigidas para a realização da troca – sendo relevante mencionar que os saldos de acordos de 1988 que foram transformados em Brady eram compostos também por dívidas do setor privado que foram transferidas ao Estado, sendo fundamental detalhar a conciliação dessas cifras, tendo em vista o forte indício de dano ao patrimônio público.

O Plano Brady representou a renovação de dívida anterior, que vinha sendo severamente questionada por três Comissões anteriores do Congresso Nacional, as quais apontaram em seus relatórios a configuração de graves crimes e irregularidades[12]. Tais relatórios recomendaram a anulação da dívida contratada ilegalmente. A negociação Brady não levou em consideração tais recomendações do Congresso Nacional, portanto, a nova dívida dos bônus Brady também pode ter sua legitimidade e legalidade questionadas.

A Comissão Negociadora Brasileira do Plano Brady também não considerou o valor de mercado da dívida levada à troca por títulos, que se encontrava cotada no mercado secundário em torno de apenas 30%, ou até menos, conforme mencionado em um dos trabalhos do TCU, por volta de 20%. Tal fato denota a ocorrência de expressivo dano ao patrimônio público que necessita ser reparado. Além disso, a Comissão Negociadora Brasileira assumiu o compromisso de que o Brasil não compraria a própria dívida durante o período em que se endividava para comprar as garantias exigidas para a negociação, deixando tal privilégio para os bancos ‘credores’.

A afirmação do Sr. Armínio Fraga em seu depoimento à CPI, acerca da demora em firmar os contratos do Plano Brady, que “até novembro de 2002” não haviam sido firmados, significa que à época da emissão dos bônus sequer havia contrato firmado, o que enseja um forte indício de ilegalidade que demanda o aprofundamento das investigações.

O fato de os bônus emitidos não terem sido registrados na SEC (Securities and Exchange Comission dos Estados Unidos da América) também constitui relevante indício de irregularidade. Os títulos emitidos pelo Brasil no âmbito do Plano Brady não poderiam ser registrados naquela Comissão porque não foram ofertados ao público em geral, tendo ocorrido uma troca direta com os então ‘bancos credores’ da dívida antiga, ou seja, tratou-se de uma oferta privada, negociada em Luxemburgo.

Embora a Lei Regente em todos os contratos pactuados com bancos privados internacionais fossem as leis de Nova Iorque, os bônus “Brady” emitidos não observaram a Lei de Valores dos Estados Unidos da América do Norte, razão pela qual possuíam uma série de restrições: não poderiam ser ofertados nem negociados na Bolsa de Nova Iorque ou qualquer outra bolsa regular de outros países, sendo negociados em Luxemburgo, conhecido paraíso fiscal. Portanto, os bônus Brady não puderam ser registrados na SEC porque não obedeceram às formalidades exigidas na Lei de Valores dos Estados Unidos para uma “Oferta Pública” de bônus soberanos naquele país.

A operação Brady não significou ingresso de recursos para o país, pois constituiu mera troca de dívida antiga por dívida representada em títulos. No entanto, essa operação representou elevado ônus ao país, pois além de exigir a aquisição de garantias colaterais de quase US$ 4 bilhões – cujo controle também não foi apresentado à CPI – o Brasil, tal como em todas as negociações com bancos privados ocorridas na década de 80, arcou com todos os gastos do Comitê de Bancos, dos Agentes e dos bancos privados internacionais, além de todos os custos administrativos da operação.

Embora na época da negociação tenham sido anunciados pelo governo e pela grande mídia que a operação envolvia descontos relevantes, na realidade foi concedido um desconto “aparente[13]” em apenas um dentre os sete tipos deferentes de bônus emitidos naquele plano. Se comparado com o valor de mercado e, ainda, se consideradas as garantias exigidas, essa operação representou um grande prejuízo ao país, enquanto significou excelente negócio para os credores que trocaram uma dívida eivada de questionamentos e possivelmente até prescrita, por títulos que posteriormente serviram de moeda nas privatizações de empresas brasileiras. Tais aspectos demandam o aprofundamento das investigações a fim de quantificar o dano provocado ao patrimônio público nacional.

Os contratos referentes ao Acordo Brady continham diversas cláusulas ilegítimas, além das cláusulas de Renúncia à Jurisdição, Imunidade, à obrigatoriedade de manter acordo com FMI, dentre outras.

Enfim, a CPI não teve acesso, apesar dos requerimentos de informações, a documentos e informações relevantes e essenciais para a investigação da operação de conversão da dívida externa nos títulos Brady, especialmente informações relativas à conciliação da dívida objeto de troca, das dívidas privadas envolvidas nessa conversão, da administração das garantias colaterais, denotando falta de transparência e deficiência de controle interno.

Não se vislumbrou justificativa plausível para a troca efetuada por meio do Plano Brady, que além de onerosa, exigiu garantias colaterais e beneficiou unicamente aos credores, razão pela qual tais investigações devem ser submetidas a crivo jurídico especializado, a fim de determinar possíveis responsabilidades. A novação – transformação de uma dívida em outra – deve ter uma causa legítima, o que não se confirmou no presente caso. Adicionalmente, a dívida externa contratual com bancos privados vinha sendo objeto de graves questionamentos de ordem legal[14], podendo ter havido inclusive prescrição dessa dívida[15], sendo que atos ilícitos não geram conseqüências lícitas – princípio elementar de ordem jurídica.

Os documentos disponibilizados pelo Tribunal de Contas da União à CPI revelam ter havido apenas investigação parcial sobre o preço de aquisição de parte de garantias colaterais e sobre eventual benefício a bancos brasileiros, não tendo sido auditada a conversão da dívida nos moldes do Plano Brady.

É importante observar que o valor da dívida registrada no passivo do Banco Central e que foi transferida para o Tesouro Nacional por ocasião da emissão dos títulos “Brady”, no valor de US$ 28 bilhões, era bem inferior ao montante negociado por meio do Plano Brady (cerca de US$ 50 bilhões), o que constitui mais um indício relevante que demanda o aprofundamento das investigações e a realização da auditoria da dívida prevista na Constituição Federal.

Após o Plano Brady, a partir de 1995 até 2002, verificou-se a emissão acelerada de títulos da dívida externa sob a justificativa de “substituição da dívida interna por externa”. A maioria dos títulos emitidos no período analisado possuía as mesmas restrições que os emitidos por ocasião do Plano Brady, sem registro na SEC e negociados em Luxemburgo. Constatou-se, adicionalmente, que diversas emissões se deram abaixo do valor de face, ou seja, de saída o país já contabilizava uma perda, pois todos os encargos seriam calculados sobre o valor de face, embora o valor efetivamente auferido na operação fosse inferior a este, o que representou prejuízo inicial. Além disso, as condições eram onerosas, assumindo o Brasil o compromisso de arcar com todas as despesas e pagamento de comissões diversas aos agentes emissores dos títulos no exterior, que nem sempre constavam dos contratos, mas eram remetidos para outro documento que não foi disponibilizado à CPI, denotando falta de transparência nas negociações.

Todos os contratos de emissão de bônus da dívida externa a partir de 1995 que foram disponibilizados à CPI se encontram somente em língua estrangeira.

Três emissões chamaram a atenção da CPI, relativas às emissões dos títulos Global 2040, Global 2024 e Global 2024-B, pois, respectivamente, foram feitas a apenas 80,203%, 71,270% e 75,581% do valor de face, nos montantes de US$ 5.157.311.000,00, US$ 2.150.000.000,00 e US$ 824.702.000,00, em 09.08.2000, 07.03.2001 e 30.07.2003. Tais operações significaram o pagamento de juros (yield) da ordem de 13,732%, 12,91% e 12,59% ao ano, respectivamente. Os três contratos correspondentes a tais operações não foram disponibilizados à CPI pelo Banco Central ou pelo Ministério da Fazenda, apesar de reiterados os pedidos.

Em 11.12.2009, o Ministério da Fazenda enviou à CPI cópias de minutas dos contratos do Agente de emissão dos bônus Global 2040, Global 2024 no exterior (Dealer Managers Agreement e Fiscal Agency Agreement), mas não os contratos de emissão dos títulos, que deveriam conter as respectivas cláusulas e condições pactuadas.

A CPI observou ainda a existência de cláusula, em grande parte dos contratos de emissão de títulos da dívida externa, que previa a possibilidade de realização de emissões adicionais, denominadas “over-allot”, que são feitas pelos Agentes no exterior e à revelia do país. Essa figura “over-allot” foi comentada pelo Sr. Armínio Fraga em seu depoimento à CPI, a partir do qual se constatou que os títulos da dívida externa brasileira têm servido de lastro para grandes negócios do mundo financeiro internacional, o que demanda o aprofundamento das investigações inclusive no âmbito externo, especialmente diante dos danosos efeitos da última crise financeira internacional decorrente justamente da emissão desenfreada de derivativos financeiros por bancos privados internacionais.

As Resoluções do Senado Federal que autorizaram a emissão de títulos da dívida externa “para substituir dívida interna” partiram do limite de US$ 2 bilhões com a Resolução Nº. 87, de 1994, e alcançaram o patamar de US$ 75 bilhões com a Resolução Nº. 20, de 2004. Desta forma, o Senado Federal autorizou tacitamente as vultosas emissões de títulos da dívida externa brasileira, sem conhecer os termos das operações, o que não atende ao disposto no art. 52, inciso V, da Constituição Federal de 1988, combinado com o art. 389 do Regimento Interno do Senado Federal, que estabelece as regras para a apreciação dos pedidos de autorização de quaisquer operações externas de natureza financeira. A CPI solicitou esclarecimentos ao Senado Federal que encaminhou à CPI cópia completa dos processados de tais resoluções, o que permitiu constatar que o Senado não teve acesso aos referidos contratos de emissão de títulos da dívida externa brasileira, que foram parcialmente disponibilizados à CPI, pelo Ministério da Fazenda, somente em língua estrangeira.

Embora as sucessivas Resoluções do Senado Federal determinassem que os recursos decorrentes das emissões de títulos da dívida externa naquele período de 1995 a 2002 seriam destinados à “substituição da dívida mobiliária interna por dívida externa”, não se observou, no período, redução da dívida interna, que não parou de crescer.

A CPI constatou que logo após o referido Plano Brady, foram realizadas trocas desses títulos por novos títulos da dívida externa (Global[16]) e interna (NTN[17]), operações que possuem forte indício de dano ao patrimônio público, ante os significativos deságios nas emissões dos bônus Global, suas elevadas taxas de juros e onerosas comissões e demais gastos assumidos pelo Brasil, e face às elevadíssimas taxas de juros da dívida interna. Observou-se, também, que os bônus Brady foram objeto de troca por outros títulos da dívida externa (por exemplo, C-Bond por A-Bond, em 2005) e objeto de resgate antecipado em 2006[18].

As dificuldades enfrentadas pela CPI para obter informações e documentos sobre o processo de endividamento denota deficiência de transparência dos órgãos envolvidos com o manejo da dívida externa brasileira, recomendando-se que a CPI apresente propostas de alterações legais que garantam maior transparência das operações, bem como penalidades pelo descumprimento do art. 32, § 4º, da Lei de Responsabilidade Fiscal, pois conforme acórdãos do TCU, até o momento referido dispositivo não foi cumprido:

Art. 32. O Ministério da Fazenda verificará o cumprimento dos limites e condições relativos à realização de operações de crédito de cada ente da Federação, inclusive das empresas por eles controladas, direta ou indiretamente.

(…)

  • 4o Sem prejuízo das atribuições próprias do Senado Federal e do Banco Central do Brasil, o Ministério da Fazenda efetuará o registro eletrônico centralizado e atualizado das dívidas públicas interna e externa, garantido o acesso público às informações, que incluirão:

        I – encargos e condições de contratação;

        II – saldos atualizados e limites relativos às dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito e concessão de garantias.

 

Em setembro de 2001, o Banco Central noticiou uma diferença de US$ 32,7 bilhões nas estatísticas da dívida externa brasileira. A imprensa divulgou que teria havido um “erro” desse montante. O Banco Central informou à CPI que não se tratava de “erro”, mas de mudança de critérios metodológicos de registros estatísticos, tendo apartado “empréstimos intercompanhias e também parcelas de principal vencidas há mais de cento e vinte dias.”

A análise da resposta apresentada pelo Banco Central demonstrou a deficiência de controle de pagamentos ao exterior, quando efetuados pelo setor privado. Conforme informação prestada pelo Banco Central, o registro desses pagamentos é meramente declaratório e, se o setor privado não efetua o registro eletrônico desses pagamentos ao exterior, o Banco Central não tem como efetuar a baixa em seus sistemas. É importante observar que historicamente dívidas do setor privado foram transformadas em dívidas públicas, conforme chegou a ser confirmado pelo Banco Central que, entretanto, não quantificou nem detalhou tais transformações de dívida privada em dívida pública.

A resposta dada pelo Banco Central demonstrou também o efetivo descasamento entre as informações dos chamados dados “primários” com as estatísticas da dívida externa, conforme trechos da Nota Técnica enviada à CPI, da qual constou, textualmente, que: “a dívida externa constitui uma estatística macroeconômica. Nessa qualidade, ela não se confunde com as bases de dados primárias” (…) “as informações constantes nesses dados primários são convertidas em dados estatísticos de acordo com metodologia própria”. Tal descasamento entre os dados primários e as estatísticas da dívida externa é mais um fato demanda o aprofundamento das investigações e a auditoria da dívida prevista na Constituição Federal.

A partir de 2003, todas as emissões de títulos da dívida externa brasileira passaram a conter a “Cláusula de Ação Coletiva – CAC”, conforme coluna destacada em planilha disponível na página da Secretaria do Tesouro Nacional[19]. A CPI obteve a tradução dos termos da referida cláusula, que determinou alterações fundamentais nas condições do endividamento, tais como a concentração dos poderes em uma super-maioria de credores (que detenham 85% do valor da dívida), no caso de dificuldades de pagamento da dívida.

A referida cláusula prevê que tal super-maioria de credores possa impor que o Brasil renuncie à sua soberania, e que efetue qualquer emenda, alteração, modificação ou renúncia relativa aos títulos de dívida, até mesmo sem o consentimento do Brasil. Essas cláusulas representam um forte indício de que as disposições da CAC violam diversos dispositivos da Constituição Brasileira, demandando estudo jurídico especializado.

A Cláusula CAC não foi objeto de aprovação pelo Senado Federal, apesar de significar alteração substancial das condições pactuadas, garantindo a uma maioria de credores o direito de decidir sobre as regras de uma futura renegociação.

 

A CPI verificou as condições da troca de títulos C-Bonds (sem CAC) por A-Bonds (com CAC) em 2004, por US$ 4,4 bilhões, cuja justificativa apresentada pelo governo foi de que tal troca seria importante para a queda das taxas de juros incidentes sobre as emissões de dívida externa. Porém, conforme cálculos demonstrados na investigação realizada pela CPI, tal fato não se confirmou na prática, pois naquele ano a taxa média (ponderada pelo valor das emissões) anterior ao lançamento do A-Bond foi de 8,31% ao ano, enquanto a taxa média posterior a tal lançamento foi de 10,18% ao ano. Adicionalmente, os custos de tal operação foram elevados, mencionando-se, por exemplo, que foi pago, a título de comissão, o valor de R$ 30 milhões para a troca dos C-Bonds por A-Bonds. Constata-se, assim, a necessidade de aprofundamento das investigações a fim de averiguar a ocorrência de dano ao patrimônio público.

 

Da mesma forma, não se confirmou a justificativa para a realização do resgate antecipado de parte de outros Bônus Brady em 2006, no valor de US$ 6,64 bilhões, tendo em vista que os cálculos demonstrados pela CPI indicaram que tal resgate também não contribuiu para a queda nos juros, como anunciado. Pelo contrário, os juros praticados nos lançamentos que ocorreram após o referido resgate antecipado se elevaram, ou seja, verificou-se que durante aquele ano, as taxas aumentaram significativamente, de 6,95% ao ano para 8,90% ao ano, após o resgate antecipado dos Brady, enquanto o prazo caía fortemente, de 27 para 16 meses. Da mesma forma que na operação antes mencionada, constata-se a necessidade de aprofundamento das investigações a fim de averiguar a ocorrência de dano ao patrimônio público.

Da investigação restou apurado que ao mesmo tempo em que resgatava antecipadamente os títulos Brady, o governo emitia dívida externa mais cara e também acumulava reservas cambiais por meio de emissão de dívida interna a juros bem mais elevados e com prazos curtos, aumentando a vulnerabilidade financeira do país. Tais ações provocaram contínuos prejuízos operacionais ao Banco Central, que foram arcados pelo Tesouro Nacional, ou seja, pela sociedade.

A CPI constatou que a partir de 2006 o Tesouro Nacional passou a comprar antecipadamente diversos tipos de títulos da dívida externa brasileira, com significativo ágio. Os títulos recomprados antecipadamente somaram R$ 24,979 bilhões em seu valor de face, enquanto o valor pago a título de ágio foi de R$ 5,314 bilhões. Isso significa que foi pago, a título de ágio, valor correspondente a 21,27%, em média, do valor de face. Algumas operações chegaram a ser feitas com ágio superior a 50%. Esse é mais um aspecto que demanda o aprofundamento das investigações a fim de determinar se houve má gestão das contas públicas.

Até mesmo os A-Bonds recentemente emitidos (em troca dos C-Bonds) já foram recomprados antecipadamente, com significativo ágio, conforme analisado no capítulo IV da presente análise preliminar.

 

Ao final de 2005, o governo pagou antecipadamente US$ 15,5 bilhões ao FMI, às custas de emissão acelerada de dívida externa e de mais dívida interna, que paga juros muito mais altos que os do empréstimo do FMI e possui prazos muito mais curtos. Tal operação também se demonstrou desinteressante em termos financeiros ao país, pois se pagou antecipadamente dívida externa de custo equivalente a 4% ao ano, às custas de emissão de dívida interna e externa bem mais caras, conforme analisado no capítulo IV da presente análise preliminar.

 

Importante registrar que após o anúncio do empréstimo de US$ 10 bilhões ao FMI, em julho/2009, foram efetuadas outras emissões de títulos da dívida externa: Global 2037, por US$ 525 milhões em 29/07/2009 e Global 2041, por US$ 1,25 bilhão em 30/09/2009, ou seja, ao mesmo tempo em que se faz a propaganda de que ‘a dívida externa acabou’, que ‘somos credores’ e que temos mais de US$ 200 bilhões em reservas cambiais, seguimos emitindo títulos da dívida externa e comprometendo o futuro.

 

Nos 39 anos analisados, o processo de endividamento externo foi marcado por negociações pouco transparentes, com cláusulas lesivas à soberania nacional e condições financeiras extremamente desfavoráveis ao país. A parcela mais relevante do endividamento externo correspondeu à dívida com bancos privados internacionais, cuja contrapartida foi constituída eminentemente por dívida do setor privado no início da década de 70, seguida de endividamento de vários setores, especialmente de empresas estatais que logo foram submetidas à privatização, tendo suas dívidas sido assumidas pela União. A partir da década de 80, a natureza da dívida externa com bancos comerciais passou a ser eminentemente financeira, ou seja, os acordos da década de 80, as conversões em títulos (ou bônus) da dívida externa e as novas emissões da década de 90 e seguinte foram integralmente destinadas ao pagamento de dívida externa e interna, conforme termos dos referidos acordos e atos legais que regem a matéria, fato também apontado em diversos relatórios dos órgãos responsáveis.

 

Verifica-se, portanto, que a análise da dívida externa a partir de 1970 demonstrou que a mesma foi, inicialmente, meramente privada, seguida de endividamento de empresas estatais, cujos montantes se multiplicaram em função da alta unilateral das taxas de juros internacionais, sendo posteriormente objeto de recorrentes renegociações e trocas da mesma dívida anterior, sem representar qualquer benefício ao país. Ao contrário, a dívida externa representou uma transferência líquida ao exterior de US$ 144 bilhões e ainda temos uma dívida externa de US$ 282 bilhões.

 

Relativamente ao controle do endividamento, as investigações feitas evidenciaram deficiências por parte do Banco Central, comprovadas pela ausência de resposta a requerimentos de informações relativamente óbvios, como os que requeriam estatísticas discriminadas por tipo de dívida; conciliações e destinação dos montantes renegociados nas diversas operações com bancos privados internacionais em que o Banco Central assumiu o papel de tomador; discriminação das dívidas privadas estatizadas; controles das garantias adquiridas pelo Brasil por ocasião do plano Brady, cópia de livro de registro da dívida externa, dentre outras, que demonstraram a inexistência de registros estatísticos adequados, ou arquivos apropriados para documentos tão importantes para o país.

 

A CPI recebeu cópia de diversos trabalhos realizados pelo Tribunal de Contas da União sobre o endividamento externo brasileiro, contendo relevantes trabalhos sobre aspectos que são comentados a seguir. Entretanto, é importante ressaltar que a contrapartida da dívida externa contratada com bancos privados internacionais – que historicamente representou a maior parcela da dívida externa – não foi objeto de investigação pelo Tribunal de Contas da União. Dentre os trabalhos enviados à CPI também não foram localizadas investigações sobre os acordos celebrados com bancos privados na década de 80, quando o Banco Central assumiu o papel de devedor, nem sobre as renúncias feitas em 1992, como preparação para o Plano Brady. A auditoria do TCU em relação ao Plano Brady se restringiu a aspectos relacionados à aquisição de parte das garantias colaterais por preço superior ao de mercado e sobre eventual benefício de bancos brasileiros. Também não foram localizadas, dentre os trabalhos enviados pelo TCU à CPI, investigações sobre as emissões aceleradas de títulos da dívida externa a partir de 1995, ou sobre a diferença de US$ 32,7 bilhões em 2001, ou inclusão de Cláusula CAC, ou trocas por dívida interna e externa, ou ainda sobre os resgates antecipados com pagamento de ágio, o que enseja a realização da completa auditoria prevista na Constituição Federal de 1988, até hoje não cumprida.

 

Analisando-se os trabalhos realizados pelo Tribunal de Contas da União (TCU) cujas cópias foram disponibilizadas em atendimento aos Requerimentos de Informações Nº. 68/09 sobressai a constatação da falta de regulamentação do art. 30, incisos I e II da Lei de Responsabilidade Fiscal, no que concerne aos limites globais para o montante da dívida consolidada da União e para o montante da dívida mobiliária federal, cuja preocupação é levantada pelo TCU em vários documentos, parcialmente transcritos a seguir.

No Aviso nº 1447, de 17.12.2009, o TCU citou as principais normas constitucionais e infraconstitucionais que definem o marco regulamentar brasileiro, destacando que: “Embora o Poder Executivo da União tenha encaminhado as propostas para as três esferas de governo, não foram fixados limites e condições para a União”, e, complementa: “(…) a falta de normas que limitem a dívida pública da União sempre foi objeto de preocupação para esta Corte de Contas, tendo sido objeto de destaques especificamente encaminhados ao Congresso Nacional nos seguintes termos do item 9.5 do Acórdão nº 1.573/2006-Plenário referente ao Relatório de Gestão Fiscal da União do 3º quadrimestre de 2005, de relatoria do Ministro VALMIR CAMPELO:

9.5.1 aos Presidentes da República e do Congresso Nacional, em face do que estabelece art. 30 da Lei Complementar n. 101/2000, ressaltando os seguintes fatos preocupantes:

9.5.1.1 a Dívida Líquida do Setor Público atingiu ao final de 2005 o montante de 1,002 trilhão de reais;

9.5.1.2 o crescente endividamento cria a necessidade de geração de superávits primários cada vez maiores, cujos recursos, voltados ao pagamento de juros, deixam de ser aplicados em obras de infra-estrutura ou em políticas sociais, o que vem comprometendo o desenvolvimento nacional;

9.5.1.3 se encontram em tramitação no âmbito:

9.5.1.3.1 do Congresso Nacional, o Projeto de Lei n. 3.431/2000, que “estabelece limites para a dívida pública mobiliária federal”;

9.5.1.3.2 do Senado Federal, a Mensagem n. 154/2000, que cuida da “proposta de limites globais para o montante da dívida consolidada da União, de que trata o inciso I do art. 30 da Lei Complementar n. 101, de 4 de maio de 2000”;

9.5.1.4 a necessidade de legislação específica, prevista no art. 30 da LRF, que defina os limites de endividamento da União (grifou-se)”

 

Ainda segundo o TCU[20] “(…) permanece pendente a fixação de limite para a dívida consolidada e mobiliária da União, a primeira a cargo do Senado Federal e a segunda do Congresso Nacional” e complementa: “(…) a dívida pública, por vezes inevitável e necessária, deve ser controlada de perto, pois seu saldo é fluido, suscetível a alterações que, muitas vezes, são ocasionadas por variáveis que não são objetivamente apuráveis e controláveis. Considerando que a capacidade de tributar do Estado é limitada por imperativo constitucional, a elevação da dívida pública e a necessidade de pagamentos segundo o cronograma pactuado geram, no outro lado, redução de receita disponível para fazer frente a outras despesas necessárias ao funcionamento da máquina e ao desenvolvimento econômico e social da Nação. O comprometimento da receita fiscal com o pagamento da dívida. Por representar passivo de prestações sucessivas numa trajetória de longo prazo é dado do regime financeiro público que demanda cuidado e atenção específicos.

Apesar da relevância de “controlar de perto a dívida pública”, conforme ressaltado pelo TCU, a CPI verificou que o Senado Federal não vem analisando individualmente as operações de crédito externo, como determina a Constituição Federal, tendo editado a Resolução 20/2004 que autoriza emissões até o limite de 75 bilhões de dólares, o que afronta tanto o dispositivo constitucional como o regimento interno do próprio Senado.

O TCU mencionou[21] que são realizadas várias fiscalizações de auditorias “...com o propósito de controlar a dívida pública no seu conjunto, seja por meio das fiscalizações sistemáticas – a cada quadrimestre – dos Relatórios de Gestão Fiscal da União, seja por meio de auditorias e outros instrumentos de controle empreendidos com a finalidade de subsidiar a elaboração do Parecer Prévio a cargo desta Corte de Contas”, tendo juntado ao Aviso 1.435/GP-TCU as principais fiscalizações efetuadas e respectivas cópias de decisões, destacando-se os Acórdão 1.573/2006 e 451/2009-Plenário que: “…permitem identificar desafios enfrentados pela administração pública no controle das operações de crédito, cuja realização impacta diretamente na trajetória almejada para a dívida pública. O Acórdão nº 1.573/2006-Plenário determina a realização de estudos pela STN no sentido de dirimir, para esfera federal – e conseqüentemente para as demais esferas de governo -, um modelo de estruturação de contas contábeis mais preciso, cuja descrição espelhe de forma mais clara os novos conceitos de operações de crédito previstos no § 1º do art. 29 da LRF, com especial destaque para a contabilização das operações provenientes de assunção, reconhecimento e confissão de dívida que não impliquem ingresso de recursos orçamentários, como ocorre com os parcelamentos de débito preexistentes. Por sua vez, o Acórdão n º 451/009 reitera a determinação do primeiro, no sentido de fixar prazo para apresentação de cronograma para a definição das contas, assim como do sistema de transparência da dívida pública do país previsto nos artigos 31 e 32, §§ 4 da LRF e artigo 27 da Resolução do Senado Federal nº  43, de 2001, sistema este ainda pendente de implementação pelo Ministério da Fazenda.

Comunicou o TCU à CPI que o sistema eletrônico exigido pela Lei de Responsabilidade Fiscal que deverá garantir transparência às contratações encontra-se pendente de implantação, o que tem sido acompanhado por recentes acórdãos daquela Corte:

“As auditorias do TCU têm buscado observar a transparência das contratações de operações de crédito por entes públicos, assim como verificar se tais entes têm observado a obrigatoriedade de autorização prévia para realização dessas operações por parte do Ministério da Fazenda, do BACEN e do Senado Federal. Os artigos 31 e 32, § 4º da Lei Complementar nº 101, de 2000, como dito, avançam no sentido de exigir a total transparência da dívida pública contraída pelos entes das três esferas de governo, por meio da institucionalização e manutenção de sistema eletrônico centralizado e atualizado das dívidas interna e externa, garantido amplo e irrestrito acesso ao público, inclusive por meios eletrônicos, dos encargos e condições de contratação e saldos atualizados e limites relativos às dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito e concessão de garantias. Porém, a implementação desse sistema permanece pendente, questão que vem sendo acompanhada pelo TCU conforme se observa do teor dos Acórdãos nº 1.573-20056 e 451/2009-Plenário e destacado no Voto do Relator ao relatar o TC que resultou no Acórdão nº 314/2009-Plenário.”.

“Outras ações relacionadas aos instrumentos facilitadores da gestão da dívida pública apontados na ISSAI 5440 podem ser encontradas nos Acórdãos nº 435/2009-1ª Câmara e 5403/2009-1ª Câmara, que reiteram determinações anteriores no sentido de que os demonstrativos sintético e analítico da dívida consolidada da União passem a ser elaborados a partir das informações do SIAFI, visto que as informações disponíveis no sistema de controle do BACEN não espelham todas as situações consideradas no conceito de operação de crédito e dívida pública definido pela Lei Complementar nº 101, 2000.

 

A CPI constatou que grande parte dos fatos relevantes e objeto de investigação não chegaram a ser auditados pelo TCU, tendo constado também a ausência de contabilização detalhada, aliada à insuficiência de documentação, o que prejudicou a comprovação da contrapartida de grande parte da dívida pública, tanto interna quanto externa, o que constitui mais uma prova da necessidade da realização da auditoria da dívida prevista na CF/88.

Ao final do exame que foi possível realizar nesse curto tempo de duração da CPI, a conclusão foi de que nos 39 anos analisados, a dívida externa passou de US$ 5,4 bilhões em 1970 e alcançou US$ 198 bilhões[22] em 2008, representando uma transferência líquida ao exterior da ordem de US$ 144 bilhões[23], conforme dados estatísticos fornecidos pelo Banco Central à CPI, incluídos na Tabela denominada “Dívida Externa Total” que excluiu os empréstimos intercompanhias a partir de 1993[24].

O gráfico seguinte mostra como o processo de endividamento externo significou, desde a década de 70 até os dias atuais, uma transferência líquida de recursos ao exterior:

Nota: Transferência líquida = Empréstimos recebidos – Amortizações – Juros pagos e refinanciados + líquido de curto prazo. A metodologia utilizada pelo BACEN excluiu empréstimos inter-companhias.

Observe-se que no cálculo da transferência líquida de US$ 144 bilhões não foram computados os onerosos pagamentos decorrentes de comissões diversas (de compromisso, de agente, de negociação, de facilidade, dentre outras), taxas e gastos com o Comitê de Bancos, com os bancos privados, organismos internacionais e gastos de emissão de bônus. O Banco Central apresentou à CPI apenas informações parciais referentes a comissões e gastos com endividamento externo que foram contabilizados no SIAFI, no período de 1987 a 2008, totalizando US$ 6,31 bilhões no período. Somando-se tais gastos, verifica-se que foi feita uma transferência líquida de US$ 150,31 bilhões, e ainda devemos US$ 282 bilhões[25] ao exterior.

Essa transferência líquida de recursos teve forte impacto social no país, que vem acumulando histórica dívida social, com grande parte da população excluída do acesso aos direitos sociais básicos, em flagrante desrespeito ao art. 6º. da Constituição Federal. Ao mesmo tempo em que transferimos grandes somas de recursos para pagamento de dívida externa eivada de ilegitimidades, indícios de irregularidades e até de ilegalidades, convivemos com mais de 10 milhões de brasileiros que passam fome, 46 milhões em condição de pobreza e milhões de desempregados, desamparados, sem acesso a serviços de educação, saúde, moradia, alimento, trabalho, ou seja, sem as mínimas condições para uma vida digna.

 

Além dos aspectos financeiros, a dívida externa foi também o pano de fundo para as mais relevantes alterações econômicas das últimas décadas. O endividamento foi usado como justificativa para as privatizações, para a abertura comercial e financeira, para ausência de controle de capitais, aumento da carga tributária, prática de juros excessivamente elevados, arrocho salarial e enxugamento de gastos e investimentos públicos.

Quando comparamos todos esses impactos sociais e econômicos com a natureza estritamente financeira do endividamento externo com bancos privados (que representa a parcela mais relevante de toda a dívida externa) desde a década de 80, evidencia-se o brutal equívoco desse modelo que tem privilegiado a política de endividamento.

O setor financeiro tem sido altamente beneficiado com a política de endividamento brasileiro, enquanto a sociedade arca com a subtração de direitos sociais além da elevada carga tributária, a fim de garantir o cumprimento das metas de superávit primário e o pagamento dos elevados compromissos decorrentes do endividamento interno e externo. O gráfico a seguir indica o crescente lucro dos bancos no Brasil:

Face aos inúmeros indícios e até evidências de dano ao patrimônio público, é necessário o aprofundamento das investigações e a realização de auditorias permanentes e transparentes, com participação popular, tendo em vista que o ônus da dívida tem sido arcado pela Nação como um todo.

É fundamental ressaltar o custo social do processo de endividamento externo, especialmente diante das dificuldades de se comprovar a contrapartida real dessa dívida ao longo dos 39 anos analisados. A dívida externa tem historicamente subtraído recursos que deveriam se destinar ao atendimento das necessidades sociais prioritárias da sociedade, o que caracteriza desrespeito a fundamentos constitucionais da República Federativa do Brasil: a soberania (Art. 1º, I) e a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III).

Ao subtrair vultosos recursos das áreas sociais, a dívida externa também representa violação de objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: a erradicação da pobreza (art. 3º, III) e, adicionalmente, representa a violação do próprio princípio republicano no sentido do adequado trato da coisa pública pelos agentes do Estado, violando ainda o disposto no artigo 6º. da Constituição Federal.

É evidente a conexão entre as ilegitimidades apontadas na presente análise preliminar sobre a dívida externa e seus impactos à sociedade, decorrentes das medidas econômicas adotadas para permitir o cumprimento das obrigações do endividamento externo, gerando importantes restrições no cumprimento do papel do Estado e na garantia dos direitos sociais à população.

Diante das diversas ilegitimidades, indícios de irregularidades e até de ilegalidades constatadas nesse curto período de duração da CPI, é recomendável o aprofundamento das investigações, especialmente face às evidências de danos ao patrimônio público, à necessidade de buscar ressarcimentos financeiros devidos ao Brasil e, adicionalmente, dada a relevância dos fatos para a evolução do processo de endividamento externo brasileiro, que tem historicamente provocado graves conseqüências sociais e ofensa aos direitos humanos fundamentais da sociedade brasileira.

É recomendável o aprofundamento das investigações relacionadas aos diversos temas mencionados na presente análise preliminar, que abrangeu o período de 1970 a 2008, realizando-se a AUDITORIA DA DÍVIDA PREVISTA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988, tendo em vista a necessidade de elucidar os aspectos fundamentais do endividamento público que não puderam ser desvendados pela atual CPI, dado o exíguo prazo de seu funcionamento e as diversas limitações indicadas.

 É recomendável que os parlamentares da CPI proponham alterações legais a fim de evitar a continuidade de práticas lesivas ao patrimônio público, como as verificadas na presente análise preliminar, especialmente relacionadas às transformações de dívidas privadas em dívidas públicas; às justificativas para emissões de dívida externa quando acumulamos reservas tão elevadas e emprestamos até ao FMI; à exigência de controle individual de cada operação autorizada pelo Senado Federal, impedindo-se o estabelecimento de elevado limite que significa um “cheque em branco” ao Executivo, bem como medidas efetivas ao controle do endividamento público, à manutenção de arquivos públicos sobre o endividamento, com ampla transparência sobre cada operação.

É recomendável a revisão da Cláusula de Ação Coletiva – inserida em todas as emissões de títulos da dívida externa a partir de 2003 – e dos programas de resgate de títulos da dívida externa com ágio no mercado secundário, realizando-se auditorias integrais sobre todas as operações de resgate antecipado que resultaram em prejuízo financeiro às contas públicas.

 

É urgente a revisão da política de acumulação de reservas cambiais via endividamento interno, dado seu elevado custo e utilização para a transformação de dívida externa em interna, como se evidenciou por ocasião do pagamento antecipado ao FMI, bem como a criação de mecanismos de controle de capitais que inibam o ingresso de capitais voláteis, que tem provocado volumosos prejuízos ao Banco Central.

É recomendável a criação de uma Comissão Permanente de Auditoria da Dívida no Congresso Nacional, conforme proposto por integrantes da CPI da Dívida Pública durante os debates. Tal medida se justifica pelo fato de que a dívida tem sido permanente e os órgãos de controle demonstraram grande fragilidade no trato do tema, conforme detalhado no item das limitações da presente análise preliminar.

É recomendável o aprofundamento das investigações por parte do Ministério Público, especialmente diante das evidências de danos ao patrimônio público, e ao flagrante desrespeito aos direitos humanos decorrente da priorização de gastos financeiros.

É urgente a priorização dos recursos para as áreas sociais, revisando-se os dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal que promovem a priorização da formação do superávit primário e o pagamento da dívida.

É necessária a criação da “Lei de Responsabilidade Social”, que obrigue os governos a priorizarem os investimentos nas áreas sociais e a preservação da vida humana em detrimento do pagamento da dívida financeira.

O detalhamento dos aspectos apresentados nessa Introdução estão dispostos nos seguintes capítulos:

O Capítulo I trata de aspectos fundamentais da origem do endividamento acelerado verificado no período de 1970 a 1982, levantando-se, especialmente, aspectos da dívida externa que não foram objeto de comissões anteriores do Congresso Nacional, tais como: a emissão de títulos da dívida externa na década de 70, cujos contratos foram apenas parcialmente enviados à CPI; tentativa de conciliação de cifras, e análise de alguns contratos que foram disponibilizados pelo Ministério da Fazenda à CPI. Analisa-se também o impacto da elevação unilateral das taxas de juros pelo FED norte-americano e as possibilidades de ações concretas em relação a esse tema, que teve papel preponderante no crescimento da dívida externa.

 

O Capítulo II revela as constatações relacionadas às “renegociações” com bancos privados internacionais no período de 1983 a 1992, quando o Banco Central assume o papel de Tomador de empréstimos perante a banca privada internacional. As sucessivas negociações realizadas nesse período exerceram forte impacto na evolução do endividamento público brasileiro, com repercussões que alcançam seu estágio atual. O período foi marcado também por recorrentes negociações com o Fundo Monetário Internacional, formalizadas por meio de Cartas de Intenções, nas quais o país assumia o compromisso de implementar rigorosos “programas de estabilização econômica”, cujas medidas atingiram profundamente a economia nacional, caracterizando, assim, a ingerência direta do Fundo nas decisões de política econômica interna. Foi relevante, também, a interferência expressa do FMI em todas as fases das negociações com os bancos privados internacionais. Verificou-se a existência de sucessivas negociações com o Clube de Paris, simultâneas às fases de negociação com os bancos privados.

 

O Capítulo III trata da troca de grande parte da dívida externa brasileira com bancos privados internacionais, nos moldes do denominado Plano Brady, cujos títulos foram emitidos em 1994. Esta negociação não considerou o valor de mercado da dívida na época e exigiu que o país adquirisse garantias colaterais. Antes da emissão dos títulos em 1994, foram realizadas negociações no ano de 1992, em Toronto, Canadá, que envolveram Solicitação de Renúncia, cujos contratos não foram disponibilizados à CPI. A investigação de tal fato é relevante para determinar se não teriam sido negociadas dívidas já prescritas, tendo em vista o disposto nas leis de Nova Iorque, que regiam todos os acordos objeto de transformação no Plano Brady e que previam a prescrição de dívidas, quando essas não eram pagas no espaço de 6 (seis) anos, segundo o Estatuto de Limitações. Menciona-se também, no capítulo, a seqüência de emissões da dívida externa a partir de 1995. Adicionalmente, foi verificada a causa para a diferença de US$ 32,7 bilhões anunciada pelo Banco Central em 2001.

 

No Capítulo IV são analisados os resgates antecipados de dívida externa ocorridos recentemente, com ágio, bem como a inclusão da Cláusula de Ação Coletiva nos títulos da dívida externa brasileira, os quais representaram importante alteração das condições de negociação. Tal cláusula não foi objeto de aprovação pelo Senado Federal, tendo sido introduzida nas emissões de bônus da dívida externa lançados a partir de abril de 2003.

 

No Capítulo V são analisados os impactos sociais decorrentes do processo de endividamento externo, em conexão com o endividamento interno, tendo em vista as inúmeras ocasiões em que dívida externa foi transformada em interna e vice-versa.

 

Ao final, compilamos as ilegitimidades apontadas em cada um dos capítulos, conectando as mesmas às conseqüências sociais e à subtração dos direitos humanos de forma continuada ao longo dos 39 anos analisados, expondo-se as Conclusões e Recomendações.

 

Considerando que a dívida pública atual é fruto, em grande parte, de sucessivas renegociações de dívidas anteriores, a presente análise visa, também, a atender ao estabelecido no primeiro item do roteiro apresentado pelo Relator da CPI, deputado Pedro Novais, relativamente ao “conhecimento da posição das dívidas fundada, mobiliária e flutuante em 31 de dezembro de 2008, compreendendo a Dívida Federal, dos Estados e dos Municípios”.

1 – OBJETO: Análise de aspectos relevantes do acentuado endividamento externo ocorrido no período analisado – 1970 a 2009. O objeto da investigação incluiu a análise das cópias dos documentos relacionados ao intenso endividamento de empresas estatais, bem como as negociações da dívida externa brasileira com bancos privados ocorridas a partir de 1983, especialmente alguns aspectos fundamentais que não chegaram a ser abordados pelas demais Comissões Parlamentares do Congresso Nacional que enfrentaram a questão do endividamento público brasileiro. Levantamento de questionamentos sobre as operações não transparentes de 1992, realizadas no Canadá, e estudo das renegociações objeto dos contratos disponibilizados à CPI, especialmente os relacionados ao Plano Brady e emissões subseqüentes, cuja motivação era a substituição de dívida interna por dívida externa. Estudo sobre a inclusão da Cláusula de Ação Coletiva nos títulos da Dívida Externa Brasileira a partir de 2003 e análise das diversas operações de resgate antecipado de dívida externa a partir de 2004.

A presente análise amparou-se em cópias dos seguintes documentos e fontes de informações, recebidos pela CPI no período de 18/09/2009 até o dia 25/03/2010:

  • Relatórios de Comissões Parlamentares do Congresso Nacional que enfrentaram a questão do endividamento público brasileiro:
  • CPI da Dívida de 1983 – Relatório do Deputado Sebastião Nery
  • Comissão Especial do Senado Federal de 1987 – Relatório do Senador Fernando Henrique Cardoso
  • Comissão Mista do Congresso Nacional de 1989 – Relatórios do Senador Severo Gomes e do Deputado Luis Salomão.
  • Cópias dos documentos e informações remetidos à CPI, principalmente pelo Ministério da Fazenda, Banco Central, Tribunal de Contas da União e Senado Federal em atendimento a requerimentos de informações formulados pela CPI da Dívida Pública, especialmente Contratos, Acordos, Relatórios, Boletins, dados estatísticos e demais informações prestadas.
  • Livros e publicações:
  • “Dívida Externa Brasileira”, de Ceres Aires Cerqueira, Banco Central do Brasil, 1997. A autora foi chefe-adjunta do Departamento de Dívida Externa do Banco Central do Brasil. O livro, prefaciado pelo Ministro da Fazenda Pedro Sampaio Malan o qual, nesse prefácio respaldou o conteúdo da obra, contou com a revisão de José Linaldo Gomes de Aguiar (chefe do Departamento da Dívida Externa do Banco Central do Brasil), Olímpia Calmon e Cristina Cortes (consultoras do Departamento da Dívida Externa do Banco Central do Brasil), Altamir Lopes (chefe do Departamento Econômico do Banco Central do Brasil), Anuar Kalil (ex-chefe do Departamento de Câmbio do Banco Central do Brasil) e Luiz Carlos Sturzenegger (procurador-geral da Fazenda Nacional).
  • “Dívida Externa e Política Econômica”, Paulo Davidoff Cruz, Instituto de Economia da UNICAMP, 1999.
  • Outras publicações indicadas em notas, páginas web e artigos disponíveis
  • Legislação pertinente à matéria.
  • Depoimentos dos convidados para participar de audiências públicas realizadas pela CPI.

 

2 – METODOLOGIA: Análise da documentação disponibilizada pelos órgãos oficiais a esta CPI da Dívida Pública, bem como demais fontes acima indicadas, relevantes para a investigação da dívida externa no período e para a determinação das causas do elevado pagamento de juros e seus impactos para a sociedade brasileira.

 

O critério utilizado para determinar a relevância está relacionado a aspectos legais, econômicos e sociais que provocaram impactos substanciais desde a origem da dívida externa nos anos 70, com reflexos nas sucessivas renegociações.

3 – DEFICIÊNCIAS e LIMITAÇÕES:

O exíguo tempo disponível para a necessária análise aprofundada de fatos e documentos tão relevantes para a nação brasileira constituiu a principal limitação para a elaboração da presente análise preliminar.

Cabe ressaltar também a reduzida equipe técnica da CPI que, para a análise dos documentos e informações, contou com apenas uma auditora da Secretaria da Receita Federal do Brasil por cinco meses, um auditor da Caixa Econômica Federal por três meses, e uma Assistente Social por três meses. Dois auditores do TCU e dois funcionários de apoio do MPU foram disponibilizados nas últimas semanas. Três requisições de auditores não chegaram a ser atendidas pelos órgãos de origem – SRB – Secretaria da Receita Federal do Brasil, SEFMG – Secretaria de Estado da Fazenda de Minas Gerais e CEF – Caixa Econômica Federal. Verificou-se também deficiência de pessoal da própria Câmara dos Deputados para tarefas de apoio à CPI, além do fato de que os Consultores Parlamentares requisitados pela CPI ficaram exclusivamente à disposição do Relator.

 

A apresentação de respostas parciais e incompletas aos requerimentos de informações formulados pela CPI aos diversos órgãos – Ministério da Fazenda, Banco Central, Senado Federal, Tribunal de Contas da União – bem como diversos pedidos de prorrogação de prazo por parte de diversos órgãos, limitou a profundidade de investigação desta CPI, que não recebeu as informações necessárias ao trabalho de investigação a que se propôs a Comissão.

A ausência de determinadas respostas completas a requerimentos de informações formulados pela CPI por parte do Banco Central – especialmente aquelas em que essa autarquia atuou como tomadora ou parte no período de 1983 a 1994 – revelam deficiências de controle interno e constituem demonstração inequívoca da necessidade de aprofundamento da investigação desde seu crescimento acentuado a partir de 1970, ponto de partida do processo de endividamento externo brasileiro que produz reflexos até os dias atuais, tendo em vista as sucessivas renegociações, conversões e transformações a que foi submetida essa dívida.

Dentre as deficiências de controle interno por parte do Banco Central mencionam-se os seguintes exemplos:

DEFICIÊNCIA DE CONTROLE INTERNO DO BACEN Documentos enviados pelo Banco Central à CPI, que demonstram a referida deficiência de controle
Não encaminhamento à CPI, até o presente momento, de alguns Contratos e Instrumentos de Negociação da Dívida Externa Brasileira com Bancos Comercias, sendo que a maioria era composta por Bancos Privados Internacionais Conforme Ofício 0891/2009-BCB/Secre e Nota Derin/Gabin-2009/149 o Banco Central informou que não localizou os seguintes instrumentos contratuais, que foram requisitados pela CPI:

– Credit and Guaranty Agreement – Acordo de Crédito de Garantia (CGA-1984) – Versão original em inglês

– Interim Financing Agreement (FASE IV – 1987-1988)

– Solicitação de Renúncia (1992)

– Waiver and Amendment Request (1992)

– Acordo de Princípios sobre a Reestruturação da Dívida Externa (1991-1992)

– Collateral Pledge Agreements (FASE V – Brady)

– Phase-In Bonds (FASE V – Brady)

– Closing Documents (FASE I a V)

Não encaminhamento à CPI, até o presente momento, de Tradução para o idioma nacional de Contratos e Instrumentos de negociação da dívida externa brasileira

 

Conforme Ofício 0891/2009-BCB/Secre e Nota Derin/Gabin-2009/149 o Banco Central informou que “está sendo providenciada a tradução dos seguintes instrumentos contratuais, que foram requisitados pela CPI:

-Deposit Facility Agreement (FASE I – 1983)

– Deposit Facility Agreement (FASE II – 1984)

– Interbank Facility Commitment Letter e Trade – Commitment Letter (FASE II – 1984)

– Amendment Nº1 ao Deposit Facility Agreement (FASE III – 1986)

– Interbank Facility Commitment Letter e Trade Commitment Letter (FASE III – 1986)

– Interim Financing Agreement (FASE IV – 1987-1988)

– New Money Bond Subscription Agreement (FASE IV – 1987-1988)

– 1988 Interbank Facility Commitment Letter (FASE IV – 1987-1988)

– Solicitação de Renúncia (1991-1992)

– Waiver and Amendment Request (1991-1992)

– Term Sheet 1992 – Financing Plan (1991-1992)

– Acordo de Princípios sobre a Reestruturação da Dívida Externa (1991-1992)

– C-Bond (FASE V – Brady)

– Collateral Pledge Agreements (FASE V – Brady)

– Phase-In Bonds (FASE V – Brady)

– Closing Documents (FASE I, II, III e V)

Apresentação de apenas minutas (em inglês) dos Contratos de Negociação da Dívida Externa da Fase IV (1988) sem assinaturas Apesar de a CPI ter requisitado cópias dos “originais em inglês”, mediante Ofício 0891/2009-BCB/Secre e Nota Derin/Gabin-2009/149 o Banco Central enviou apenas minutas sem assinaturas e sem data dos seguintes instrumentos contratuais:

– Parallel Financing Agreement;

– Commercial Bank Cofinancing agreement;

– Deposit Agreement;

– Brazil Investment Bond Agreement;

– Multi-year Deposit Facility Agreement;

– New-Money Trade Deposit Facility;

– 1988 Trade Commitment Letter;

– 1988 Interbank Commitment Letter;

– Closing Documents

 

O mesmo fato ocorreu em relação ao contrato do C-Bond (Fase V-Brady), que o Banco Central informou à CPI que “ainda não foram concluídas as pesquisas para a localização do original em inglês desse documento”.

Ausência de informações sobre as dívidas Privadas assumidas pelo Banco Central nos acordos da década de 80 Conforme Nota Derin/Gabin-2010/016, enviada com Ofício 125/2010-BCB-Secre, de 23.02.2010, o Banco Central informou o seguinte em relação às dívidas privadas:

“Com referência ao Ofício nº. 162/10-P, informo que as parcelas de dívida externa privada que foram transformadas em dívida pública a cargo deste BCB são aquelas que permaneceram em depósito sob o Acordo MYDFA e foram trocadas por bônus em abril de 1994. Dado o tempo decorrido e dificuldades já descritas em notas anteriores, não há como realizar, no curto prazo, pesquisa para identificar as milhares de parcelas em suas diferentes moedas, que foram convertidas em bônus. Ademais, os dados estão registrados em sistemas informatizados que já foram desativados, cuja operação é complexa e para a qual esta Autarquia não dispõe de especialistas com os conhecimentos necessários. Haveria que se constituir grupo de trabalho para se estudar os termos dos contratos e a seguir proceder à pesquisa, tarefa que não é possível desenvolver com os atuais recursos da Unidade.”

Não encaminhamento à CPI, até o presente momento, de Acordos de Negociação da Dívida Externa com Bancos Privados que teriam sido firmados em 1992, em Toronto, Canadá Conforme Ofício 0891/2009-BCB/Secre e Nota Derin/Gabin-2009/149, o Banco Central informou à CPI que “ainda não foram concluídas as pesquisas para a localização do original em inglês desse documento”.
Não encaminhamento à CPI, até o presente momento, de tradução das minutas acordadas no âmbito do Clube de Paris em 1983, 1987, 1988 e 1992, bem como das memórias de cálculo solicitadas pela CPI Conforme Nota Técnica Derin/Gabin-2009/154, enviada à CPI com Ofício 938.1/2009-BCB/SECRE, o BC remeteu cópias das minutas acordadas no âmbito do Clube de Paris em 1983, 1987, 1988 e 1992, das quais consta carimbo “Ilegível” e informou que “a maior parte desses contratos está na língua inglesa”.
Não encaminhamento à CPI, até o presente momento, de dados estatísticos relativos a saldos e fluxos de juros e amortizações da Dívida Externa Brasileira por tipo de dívida (Multilateral, Bilateral, Comercial e Privada) Conforme Nota Técnica Depec-2009-211, enviada à CPI com Ofício 782/2009-BCB/Secre, informou o Banco Central que “A compilação das informações primárias para produção das estatísticas de dívida externa é feita de acordo com o padrão metodológico internacional, definido pelo Departamento de Estatísticas do Fundo Monetário Internacional…”(…)”embora existam estatísticas sobre quanto da dívida externa total era devido a cada uma dessas categorias de credores, não eram desagregadas informações específicas sobre os credores da Dívida Externa Federal.”(…) Em relação aos fluxos relacionados com a dívida externa (empréstimos recebidos, amortizações pagas e juros pagos) as estatísticas agregadas do balanço de pagamentos do país, cuja publicação por este Banco Central inicia-se em 1947, não são suscetíveis de desagregação para a finalidade de isolar os relativos ao Governo Federal no período de 1970 a 1992.
Relativamente ao controle do Registro da Dívida Externa solicitado pela CPI, inicialmente o Bacen  alegou dificuldades e empecilhos à sua obtenção.

 

Após pesquisas realizadas pela CPI acerca de controles existentes no FIRCE, foi aprovado novo requerimento de informações, tendo o Bacen encaminhado planilhas digitadas contendo informações resumidas (nº. do registro, a data, o valor, moeda, devedor, UF, credor e país), que não permitiam verificar as condições da operação nem a sua natureza.

 

Após reiterado o pedido de informação sobre as condições das operações e natureza, foi enviada uma das planilhas contendo tais informações

 

 

 

 

Por meio da Nota Técnica Desig/Gabin-2009/04 o Banco Central informou que “a localização, a coleta e a pesquisa inerentes envolvem dedicação integral de servidores, incluindo deslocamentos entre as dez capitais onde há representações desta Autarquia. Por meio da pesquisa realizada inicialmente apurou-se que, em números aproximados: a) o trabalho deve envolver 800.000 (oitocentos mil) processos e registros de contratos, além de possíveis emendas e adições; b) por amostragem, os registros de contratos de que trata, não incluídas as suas possíveis emendas e adições, contêm 3 folhas em cada um deles, resultando 2.400.000 (dois milhões e quatrocentos mil) folhas impressas.

Posteriormente, por meio dos Ofícios 945/2009-BCB/Secre e 975/2009-BCB/Secre, o Banco Central enviou à CPI tão somente planilhas digitadas contendo tão somente o nº. do registro, a data, o valor, moeda, devedor, UF, credor e país.  Não foi disponibilizado acesso da CPI aos registros originais.

Posteriormente, por meio do Ofício 1006/2009 BCB/Secre, enviou uma das planilhas contendo natureza da operação e condições pactuadas.

Tal fato demonstra a impropriedade da resposta inicialmente dada pelo Bacen à CPI por meio da Nota Técnica Desig/Gabin-2009/04 acima citada.

Não encaminhamento à CPI, até o presente momento, de informações fundamentais relacionadas aos grandes acordos de “refinanciamento” da Dívida Externa Brasileira com bancos comerciais ocorridos em 1983, 1984, 1986, 1988 e 1994 especialmente as informações relativas à conciliação dos valores que fizeram parte das sucessivas Fases de negociações com bancos privados internacionais Por meio dos Requerimentos de Informações no. 50, 51, 52 e 56 foram solicitadas informações detalhadas relativas aos grandes acordos com bancos privados, especialmente a composição dos valores objeto de negociação em 1983, 1984 e 1986, bem como as conciliações entre as dívidas existentes e as que foram objeto de “transformação” em 1994.

Conforme Nota Técnica Derin/Gabin-2009/154, enviada à CPI com Ofício 938.1/2009-BCB/SECRE, nenhuma dessas informações foi prestada, tendo sido apresentada solicitação de prorrogação de “prazo adicional de 60 dias para as avaliações…”

Posteriormente, foi aprovado o Requerimento de Informações Nº. 72, cujo item 2 requereu a “Conciliação entre os valores da dívida externa brasileira discriminada por devedor e credor antes e após cada “renegociação” objeto de cada Acordo resultante das negociações da dívida externa com bancos privados internacionais em 1983 (Fase I), 1984 (Fase II), 1986 (Fase III), 1988 (Fase IV), 1992 e 1994 (Fase V).

O Banco Central informou à CPI que “Os valores constantes dos contratos assinados, portanto, já eram os valores conciliados e a conciliação manual não era guardada(Ofício 1.052/09-BCB-Secre, juntamente com Nota Técnica Derin/Gabin-2009/172, de 29.12.2009).

Desativação de bases de dados e programas informatizados utilizados na conciliação dos números de todos os acordos, apesar da previsão constitucional de realização de auditoria da dívida pública, até o momento não cumprida Conforme Nota Técnica Derin/Gabin-2009/154, enviada à CPI com Ofício 938.1/2009-BCB/SECRE, “as bases de dados e programas informatizados utilizados no processo de conciliação dos números de todos os acordos foram desativados em agosto de 2006, pois, encontrando-se concluído, há mais de dez anos, o processo de renegociação da dívida externa, a manutenção das bases e programas em questão, além de desnecessária, representava alto custo.”
Desmonte do setor de controle do endividamento externo Conforme Nota Técnica Derin/Gabin-2009/154, enviada à CPI com Ofício 938.1/2009-BCB/SECRE, “o Derin não dispõe mais de especialistas em matéria de dívida externa, pois os servidores que atuaram no processo de renegociação encontram-se quase todos aposentados …
Registros contábeis insuficientes e indisponíveis em parte do período analisado pela CPI

 

Substituição e complementação de demonstrativos contáveis enviados anteriormente à CPI

Conforme Nota Técnica Deafi – 2009/54, de 29.10.2009, informou o Banco Central que não existem essas informações para o período de 1970 a 1973”. Período 1974 a 1983: “essas informações foram obtidas por meio de cópias de microfichas e microfilmes, as quais não estavam disponíveis para todo o período.”-.”Período 1984 a 1998: “a área de informática do Banco está elaborando programa para a recuperação de dados solicitados pela CPI” Período 1999 a 2008: “enviados os demonstrativos analíticos” .

Conforme Ofício 980.2/2009-BCB/Secre, de 27.11.2009 e Nota Técnica Deafi-2009/61, o Banco Central enviou documentação para complementar e substituir parte da documentação contábil anteriormente enviada por meio da Nota Técnica Deafi – 2009/54.

 

Esta insuficiência de informações fundamentais – dados estatísticos, contábeis e documentais – representou sério limitador para o alcance dos objetivos a que se propôs a CPI da Dívida Pública, comprometendo a execução dos trabalhos.

Outra limitação importante foi a ausência de resposta a vários requerimentos de informações relevantes e sucessivos pedidos de prorrogação de prazo para atendimento ao solicitado.

É também fundamental ressaltar as sérias limitações de pessoal dedicado à investigação e do prazo para a realização dos trabalhos, haja vista a complexidade do tema e o grande tempo consumido em sucessivas reiterações dos pedidos de documentos enviados de forma incompleta e insuficiente à CPI.

4 – OBJETIVOS:

 

  1. Analisar os aspectos fundamentais da ORIGEM do endividamento agressivo verificado no período de 1970 a 1982, destacando-se os seguintes pontos:
  • Marco legal utilizado para amparar o endividamento acelerado na década de 70;
  • Decretos que autorizaram endividamento externo, inclusive por meio de emissão de títulos da dívida externa na década de 70;
  • Formalidades legais relativas aos registros da dívida – impossibilidade de acesso aos registros originais;
  • Análise da conjuntura que propiciou o endividamento agressivo decorrente da super oferta de capitais devida ao excesso de liquidez internacional;
  • Análise estatística – constatação da insuficiência de dados segregados por tipo de dívida – Multilateral, Bilateral e Comercial;
  • Análise da natureza da dívida, em base às fontes disponíveis: contratos enviados pelo Ministério da Fazenda; Resoluções do Senado Federal; Decretos autorizativos de contratação de operações de crédito externo, ressaltando-se os que autorizaram emissão de títulos da dívida no exterior; publicações e planilhas enviadas pelo Banco Central contendo dados sumários sobre os Certificados de Registro relativos a endividamento externo;
  • Predominância do endividamento do setor privado internacional instalado no país, no início da década de 70, seguido de expressivo endividamento das empresas estatais;
  • Contratos com taxas de juros flutuantes;
  • Impacto da elevação unilateral das taxas de juros a partir de 1979 (de cerca de 5 para 20,5%) pelo FED norte-americano na evolução da dívida externa brasileira, bem como sua relação direta com a dívida interna atual;
  • Redução dos preços das mercadorias de exportação;
  • Fechamento das linhas de crédito internacional;
  • Crise financeira internacional e impossibilidade de cumprir os compromissos.
  1. Revelar as constatações relacionadas às “renegociações” com bancos privados no período de 1983 a 1988, que exerceram forte impacto na evolução do endividamento público brasileiro, até seu estágio atual, demonstrando-se a participação do Clube de Paris e ressaltando a interferência expressa do FMI em todas as fases das negociações com os bancos privados:
  • Fase I – 1983
  • Fase II – 1984
  • Fase III – 1986
  • Fase IV – 1988
  • Negociações de 1992

 

  1. Analisar os principais aspectos da negociação de troca de grande parte da dívida externa brasileira com bancos privados internacionais, nos moldes do denominado Plano Brady, cujos títulos foram emitidos em 1994, bem como as emissões aceleradas de títulos da dívida externa a partir de 1995
  • Identificar aspectos relevantes que deveriam ter sido observados na negociação, tais como valor de mercado da dívida, a exigência de garantias colaterais, condições financeiras e demais custos envolvidos, representados por taxas e comissões diversas, gastos do Comitê assessor dos Bancos, dos Agentes e dos próprios bancos privados que foram assumidos pelo Brasil.
  • Investigação sobre os acertos pactuados no ano de 1992, em Toronto, Canadá, que envolveram Solicitação de Renúncia.
  • Determinar se não foram negociadas dívidas já prescritas, tendo em vista o disposto nas leis de Nova Iorque, que regiam todos os acordos objeto de transformação no Plano Brady e que previam a prescrição de dívidas, quando essas não eram pagas no espaço de 6 (seis) anos, segundo o Estatuto de Limitações.
  • Menciona-se também, no capítulo, a sequência de emissões da dívida externa a partir de 1995 e a diferença de US$32,7 bilhões no saldo da dívida externa, anunciada publicamente pelo Banco Central em 2001.

 

  1. Investigar a natureza da Cláusula de Ação Coletiva, incluída nos títulos da dívida externa brasileira a partir de abril de 2003.
  • Analisar os resgates antecipados de dívida externa ocorridos recentemente, com pagamento de ágio a partir de 2006, bem como o pagamento antecipado ao FMI em 2005 e o resgate antecipado de parte dos bônus Brady em 2006.
  • Determinar o ônus que tais operações de resgate antecipado significaram para o país.
  1. Revelar a subtração de direitos humanos fundamentais em decorrência dos pagamentos da dívida externa e a NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DA AUDITORIA DA DÍVIDA PREVISTA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988, tendo em vista que aspectos fundamentais do endividamento público não puderam ser aprofundados pela atual CPI, dado o exíguo prazo de seu funcionamento e as diversas limitações indicadas.

Feita esta introdução, passamos à análise preliminar desenvolvida nos capítulos seguintes, colocando             esta equipe técnica à disposição para quaisquer esclarecimentos que se façam necessários, tendo em vista que diante das limitações antes mencionadas, não foi possível apresentar o presente trabalho de uma forma mais completa e detalhada.

CAPÍTULO I

CPI DA DÍVIDA PÚBLICA

ANÁLISE PRELIMINAR Nº. 5

CAPÍTULO I

ORIGEM DAS NEGOCIAÇÕES DA DÍVIDA EXTERNA

PERÍODO DE 1970 A 1982

I.1 – ANTECEDENTES – Marco Legal – Resumo

O regime autoritário que se instalou no Brasil a partir de 1964 subtraiu não somente a liberdade democrática, mas teve forte influência na vida econômica brasileira.

No que tange ao endividamento público – objeto da presente investigação – a ditadura militar promoveu mudanças significativas na legislação que rege a matéria. Adicionalmente, não havia a devida transparência em relação à contrapartida do elevado crescimento do endividamento no período.

Em 1964, a dívida externa bruta somava US$ 3,294 bilhões. Ainda em 1964 foi autorizada a elevação em 300% dos limites para contrair créditos[26]. Quando terminou a ditadura em 1985, a mesma alcançava US$ 105,171 bilhões, tendo crescido 32 vezes no período. [27]

 

Relevantes alterações legais e autorizações excessivas foram efetuadas no período – a maioria por meio de decretos e decretos-leis.

 

Em 1966 a Lei 5.000[28] permitiu ao Ministro da Fazenda outorgar diretamente o aval do Tesouro Nacional a créditos obtidos no exterior, sem a necessidade de autorização legal específica. O mesmo ato permitiu que o Tesouro tomasse créditos externos – junto a entidades oficiais ou privadas – destinados ao financiamento compensatório de desequilíbrio do balanço de pagamentos ou à formação de reservas internacionais.

 

A Constituição Federal de 1967[29] manteve a atribuição privativa do Senado Federal de “autorizar empréstimos, operações ou acordos externos, de qualquer natureza, aos Estados, Distrito Federal e Municípios.”

 

Em relação aos acordos da União, o art. 83, inciso VIII, da Constituição Federal de 1967 estabelecia que “Compete privativamente ao Presidente celebrar tratados, convenções e atos internacionais, ad referendum do Congresso Nacional”.

 

Autores como Pontes de Miranda defendiam que, por força do artigo 83, VIII, do Texto Constitucional de 1967[30], os empréstimos externos também estavam sujeitos à aprovação do Congresso Nacional [31]:

 

 “Qualquer acordo interestatal, inclusive de participação em organizações supra-estatais, interestatais está sujeito à aprovação do Congresso Nacional. Não importa o nome que se dê ao acordo (tratado, convenção, acordo, declaração, protocolo), nem a classificação ou discriminação (tratados políticos, tratados econômicos ou tratados de comércio, tratados consulares), nem sequer a distinção de fundo (tratados-contratos, tratados-leis).”

 

O Decreto 62.700[32] estabeleceu que “nenhuma contratação de operação de créditos de origem externa, ou de concessão de garantia da União Federal a crédito de origem externa, poderá ser negociada ou ajustada por órgãos integrantes da administração direta e indireta – inclusive autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações de cujos recursos participe a União Federal sem prévio expresso pronunciamento do Ministro do Planejamento e Coordenação Geral sobre o grau de prioridade do respectivo projeto ou programa específico, dentro dos planos e programas nacionais de investimento, bem como sobre a existência de previsão dos correspondentes recursos orçamentários.”

Referido decreto dispôs também sobre a competência privativa do Ministro da Fazenda para firmar, pela União Federal, quaisquer instrumentos de empréstimo, garantia, aquisição de bens e financiamento contratados no exterior, podendo delegá-la nas condições que estabelece.

Em 1969, por meio do Decreto 65.071[33], foi criada a Comissão de Empréstimos Externos – CEMPEX – integrada por representantes do Ministério do Planejamento e Coordenação Geral, Ministério da Fazenda, Ministério das Relações Exteriores, Banco Central do Brasil S.A. e Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico, com o objetivo de manter política harmônica de endividamento externo, efetuar o exame conjunto pelos diversos órgãos com interferência na matéria, coordenar os diferentes aspectos da contratação de créditos no exterior, “com vistas a imprimir maior celeridade no seu processamento“.

O endividamento externo tanto do setor público como do setor privado apresentou crescimento acelerado na década de 70. Nessa década, foi relevante a utilização dos “empréstimos em moeda” mediante a utilização da Lei 4.131/62[34], bem como da Resolução 63 do Banco Central do Brasil[35], conforme dados estatísticos mencionados posteriormente na presente análise.

A Lei 4.131/62 disciplinou a aplicação do capital estrangeiro e as remessas de valores para o exterior. Esta lei passou a amparar os chamados “empréstimos em moeda” que poderiam ser concedidos por bancos, companhias ou pessoas físicas diretamente a tomadores no país, sendo tais operações previamente autorizadas pelo Banco Central[36] mediante expedição de Certificado.

 

A lei 4.131/62 foi regulamentada pelo Decreto 55.762[37]. A contratação de tais empréstimos dependia de anuência prévia do Banco Central que, segundo José Eduardo de Carvalho Pereira[38], “examinava cada solicitação, à luz de um mapa de controle dos ingressos e maturação dos créditos”.

 

A Resolução 63 do Banco Central permitiu aos bancos comerciais e privados a obtenção de empréstimos em moeda estrangeira a serem repassados (em cruzeiros) a empresas industriais e comerciais no país, para financiamento de capital fixo ou de giro.  Os empréstimos via Resolução 63 também dependiam de autorização prévia do Banco Central.

Em 1972 foi estabelecido o prazo mínimo de amortização de 10 (dez) anos para os empréstimos externos que pretendessem se beneficiar da isenção do imposto de renda instituída pelo Decreto-lei 1.215[39]. Tal medida foi motivada pela “oferta de recursos externos ao Brasil em níveis sem precedentes” e visou a “uma melhor distribuição no tempo dos compromissos decorrentes de nosso endividamento externo”, tendo sido proposta a “criação de incentivos tendentes a conduzir uma parte da demanda de recursos externos para uma faixa de tempo mais extensa”.

Em 1974, com a Resolução 279[40] suspendeu-se o depósito obrigatório incidente sobre o contravalor em cruzeiros dos empréstimos regulados pela Lei 4.131/62 e pelas Resoluções 63 e 64, sendo, destarte, introduzido elemento de estímulo às operações dessa natureza pela diminuição dos custos para o mutuário[41].

 

Nesse mesmo ano foi editado o Decreto-lei no. 1.312[42] que, além de vários outros aspectos relevantes elevou limites para o endividamento e alargou as condições para a concessão de garantias por parte do Tesouro Nacional.

 

Relativamente ao aspecto legal, cumpre ressaltar que o Decreto-lei 2.070/83[43] introduziu o parágrafo único ao artigo 1º. do Decreto-lei 1.312/74, permitindo que o Tesouro Nacional pudesse contratar ou garantir créditos com o fim de promover “consolidações” e “refinanciamentos” de créditos obtidos no exterior. Tal modificação é datada de 14 de dezembro de 1983. Os acordos referentes às negociações com os bancos privados encontram-se datados de 25 de fevereiro de 1983[44], quase 10 (dez) meses antes da edição da precitada alteração legal, ou seja, tais acordos de “consolidações” e “refinanciamentos” foram firmados quando a legislação vigente ainda não amparava especificamente as operações de consolidação e refinanciamento. Esse fato constitui indício de que não havia previsão legal para a assinatura dos acordos de refinanciamento em fevereiro de 1983, o que demanda estudo jurídico mais aprofundado.

 

Tais operações realizadas a partir de 1983 significaram, na realidade, pagamentos diretos de dívidas no exterior e a assunção de onerosas dívidas diretamente pelo Banco Central, na condição de “Tomador”[45], situação que também demanda estudo jurídico aprofundado, pois tal fato não foi objeto de exame por comissões anteriores do Congresso Nacional.

 

I.1.1 – Atos Legais autorizativos de operações de crédito externo:

 

Durante os trabalhos de análise da atual CPI da Dívida Pública, foram localizados e compilados vários decretos, autorizativos de operações de empréstimos externos, editados a partir de 1970, durante a vigência do regime militar, conforme detalhado no Anexo I e comentados em itens subseqüentes da presente análise.

 

Tais decretos não contêm o necessário detalhamento das operações e teriam que ser analisados juntamente com os contratos respectivos. Procedendo-se à conferência dos mencionados decretos relacionados no Anexo I da presente análise preliminar com o conjunto de contratos enviados a esta CPI da Dívida Pública pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional[46], verificou-se foram enviados os contratos correspondentes a apenas 7 (sete) decretos listados no Anexo I. Diante disso, foi solicitado ao Banco Central e ao Ministério da Fazenda o envio dos contratos faltantes[47], que são analisados no presente capítulo.

Os decretos localizados (Anexo I) somam, no período de 1970 a 1982, a cifra de US$ 8.520.402.769,68[48] e explicam apenas uma pequena parcela das elevações nos saldos estatísticos do período, constantes da tabela “Dívida Externa Total”, enviada pelo Banco Central a esta CPI em atendimento parcial a requerimentos de informações[49], o que demanda o aprofundamento dos trabalhos para o esclarecimento da origem do endividamento externo na década de 70.

I.1.2 – Formalidades legais – Contratos e Registros

O Decreto nº. 24.036, de 26 de março de 1934[50], em seu art. 104, letra “d” estabeleceu a atribuição legal e a competência do gabinete da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional de “registrar os contratos depois de aprovados, e fiscalizar sua execução”.

 

A Lei nº. 1.807/53 instituiu, “nos casos de especial interesse para a economia nacional” e quando destinados ao financiamento de projetos aprovados pelo governo federal, o registro obrigatório de capitais estrangeiros junto à SUMOC – Superintendência da Moeda e do Crédito, que foi durante muitos anos um órgão normativo de importância na formulação das políticas monetária e cambial.

 

A Lei 4.131/62 determinou que todos os ingressos de capitais estrangeiros, bem como a totalidade das operações financeiras com o exterior[51] fossem regularmente registrados.

 

A Lei 4.595/64[52], em seu art. 8º, transformou a SUMOC em autarquia sob a denominação de Banco Central da República do Brasil estabelecendo, em seu art. 9º, que “compete ao Banco Central da República do Brasil cumprir e fazer cumprir as disposições que lhe são atribuídas pela legislação em vigor e as normas expedidas pelo Conselho Monetário Nacional.”

 

O Decreto 55.762/65[53] estipulou a necessidade de emissão de certificado de todos os ingressos de capital estrangeiro que constavam no “Registro Geral de Financiamentos Externos – RGFE”, inicialmente registrados pela SUMOC e que a partir de 1965 deveriam estar sendo registrados junto ao Departamento de Fiscalização e Registros de Capitais Estrangeiros – FIRCE do BACEN.

 

Em atendimento ao Requerimento de Informações 44/09 desta CPI, referente à solicitação de cópia do Registro de Contratos da Dívida Externa sob a forma de livros, fichas ou outro instrumento de controle, o Banco Central[54] respondeu que “a localização, a coleta e a pesquisa inerentes envolvem dedicação integral de servidores, incluindo deslocamentos entre as dez capitais onde há representações desta Autarquia. Por meio da pesquisa realizada inicialmente apurou-se que, em números aproximados: a) o trabalho deve envolver 800.000 (oitocentos mil) processos e registros de contratos, além de possíveis emendas e adições; b) por amostragem, os registros de contratos de que trata, não incluídas as suas possíveis emendas e adições, contêm 3 folhas em cada um deles, resultando 2.400.000 (dois milhões e quatrocentos mil) folhas impressas.

 

Posteriormente, em atendimento ao Requerimento de Informações nº. 57/09, referente à solicitação de “registros existentes no Banco Central referentes a registros de empréstimos externos, a exemplo da Relação de Certificados de Registros de Capitais Estrangeiros junto ao FIRCE (publicados em Boletim Mensal do BC)”, o Banco Central respondeu[55] que “as bases em que estão armazenados esses dados requerem a utilização de linguagem em desuso e de domínio restrito a poucos servidores ainda em atividade” e “a impressão demandaria cerca de 20.000 folhas, tendo solicitado o prazo de 20 (vinte) dias adicionais.

 

Em seguida, o Banco Central enviou[56] à CPI tão somente planilhas digitadas, em meio eletrônico, contendo informações parciais sobre as operações, ou seja: nº. do registro, data, valor, moeda, devedor, UF, credor e país, que não permitiam verificar o objetivo da operação nem suas condições (juros, prazos par amortização, taxas, etc).

 

Após reiterado o pedido de informação das condições pactuadas e natureza dos empréstimos o Banco Central enviou à CPI novo CD contendo tais dados dos empréstimos “sem aval” (Ofício 945).

 

É importante ressaltar que os dados informados por meio das planilhas enviadas com os Ofícios 945 e 975-BCB/Secre demonstram a inconsistência das dificuldades inicialmente alegadas pelo Banco Central por meio do Ofício 894-BCB/Secre, de que teria que “envolver 800.000 processos” em todo o país para obter os referidos dados dos registros de empréstimos externos, que resultariam em “2.400.000 folhas impressas”.

 

A CPI reiterou o pedido para a complementação dos dados relativos aos empréstimos[57], informando também a natureza jurídica do devedor e do credor, o garantidor e encargos acessórios, tendo o Banco Central enviado CD com informações parciais adicionais[58].

 

Não foi entregue à CPI cópia dos controles originais dos Registros de Contratos da Dívida Externa junto ao Banco Central, do qual devem constar todas as operações, em forma seqüencial, bem como as informações relacionadas a cada operação, fato que demanda o aprofundamento das investigações.

 

É relevante observar que vários artigos da Lei 4.131/62 mencionam a existência de “contrato” e “registro”, bem como das condições financeiras das operações de crédito externo, a exemplo do que consta do seu art. 8º que estabelecia o seguinte:

 

“As remessas de juros de empréstimos, créditos e financiamentos serão consideradas como amortização do capital na parte que excederem da taxa de juros constante ao contrato respectivo e de seu respectivo registro, cabendo à SUMOC impugnar e recusar a parte da taxa que exceder à taxa vigorante no mercado financeiro de onde procede o empréstimo, crédito ou financiamento, na data de sua realização, para operações do mesmo tipo e condições.” (grifos nossos)

 

De igual forma, o art. 9º. estabelecia que:

 

“….as pessoas físicas e jurídicas que desejarem fazer transferências ao exterior a título de lucros, dividendos, juros, amortizações, royalties, assistência técnica científica, administrativa e semelhantes, deverão submeter aos órgãos competentes da SUMOC e da Divisão do Imposto sobre a Renda, os contratos e documentos que forem considerados necessários para justificar a remessa.”  (grifos nossos)

 

Constata-se, a partir dos dispositivos legais, que desde a vigência da Lei 4.131/62 todo e qualquer pagamento de encargos da dívida deveria estar respaldado em contrato. Adicionalmente, deveria haver contrato e registro das operações, sem os quais não deveria ser autorizado o pagamento dos juros.

  1. 2 – EVOLUÇÃO DO ENDIVIDAMENTO EXTERNO BRASILEIRO – PERÍODO 1970 A 1982
  2. 2.1 – CONJUNTURA

No início da década de 70, ante o excesso de liquidez internacional, decorrente principalmente da elevação do preço do petróleo, os bancos privados internacionais assumiram papel preponderante no mercado financeiro mundial, passando a ofertar grandes somas de empréstimos aos países de Terceiro Mundo, com taxas de juros aparentemente atrativas, porém “flutuantes”, ou seja, a cláusula contratual relativa aos juros previa a variação das taxas pactuadas, geralmente com base na variação das taxas LIBOR – London InterBank Offered Rate ou PRIME – Prime Rate of New York[59].

Além da aparente vantagem de taxas de juros momentaneamente baixas (embora flutuantes), os bancos privados apresentavam adicionalmente outros atrativos para estimular o endividamento, ressaltando-se generosos prazos de carência para o início do pagamento das amortizações.

Simultaneamente a esse esbanjamento da oferta de crédito externo com o oferecimento de juros e prazos de carência atrativos, no Brasil ocorria exatamente o oposto, com restrições ao crédito interno e taxas de juros elevadas, o que constituiu mais um incentivo ao endividamento externo. Segundo Paulo Davidoff Cruz, “o diferencial do custo do dinheiro favoreceu, de forma substancial, as operações externas via Lei n. 4131[60], conhecida como lei do capital estrangeiro.

Lembramos que, além do fato da elevação dos preços do petróleo no mercado internacional, levando grandes somas de recursos a depósito nos bancos privados internacionais, outro fator que influenciou o excesso de liquidez internacional foi a desvinculação do dólar ao ouro em 1970, conforme abordado no relatório da CPI da Dívida de 1983[61]:

“As causas imediatas que explicam o crescimento da liquidez internacional, numa primeira fase, após 1950, são os persistentes déficits incorridos pelos EUA nas suas contas externas e no conseqüente acúmulo de grandes saldos financeiros nos Bancos Centrais dos países mais desenvolvidos e também nas empresas transnacionais, que se tornam ainda mais expressivas quando o governo norte-americano decide suspender a convertibilidade do dólar em ouro.”

Inúmeros autores, bem como as comissões que previamente analisaram a questão do endividamento externo, ressaltaram o fato de que a conjuntura de excesso de liquidez internacional contribuiu fortemente para o crescimento do volume do endividamento público brasileiro na década de 70[62].

Outro fator preponderante para o crescimento do estoque da dívida externa brasileira foi a elevação unilateral das taxas de juros internacionais a partir de 1979, conforme análise mais detalhada nos próximos itens do presente texto.

Segundo dados apresentados pelo Banco Central a esta CPI[63] relativos aos saldos finais da dívida externa total em dezembro de cada ano, reproduzidos no Anexo III à presente análise preliminar, o estoque da dívida externa total partiu de US$ 5,40 bilhões[64] no início de 1970 para US$ 85,49 bilhões em 1982, valor 15,8 vezes superior, apesar dos vultosos pagamentos de juros e amortizações realizados no período.

 

I.2.2. – ANÁLISE DA COMPOSIÇÃO DA DÍVIDA NO PERÍODO

I.2.2.1 – ANÁLISE ESTATÍSTICA

A fim de analisar a composição da dívida externa do período foram solicitados ao Banco Central e ao Ministério da Fazenda os dados estatísticos anuais, contendo o estoque da dívida externa – saldo inicial e final – bem como os fluxos de ingressos e pagamentos de amortizações e juros – demonstrando-se o saldo final anual, segregando-se tal informação por tipo de dívida (Multilateral, Bilateral, Comercial e Privada).

 

O Banco Central informou a esta CPI[65] que “não é possível reconstruir a série histórica da Dívida Externa Federal com Multilaterais, Bilaterais e Bancos Privados a partir de 1975, desagregação possível somente a partir de 1997”.

Os dados estatísticos desagregados por tipo de dívida desde 1970 foram solicitados também ao Ministério da Fazenda que informou à CPI[66] que “a STN somente possui informações sobre saldos, movimentação financeira de contratos, pagamento de principal e juros a partir de 1993”. Acrescentou ainda que “informações anteriores ao período mencionado somente podem ser fornecidas pelo Banco Central, com base em seus registros estatísticos da movimentação de capital estrangeiro no país.

 

O pedido de dados estatísticos foi reiterado ao Banco Central que informou[67] que “para atender à solicitação da CPI a tabela foi elaborada…”, denominada “Dívida Externa Total”, que se encontra reproduzida no Anexo III da presente análise preliminar. A metodologia utilizada para construir a tabela denominada “Dívida Externa Total” consta da Nota Técnica Depec-2009/248:

 

“Para atender à solicitação da CPI, a tabela foi elaborada contemplando as seguintes metodologia e fontes de dados.

  1. A linha “Dívida Externa Total – Estoque Final” apresenta a série agregada da dívida externa do país, de 1970 a 2008;
  2. Para os desembolsos e amortizações de operações de médio e longo prazos, foram considerados os fluxos do balanço de pagamentos do país, excluídas as operações intercompanhias por se constituírem componentes dos investimentos diretos;
  3. Para os fluxos de curto prazo, são informados apenas os valores líquidos, posto que a base de dados para essas operações são balanços patrimoniais do setor bancário e, dessa maneira, os fluxos são estimados pelas variações de estoques;
  4. Adicionalmente, foi incluída linha denominada “Outros”, composta pelos fatores residuais para a variação anual do estoque da dívida externa não originados de fluxos de pagamentos e recebimentos, tais como variações por paridade;
  5. A partir dessas informações, para cada ano, a partir de 1971, partiu-se do estoque ao final do ano anterior, linha “Dívida Externa Total – Estoque Inicial” e foram considerados os desembolsos, as amortizações e os outros fatores, para alcançar o estoque final do referido ano;
  6. Adicionalmente, para atender à solicitação de juros devidos e pagos, foram informadas as despesas de juros, na linha “juros pagos”. Estão informados, também, os “juros refinanciados” e os “juros atrasados” que, em ambos os casos, referem-se a valores devidos e não pagos no vencimento. A fonte dessas informações de juros são as estatísticas do balanço de pagamentos do país.”.

 

 

Cumpre ressaltar que foram solicitados esclarecimentos e dados acerca da exclusão dos empréstimos intercompanhias, por meio do Ofício nº. 122/09-P, de 26.11.2009, e, somente em 10.12.2009 o Bacen, por meio do Ofício 1014/2009, de 09.12.2009, encaminhou a Nota Técnica Depex-2009/273, de 08.12.2009, na qual esclarece que “… os empréstimos intercompanhias foram excluídos do total da dívida externa a partir de 1992, inclusive, por ser este o primeiro ano para o qual se podem identificar na base de dados de dívida externa essas relações. Em função disso, enviamos tabela anexa, nos moldes requeridos pela CPI-Dívida Pública, com informações de 1993, incluindo o estoque ao final do ano anterior, a 2008”.

Cabe observar que a Tabela Dívida Externa Total continha nota informando que a exclusão havia sido efetuada a partir de 2001, portanto, o esclarecimento prestado em dezembro/2009 conflita com a informação que constou anteriormente da Tabela Dívida Externa Total.

 

É importante lembrar que as empresas multinacionais sediadas no Brasil tiveram participação relevante no endividamento externo brasileiro.

 

Por sua vez, a dívida externa contratada pelo setor privado chegou a representar 75% dos empréstimos em moeda no início da década de 70, havendo necessidade de aprofundar os trabalhos de investigação sobre os impactos dessa dívida privada na evolução do endividamento externo brasileiro, especialmente diante do fato de que não foi atendido o requerimento de informações que solicitou o detalhamento das dívidas privadas que foram transformadas em dívida pública.

 

Após uma análise da nova tabela encaminhada à CPI pelo Bacen[68], constata-se que o valor dos estoques dos empréstimos intercompanhias, no período de 1993 (US$ 7.565 milhões) a 2008 (US$ 64.570 milhões), foi ampliado em mais de 750%, daí a relevância dessa informação e a necessidade de aprofundamento dos trabalhos de investigação.

 

Adicionalmente, foi informado à CPI que “O Banco Central é o responsável pela publicação das estatísticas oficiais relativas à dívida externa do país, cuja série histórica inicia-se em 1970, e também o balanço de pagamentos, cuja série anual origina-se em 1947. Para ambos os casos, a compilação das informações primárias para a produção das estatísticas é feita de acordo com o padrão metodológico internacional, definido pelo Departamento de Estatísticas do Fundo Monetário Internacional (FMI) em seus manuais de balanço de pagamentos e de dívida externa, revisados periodicamente.”

 

Tal informação é relevante, pois demonstra que a estatística fundamental (relativa à informação básica de estoque e fluxo de pagamento de juros e amortizações) teve que ser construída para atender à CPI, pois a estatística disponível foi elaborada de acordo com normas do FMI, que não atendem ao princípio da transparência exigido da administração pública, previsto na Constituição Federal Brasileira.

 

Alertamos ainda para o fato de que a ausência de informações estatísticas desagregados por tipo de dívida externa (Multilateral, Bilateral e Comercial) demonstra séria deficiência de controle interno daquela autarquia e significou considerável prejuízo aos trabalhos da CPI.

À vista dos dados globais da Dívida Externa Total, disponibilizados a esta CPI pelo Banco Central (Tabela – Anexo III), evidencia-se os seguintes movimentos globais em termos de estoque e fluxo:

 

ESTOQUE – DÍVIDA EXTERNA TOTAL – 1970 A 1982
Em milhões de US$
Saldo inicial em 1970 5.397
Saldo final em 1982 85.488
Variação Nominal 79.248
Variação Percentual 1.584%

Fonte: Dados fornecidos pelo Banco Central – Tabela reproduzida no Anexo III da presente análise preliminar

É impressionante o crescimento exponencial da dívida externa brasileira no período analisado, especialmente considerando-se que o volume de pagamentos efetuados somente a título de amortizações e juros no período correspondeu ao expressivo percentual de 87% dos ingressos registrados no mesmo período:

FLUXO – DÍVIDA EXTERNA TOTAL – 1970 A 1982
Ingressos de recursos Desembolsos 114.247
Saídas

de

recursos

Amortizações

50.831
 

Juros

48.293
Soma amortizações e Juros 99.124

Fonte: Dados fornecidos pelo Banco Central – Tabela reproduzida no Anexo III da presente análise preliminar

Os outros fatores informados na tabela proporcionada pelo Banco Central (Operações de Curto Prazo e “Outros”) tiveram saldos positivos e negativos durante os anos do período analisado, tendo globalmente representado o seguinte resultado:

Líquido de Operações de Curto Prazo…………          US$ 7.263 milhões

“Outros” …………………………………………………          US$ 9.335 milhões

Refazendo-se o quadro do fluxo com os resultados anuais desses dois fatores, conforme constou da tabela elaborada pelo Banco Central (Anexo III), somando-se às amortizações os saldos negativos desses fatores e aos desembolsos os saldos negativos tem-se o seguinte movimento:

FLUXO – DÍVIDA EXTERNA TOTAL – 1970 A 1982
Desembolsos 114.247
Líquido CP (positivo) 8.203
“Outros” (positivo) 14.863
Soma “Ingressos” 137.313
Amortizações 50.831
Líquido CP (negativo) 864
“Outros” (negativo) 5.528
Soma “Saídas” 57.223
Juros 48.293
Soma “Saídas” e Juros 105.516

 

Considerando que o Banco Central informou a esta CPI que “não é possível reconstruir a série histórica da Dívida Externa Federal com Multilaterais, Bilaterais e Banco Privado a partir de 1975, desagregação possível somente a partir de 1997”, visando a subsidiar os trabalhos da CPI da Dívida Pública recorremos aos Relatórios publicados anualmente pelo Banco Central, em busca das informações ali registradas sobre o endividamento externo.

 

Observou-se a divergência entre saldos publicados nos referidos relatórios anuais publicados e os saldos anuais constantes da Tabela Dívida Externa Total elaborada pelo Banco Central para atender à CPI[69], tendo sido solicitados esclarecimentos a respeito da fonte dos dados utilizados na referida tabela, conforme requerimento de informações nº. 70/09. O mesmo requerimento solicitou esclarecimentos sobre o tratamento dado aos “juros atrasados”, bem como sobre os relevantes montantes indicados sob a rubrica “Outros”, que foram genericamente esclarecidos por meio da Nota Técnica Depec-2010/003, enviada com Ofício 04/2010/BCB-Secre, de 04/01/2010.

 

Apesar de o Banco Central não ter fornecido à CPI os dados estatísticos da dívida externa por tipo de credor, analisando-se os Relatórios Anuais publicados por aquela autarquia, foi possível identificar tabelas contendo dados da posição (estoque) da dívida em cada ano. Os dados publicados não permitiram identificar os fluxos de pagamento por tipo de dívida externa, o que representou um grande limitador aos trabalhos da CPI.

 

Verificou-se que no período compreendido entre 1970 e 1994, as tabelas contendo a posição do estoque da dívida em cada ano seguiam um padrão semelhante de disposição dos dados, o que nos permitiu elaborar uma série histórica do estoque da dívida externa registrada pelo Banco Central.

A Tabela construída com base nos dados dos Boletins do BC encontra-se no Anexo VI à presente análise preliminar, sendo que a mesma tabela permitiu a elaboração do gráfico a seguir, que mostra que a parcela mais relevante da dívida externa brasileira foi a dívida contratada com bancos privados internacionais[70].

Dívida Externa Registrada no Banco Central – US$ milhões – 1969 a 1994

Fonte: Relatórios Anuais do Banco Central disponibilizados à CPI da Dívida.

Nota: O gráfico permite visualizar nitidamente que, a partir do início da década de 90, iniciou-se o processo de substituição da dívida contratual por bônus (operações indicadas em azul no gráfico), com o lançamento do IDU Bonds e BIB. Em 1994 essa dívida foi transformada nos bônus Brady. O mesmo gráfico também evidencia que não houve redução na dívida externa total quando da negociação nos moldes do Plano Brady, em 1994.

A partir da análise dos dados, constatou-se que a parcela mais relevante da dívida externa brasileira (indicada na cor vermelha no gráfico acima) correspondeu, historicamente, aos chamados “Empréstimos em Moeda” realizados ao amparo da Resolução 63, de 21/08/67; Resolução 289, de 14/01/65; e principalmente a Lei 4.131, de 03/09/62. Tais empréstimos em moeda correspondiam fundamentalmente a empréstimos obtidos junto a bancos comerciais – em sua maioria bancos privados internacionais – e eram autorizados, controlados e registrados pelo Banco Central.

I.2.2.2 – ANÁLISE DA NATUREZA DA DÍVIDA EXTERNA – 1970-1982

Mediante Requerimento de Informações No. 11, de autoria do dep. Ivan Valente, foram solicitadas – ao Banco Central e ao Ministério da Fazenda – cópias de todos os contratos de endividamento externo do período.

 

O Banco Central enviou à CPI unicamente cópias de Cartas de Intenções com o FMI e cópias de contratos de renegociação da dívida externa posteriores a 1983, tendo informado[71], em relação aos demais instrumentos solicitados:

“Contratos de endividamento externo público brasileiro – a cargo do governo federal e de empresas estatais – firmados a partir de 1970 com bancos comerciais e demais credores internacionais : “este Derin está pesquisando os contratos individualizados …”

– Contratos de emissões de títulos da dívida externa brasileira por intermédio de bancos privados internacionais a partir de 1970, vigentes e liquidados: conforme entendimentos com o Ministério da Fazenda/STN, esse item será atendido por aquele Ministério, que detém todas as informações a respeito.

 

 

  1. ANÁLISE DOS CONTRATOS ENVIADOS PELO MF/PGFN:

 

O Ministério da Fazenda enviou à CPI[72] cópias de instrumentos contratuais resgatados junto à Procuradoria Geral da Fazenda Nacional[73]. Relativamente ao período analisado neste capítulo – de 1970 a 1982 – constam 108 contratos de endividamento externo que compreendem operações de crédito externo com aval da União, contraídas pelo setor público junto a bancos públicos, privados, organismos internacionais e totalizam o montante de US$ 9,024 bilhões.

 

Considerando que o Banco Central informou que o total de ingressos[74] no período de 1970 a 1982 somam US$ 114 bilhões, os contratos enviados pelo MF/PGFN constituem uma ínfima parte do valor contratado no período, correspondente a apenas 7,92% dos empréstimos. Tal discrepância é significativa, mesmo ponderando-se que tais US$ 114 bilhões incluem a dívida externa do setor privado, de estados e dos municípios.

 

A CPI elaborou uma planilha com os contratos recebidos do Ministério da Fazenda[75]. Para análise foram selecionados, por amostragem, os cinco contratos de maior valor no período, dentre os contratos enviados à CPI:

 

DATA VALOR (US$)[76] DEVEDOR CREDOR PROJETO FINANCIADO
23/07/1976 746.298.762 Furnas Centrais Elétricas SA KFW – Kreditanstalt Fur Wiederaufbau Usinas nucleares Angra 2 e Angra 3
24/10/1978 700.000.000 Cia Siderúrgica de Tubarão Bank of Tokyo e outros Contrato de empréstimo enviado à CPI não informa
27/10/1982 600.000.000 Companhia Vale do Rio Doce Bank of America Contrato de empréstimo enviado à CPI não informa
28/07/1980 400.000.000 Eletrobrás Morgan & CIA Contrato de empréstimo enviado à CPI não informa
21/06/1982 300.000.000 Eletrobrás Bank of America e outros Contrato de empréstimo enviado à CPI não informa
SOMA 2.746.298.762

 

 

A amostra de apenas 5 contratos selecionados dentre os enviados pela PGFN é bastante significativa, pois corresponde a 30,43% do valor dos 108 contratos enviados à CPI, relativos ao período analisado de 1970 a 1982.

 

Consultando os pareceres jurídicos da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional que foram encaminhados à CPI[77], correspondentes aos referidos contratos constata-se que somente o parecer relativo ao endividamento de Furnas apresenta maiores detalhes do projeto financiado e das operações de crédito decorrentes de Acordo de Cooperação Técnica. Os outros quatro pareceres são bem resumidos e informam, de maneira genérica, a destinação dos recursos, conforme quadro a seguir. As taxas de juros pactuadas eram variáveis:

 

DEVEDOR DESCRIÇÃO DA DESTINAÇÃO DOS RECURSOS CONSTANTE DO PARECER DA PGFN TAXA DE JUROS PACTUADA
Furnas Centrais Elétricas SA Destinado ao financiamento de bens e serviços para unidades Angra 2 e Angra 3 , da Central Nuclear Almirante Alvaro Alberto…decorrente do Acordo entre o Brasil e a Rep. Federal da Alemanha sobre Cooperação no Campo dos Usos Pacíficos de energia Nuclear, feito em Bonn, Alemanha, em 27 de junho de 1975 – Parcial I de DM 350 milhões: taxa de 7,25 a. a

– Parcial II de DM 1.850 milhões: as taxas serão fixadas pelo Kreditanstald em 1 de março, 1 de junho, 1 de setembro e 1 de dezembro de cada ano civil

Cia Siderúrgica de Tubarão Destinado a financiar parte das despesas decorrentes da construção de usina siderúrgica em Tubarão, Espírito Santo 1 ¼% acima da LIBOR para a tranche A e 1 3/8% para as tranches B
Companhia Vale do Rio Doce Para o financiamento parcial do Programa Carajás-Ferro Não informada no Parecer da PGFN. Cópia do contrato enviado pela PGFN faltando justamente as páginas 2 e 3 das quais constariam as taxas pactuadas
Eletrobrás Para aplicação no financiamento parcial da construção de usinas hidrelétricas no Brasil 1 3/8% a. a. acima da LIBOR
Eletrobrás Destinado a financiar em parte os custos com a construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu, como parte integrante do programa de expansão dos sistemas elétricos do país, a cargo da Eletrobrás Alternativas:

– 1 7/8 a. a. acima da maior entre:

a)     PRIME RATE do Agente, ajustada a “pari passu”

b)     Média semanal dos certificados de depósito para 90 dias, no mercado secundário, ajustada de acordo com os “current mandatory reserve requirements and FDIC insurance premiuns”

– 2 1/8% a. a. sobre a LIBOR semestral cotada pelos bancos de referência

 

 

Observou-se, adicionalmente, a cobrança de taxas diversas e onerosas, de compromisso (cobradas sobre o valor não liberado do empréstimo), de contratação, de crédito, além de cláusulas que elegem foro estrangeiro, dentre outras, cuja quantificação não foi possível nessa fase dos trabalhos, mas constitui tarefa necessária, ainda a ser realizada.  A análise de outros contratos encontra-se em elaboração e demonstra a necessidade de realização de auditoria dos processos de contratação do crédito externo, com acesso a outros elementos além do contrato, tendo em vista que este, em muitos casos, é peça estritamente financeira e sua análise isolada não permite verificar a finalidade do crédito, nem a efetiva destinação dos recursos, como no caso de quatro dentre os cinco contratos selecionados acima.

 

A maioria dos instrumentos contratuais enviados pelo MF/PGFN à CPI corresponde a contratações junto ao Banco Mundial, BID e BIRD, conforme indicado na listagem elaborada a partir das cópias enviadas, constante do Anexo IV à presente análise Preliminar. Em termos de valor, a parcela mais relevante coube às empresas estatais, que respondem por cerca de 64% do valor dos empréstimos constantes dos contratos enviados à CPI pelo MF/PGFN, no período de 1970 a 1982.

 

A CPI buscou informações junto ao Ministério do Planejamento sobre os empréstimos e respectiva destinação dos recursos tomados pelas empresas estatais, a partir de 1970 até 2000, tendo em vista a atribuição legal da Secretaria Especial de Controle das Empresas Estatais – SEST, que reunia amplos poderes de controle sobre as fontes e os usos dos recursos das estatais. Em atendimento ao Requerimento de Informações 55/09, aquele Ministério informou à CPI[78] que “este Departamento dispõe das informações requeridas somente a partir de 1995, data da implantação do Programa de Dispêndios Globais – PDG no Sistema de Informação das Estatais – SIEST” e que “os controles exercidos por este Departamento sobre os empréstimos tomados por estatais restringem-se apenas ao aspecto orçamentário anual, não dispondo, assim, do valor da moeda estrangeira nem das justificativas para os empréstimos contraídos.

 

Diante dessa deficiência nos arquivos da Secretaria Especial de Controle das Empresas Estatais – SEST, não foi possível aprofundar a investigação sobre o endividamento das estatais na década de 70 e 80, período em que a participação dessas empresas – que foram submetidas ao processo de privatização na década de 90 – foi extremamente relevante, o que demanda a necessidade de realização da auditoria da dívida prevista na Constituição Federal.

 

Considerando que os contratos disponibilizados pelo MF/PGFN justificam apenas uma pequena parte (7,85%) do endividamento do período analisado no presente capítulo – 1970 a 1982 – a fim de subsidiar os trabalhos da CPI recorremos à pesquisa de atos legais publicados, tendo localizado diversos decretos autorizativos de contratação de operação de crédito externo, conforme análise a seguir.

 

  1. ANÁLISE DE DECRETOS AUTORIZATIVOS DE EMPRÉSTIMOS EXTERNOS

 

Os decretos autorizativos de contratação de operação de crédito externo localizados, relativos ao período de 1970 a 1980, foram relacionados no Anexo I da presente análise preliminar. Da leitura dos respectivos atos, depreende-se que os mesmos não contêm o necessário detalhamento das operações e teriam que ser analisados juntamente com os contratos respectivos.

 

Procedendo-se ao cotejo dos mencionados decretos relacionados no Anexo I da presente análise preliminar com o conjunto de contratos enviados a esta CPI da Dívida Pública pelo MF/Procuradoria Geral da Fazenda Nacional[79], verificou-se que foram enviados os contratos correspondentes a apenas 7 (sete) decretos listados no Anexo I[80]. Diante disso, foi solicitado ao Banco Central e ao Ministério da Fazenda o envio dos contratos faltantes[81], cujo pedido foi parcialmente atendido pelo Ministério da Fazenda em 11 de dezembro de 2009[82].

 

Os empréstimos autorizados por meio dos mencionados decretos indicados no Anexo I somam a cifra de US$ 8,520 bilhões[83], quantia que justifica apenas 7,4% dos ingressos informados na tabela “Dívida Externa Total”, enviada pelo Banco Central a esta CPI[84], o que demonstra a necessidade de aprofundamento dos trabalhos para o esclarecimento das cifras relacionadas à origem do endividamento externo na década de 70 (mesmo considerando que tal Tabela “Divida Externa Total” inclui o endividamento externo privado, e de estados e municípios).

 

Dentre os decretos autorizativos de contratação de crédito externo no período, foram selecionados aqueles relativos à autorização para emissão de bônus da dívida externa brasileira, tendo em vista que a análise dos relatórios[85] das comissões anteriores, do Congresso Nacional, não chegaram a abordar esse aspecto do endividamento externo brasileiro.

 

Justamente em meio à excessiva abundância de recursos no mercado financeiro internacional, o Brasil efetuou a emissão de Títulos da Dívida Externa no exterior, por meio de instituições financeiras privadas na década de 70, em relevantes montantes, cujos títulos seriam controlados pelo Banco Central, conforme relação de Decretos selecionados por amostragem:

 

 

CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMOS EXTERNOS MEDIANTE A EMISSÃO DE TÍTULOS CONTROLADOS PELO BANCO CENTRAL
DECRETO DATA VALOR MOEDA FINALIDADE CREDOR EXTERNO CONTRA-

TANTE

GARAN-TIDOR
70.130 07/02/72 30.000.000,00 US$ Fins previstos no art. 8º da Lei nº 5.000, de 24/05/1966. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Deutsche Bank, como lider de um Sindicato de Bancos Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
71.084 12/09/72 100.000.000,00 DM Para fins previstos no artigo 8º, da Lei nº 5.000, de 24 de maio de 1966. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Sindicato de bancos liderados pelo Deutsche Bank Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
31.359.759,16 (*) US$
71.315 06/11/72 35.000.000,00 US$ Para fins previstos no artigo 1º, da Lei nº 1.518, de 24 de dezembro 1951, e no artigo 8º, da Lei nº 5.000, de 24 de maio de 1966. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Sindicato de instituições financeiras norte-americanas liderado por Dillon Read & Co.Inc., Kuhn Loeb & Co., e Lazard Frères & Co. Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
72.863 28/09/73 10.000.000.000,00 Y Para os fins previstos no artigo 1º da Lei nº 1.518, de 24 de dezembro de 1951, e no artigo 8º, da Lei nº 5.00, de 24 de maio de 1966. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Grupo de instituições financeiras japonesas lideradas por The Namura Securities Co. Ltd., The Daiwa Securities Co. Ltd. e Yamaichi Securities Co. Ltd. Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
37.650.602,41(*) US$
75.020 02/12/74 25.000.000,00 US$ Para os fins previstos no art. 1º, item 1, do Decreto-lei nº 1.312, de 15 de fevereiro de 1974. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Grupo de banqueiros liderados pela Kuwait Investment Company S.A.K., Arab Finance Corporation S.A.L., e Intra Investment Company S.A.L. Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
76.553 05/11/75 75.000.000,00 US$ Para os fins previstos no art. 1º, item 1, do Decreto-lei nº 1.312, de 15 de fevereiro de 1974. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Grupo de instituições financeiras lideradas por Merril Lynch, Pierce, Fenner & Smith Incorporated e Banco do Brasil S/A Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
78.247 16/08/76 10.000.000.000,00 Y Para os fins previstos no art. 1º, do item 1, do Decreto-lei nº 1.312, de 15 de fevereiro de 1974. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Grupo de instituições financeiras japonesas lideradas por The Namura Securities Co. Ltd., The Daiwa Securities Co. Ltd.,  Yamaichi Securities Co. Ltd. e Nikko Securities Co. Ltd. Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
34.440.005,51 (*) US$
78.313 26/08/76 100.000.000,00 DM Para formações de reservas internacionais, em moeda estrangeira, nos termos do artigo 8º do Decreto-lei nº 1.312, de 15 de fevereiro de 1974. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Grupo de instituições financeiras lideradas pelo Deutsche Bank Aklengellschaft Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
39.649.498,43 (*) US$
78.940 15/12/76 75.000.000,00 US$ Formação de reservas internacionais em moeda estrangeira nos termos do artigo 8º do Decreto-lei nº 1.312, de 15 de fevereiro de 1974. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Grupo de entidades financeiras lideradas pelo Deutsche Bank Aktiengessellschaft, Frankfurt, Alemanha. Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
79.551 19/04/77 150.000.000,00 DM Nos termos do Decreto-lei nº 1.312, de 15 de fevereiro de 1974. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Grupo de instituições financeiras lideradas pelo Deutsche Bank Akltiengesselschaft, Frankfurt, Alemanha Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
63.269.782,35 (*) US$
79.904 04/07/77 75.000.000,00 US$ Para os fins previstos no art. 1º, item I, do Decreto-Lei número 1.312, de 15 de fevereiro de 1974. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Grupo de instituições financeiras lideradas por Merryl Lynch, Pierce, Fenner & Smith Incorporated, Deutshe Bank Aktiengesellschaft, The First Boston Corporations, Salomon Brothers, Banque Nationale de Paris, Union Bank of Switzerland (Securities) Limited e Banco do Brasil S.A. (Ag. Londres) Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
80.555 11/10/77 20.000.000.000,00 Y Para os fins previstos no art. 1º, do item 1, do Decreto-lei nº 1.312, de 15 de fevereiro de 1974. § 1º e §2º. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Grupo de Instituições financeiras liderado por The Nomura Securities Co. Ltd., Daiwa Securities Co. Ltd., The Nikko Securities Co. Ltd., e Yamaichi Scurities Co. Ltda. Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
77.579.519,01 (*) US$
80.763 21/11/77 100.000.000,00 SwFr Para fins previstos no art. 8º, do Decreto-lei nº 1.312, de 15 de fevereiro de 1974. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Grupo de instituições financeiras , sob a liderança de Swiss Bank Corporation, Union Bank os Switzerland e Swiss Credit Bank. Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
45.479.352,37 (*) US$
81.211 12/01/78 200.000.000,00 DM Termos do Decreto-lei nº 1.312, de 15 de fevereiro 1974. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Entidades financeiras lideradas pelo Deutsche Bank Aktiengesselschaft. Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
93.839.440,72 (*) US$
81.680 18/05/78 75.000.000,00 DFls Para fins previstos no art. 8º, do Decreto-lei nº 1.312, de 15 de fevereiro de 1974. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Grupo de Instituições financeiras lideradas pelo Algemene Bank Nederland NV Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
US$
82.492 27/10/1978 100.000.000,00 SwFr Para fins previstos no art. 8º, do Decreto-lei nº 1.312, de 15 de fevereiro de 1974. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Grupo de Instituições financeiras lideradas pelo Union Bank of Switzerland, Swiss bank Corp. e Swiss Credit Bank Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
66.489.361,70 (*) US$
82.819 11/12/1978 150.000.000,00 DM Para fins previstos no  Decreto-lei nº 1.312, de 15 de fevereiro de 1974. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Grupo de Instituições financeiras lideradas pelo Deutsche Bank  Aktiengesellschaft Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
78.851.916,10 (*) US$
83.050 17/01/1979 40.000.000.000,00 Y Para fins previstos no art. 1º, do item I, do Decreto-lei nº 1.312, de 15 de fevereiro de 1974. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Grupo de instituições financeiras japonesas lideradas por The Namura Securities Co. Ltd., The Daiwa Securities Co. Ltd.,  Yamaichi Securities Co. Ltd. e Nikko Securities Co. Ltd. Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
203.252.032,52 (*) US$
83.694 05/07/1979 200.000.000,00 DM Termos do Decreto-lei nº 1.312, de 15 de fevereiro 1974. Os títulos da dívida externa emitidos serão controlados pelo Banco Central Grupo de Instituições financeiras lideradas pelo Deutsche Bank  Aktiengesellschaft Ministro da Fazenda República Federativa do Brasil
104.302.477,18 (*) US$
SOMA …………………….. US$ 1.266.163.747,46

(*) Para possibilitar a soma dos montantes dos títulos da dívida externa emitidos por meio dos decretos acima listados, as emissões de títulos que constavam em moedas distintas foram convertidas para o dólar norte-americano mediante a utilização dos parâmetros disponíveis no site do Federal Reserve Bank http://www.federalreserve.gov/RELEASES/H10/Hist/default1989.htm, na data da edição do decreto.

Mediante Requerimento de Informações no. 59/09 a CPI solicitou informações acerca do valor efetivamente auferido pelo Brasil por meio das emissões de títulos da dívida externa objeto dos precitados decretos, sobre as condições financeiras dos títulos emitidos – valor das comissões e taxas cobradas pelas instituições financeiras intermediárias, e demais condições não detalhadas nos citados decretos – bem como o valor e demais condições de resgate e os controles que o Banco Central efetuou em cumprimento aos respectivos decretos.

 

Cumpre ressaltar, adicionalmente, que não haviam sido encaminhados a esta CPI, pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional[86], os contratos correspondentes às emissões de títulos objeto dos decretos acima listados, no montante de US$ 1,266 bilhão, tendo sido reiterado o pedido especificamente em relação aos mesmos mediante Ofício nº 118/09-P, desta CPI. As precitadas operações de emissão de títulos da dívida externa na década de 70 não foram objeto de nenhuma das comissões anteriores do Congresso Nacional.

 

Conforme assinalado no quadro acima, todos os decretos dispunham que os títulos emitidos seriam controlados pelo Banco Central. Em 03.12.2009 o Banco Central entregou[87] resposta ao Requerimento nº.  59. Relativamente aos registros contábeis relacionados ao “controle” dos títulos da dívida externa emitidos com base nos decretos listados no quadro acima, informou o seguinte:

 

“II – uma vez que os registros dos títulos da dívida externa na contabilidade não foram realizados de forma segregada para cada um dos decretos discriminados no ofício, não foi possível estabelecer correspondência entre os decretos e cada uma das contas;”

 

Na mesma data, o Banco Central enviou a Nota Técnica Desig/Gabin-07/2009[88], à qual foi juntado um quadro demonstrativo, no qual foram prestadas as informações solicitadas sobre os títulos da dívida externa objeto dos decretos localizados, sem, contudo disponibilizar qualquer documento de respaldo para tais informações. Cumpre ressaltar que os contratos relativos a essas operações já haviam sido requeridos por meio do Requerimento 11/09, tendo o Banco Central informado à CPI o seguinte[89]:

 

Contratos de emissões de títulos da dívida externa brasileira por intermédio de bancos privados internacionais a partir de 1970, vigentes e liquidados: conforme entendimentos com o Ministério da Fazenda/STN, esse item será atendido por aquele Ministério, que detém todas as informações a respeito.

 

Juntamente com a resposta ao requerimento de informações nº. 59 foi enviada grande quantidade de cópias de demonstrativos contábeis em retificação e substituição a informações contábeis anteriormente prestadas por meio da Nota Técnica Deafi-2009/54, que por sua vez são referentes ao Requerimento nº. 44. O pedido de substituição de informações contábeis anteriormente prestadas denota inconsistência das informações previamente apresentadas à CPI, o que demanda o aprofundamento das investigações.

 

Em 11.12.2009 o Ministério da Fazenda enviou à CPI o Aviso Nº. 480/MF, com o Memorando PGFN/PGA/Nº. 6123, da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, e documentação anexa ao mesmo, em resposta aos Ofícios 118 e 119/09-P.

 

Analisando-se os documentos enviados, relacionados aos decretos acima listados, depreende-se que dentre os 19 decretos de emissão dos títulos da dívida externa na década de 70, constam apenas 6 contratos assinados e, ainda assim, sem a identificação do representante brasileiro ou faltando folhas do contrato, conforme indicado no quadro seguinte, referente à conferência dos documentos enviados. Verificou-se que nos demais casos foram enviadas apenas minutas de contratos ou apenas cópia de oferta no exterior, conforme quadro a seguir, restando apenas parcialmente atendido o requerimento de informações da CPI. Das cópias enviadas, foram examinadas as condições delas constantes, conforme também indicado no mesmo quadro a seguir:

 

 

 

Análise dos documentos enviados pelo MF/PGFN-Aviso 480
Decreto Valor Moeda Documento enviado Condições pactuadas
70.130 30.000.000,00 US$ Cópia assinada; Contrato de emissão de títulos  no valor de DM 100 milhões Emissão por 96,5%; Bancos poderiam ofertar por 99%; Diferença de 2,5% ficaria para bancos e “comissões de praxe em favor de terceiros”; Juros de 6,75%; Todas as despesas, taxas e comissões, inclusive despesas jurídicas; Comissões de 0,25% sobre pagamentos de juros e 0,125% sobre pagamento de principal e 0,10% sobre pagamento de principal e juros ao agente pagador
71.084 100.000.000,00 DM Cópia de outro contrato de 1976, 4 anos após o decreto. Emissão a 96,3/4%, mas bancos podem oferecer até por 99,25 %; Diferença de 2,5% destinada aos bancos; Juros de 8,75 %; Todos os recursos necessários para o cumprimento do contrato; Comissões de 0,25% sobre pagamentos de juros e 0,125% sobre pagamentos de principal
31.359.759,16 (*) US$
71.315 35.000.000,00 US$ Minuta sem assinaturas de acordo datado de 29/06/1978, portanto não correspondente ao decreto
72.863 10.000.000.000,00 Y Minuta sem assinaturas Juros de 8,25%; Comissão Agente 0,3 % dos juros e 0,2 % do valor de face do principal
37.650.602,41 (*) US$
75.020 25.000.000,00 US$ Minuta sem assinaturas Minuta com espaços em branco, sem especificar as condições
76.553 75.000.000,00 US$ Cópia de outra oferta em que o agente era Manufacures Hannover Trust Company of NY no valor de $ 50 milhões, juros de 10%
78.247 10.000.000.000,00 Y Minuta sem assinaturas Emissão por 99% do valor de face; Comissão de 1,9%; Juros 9% a.a.; Todas as despesas + Y 18.500.000,00
34.440.005,51 (*) US$
78.313 100.000.000,00 DM Cópia apenas de oferta no exterior, datada de 27/07/1977 no valor de $85.000.000,00 Emissão por 98% do valor de face; Juros 9%; Condiçõess dos bônus – faltando folhas da oferta
39.649.498,43 (*) US$
78.940 75.000.000,00 US$ Minuta sem assinaturas, datada de 12/05/1976, anterior ao decreto, no valor de $ 50.000.000,00 Juros de 10%; Comissão de 10%
79.551 150.000.000,00 DM Minuta sem assinaturas Emissão de 97 5/8% do valor de face; Juros de 7,75 E31%; Comissão de 2 3/8%; Todas despesas e taxas; Comissões de 0,25% sobre pagamentos de juros e 0,125% sobre pagamentos de principal
63.269.782,35 (*) US$
79.904 75.000.000,00 US$ Minuta sem assinaturas. “oferta no exterior em 30/06/77, anterior ao decreto. Min. Mario Henrique Simonsen A minuta enviada não contém as condições financeiras da emissão, tendo indicado apenas espaços em branco
80.555 20.000.000.000,00 Y Contrato com assinatura, faltando folhas Emissão por 99,95%; Comissão de serviços 0,15%; Juros 9,2%; Despesas
77.579.519,01 (*) US$
80.763 100.000.000,00 SwFr Cópia assinada, sem identificação da assinatura do representante do Brasil. Emissão por 99,5%; Juros de 5%; Comissão de 2,5% para serviços; Comissão de Agente de 0,5%; Comissão de 0,25% para listas; 2,15% de taxas suíças
45.479.352,37 (*) US$
81.211 200.000.000,00 DM Cópia do contrato em alemão, contendo assinaturas Emissão por 97,625 %, mas os bancos poderiam ofertar por 100% e a diferença ficaria para os bancos; Juros de 6,75 %; Todas as despesas, taxas; Comissão de Agente de 0,25% sobre juros e 0,125% sobre pagamentos de principal
93.839.440,72 (*) US$
81.680 75.000.000,00 Dfls Cópia assinada, sem identificação da assinatura do representante do Brasil Emissão por 99,5%; Juros de 7,5%; Comissão de Agente 0,5%; Comissão Bancos e Dealers 1%
35.254.999,33 US$
82.492 100.000.000,00 SwFr Cópia assinada, sem identificação da assinatura do representante do Brasil Emissão por 99,5%; Juros de 4,25%; Comissão de 2,5% despesas; Comissão 0,5% Agente; Comissão 0,25% lista; 0,755 sobre juros; 0,30% sobre principal
66.489.361,70 (*) US$
82.819 150.000.000,00 DM Cópia de outra oferta feita em 1980
78.851.916,10 (*) US$
83.050 40.000.000.000,00 Y Cópia com assinaturas, apenas de contrato com agentes comissionados no valor de Y 30 bilhões – divergente do decreto – sem identificação do representante do Brasil
203.252.032,52 (*) US$
83.694 200.000.000,00 DM Cópia apenas de oferta no exterior datada de 30/01/1978, um ano e meio anterior ao decreto
104.302.477,18 (*) US$
TOTAL US$ 1.226.418.746,79

 

 

As condições negociadas nas emissões de títulos se mostraram excessivamente onerosas, tendo em vista o volume de comissões pactuadas além das taxas de juros.

 

Observa-se, adicionalmente, inconsistência em relação à informação prestada pelo Banco Central no quadro anexo à Nota Técnica Desig/Gabin-07/2009, na qual informou que o valor efetivamente ingressado no país teria correspondido a 100% dos valores aprovados nos respectivos decretos. Da leitura dos documentos enviados pela PGFN à CPI, depreende-se que em quase todos os casos o valor da emissão dos títulos ficou abaixo dos 100%, conforme indicado no quadro acima. A referida contradição constitui sério indício de falta de controle interno, confirmada pelo próprio Banco Central por meio do Ofício 980.2, onde informou que “não foi possível estabelecer correspondência entre os decretos e cada uma das contas”, embora fosse o órgão designado, por decreto, para controlar os títulos da dívida externa então emitidos.

 

 

  1. RESOLUÇÕES DO SENADO FEDERAL

 

A outra fonte de informação a que recorremos a fim de buscar as justificativas para o elevado endividamento dos anos 70 até 1982 foram as Resoluções do Senado Federal que aprovaram a contratação de crédito externo, conforme tabela constante do Anexo V à presente análise preliminar. Constata-se que o Senado analisou somente dívidas contratadas por estados e municípios que totalizaram a cifra de US$ 7,015 bilhões no período analisado. Tal cifra justificaria apenas 6,1% dos ingressos informados na tabela “Dívida Externa Total”, enviada pelo Banco Central a esta CPI[90].

 

 

  1. INFORMAÇÕES PRESTADAS PELO BANCO CENTRAL

 

O Banco Central enviou à CPI[91] arquivo magnético contendo planilha de dados identificados como “Endividamento externo registrado”, “Operações do setor público, sem garantia do Governo Federal, registradas no período: 1970 a fev/2001”. Somando-se os valores das operações ali indicadas, relativas ao período analisado, de 1970 a 1982, obtém-se o montante de US$ 16,957 bilhões.

 

A planilha enviada pelo Banco Central à CPI por meio do Ofício 945 continha apenas as seguintes informações: número do certificado de registro, data, valor, moeda, devedor, credor e país, não identificando o objetivo do empréstimo nem as condições pactuadas. Foi então reiterado o pedido mediante Ofício 121/09-P, de 25.11.2009, por meio do qual a CPI solicitou informações sobre a fonte dos dados indicados na planilha enviada, bem como cópia dos registros originais; as condições básicas dos empréstimos (taxa de juros e prazo de amortização), a natureza dos empréstimos e o agente fiscal; a relação entre os empréstimos listados na mesma e as operações de curto prazo, que haviam sido informados apenas por saldo na tabela da Dívida Externa Total, e cópias de alguns contratos.

 

Em resposta, o Banco Central informou[92] o documento relativo à fonte dos dados somente a partir de 1996 (para operações de importação financiada) e 2001 (para empréstimos em moeda), quando passou a ser realizado registro no Sistema de Registro Declaratório Eletrônico (RDE) – Módulo de Registro de Operação Financeira (ROF). Não informou o documento relativo à fonte dos dados informados anteriores a essas datas, como havia sido solicitado pela CPI, mencionando apenas o mecanismo de emissão de certificados numerados sequencialmente e inclusão em sistemas informatizados, sem especificar os respectivos sistemas ou livros antes existentes. Nessa oportunidade, foi enviado novo CD à CPI, no qual foram incluídas as colunas relativas às condições pactuadas (taxa de juros) e natureza dos empréstimos.

 

Analisando-se os dados enviados pelo Banco Central, relativos às operações do setor público, sem garantia do Governo Federal, registradas no período de 1970 a 1982, objeto do presente capítulo, constatou-se que 86,4% do valor dos empréstimos foram tomados a taxas flutuantes[93] e apenas 13,6% dos valores foram tomados a taxas fixas.

 

Em relação à natureza de tais empréstimos, verificou-se que 54% dos empréstimos se destinaram a “capital de giro” e 36% corresponderam a empréstimos tomados por bancos para repasse. Os outros 10% eram referentes a financiamento de importações (7%) e outros tipos de empréstimos junto ao BID ou emissão de títulos.

 

Constata-se, assim, que os dados dessa amostra de dados de dívidas sem aval da União enviadas pelo Banco Central à CPI demonstram a opção adotada no período, de buscar recursos no plano externo, assumindo-se os riscos inerentes às oscilações de variáveis alheias ao controle interno – câmbio e taxas de juros – como se verificou na prática.

 

Embora já tivesse sido solicitada a especificação da natureza e condições dos empréstimos informados, conforme acima descrito, em 27.11.2009 o Banco Central entregou à CPI[94] outro arquivo em meio magnético contendo “os registros existentes no Banco Central, referentes ao Registro de Empréstimos Externos, a exemplo da Relação dos Certificados de Registro de Capitais Estrangeiros registrados junto ao FIRCE (publicados em Boletim mensal do BC), diferenciando-se os relativos às operações originais e às decorrentes de transferências ou renovações de operações já registradas”.

 

A planilha enviada indicava apenas o número do registro, data, valor, moeda, devedor, credor e país, não identificando o objetivo do empréstimo nem as condições pactuadas, não permitindo análise acerca da natureza do endividamento. Tal como na planilha anteriormente enviada, não se sabe se estariam aí incluídas operações de curto prazo, que foram informadas apenas por saldo na tabela da Dívida Externa Total.

 

A CPI reiterou o pedido para a complementação dos dados relativos aos empréstimos[95], para que fossem acrescentadas informações sobre a natureza jurídica do devedor e do credor, o garantidor e encargos acessórios, tendo o Banco Central enviado à CPI planilha eletrônica em CD contendo informações adicionais[96].

 

O Requerimento no. 44/09, letra “b”, havia solicitado a cópia completa dos Registros de Contratos (Acordos e demais Compromissos, Notas, Empréstimos) de Dívida Externa efetuados junto ao Banco Central (em forma de livro, fichas ou outro instrumento), no período de 1970 até 2008. O envio das planilhas eletrônicas pelo Banco Central, em resposta ao referido requerimento, ainda não permite uma análise completa sobre a origem do endividamento, o que demandaria aprofundamento das investigações. O que foi possível verificar foi a relevância dos empréstimos tomados pelo setor privado internacional, conforme mencionado a seguir, no presente capítulo.

 

Outra fonte de informação consultada pela CPI foram os Relatórios publicados pelo Banco Central, que evidenciam a relevância das contratações de empréstimos em moeda, amparados na Lei 4.131 no período, conforme demonstrado em gráfico no item 1.2.2.1, cujo controle ficava inteiramente a cargo do Banco Central.

 

 

 

  1. RELEVÂNCIA DO SETOR PRIVADO INTERNACIONAL ENTRE OS DEVEDORES DA DÍVIDA EXTERNA BRASILEIRA NA DÉCADA DE 70:

 

Visando a obter dados sobre a natureza do endividamento, foram pesquisados outros aspectos relevantes relacionados ao crescimento da dívida externa, em sua origem, tais como os empréstimos intercompanhias e o endividamento privado.

 

A CPI de 1983[97] chegou a indicar que tais empréstimos constituiriam um dos aspectos de ilegitimidade da dívida:

“Um outro componente da dívida externa cuja legitimidade caberia questionar é o endividamento das filiais de empresas estrangeiras com suas matrizes ou agentes financeiros associados.”

Conforme tabela a seguir[98], o endividamento externo crescente na década de 70 iniciou-se com forte participação do setor privado, que em 1972 representava 75,1% dos ingressos referentes a empréstimos em moeda realizados ao amparo da Lei 4.131/62:

 

 

 

Empréstimos em moeda (Lei n. 4131/62)
Estrutura dos ingressos brutos anuais segundo a propriedade do capital tomador
1972/81
Discriminação 1972 % 1973 % 1974 % 1975 % 1976 %
US$106 US$106 US$106 US$106 US$106
Público 623,1 24,9 1.130,9 39,7 1.098,0 35,3 1.900,9 50,4 1.953,3 51,1
Privado 1.874,4 75,1 1.718,3 60,3 2.011,5 64,7 1.872,1 49,6 1.872,7 48,9
Total 2.497,5 100,0 2.849,2 100,0 3.109,5 100,0 3.773,0 100,0 3.826,0 100,0
Discriminação 1977 % 1978 % 1979 % 1980 % 1981 %
US$106 US$106 US$106 US$106 US$106
Público 2.500,5 51,5 5.317,4 60,2 6.642,9 76,8 3.687,0 76,6 5.285,5 69,6
Privado 2.356,9 48,5 3.511,5 39,8 2.007,4 23,4 1.124,1 23,4 2.311,1 30,4
Total 4.857,4 100,0 8.828,9 100,0 8.650,3 100,0 4.811,1 100,0 7.596,6 100,0
Fonte dos dados brutos: Registros efetuados junto à fiscalização e registro de capitais estrangeiros – FIRCE, do Banco Central do Brasil

 

É importante ressaltar, inicialmente, que a tabela acima, extraída da publicação referenciada, revela que os registros disponíveis no FIRCE-Banco Central continham muitas outras informações além das enviadas à CPI por meio das planilhas relativas a “Operações do setor público, sem garantia do Governo Federal” e a “os registros existentes no Banco Central, referentes ao Registro de Empréstimos Externos”.

 

A partir da análise da tabela acima, constata-se que o total de ingressos da dívida externa pública por meio da Lei 4.131/62 – que exigia a formalização de contrato e era autorizada pelo Banco Central – atingiu R$ 21 bilhões somente no período de 1972 a 1979.

 

No que se refere à dívida externa privada, o volume de empréstimos em moeda tomados ao amparo da Lei 4.131/62 alcançou a relevante cifra de US$ 17,2 bilhões no período de 1972 a 1979, sendo que grande parte deste valor foi tomado por empresas internacionais sediadas no Brasil, como se analisa a seguir.

 

É relevante ressaltar que ao detalhar a composição do “Setor Privado” que recorreu a empréstimos externos depreende-se que este era predominantemente composto por instituições estrangeiras privadas, conforme tabela a seguir[99], que demonstra a participação do Setor Privado Externo nas captações de empréstimos no período de 1972 a 1981:

 

 

 

Empréstimos em moeda (Lei n. 4131)
Captações brutas anuais realizadas pelo setor privado, segundo a propriedade do capital do tomador
1972/81
Discriminação 1972 % 1973 % 1974 % 1975 % 1976 %
US$106 US$106 US$106 US$106 US$106
Setor Privado 1874,4 75 1718,3 60 2011,5 65 1872,1 50 1872,7 49
    Privado Nacional (*) 680,6 27 655,6 23 431,8 14 234,8 6,2 139,5 3,6
    Privado Externo (*) 1193,8 48 1062,7 37 1579,7 51 1637,3 43 1733,2 45
        Internacionais (*) 1004 40 860,2 30 1330,9 43 1384,7 37 1511,3 40
        Estrangeiras (*) 47,5 1,9 68,4 2,4 121,3 3,9 75,5 2 49,7 1,3
        Conglomerados (*) 37,5 1,5 19,8 0,7 52,9 1,7 109,4 2,9 53,6 1,4
        Joint-Ventures (*) 104,8 4,2 114 4 74,6 2,4 67,7 1,8 118,6 3,1
Setor Público 623,1 25 1130,9 40 1098 35 1900,9 50 1953,3 51
Total 2497,5 100 2849,2 100 3109,5 100 3773 100 3826 100
Discriminação 1977 % 1978 % 1979 % 1980 % 1981 %
US$106 US$106 US$106 US$106 US$106
Setor Privado 2356,9 49 3511,5 40 2007,4 23 1124,1 23 2311,1 30
    Privado Nacional (*) 292,6 6 465,5 5,3 554,1 6,4 176,2 3,7 427,7 5,6
    Privado Externo (*) 2064,3 43 3046 35 1453,3 17 947,9 20 1883,4 25
        Internacionais (*) 1695,2 35 2357,3 27 1228,3 14 500,4 10 1459,9 19
        Estrangeiras (*) 63,1 1,3 53 0,6 8,7 0,1 43,3 0,9 61,3 0,8
        Conglomerados (*) 97,1 2 282,5 3,2 138,4 1,6 120,3 2,5 164,1 2,2
        Joint-Ventures (*) 208,9 4,3 353,2 4 77,9 0,9 283,9 5,9 198,1 2,6
Setor Público 2500,5 52 5317,4 60 6642,9 77 3687 77 5285,5 70
Total 4857,4 100 8828,9 100 8650,3 100 4811,1 100 7596,6 100
(*) Valores estimados a partir da amostra do setor privado. Fonte dos dados brutos: Registros efetuados junto à fiscalização e registro de capitais estrangeiros – FIRCE, do Banco Central do Brasil

 

Tais instituições e empresas multinacionais passaram a utilizar fortemente os empréstimos provenientes de bancos privados internacionais como uma ferramenta não somente de aumentar ganhos financeiros, mas também visando a escapar da tributação sobre remessas de lucros vigente à época:

 

Além das vantagens quanto a prazos e custos, os empréstimos em moeda nos moldes da Lei n. 4131 mostraram-se especialmente atrativos às empresas de capital externo, de vez que passaram a representar o mecanismo de burla das restrições quanto à remessa de lucros originária de investimentos estrangeiros realizados no país.[100]

 

A relevância dos empréstimos tomados pelo SETOR PRIVADO ao amparo da Lei 4.131, em comparação com o total de ingressos desta modalidade e, por sua vez, desta em relação ao total de ingressos da dívida externa no período são demonstradas na tabela a seguir. A tabela compara os dados compilados por Davidoff (em base a registros disponibilizados pelo FIRCE/Banco Central) com a informação prestada pelo Banco Central à atual CPI da Dívida Pública, relativa aos “Desembolsos” anuais relativos à Dívida Externa Total[101]:

 

 

 

 

 

 

Ano

Ingressos Anuais (Dívida Externa contratada ao amparo da Lei 4.131) Total Ingressos Anuais (Dívida Externa Total informado pelo Banco Central) Participação percentual dos ingressos anuais amparados pela Lei 4.131, no total de Ingressos da Dívida Externa (%) Ingressos Anuais SETOR PRIVADO (Dívida Externa contratada ao amparo da Lei 4.131) Participação percentual dos ingressos anuais do SETOR PRIVADO amparados pela Lei 4.131, no total de Ingressos desta Lei (%)
I II III = I/II IV V = IV/I
1972 2.497,5 4.375,0 57,09% 1.874,4 75,05%
1973 2.849,2 4.555,0 62,55% 1.718,3 60,31%
1974 3.109,5 7.058,0 44,06% 2.011,5 64,69%
1975 3.773,0 6.136,0 61,49% 1.872,1 49,62%
1976 3.826,0 8.042,0 47,58% 1.872,7 48,95%
1977 4.857,4 8.766,0 55,41% 2.356,9 48,52%
1978 8.828,9 14.284,0 61,81% 3.511,5 39,77%
1979 8.650,3 11.992,0 72,13% 2.007,4 23,21%
1980 4.811,1 12.440,0 38,67% 1.124,1 23,36%
1981 7.596,6 18.123,0 41,92% 2.311,1 30,42%

Fonte: Colunas I e IV: Dados compilados por Davidoff Cruz: Fonte dos dados brutos: Registros efetuados junto à fiscalização e registro de capitais estrangeiros – FIRCE, do Banco Central do Brasil. Coluna II: Nota Técnica Depec-2009/248, de 30/10/2009, enviada à CPI com Ofício 898/2009-BCB/Secre, de 03/11/2009 pelo Banco Central do Brasil

 

Constata-se, a partir dos dados demonstrados, que interesses de instituições financeiras, bancos privados internacionais e empresas multinacionais sediadas no Brasil, aliados ao impressionante excesso de liquidez existente no mercado financeiro internacional foram fatores determinantes para o crescimento da dívida externa brasileira, sem contrapartida em bens e serviços ao país, o que representa significativo dano ao patrimônio público, conforme cálculo estimado em US$ 223 bilhões, demonstrado nos itens seguintes do presente capítulo.

 

Embora comissões parlamentares que analisaram o endividamento externo no Congresso Nacional tenham abordado os temas do excesso de liquidez internacional e da co-responsabilidade dos credores na acumulação da dívida externa brasileira, conforme trechos dos relatórios finais destacados a seguir, nenhuma medida concreta foi tomada a partir dessas constatações, cabendo à atual CPI da Dívida Pública resgatar esses importantes aspectos presentes na origem do endividamento externo brasileiro, com reflexos na evolução da mesma:

 

“As causas imediatas que explicam o crescimento da liquidez internacional, numa primeira fase, após 1950, são os persistentes déficits incorridos pelos EUA nas suas contas externas e no conseqüente acúmulo de grandes saldos financeiros nos Bancos Centrais dos países mais desenvolvidos e também nas empresas transnacionais, que se tornam ainda mais expressivas quando o governo norte-americano decide suspender a convertibilidade do dólar em ouro”[102].

Os dados disponíveis demonstram que os déficits comerciais dos países desenvolvidos para com os países produtores-exportadores de petróleo foram repassados, via superávits comerciais, aos países em desenvolvimento não-exportadores de petróleo. O possível confronto entre os países produtores-exportadores e os países consumidores de petróleo foi evitado, assim, pelo endividamento dos países em desenvolvimento, através da reciclagem dos petrodólares.” (…) O engajamento dos países em desenvolvimento nesse processo foi possibilitado, obviamente, pelos bancos internacionais, que concediam os empréstimos; endossado pelo FMI, que acompanhava a avaliava, anualmente, as economias dos seus membros; e, encorajado pelos governos dos países credores, que deram apoio político à estratégia de crescimento econômico com financiamento externo. Torna-se evidente, desta perspectiva, que a crise da dívida externa do Terceiro Mundo envolve a co-responsabilidade dos devedores e dos credores.”[103]

 

É importante ressaltar que embora a captura de economia brasileira pelos bancos privados também tenha sido amplamente abordada pelas comissões parlamentares anteriores, conforme trecho destacado a seguir (que acusa a significativa predominância da atuação dos bancos privados na dívida externa brasileira), nenhuma das comissões anteriores cuidou de efetuar a conciliação entre os montantes registrados do endividamento externo com os valores objeto dos “refinanciamentos” realizados a partir de 1983, sendo fundamental o aprofundamento dos trabalhos de investigação:

 

“Com o crescimento da liquidez internacional, a partir dos anos 70, em mãos principalmente dos agentes financeiros privados formados por cerca de 1500 bancos, a estrutura da dívida dos países em desenvolvimento se altera em direção do sistema Financeiro Internacional não governamental. No caso do Brasil, esse sistema torna-se credor de 87% da dívida registrada, a maior parte contratada em moeda e a taxas de juros flutuantes.”[104]

 

Essa captura atingiu não somente o Brasil, mas várias outras nações que aceitaram servir de receptáculo para o excesso de recursos financeiros existentes em poder dos bancos privados internacionais e permitiram o forte ingresso desses recursos sob a forma de empréstimos a taxas flutuantes. Segundo Davidoff:

 

  “Nesse sentido, a economia brasileira, ao elevar seus níveis de endividamento externo, nada mais fez do que acompanhar um movimento geral que envolveu diferentes economias “em desenvolvimento” num momento em que o euromercado buscava novos clientes fora dos Estados Unidos e Europa. Por outras palavras, a economia brasileira foi “capturada”, juntamente com várias outras economias, num movimento geral do capital financeiro internacional em busca de oportunidade de valorização.”[105]

 

 

I.2.2.3 – CONCLUSÕES SOBRE A NATUREZA DA DÍVIDA NO PERÍODO 1970-1982

 

Diante do exposto, mesmo recorrendo às diversas fontes de informação antes mencionadas, a investigação sobre a natureza do endividamento no período de 1970 a 1982 foi apenas parcial, tendo em vista a deficiência de documentos disponibilizados à CPI.

 

Das análises efetuadas, foi possível concluir que a parcela mais relevante do endividamento externo brasileiro no período 1970 a 1982 foi a dívida contraída junto a bancos privados internacionais, que ofereciam taxas de juros aparentemente atraentes, porém, flutuantes, além de períodos de carência. O forte crescimento da dívida externa no período iniciou com forte componente de dívidas do setor privado, seguida de expressivo endividamento das empresas estatais, que foram objeto de privatização na década seguinte.

 

A documentação disponibilizada à CPI comprovou o impressionante endividamento de empresas estatais, correspondente a cerca de 64%[106] do valor total dos contratos disponibilizados pelo MF/PGFN e a 73%[107] do valor total dos decretos localizados, bem como a utilização de taxas flutuantes na imensa maioria dos contratos de estatais enviados pelo MF/PGFN.

 

Os dados informados pelo Banco Central por meio das planilhas enviadas à CPI, relativas aos “registros existentes no Banco Central, referentes ao Registro de Empréstimos Externos[108], constituem importante fonte de informação a ser aprofundada, tendo em vista que os dados parciais indicam que o Banco Central era o principal órgão de controle do endividamento externo no período, marcado principalmente por empréstimos realizados com base na Lei 4.131/62 e Resolução 63, que representavam a maior parcela da dívida contraída no período, conforme gráfico elaborado por essa assessoria.

 

Finalmente, não foi possível efetuar a conciliação entre os dados obtidos nas diversas fontes de informações analisadas, acima mencionadas, com as estatísticas apresentadas pelo Banco Central[109], tendo em vista que as estatísticas não foram apresentadas de forma segregada por tipo de dívida, como solicitado pela CPI, e os dados dos relatórios anuais publicados pelo Banco Central divulgaram apenas dados relativos aos estoques dessas dívidas e ainda possuíam divergências em relação aos dados estatísticos apresentados pelo Banco Central à CPI[110].

 

A dificuldade em justificar incrementos da dívida externa brasileira foi mencionada em livro publicado por Davidoff Cruz que, referindo-se ao significativo incremento da dívida externa no biênio 1977/78, revelou que “somados os déficits das contas de mercadorias e de serviços produtivos chega-se a um déficit global de US$ 3,8 bilhões no biênio (…) na verdade, a pressão para a tomada de empréstimo, descontada a contribuição líquida do ingresso de capital de risco, não supera a marca dos US$ 2,7 bilhões. O confronto desse valor com os US$ 13,5 bilhões relativos à contratação líquida de capitais de empréstimo deixa evidente que o acréscimo da dívida ocorrido no período novamente pouco tem a ver com o financiamento do ‘hiato de recursos’. Ou, por outras palavras, revela o caráter predominantemente financeiro da tomada de novos recursos externos.”[111]

 

Verificando-se a tabela “Indicadores Externos” constante do Anexo Estatístico do Livro recentemente publicado pelo Tesouro Nacional[112], constata-se que de fato o saldo da Dívida Externa Bruta saltou de US$ 37.952 milhões em 1977 para US$ 52.187 milhões em 1978, apresentando um incremento de 73% (US$ 14.235 milhões) de um ano para o outro. Importante notar que a mencionada tabela publicada pela STN não informa a parcela da dívida do setor privado e do setor público responsável por esse relevante acréscimo. Tal informação só passou a constar da referida tabela a partir de 1979, quando a dívida externa total apresentou o saldo de US$ 55.803 milhões, sendo US$ 32.364 milhões do setor público e US$ 23.439 milhões do setor privado.

 

Especialmente no ano de 1979, há indícios sobre a contratação de um “empréstimo jumbo”[113] diretamente pelo Tesouro Nacional junto a um pool de bancos internacionais. Conforme Requerimento de Informações nº. 54/09, da atual CPI da Dívida Pública, foram solicitadas informações sobre o referido empréstimo à Secretaria do Tesouro Nacional, não tendo o mesmo sido respondido até a presente data.

 

Todas as dificuldades em obter informação, aliadas às inconsistências entre dados obtidos constituem evidências acerca da necessidade de aprofundamento das investigações e a realização da auditoria da dívida prevista na Constituição Federal, especialmente devido ao fato de que as negociações com bancos privados internacionais ocorridas na década seguinte corresponderam meramente a renegociações dessas dívidas originais.

 

 

I.3 – RELAÇÃO ENTRE O CRESCIMENTO DA DÍVIDA INTERNA NA DÉCADA DE 70, EM DECORRÊNCIA DA ACELERAÇÃO DO ENDIVIDAMENTO EXTERNO, E A VIABILIZAÇÃO DE GANHOS ESPECULATIVOS

É importante ressaltar como o endividamento público tem historicamente propiciado ganhos especulativos impressionantes por parte do setor privado, cabendo transcrever trecho de importante depoimento do Prof. Carlos Lessa à CPI da Dívida de 1983, no qual mencionou dados exatamente do período 1977/78, quando se verificou relevante elevação do estoque da dívida, como mencionado em item anterior da presente análise preliminar.

 

Adicionalmente, é importante observar as circunstâncias de elevação de taxas de juros internas, que provocou o crescimento acelerado da dívida interna no período analisado, ao mesmo tempo em que permitiu vultosos ganhos especulativos:

 

“A descrição da relação entre endividamento externo e interno no período é bem sumariada no depoimento do Professor Carlos Lessa na CPI, do qual pode ser extraído o seguinte trecho cuja frase final, com uma bela imagem poética, resume toda a dramaticidade dos dois grandes vetores da atual crise: “Em 1977/78 a nossa política econômica passou a estimular o endividamento externo como uma decisão de política econômica. É o período em que Mário Henrique Simonsen, como Ministro, pratica a seguinte política: internamente, ele eleva violentamente o patamar da taxa de juros e busca reduzir o custo dos recursos contratados externamente. Ele o faz apertando internamente a circulação monetária, usando os mecanismos de refinanciamento da dívida interna para forçar a taxa de juros para cima, liberando de qualquer controle a taxa de juros interna e, externamente, mantendo a taxa de câmbio brasileira correndo por baixo da taxa de inflação. Volta a crescer o endividamento externo, apesar de o Brasil não ter, no biênio 77/78, nenhum desequilíbrio comercial. Durante esse período, as piores dimensões da armadilha especulativa já estão inteiramente visíveis. Durante esses anos especular em cruzeiros tem um prêmio, dado que é possível, endividando-se em moeda estrangeira, ganhar uma diferença expressiva por aplicações financeiras internas. Pura e simplesmente um empréstimo externo é contratado e aplicado no mercado financeiro interno e com o ganho de uma expressiva diferença. Claro que, ao fazer isso, quando entram dólares, está se expandindo a quantidade de cruzeiros. Ao expandir a quantidade de cruzeiros, a política monetária enxuga os cruzeiros, a dívida pública cresce, aumenta a circulação de títulos. Todo o sistema está se inchando especulativamente…. Durante esse período é como se tivesse dado o empurrão definitivo nas duas bolas de neve. A bola de neve da dívida externa e a bola de neve da dívida pública interna se despregaram das encostas das montanhas e passaram, a partir daí, a rolar alucinadamente”.

 

É claro que a montagem desse sistema de atrelamento, favorecendo a entrada de recursos, fossem quais fossem as condições externas e fossem quais fossem as conseqüências da entrada, só seria possível através de um entrelaçamento de interesses entre os agentes governamentais, os banqueiros, nacionais e internacionais, e todos os intermediários e especuladores.

 

O excesso de liquidez externa e a busca de ganhos especulativos contribuiu para o agravamento do processo inflacionário brasileiro, ou seja, o crescimento da inflação interna na década de 70 foi uma conseqüência direta do excesso de empréstimos externos com viés estritamente financeiro, promovendo o desarranjo das contas internas, conforme analisado pela CPI da Dívida de 1983:

 

Um determinante para o processo de endividamento do Terceiro Mundo foi a farta disponibilidade de divisas no mercado financeiro internacional à procura de aplicação rentável.

ao invés de ser imputada a desvios ou erros da política monetária, a inflação assume um sentido internacional de adiar a crise da realização do capital, que não encontra aplicações produtivas nos países desenvolvidos. Concomitantemente a proliferação dos investimentos diretos, as aplicações puramente financeiras nos países do Terceiro Mundo passam a constituir-se em alternativa de aplicação desse excesso de liquidez, cujo montante irá crescer substancialmente com elevados excedentes de divisas gerados em decorrência da elevação de preços do petróleo.[114]

 

 

 

 

I .4 – IMPACTO DO AUMENTO UNILATERAL DAS TAXAS DE JUROS

 

No presente item se analisa o impacto da elevação unilateral das taxas de juros internacionais que, conforme cálculos projetados pela CPI, foi estimado um dano ao patrimônio público de cerca de US$ 223 bilhões, cujo ressarcimento deveria ser buscado pelos órgãos competentes.

 

Ao final de 1979 se verificou o acirramento da elevação unilateral da taxa de juros por decisão unilateral do Federal Reserve Bank norteamericano (que estipulava o valor da “Prime” em um movimento conjunto com uma Associação de bancos privados de Londres que definiam a “Libor”). O comportamento idêntico dessas taxas é evidenciado no gráfico seguinte. Cabe ressaltar que a conformação acionária do Federal Reserve Bank se constitui por doze bancos federais, que por sua vez estão absolutamente controlados pelas corporações financeiras mais importantes dos Estados Unidos, como Chase Manhattan Bank, Citibank, Goldman Sachs, JP Morgan, Bank of America[115]. Este fato demonstra a inter-relação da banca privada internacional a nível mundial, evidenciada no gráfico a seguir.

 

 

 

Gráfico – Taxa de Juros Internacionais

Fonte: www.ipeadata.gov.br

 

 

Segundo o princípio Rebus sic Stantibus previsto no Direito Internacional, o incremento significativo das taxas de juros internacionais representa um cambio fundamental de circunstancias, o que permite ao devedor questionar seus pagamentos, conforme artigo 62 da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, de 1969[116].

 

O impacto da elevação dos juros pode ser medido tomando-se a série agregada da Dívida Externa Total (pública e privada), no período de 1970 a 2008, enviada pelo Banco Central[117], que apresentou o saldo final da dívida externa a cada ano, após indicar os empréstimos, amortizações e outros fatores. A tabela também indica os juros devidos, pagos, refinanciados (ou seja, pagos por meio de novos empréstimos) e atrasados a cada ano.

 

Tomando-se a tabela enviada pelo Banco Central, foi realizada uma simulação[118], supondo-se que as taxas de juros tivessem sido mantidas em 6% ao ano, patamar no qual estavam antes da alta unilateral das taxas de juros pelos EUA a partir de finais dos anos 70. Em tal simulação, considerou-se que os juros pagos e refinanciados (ou seja, pagos por meio de novos empréstimos) além de 6% do estoque inicial da dívida em cada ano foram utilizados para o pagamento do principal da dívida.

 

Desta forma, chegou-se ao seguinte gráfico, que mostra o brutal impacto da alta unilateral das taxas de juros pelos EUA, que provocou o crescimento exponencial da dívida. Caso as taxas de juros tivessem sido mantidas em 6% ao ano, toda a dívida externa teria sido paga em 2005, e hoje o país ainda teria um crédito de US$ 25 bilhões frente aos credores internacionais. Essa estimativa demonstra uma perda de cerca de US$ 223 bilhões, o que evidencia a necessidade de aprofundar as investigações a fim de buscar o ressarcimento dos danos provocados ao patrimônio público.

 

 

Dívida Externa Total (Pública e Privada) – US$ Milhões

Fonte: Nota Técnica DEPEC – 2009/248. Elaboração própria.

Dados disponíveis no Anexo II à Análise Preliminar Nº. 5 da CPI da Dívida Pública.

 

 

Apesar de o Brasil ter pago, a título de juros e amortizações, US$ 144 bilhões a mais do que recebeu de empréstimos, ainda assim a dívida subiu de US$ 5,4 bilhões em 1970 para US$ 198 bilhões em 2008[119].

 

Observe-se que no cálculo da transferência líquida de US$ 144 bilhões não foram computados os onerosos pagamentos decorrentes de comissões diversas (de compromisso, de agente, de negociação, de facilidade, dentre outras), taxas e gastos com o Comitê de Bancos, com os bancos privados, organismos internacionais e gastos de emissão de bônus, cujo detalhamento quantitativo não foi possível realizar no curto espaço de tempo da CPI, por ausência de informações detalhadas e demais limitações expostas. O Banco Central apresentou à CPI informações parciais referentes a comissões e gastos com endividamento externo que foram contabilizados no SIAFI, no período de 1987 a 2008, totalizando US$6,31 bilhões no período. Somando-se tais gastos, verifica-se que foi feita uma transferência líquida de US$150,31 bilhões, e ainda devemos US$ 282 bilhões[120] ao exterior.

 

É relevante mencionar que por ocasião da CPI de 1983 o Ministro Ernane Galveas apresentou análise semelhante, na qual expôs as perdas decorrentes da elevação das taxas de juros, conforme Relatório Final daquela CPI, objeto da Análise Preliminar Nº. 4, apresentada à atual CPI da Dívida.

 

O gráfico acima mostra que a dívida externa atual é resultado de contundente indício de ilegalidade: a violação do princípio do Direito Internacional constante no Artigo 62 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados. Segundo o mencionado artigo, uma mudança fundamental de circunstâncias, ocorrida em relação às existentes no momento da conclusão de um tratado, e não prevista pelas partes, pode ser invocada como causa para extinguir um tratado ou dele retirar-se, caso a existência dessas circunstâncias tiver constituído uma condição essencial do consentimento das partes em obrigarem-se pelo tratado; e essa mudança tiver por efeito a modificação radical do alcance das obrigações ainda pendentes de cumprimento em virtude do tratado.

 

Embora o impacto da elevação unilateral das taxas de juros internacionais tenha sido amplamente tratado pelas comissões parlamentares anteriores[121], conforme trechos destacados a seguir, na prática não chegaram a ser adotadas medidas visando a reparar o dano causado às finanças do país em decorrência dessa atitude do FED norte-americano. Diante disso, seriam recomendáveis providências concretas em relação a essa dívida e a todas as demais dívidas – inclusive internas – contraídas para viabilizar o excessivo pagamento da dívida externa onerada pela elevação das taxas de juros.

 

 

Em relação ao impacto da elevação unilateral das taxas de juros, merecem ser destacadas algumas das citações constantes dos relatórios de comissões parlamentares anteriores:

 

I .4.1 – CPI DA DÍVIDA DE 1983 – Relatório Dep. Sebastião Nery[122]:

“As taxas de juros internacionais que, em termos reais, foram negativas durante os exercícios de elevada liquidez, ascendem fortemente quando ocorre a contração desta liquidez.”

 

“Furtado situa o começo do desmantelamento do sistema financeiro doméstico nessa época, quando o governo, para manter o afluxo de recursos externos, elevou as taxas de juros internas para acompanhar sua ascensão a nível internacional, o que praticamente levou à imobilização dos investimentos produtivos na economia, atraídos rapidamente para as mais rentáveis especulações financeiras.”

 “O Prof. Dércio Munhoz em seu depoimento afirmou que ‘aproximadamente 50% da dívida é originária apenas de juros’. Em depoimento na Escola Superior de Guerra, o Ministro Ernane Galveas apresentou o seguinte quadro de perdas decorrentes da elevação da taxa de juros:”

TABELA V.3

ACRÉSCIMOS DE ENCARGOS DO BRASIL COM A ALTA DA TAXA DE JUROS

US$ BILHÕES

 

 

 

 

ANO

 

 

 

JUROS BRUTO PAGOS (a)

 

Aplicando o coeficiente 0,0668 sobre o total da dívida de cada ano

 

(b)

Diferença Anual de Juros Pagos e que seriam pagos se os Juros se mantivessem ao nível da taxa de 1973

(c ) = (a) – (b)

Diferença Acumulada de Juros

 

(d)

= (ct) – (ct – 1)

1973 839,5 839,5 0,0 0,0
1974 1370,1 1146,7 223,4 223,4
1975 1862,7 1414,2 448,5 671,9
1976 2090,9 1735,8 355,1 1027,0
1977 2462,4 2140,1 322,3 1349,3
1978 3343,8 2906,5 437,3 1786,6
1979 5347,5 3333,6 2013,9 3800,6
1980 7457,0 3597,0 3860,0 7660,5
1981 10305,2 4102,2 6203,0 13863,5
1982 12550,6 4652,9 7897,7 21761,2
1983 10262,6 5432,1 4830,5 26591,7

(b): Juros que seriam pagos anualmente, quando mantida a mesma relação de juros efetivamente pagos sobre o total da dívida registrada de 1973.

Fonte: Banco Central do Brasil – Extraído do pronunciamento do Sr. Ministro Ernane Galvêas na Escola Superior de Guerra em 14/06/1984

 

 “Herbert Levy afirma que a parte legítima da dívida externa brasileira corresponde a aproximadamente 33 bilhões de dólares em fins de 1982. Concluir-se-ia que os 36 bilhões de dólares adicionais, contabilizados pelos bancos internacionais e aceitos pelo governo seriam ilegítimos, por serem decorrentes de uma decisão unilateral do governo norte-americano em manter o dólar sobrevalorizado para a cobertura de seus déficits.”

 

I.4.2 – Comissão Especial do Senado Federal – Relatório Senador Fernando Henrique Cardoso[123]:

O quadro externo começou a sofrer alterações a partir do chamado segundo choque do petróleo em 1979.” (Página 7)

 

Embora as economias centrais tenham sido administradas com rédeas curtas após o segundo choque do petróleo, os países em desenvolvimento iniciaram os anos 80 às voltas com uma crise que, diferentemente das tradicionais, não refletia uma crise de centro, mas sim a elevação das taxas de juros provocada pelos Estados Unidos. A América Latina, em especial, após um período continuado de crescimento de 6% ao ano, na média, foi lançada pelo choque dos juros num período de estagflação que se prolonga até o presente.” (Página 8- grifo nosso)

Como os débitos externos brasileiros haviam sido contratados basicamente a taxas de juros flutuantes, o choque dos juros provocou uma elevação da dívida sem contrapartida real de bens e serviços. A partir desse momento, a dívida externa brasileira assume um caráter eminentemente financeiro: os novos empréstimos na verdade, são obtidos para rolar em grande medida e a nível agregado os juros e as amortizações.” (Página 8 – grifo nosso)

 

… A diferença, porém, é que o impacto dos juros sobre juros elevou a dívida bruta de US$43,5 bilhões em fins de 1978 para US$70,2 bilhões em dezembro de 1982. A contrapartida real de bens e serviços não-fatores nesse período foi de apenas 14,9 bilhões de dólares, como veremos em seguida.” (Página 9 – grifo nosso)

Simulações do Banco Central, com base nas condições contratuais da dívida registrada (Prazo médio total de carência e amortizações de 103 meses, resultante da média de 57 e 46 meses, respectivamente, para o período de 1980/85); na “Libor” real média da ordem de 1,49% ao ano em 1960/79; na taxa média de juro flutuante verificada nos mercados internacionais e em uma hipótese razoável sobre taxas de juros fixa de 8,5% ao ano sugerem que o “efeito da alta de juros” entre 1979-86 sobre o estoque da dívida acumulado até 1986 é da ordem de US$24,8 bilhões de dólares a 49,9 bilhões de dólares. (Vide Tabelas na pág. 28). Grosso modo, pode-se afirmar que entre ¼ e a metade da dívida externa brasileira referem-se a juros sobre juros, sem qualquer contrapartida real de bens e serviços para o país. Por outro lado, o mercado secundário de títulos da dívida externa sabiamente registra operações com um deságio da ordem de 2/3 do valor de face. Esse dado, por si só, indubitavelmente corrobora os resultados das simulações acima referidas.” (Página 10 – grifo nosso)

O impacto dos juros sobre a dívida externa está, portanto, umbilicalmente ligado também ao movimento de preços dos produtos de exportação dos países em desenvolvimento não exportadores de petróleo.” (Página 11)

I.4.3 – Comissão Mista do Congresso Nacional – Relatório Senador Severo Gomes[124]:

Conclusões:

 …

6 – Alguns desses atos enquadram-se no princípio da responsabilidade pelos danos, de larga aceitação internacional. Não se pode esquecer, a propósito, que nos acordos de Bretton Woods, em benefício de uma posição hegemônica, os Estados Unidos assumiram uma responsabilidade face à comunidade internacional no que concerne à adoção do dólar como moeda de conta. E que agravam esta responsabilidade ao desvincular o dólar do valor do ouro, durante a administração Nixon. Ao realizar uma política de combate à sua inflação interna através do aumento da taxa de juros, por decisão do Federal Reserve Board, em vez de utilizar outros remédios ao seu alcance, como a redução do déficit interno, os Estados Unidos correram conscientemente o risco de provocar o agravamento das dívidas em dólar em todo o mundo. Provocaram, assim, a chamada crise da dívida externa, que atingiu até mesmo países desenvolvidos, como a França, na época do primeiro mandato do presidente Mitterand, e criaram uma situação insustentável para as nações em desenvolvimento, entre elas o Brasil. Tivemos nossa dívida aumentada de maneira significativa, sem que a esse aumento correspondesse o aporte efetivo de recursos externos. Passamos a dever não o que tomamos emprestado, mas uma quantia fixada aleatoriamente, sem a nossa participação. – (grifo nosso)

 

I.4.4 – Comissão Mista do Congresso Nacional – Relatório Dep. Luiz Salomão[125]:

Efeito da elevação das taxas de juros reais, “promovida pelas políticas monetária e fiscal do governo dos EUA, cuja estimativa atualizada, efetuada pelo Banco Central, conforme constante do anexo V [Simulações], por solicitação do Relator, é de US$ 34 a 62 bilhões, ou seja, de 30 a 60% do saldo total registrado ou 50 a 90% da dívida bancária, como demonstrado nos Quadros IX [Efeito da elevação da Taxa de Juros sobre a Dívida Externa Brasileira] e X [Balança Comercial e Indices de Preço] seguintes .”

É evidente que os excedentes de juros cobrados leoninamente num contrato de empréstimo devem ser encarados como amortização compulsória e antecipada do principal.” (grifo nosso)

 

Apesar dessas importantes constatações e deliberações do Congresso Nacional acerca do impacto da elevação unilateral das taxas de juros internacionais, nenhuma providência concreta foi adotada, passando o país a enfrentar fortes dificuldades para cumprir os pagamentos dos encargos da dívida, ao mesmo tempo em que desorganizava internamente a economia, elevando também as taxas de juros internas, como registrou o ilustre economista Celso Furtado em seu depoimento à CPI da Dívida de 1983, antes mencionado.

 

À medida em que as taxas de juros internacionais se elevavam e a crise se agravava, os bancos cerravam as linhas de crédito e dificultavam a captação de recursos essenciais para o cumprimento das obrigações, provocando um agravamento do quadro, conforme ensinamentos de Davidoff:

 

“No final do ano de 1980, a captação de recursos no mercado financeiro internacional mostrava-se cada vez mais difícil, o que obrigava o BC a aceitar sucessivos aumentos nos spreads praticados nas operações de empréstimos externos. A gravidade do quadro externo se tornava claramente manifesta no início de outubro, quando – faltando cerca de US$3bilhões para o fechamento do balanço de pagamentos – os bancos internacionais retraíam fortemente o ritmo de seus negócios com tomadores brasileiros.”[126]

 

“…foram adotadas várias medidas destinadas a ampliar a tomada de empréstimos externos. Assim, logo em janeiro, as autoridades limitavam em 5% o crescimento dos empréstimos realizados em cruzeiros pelos bancos comerciais e de investimento no decorrer do primeiro trimestre. Tal medida visava acelerar a captação de recursos através da Resolução 63. Simultaneamente o Conselho Monetário Nacional determinava a liberação total das taxas de juros praticadas por aquelas instituições financeiras. (…)Em março era fixado o percentual de 9,5% para a expansão das operações ativas em cruzeiros pelos bancos comerciais e de investimento para o segundo semestre, o que significava a continuidade da política de aperto de crédito interno, visando forçar a captação de recursos externos. Ao mesmo tempo eram flexibilizadas, ainda mais, as operações de repasse através da Resolução no. 63, com a ampliação do prazo para a reaplicação de 15 para 60 dias”[127]

 

A forte compressão do crédito doméstico, associada às demais medidas indutoras, resultou em tomadas maciças de empréstimos no mercado financeiro internacional. Contudo, como será discutido no Capítulo 3, parcela significativa dos recursos tomados pelas instituições financeiras passou a ficar estocada no BC, por falta de tomadores finais, o que nada mais era do que uma das faces mais contraditórias da própria política recessiva como política de ajuste do balanço de pagamentos.”[128]

 

Assim, além das providências necessárias em relação ao questionamento da elevação unilateral das taxas de juros, cabe questionar a legitimidade do próprio governo que optou pelos empréstimos externos a juros flutuantes, dado que representavam Governos de Fato, e não de Direito, pois se mantinham pela força das armas e da repressão aos que contra ele se insurgiam. Tal fato também deve ser apresentado aos fóruns competentes.

 

 

I .5 – OUTROS ASPECTOS RELEVANTES

 

I .5.1 – DESVALORIZAÇÃO DOS PRODUTOS NACIONAIS

 

Paralelamente às dificuldades de crédito internacional ainda se verificou na época a deterioração nos termos de intercâmbio comercial internacional, com a atitude protecionista dos países mais desenvolvidos que reduziram expressivamente suas importações, além da desvalorização dos preços dos produtos brasileiros no mercado internacional.

 

“O economista Serra estima que o custo médio da dívida externa, entendido como tal a relação entre os juros líquidos pagos ao exterior e a dívida bruta média, elevou-se de 4,7% em 1973 para 7,1% em 1978, e 14,7% em 1982, e que o Índice de Intercâmbio em 1983 equivale a quase a metade do que era a cinco anos atrás.

Comparando o resultado real do comércio brasileiro com o saldo estimado na hipótese de permanência do índice de relações de troca de 1978, corrigindo os saldos reais pela inflação do dólar, Serra estimou o custo decorrente da deterioração nos termos de intercâmbio em US$ 31.935 milhões no período de 1978 a 1982.

Considerando a hipótese de permanência da taxa média de juros no nível de 1978 (7,1%), avaliou em US$ 15.509,5 milhões o custo derivado do acréscimo da dívida de 1979 a 1982. Em conjunto, a degradação dos termos de troca e a elevação das taxas de juros teriam acarretado uma perda para a economia brasileira de cerca de US$ 48 bilhões, praticamente a metade da dívida externa.”[129]

 

Em seu Relatório[130], Fernando Henrique Cardoso também ressalta a ligação “umbilical” entre os termos de troca e as taxas de juros:

 

“O impacto dos juros sobre a dívida externa está, portanto, umbilicalmente ligado também ao movimento de preços dos produtos de exportação dos países em desenvolvimento não exportadores de petróleo.” (Página 11)

“A partir de 1983, a questão da dívida adquire nova dimensão. Segundo a Programação do Setor Externo (PSE) submetida pelo Brasil aos banqueiros em Nova York em dezembro de 1982, a economia brasileira é direcionada para a obtenção de US$6 bilhões de superávit comercial, com uma previsão de déficit em transações correntes de US$6,5 bilhões. Como os juros dos débitos externos previstos para 1983 estava na casa dos US$10 bilhões, fica claro que a partir desse momento o Brasil marchava para a chamada “transferência líquida de recursos reais para o exterior”, com o fim específico de cumprir o serviço da dívida externa.” (Página 11 – grifo nosso)

“Vem à tona, então, o dilema de um país subdesenvolvido: como compatibilizar seu crescimento econômico com a transferência de renda real para o Exterior. Em outras palavras, como pode um país pobre, de repente, passar a financiar os países ricos, transformando-se de importador em exportador de capitais? (Página 11)

A conseqüência lógica e fatal desse encadeamento de fatores foi a crise financeira internacional deflagrada em 1982, com a quebra do México e de todos os demais países que se submeteram ao endividamento agressivo dos anos 70.

Nesse contexto, o Fundo Monetário Internacional começa a negociar o primeiro de uma série de Acordos “Stand by”, em “apoio” ao “Plano Financeiro de 1983[131]” e ao “Programa de Estabilização Social”[132], o que originou a adoção de ajuste fiscal baseado em um conjunto de medidas recessivas que aprofundaram ainda mais a crise financeira  e econômica.

I .5.2 – CO-RESPONSABILIDADE DOS CREDORES

A co-responsabilidade do Fundo Monetário Internacional e dos Bancos Privados Internacionais no processo de endividamento agressivo que levou à crise financeira de vários países, consta do Relatório de FHC:

 

Os dados disponíveis demonstram que os déficits comerciais dos países desenvolvidos para com os países produtores-exportadores de petróleo foram repassados, via superávits comerciais, aos países em desenvolvimento não-exportadores de petróleo. O possível confronto entre os países produtores-exportadores e os países consumidores de petróleo foi evitado, assim, pelo endividamento dos países em desenvolvimento, através da reciclagem dos petrodólares.” (página 6 – grifo nosso)

O engajamento dos países em desenvolvimento nesse processo foi possibilitado, obviamente, pelos bancos internacionais, que concediam os empréstimos; endossado pelo FMI, que acompanhava a avaliava, anualmente, as economias dos seus membros; e, encorajado pelos governos dos países credores, que deram apoio político à estratégia de crescimento econômico com financiamento externo. Torna-se evidente, desta perspectiva, que a crise da dívida externa do Terceiro Mundo envolve a co-responsabilidade dos devedores e dos credores.” (página 6 – grifo nosso)

 

Além de destacar a responsabilidade das instituições financeiras internacionais, é importante mencionar a estratégia utilizada pelos bancos comerciais – privados internacionais – que estimularam o endividamento por meio da oferta de elevados empréstimos com taxas aparentemente atraentes (porém flutuantes) e extensos períodos de carência, o que fazia parte da sedução para o endividamento excessivo. Na realidade, esta estratégia só avantajava aos próprios bancos privados, que assim garantiam a cobrança de juros sobre o montante total do empréstimo por um período mais extenso e de forma permanente, provocando o constante crescimento do montante da dívida em decorrência da rolagem e da incidência de juros sobre juros. Tal fato demanda o aprofundamento das investigações dessa origem da dívida externa, que foi o ponto de partida para as negociações posteriores, até os dias atuais.

I .6 – ARTICULAÇÃO DOS BANCOS PRIVADOS – FORMAÇÃO DO COMITÊ ASSESSOR 

 

O endividamento agressivo da década de 70 impactado pela elevação das taxas de juros internacionais levou todos os países que aderiram à política de financiamento via endividamento externo a intensas dificuldades de pagamento. Como conseqüência deste panorama os bancos privados internacionais fecharam as linhas de crédito ao país, “num momento de concentração de pagamentos o ingresso líquido de recursos passou a ser negativo, praticamente inviabilizando a continuidade e a normalidade dos pagamentos ao exterior.(…) As linhas de crédito para os bancos brasileiros foram subitamente cortadas apesar de sua sólida reputação de administração profissional.”[133]

 

Nesse cenário de crise financeira internacional provocada principalmente pela alta unilateral das taxas de juros internacionais, os bancos privados internacionais cerraram as linhas de crédito e criam o “Comitê Assessor”, formado por 14 bancos[134], liderados pelo Citibank, que passou a funcionar como instância pela qual teria que passar todo o trâmite para a renegociação das dívidas externas brasileiras – públicas e privadas – assumindo o Brasil todos seus gastos, conforme mencionado no Relatório FHC:

 

“Cabe neste ponto uma referência em maior detalhe ao Comitê Assessor. Criado em 1983, por inspiração dos credores bancários com a concordância e a participação do governo brasileiro, o Comitê Assessor, na prática, de­monstrou ser um instrumento dos bancos para a defesa de seus interesses.” (Página 90)

 

“Apesar de o Comitê Assessor funcionar mais como um cartel dos bancos, com uma atuação nem sempre isenta, o governo brasileiro, desde o início de 1983, paga todas as despesas relacionadas com as reuniões efetuadas em Nova York.

 

O Banco Central, durante os últimos cinco anos, arcou com gastos consideráveis. Ainda recentemente, na reunião do Conselho Monetário Nacional de 27 de janeiro, o Presidente do Banco Central procurou legalizar essa situação, aprovando decisão que autoriza o Banco a gastar US$ 5,4 milhões para cobrir des­pesas de comunicação, de viagens de primeira classe para executivos dos bancos credores, hotéis e até de alimentação desses funcionários.” (Página 91)

 

Foi justamente o Comitê Assessor[135], amparado em exigências do FMI e do Clube de Paris, que preparou os documentos para os sucessivos pacotes de negociações da dívida externa com bancos privados na década de 80, que ficaram conhecidos por “Fases” I, II, III, IV e V, objeto do Capítulo seguinte.

Tais fatos são relevantes, pois ferem o princípio do necessário equilíbrio entre as partes.

I.7 – ILEGITIMIDADES OBSERVADAS NO CAPÍTULO I

Da análise preliminar realizada sobre a origem do endividamento externo no período de 1970 a 1982, em base às informações disponíveis e considerando as diversas limitações anteriormente mencionadas, foram detectadas diversas ilegitimidades que demandam o aprofundamento das investigações, tendo em vista que o endividamento desse período determinou as negociações seguintes que influenciaram a evolução da dívida externa até os dias atuais.

 

  • Das análises efetuadas, foi possível concluir que a parcela mais relevante do endividamento externo brasileiro no período 1970 a 1982 foi a dívida contraída junto a bancos privados internacionais, que ofereciam taxas de juros aparentemente atraentes, porém, flutuantes, além de períodos de carência. O forte crescimento da dívida externa no período iniciou com forte componente de dívidas do setor privado, seguida de expressivo endividamento das empresas estatais, que foram objeto de privatização na década seguinte.

 

  • Ausência de informações estatísticas do Banco Central, desagregados por tipo de dívida externa (Multilateral, Bilateral e Comercial), demonstrando séria deficiência de controle interno daquela autarquia;

 

  • Divergências entre saldos da tabela produzida pelo BC para atender a CPI e saldos publicados em relatórios anuais publicado pelo Banco Central, que foram esclarecidas de forma genérica à CPI;

 

  • Contratos de empréstimo de valor relevante, dos quais constavam aspectos estritamente financeiros, sem especificar o objeto do endividamento;

 

  • Cobrança de taxas onerosas de compromisso, de contratação e de crédito, sobre o montante dos empréstimos;

 

  • Deficiência nos arquivos da Secretaria Especial de Controle das Empresas Estatais – SEST, do Ministério da Fazenda, impossibilitando o aprofundamento da investigação sobre o endividamento das estatais na década de 70 e 80, período em que a participação dessas empresas – que foram submetidas ao processo de privatização na década de 90 – foi extremamente relevante, o que demanda a necessidade de realização da auditoria da dívida prevista na Constituição Federal;

 

  • Ausência de parte dos contratos relativos à emissão de bônus da dívida externa na década de 70, que foram autorizados mediante decretos, e informação do BC acerca da impossibilidade de identificar os registros de tais decretos em sua contabilidade;

 

  • Comprovação deficiente da natureza da dívida externa na década de 70, considerando que os contratos enviados pela PGFN, os decretos localizados e as resoluções do Senado Federal justificam apenas uma pequena parcela dos ingressos informados nas estatísticas apresentadas pelo Banco Central à CPI. O Banco Central foi o principal órgão controlador do endividamento externo no período, tendo enviado à CPI planilhas em CD, não disponibilizando acesso a livro no qual deveriam ser registrados os certificados de registro;

 

  • Predominância do setor privado internacional (empresas multinacionais e bancos) no início do endividamento agressivo da década de 70, segundo livro publicado[136], respaldado em dados do Banco Central/FIRCE;

 

  • Viabilização de ganhos especulativos com o endividamento externo, dada a diferença entre as taxas de juros internacionais e as internas – reflexo desse excesso de empréstimos na inflação do período;

 

  • Ilegalidade da elevação unilateral das taxas de juros internacionais pelo FED norteamericano, o que provocou dano ao patrimônio público estimado em US$ 223 bilhões, demandando o aprofundamento das investigações para o devido ressarcimento ao Brasil;

 

  • Desvalorização dos produtos de exportação brasileiros e seu impacto no cumprimento das obrigações referentes ao endividamento externo;

 

  • Co-responsabilidade dos credores, conforme mencionado em comissões anteriores do Congresso Nacional;
  • Articulação de bancos privados internacionais, resultando em desequilíbrio entre as partes na negociação.

I . 8 – CONCLUSÃO e RECOMENDAÇÃO     

A análise preliminar da origem do endividamento externo brasileiro, relativo a operações realizadas no período de 1970 a 1982, contou com sérias limitações, como antes mencionado, tendo apontado diversas ilegitimidades, resumidas acima, que devem ser devidamente apuradas.

 

Foi possível evidenciar que o endividamento externo da década de 1970 foi o ponto de partida do processo de formação da dívida externa brasileira, que submetida à elevação das taxas de juros internacionais a partir de 1979 chegou à crise de 1982, dando margem a onerosas negociações e conversões futuras, que influenciam o endividamento atual.

 

É recomendável que as investigações prossigam, a fim de determinar, com a necessária transparência, a origem do endividamento externo registrado no período examinado, especialmente diante da ausência de acesso da CPI a informações fundamentais relacionadas ao registro da dívida junto ao Banco Central, bem como ausência de acesso a contratos e informações relevantes sobre o expressivo endividamento das estatais no período.

 

É recomendável que a ilegalidade da alta unilateral das taxas de juros seja enfrentada, pois esse aspecto já foi objeto de denúncia recorrente por todas as comissões parlamentares que se dedicaram ao tema do endividamento externo, sem um resultado prático até o momento.

 

Adicionalmente diante das diversas ilegitimidades constatadas no período examinado, é recomendável o aprofundamento das investigações, dada a relevância dos fatos para a evolução do processo de endividamento externo brasileiro, que provocou graves conseqüências sociais.

 

A principal conclusão do exame do endividamento do período leva à NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DA AUDITORIA DA DÍVIDA PREVISTA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988, tendo em vista a necessidade de elucidar os aspectos fundamentais do endividamento público que não puderam ser desvendados pela atual CPI, dado o exíguo prazo de seu funcionamento e as diversas limitações indicadas.

Brasília, 25 de março de 2010

Maria Lucia Fattorelli Carneiro
Auditora Fiscal da Receita Federal do Brasil
Requisitada para Assessorar a CPI da Dívida Pública

Aldo Olmos Molina Júnior
Auditor Interno da Caixa Econômica Federal
Requisitado para Assessorar a CPI da Dívida Pública

 

[1] Há divergências entre os saldos das séries temporais publicadas pelo Banco Central, que foram utilizados no gráfico, e os saldos informados pelo mesmo Bacen na Tabela da Dívida Externa Total enviada à CPI juntamente com a Nota Técnica Depec-2009/248, de 30/10/2009, enviada com Ofício 898/2009-BCB/Secre, de 03/11/2009, pois na mesma o Bacen  excluiu as operações intercompanhias.

 

[2] Multilateral: dívida externa contraída junto a organismos multilaterais, como FMI e Banco Mundial, entre outros; Bilateral: dívida externa contraída com outros países ou junto a bancos oficiais de outros países; Comercial: dívida externa contratada com bancos comerciais, em sua maioria bancos privados internacionais; e Privada: dívida externa contraída pelo setor privado junto a bancos privados internacionais.

[3] A parcela que aparece em vermelho a partir de 1994 pode ser atribuída a parcela da dívida externa com bancos privados que não foi transformada em Brady, permanecendo a cargo do Banco Central, bem como a empréstimos intercompanhias e a dívidas pagas sem que o Banco Central captasse tais pagamentos, conforme diferença anunciada pelo próprio Banco Central em 2001, no montante de US$ 32,7 bilhões, analisada no Capítulo III da presente análise preliminar.

[4] As taxas de juros internacionais dos contratos com bancos privados eram definidas pelo Federal Reserve Bank de Nova Iorque (que definia a Prime e era controlado principalmente pelos maiores bancos credores) e pela Associação de Bancos Privados de Londres (que definia a Libor)

[5] Análises Preliminares 1 a 4, apresentadas à CPI da Dívida Pública.

[6] Análises Preliminares 1 a 4 apresentadas à CPI

[7] Nota Derin/Gabin-2010/016, de 22.02.2010, enviada com Ofício 125/2010-BCB-Secre, de 23.02.2010

[8] Análise Preliminar Nº. 1, apresentada à CPI da Dívida Pública.

[9] CERQUEIRA, CERES AYRES – Dívida Externa Brasileira: Processo Negocial 1983-1996. Banco Central do Brasil, 1997. A autora foi chefe-adjunta do Departamento de Dívida Externa do Banco Central. O livro foi prefaciado pelo Ministro da Fazenda Pedro Sampaio Malan, que em seu prefácio ressaltou o mérito do conteúdo do livro, que contou com a revisão de José Linaldo Gomes de Aguiar (chefe do Departamento da Dívida Externa do Banco Central do Brasil), Olímpia Calmon e Cristina Cortes (consultoras do Departamento da Dívida Externa do Banco Central do Brasil), Altamir Lopes (chefe do Departamento Econômico do Banco Central do Brasil), Anuar Kalil (ex-chefe do Departamento de Câmbio do Banco Central do Brasil) e Luiz Carlos Sturzenegger (procurador-geral da Fazenda Nacional)

[10] Ver questionamentos às negociações de 1988 inseridos no relatório apresentado pelo então senador Fernando Henrique Cardoso à Comissão Especial do Senado em 1989 – Resumo objeto da Análise Preliminar Nº 1, apresentada à CPI da Dívida Pública.

[11] Dívida Externa Comercial corresponde à parcela da dívida externa contratada com Bancos Comerciais, sendo que a maioria destes eram Bancos Privados Internacionais

[12] Os relatórios dessas Comissões Parlamentares foram resgatados e resumidos, conforme Análises Preliminares 1 a 4, apresentadas à CPI da Dívida Pública.

[13] Desconto apenas aparente, pois não foi considerado o valor de mercado (de 30% ou até menos, conforme TCU) da dívida convertida, sendo que apenas um dentre os sete tipos de bônus oferecia um desconto de 35%.

[14] Ver resumo de outras comissões do congresso nacional, objeto de Análise Preliminar 1 a 4 da atual CPI da Dívida Pública

[15] Ver Capítulo II da presente análise preliminar

[16] Conforme Resolução do Senado Federal nº 69/1996

[17] Decreto nº. 2701, de 30.07.1998: NTN-A3, NTN-A4 , NTN-A5, NTN-A6, NTN-A7, NTN-A8 e NTN-A9

[18] Ver Capítulo IV da presente análise preliminar

[19] http://www.stn.fazenda.gov.br/divida_publica/downloads/soberanosinternet.xls

[20] Aviso nº 1447, de 17.12.2009

[21] Aviso nº 1447, de 17.12.2009

[22] O saldo de US$ 198 bilhões ao final de 2008 exclui os empréstimos intercompanhias. Se incluídos os empréstimos intercompanhias, o saldo da dívida externa em 31.12.2009 foi de US$ 282 bilhões.

[23] Tomando-se os dados da Tabela Dívida Externa Total proporcionada pelo Banco Central e considerando-se todos os ingressos e todas as saídas indicadas na referida tabela, foi calculada a Transferência liquida da seguinte forma: Empréstimos recebidos – Amortizações – Juros pagos e refinanciados + líquido de curto prazo.

[24] Tabela da Dívida Externa Total enviada à CPI juntamente com a Nota Técnica Depec-2009/248, de 30/10/2009, enviada com Ofício 898/2009-BCB/Secre, de 03/11/2009. Conforme informado pelo Banco Central, esta Tabela não incluiu os “empréstimos intercompanhias” a partir de 1993.

[25] Considerando a dívida externa total informada nas séries temporais do Banco Central, que inclui os empréstimos intercompanhias.

[26] Decreto no. 4.457, de 6 de novembro de 1964, que alterou os limites antes estabelecidos na Lei 1.518, de 24 de dezembro de 1951

[27] Dados extraídos do Anexo Estatístico do Livro “Dívida Pública: A Experiência Brasileira”, Tesouro Nacional, 2009, pág 467.

[28] Lei 5.000, de 24 de maio de 1966

[29] Constituição Federal de 1967, art. 45, inciso II, que manteve o disposto na Constituição Federal de 1946, art. 63, inciso II

[30] Art 83 – Compete privativamente ao Presidente:

(…)

VIII – celebrar tratados, convenções e atos internacionais, ad referendum do Congresso Nacional;

[31] Comentários à Constituição de 1967, com a Emenda Constitucional no. 1, de 1969, Tomo III, página 115

[32] Decreto 62.700, de 15 de maio de 1968

[33] Decreto 65.071, de 27 de agosto de 1969

[34] Lei  4.131, de 3 de setembro de 1962

[35] Resolução do Banco Central do Brasil no. 63, de 21 de agosto de 1967

[36] Resolução 125 e Comunicado FIRCE 10, atos mencionados por Pereira.José Eduardo de Carvalho in Alterações Recentes na Regulamentação dos empréstimos em moeda estrangeira e financiamento de importações. Pesquisa e Planejamento Econômico. Rio de Janeiro. junho de 1973.

[37] Decreto 55.762, de 17 de fevereiro de 1965

[38] Pereira.José Eduardo de Carvalho. Alterações Recentes na Regulamentação dos empréstimos em moeda estrangeira e financiamento de importações. Pesquisa e Planejamento Econômico. Rio de Janeiro. junho de 1973.

[39] Decreto-Lei 1.215, de 4 de maio de 1972; Mensagem No. 26, publicada no Diário do Congresso Nacional de 16/05/1972; Resolução No. 222, de 29/05/1972

[40] Resolução 279 do Banco Central, de 7 de fevereiro de 1974

[41] Relatório Anual do Banco Central 1974, página 223

[42] Decreto-lei  1.312, de 15 de fevereiro de 1974

[43] Decreto-lei 2.070, de 14 de dezembro de 1983

[44] CGA-1983 e DFA-1983

[45] Consta do Acordo de Crédito e Garantia-1983 (CGA-1983) que o Banco Central recebeu Empréstimo diretamente no exterior no montante de US$ 4,4 bilhões, destinado a reembolsos ou prepagamentos diretamente no exterior.

[46] Aviso 326/MF de 28/09/2009, juntamente com Memorando PGFN/PGA 4848, de 25/09/2009

[47] Ofício no. 117/09-P, dirigido ao Banco Central e Ofício 118/09-P dirigido ao Ministro da Fazenda, que reitera a solicitação constante do Requerimento de Informações no. 11, letra “b”, votado pela CPI.

[48] Valores de moedas distintas foram convertidas para o dólar norte-americano mediante a utilização dos parâmetros disponíveis no site do Federal Reserve Bank http://www.federalreserve.gov/RELEASES/H10/Hist/default1989.htm, na data da edição de cada Decreto.

[49] Utilizada a tabela da Dívida Externa total envidada a esta CPI. Cabe ressaltar que o atendimento ao requerimento de informações no. 10 desta CPI da Dívida Pública, por meio do qual foram solicitados dados estatísticos anuais – saldos e pagamentos de amortizações e juros – detalhados por tipo de dívida (Multilateral, Bilateral, Comercial e Privada) não foi atendido até a presente data pelo Banco Central ou Ministério da Fazenda.

[50] Decreto revogado por Decreto s/n, de 25/04/1991

[51] “Alterações recentes na regulamentação dos empréstimos em moeda estrangeira e financiamento de importações”, José Eduardo de Carvalho Pereira, Pesquisa Plan. Econ., RJ, 1973.

[52] Lei 4.595, de 31 de dezembro de 1964

[53] Decreto 55.762, de 17/02/1965, que regulamentou a Lei 4.131, de 03/09/1962, com a alteração da lei 4.390, de 29/08/1964

[54] Nota Técnica Desig/Gabin-2009/04 enviada com Ofício 894/2009-BCB/Secre

[55] Nota Técnica Desig/Gabin 05/2009, enviada à CPI com Ofício 945/2009-BCB-Secre

[56] Ofícios 945/2009-BCB/Secre e 975/2009-BCB/Secre

[57] Ofício 156/10-P, de 18/01/2010

[58] Ofício 049/2010-BCB/Secre, de 27/01/2010 e Nota Técnica Desig/Gabin-03/2010

[59] Tais taxas eram fixadas, respectivamente, pela Associação de Bancos de Londres e pelo Federal Reserve Bank de Nova York, ambas instituições comandadas pelos principais bancos privados internacionais.

[60] Cruz. Paulo Davidoff. Dívida Externa e Política Econômica. Instituto de Economia da UNICAMP, 1999, pág. 129

[61] Relatório Final aprovado em setembro de 1984. Resumo objeto de Análise Preliminar No. 4 elaborada para subsidiar os trabalhos da atual CPI da Dívida Pública.

[62] Ver Análises Preliminares 1 a 4 elaboradas para subsidiar os trabalhos da CPI da Dívida Pública

[63] Tabela da Dívida Externa Total enviada à CPI juntamente com a Nota Técnica Depec-2009/248, de 30/10/2009, enviada com Ofício 898/2009-BCB/Secre, de 03/11/2009.

[64] A tabela enviada pelo Banco Central não informa o valor do saldo inicial em 1970. O valor de US$ 5.397 milhões foi obtido a partir dos dados da própria tabela, tomando-se o saldo final em 1970, subtraindo-se os ingressos e adicionando-se as amortizações e o “Líquido CP” informados

[65] Oficio 782/2009-BCB-Secre, de 25/09/2009, e Nota Técnica Depec-2009/211, de 23/11/2009

[66] Aviso no. 419/MF, de 13 de novembro de 2009, acompanhado da Nota STN/CODIV No. 1556/2009, de 13/11/2009

[67] Ofício 8982009-BCB-Secre, de 03/11/2009, e Nota Técnica Depec-2009/248, de 30/10/2009

[68] Ofício 1014/2009-BCB-Secre, de 9 de dezembro de 2009 e Nota Técnica Depec-2009/273

[69] Ofício 898/2009-BCB-Secre, de 03/11/2009, e Nota Técnica Depec-2009/248, de 30/10/2009

[70] A parcela que aparece em vermelho a partir de 1994 pode ser atribuída a empréstimos intercompanhias e a dívidas pagas sem que o Banco Central captasse tais pagamentos, conforme diferença anunciada pelo próprio Banco Central em 2001, no montante de US$ 32,7 bilhões, analisada no Capítulo III da presente análise preliminar.

[71] Ofício 783/2009-BCB-Secre e Nota Técnica Derin-2009/121, de 23/09/2009

[72] Aviso no. 326/MF, de 28/09/2009, com Memorando PGFN/PGA no. 4848/2009, de 25/09/2009

[73]  Procuradoria Geral da Fazenda Nacional é o órgão responsável pela autorização dos empréstimos externos, conforme Decreto 24.036/34, art. 104, letra “d”

[74] Cifra decorrente da soma dos “Desembolsos” anuais informados na Tabela Dívida Externa Total elaborada pelo Banco Central para atender à CPI, Ofício 8982009-BCB-Secre, de 03/11/2009, e Nota Técnica Depec-2009/248, de 30/10/2009

[75] Planilha juntada no Anexo IV da presente Análise Preliminar

[76] Moedas distintas do dólar foram convertidas para o dólar norte-americano mediante a utilização dos parâmetros disponíveis no site do Federal Reserve Bank http://www.federalreserve.gov/RELEASES/H10/Hist/default1989.htm, na data do contrato.

[77] Aviso nº. 393/MF, Memorando PGFN/PGA nº. 5449, de 03/11/2009

[78] Memorando nº. 253/2009/MP/SE/DEST, de 12 de novembro de 2009.

[79] Aviso 326/MF de 28/09/2009, juntamente com Memorando PGFN/PGA 4848, de 25/09/2009

[80] Os 7 contratos enviados somam US$ 1.118.928.693 e dentre estes encontra-se o contrato no valor de US$ 700 milhões que faz parte da amostra de 5 contratos objeto desta análise

[81] Ofício no. 117/09-P, dirigido ao Banco Central e Ofício 118/09-P dirigido ao Ministro da Fazenda, que reitera a solicitação constante do Requerimento de Informações no. 11, letra “b”, votado pela CPI.

[82] Aviso Nº. 480/MF, com o Memorando PGFN/PGA/Nº. 6123, da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional

[83] Valores de moedas distintas foram convertidas para o dólar norte-americano mediante a utilização dos parâmetros disponíveis no site do Federal Reserve Bank http://www.federalreserve.gov/RELEASES/H10/Hist/default1989.htm, na data da edição de cada Decreto.

[84] Tabela da Dívida Externa total envidada a esta CPI, e reproduzida no Anexo III da presente análise preliminar que aponta total de ingressos no montante de US$ 114 bilhões

[85] Análise dos relatórios das comissões anteriores objeto do Capítulo I do presente Informe

[86] Memorando PGFN/PGA/No. 4848/2009, de 25.09.2009, enviado com Aviso no. 326/MF de 28.09.2009 em atendimento ao Requerimento de Informações no. 11.

[87] Ofício 980.2/2009-BCB-Secre, juntamente com Nota Técnica Deafi-2009-61, de 26.11.2009

[88] Ofício 980.2/2009-BCB-Secre, ao qual foi também anexada a Nota Técnica Desig/Gabin-07/2009

[89] Ofício 783/2009-BCB-Secre e Nota Técnica Derin-2009/121, de 23.09.2009

[90] Tabela da Dívida Externa total envidada a esta CPI, e reproduzida no Anexo III da presente análise preliminar que aponta total de ingressos no montante de US$ 114 bilhões no período de 1970 a 1982. Mesmo considerando-se que esta tabela inclui o endividamento externo privado, além do de estados e municípios.

[91] Ofício 0945/2009-BCB/Secre, de 17.11.2009

[92] Ofício 1006/2009-BCB-Secre, de 9 de dezembro de 2009 e Nota Técnica Desig/Gabin-10/2009

[93] LIBOR em 85,34% dos casos, PRIME em 0,94% e outras em 0,12%

[94] Ofício 975/2009-BCB-Secre, de 26.11.2009

[95] Ofício 156/10-P, de 18/01/2010

[96] Ofício 049/2010-BCB/Secre, de 27/01/2010 e Nota Técnica Desig/Gabin-03/2010

[97] Relatório da CPI de 1983 – Objeto de Análise Preliminar no. 4, apresentada aos parlamentares da atual CPI da Dívida Pública

[98] “Dívida Externa e Política Econômica”, Paulo Davidoff Cruz, Instituto de Economia da UNICAMP, 1999, pág. 114

[99] “Dívida Externa e Política Econômica”, Paulo Davidoff Cruz, Instituto de Economia da UNICAMP, 1999, página 119

[100] “Dívida Externa e Política Econômica”, Paulo Davidoff Cruz, Instituto de Economia da UNICAMP, 1999, pág. 130

[101] Nota Técnica Depec-2009/248, de 30/10/2009, enviada com Ofício 898/2009-BCB/Secre, de 03/11/2009

[102] CPI da Dívida em 1983 – Relatório Final votado em setembro de 1984, de autoria do Deputado Sebastião Nery, Relator da Comissão Parlamentar de Inquérito criada mediante o Requerimento nº 8/83 destinada a apurar as causas e conseqüências do elevado endividamento brasileiro e o acordo FMI/Brasil. Projeto de Resolução Nº 338, de 1985, publicado no Diário do Congresso Nacional de 03/09/1985, Suplemento. – Resumo objeto de Análise preliminar no. 4, apresentada à atual CPI.

[103] Relatório FHC No. 1/1989 – Relatório Final da “Comissão Especial do Senado Federal para a Dívida Externa”, criada mediante Requerimento Nº 17/1987 para “examinar a questão da dívida externa brasileira e avaliar as razões que levaram o Governo a suspender o pagamento dos encargos financeiros dela decorrentes, nos planos interno e externo”, cujo Relatório Final apresentado pelo Senador Fernando Henrique Cardoso foi aprovado na referida Comissão Especial em 23 de agosto de 1989 (página 6). – Resumo objeto de Análise preliminar no. 1, apresentada à atual CPI.

[104] CPI da Dívida em 1983 – Relatório Final

[105] “Dívida Externa e Política Econômica”, Paulo Davidoff Cruz, Instituto de Economia da UNICAMP, 1999, página 24

[106] Anexo  IV à presente Análise Preliminar

[107] Anexo I à presente Análise Preliminar

[108] Ofícios 945 e 975 BCB/Secre, complementados com Ofício 049/2010 BCB/Secre

[109] Anexo III à presente Análise Preliminar

[110] Divergências indicadas no Requerimento de Informações nº. 72, item 3, explicadas pelo BC como sendo referentes a parcelas de dívidas de curto prazo não registradas no BC.

[111] “Dívida Externa e Política Econômica”, Paulo Davidoff Cruz, Instituto de Economia da UNICAMP, 1999, página 29

[112] “Dívida Pública: A Experiência Brasileira”, vários autores, dentre os quais colaboradores do Tesouro Nacional e do Banco Mundial, publicado pela Secretaria do Tesouro Nacional, 2009, Tabela à Página 467.

[113] “Dívida Externa e Política Econômica”, Paulo Davidoff Cruz, Instituto de Economia da UNICAMP, 1999, pág. 117

[114] Relatório Final votado em setembro de 1984, de autoria do Deputado Sebastião Nery, Relator da Comissão Parlamentar de Inquérito criada mediante o Requerimento nº 8/83 destinada a apurar as causas e conseqüências do elevado endividamento brasileiro e o acordo FMI/Brasil. Projeto de Resolução Nº 338, de 1985, publicado no Diário do Congresso Nacional de 03/09/1985, Suplemento.

[115] Identificados no caso Lewis vs. Estados Unidos (Registro Federal, 2ª Serie, volume 680, pág. 1239, 1982. A Corte declarou: “Cada Banco da Reserva Federal é uma corporação separada possuída por bancos comerciais em sua região. Os bancos comerciais com participação acionária elegem dois terços dos nove membros da Junta Diretiva de cada banco.

[116] Artigo 62

Mudança Fundamental de Circunstâncias

  1. Uma mudança fundamental de circunstâncias, ocorrida em relação àquelas existentes no momento da conclusão do tratado e não prevista pelas partes, não pode ser invocada como causa para a extinção ou a retirada do tratado, a menos que:
  2. a) a existência dessas circunstâncias tenha constituído uma condição essencial do consentimento das partes em se obrigarem pelo tratado; e
  3. b) essa mudança tenha por efeito a transformação radical da natureza das obrigações ainda pendentes de cumprimento em virtude do tratado.
  4. Se, nos termos dos parágrafos anteriores, uma parte pode invocar uma mudança fundamental de circunstâncias como causa para a extinção ou retirada do tratado, pode também invocá-la para suspender a execução do tratado.

[117] Informações enviadas por meio do Ofício 898/2009-BCB/Secre, que enviou a Nota Técnica DEPEC – 2009/248, dia 3 de novembro de 2009. Cabe ressaltar que o Banco Central não incluiu os chamados empréstimos intercompanhias na tabela enviada. Daí o fato de que o estoque da dívida externa em 2008 tenha sido de somente US$ 198 bilhões, e não US$ 267 bilhões, conforme consta em outra tabela do Banco Central.

[118] Anexo II à presente Análise Preliminar

[119] O valor de US$ 198 bilhões não considera os empréstimos intercompanhias. A Dívida Externa Total em 31/12/2009 alcançou a cifra de US$ 282 bilhões.

[120] Considerando a dívida externa total informada nas séries temporais do Banco Central, que inclui os empréstimos intercompanhias.

[121] Conforme resumo constante da Análise Preliminar 1 a 4, apresentadas à CPI da Dívida Pública

[122] Objeto de Análise Preliminar no. 4, apresentada à atual CPI da Dívida Pública

[123] Objeto de Análise Preliminar no. 1, apresentada à atual CPI da Dívida Pública

[124] Objeto de Análise Preliminar no. 2, apresentada à atual CPI da Dívida Pública

[125] Objeto de Análise Preliminar no.3, apresentada à atual CPI da Dívida Pública

[126] “Dívida Externa e Política Econômica”, Paulo Davidoff Cruz, Instituto de Economia da UNICAMP, 1999, pág. 106

[127] “Dívida Externa e Política Econômica”, Paulo Davidoff Cruz, Instituto de Economia da UNICAMP, 1999, pág. 110

[128] “Dívida Externa e Política Econômica”, Paulo Davidoff Cruz, Instituto de Economia da UNICAMP, 1999, pág. 112

[129] CPI DA DÍVIDA DE 1983

[130] Comissão Especial do Senado, 1987

[131] CERQUEIRA, CERES AYRES – Dívida Externa Brasileira: Processo Negocial 1983-1996. Banco Central do Brasil, 1977, páginas 155 a 161, nas quais foi reproduzido o “Telex enviado à Comunidade Financeira Internacional em 21/12/1982” que menciona o “1983 Brazilian Financing Plan”

[132]  O “Programa de Estabilização Econômica e Social-1982” se relaciona ao “Plano de Financiamento de 1983” e ao “Acordo Stand-by com o FMI”, e marca o ponto de partida da ingerência dos organismos internacionais, particularmente do FMI, mediante a instrumentação de medidas econômicas, políticas, sociais e institucionais no Brasil, a pretexto de gerir a administração da dívida externa.

[133] CERQUEIRA, CERES AYRES – Dívida Externa Brasileira: Processo Negocial 1983-1996. Banco Central do Brasil, 1977

[134] Comitê Assessor formado pelos bancos: “Lloyds Bank Internacional, Citibank N.Y., The Chase Manhattan Bank NA, Chemical Bank, Bank of America National Trust and Savings Association, Arab Banking Corporation, Bank of Montreal, Bank of Tokyo, Bankers Trust Company, Credit Lyonnais, Deutsche Bank, Manufacturers Hannover Trust Co, Morgan Guaranty Trust Co, Union Bank of Switzerland.

[135] Evidências da articulação entre os bancos privados internacionais, FMI e Clube de paris em várias passagens do Relatório da Comissão Especial do Senado (Relatório FHC), especialmente às páginas 32; 56/57; 58/59; 60; 62; 84; 90; 112; 123, conforme Análise Preliminar I

[136]  “Dívida Externa e Política Econômica”, Paulo Davidoff Cruz, Instituto de Economia da UNICAMP, 1999