Governo nem sabe para quem paga a dívida

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Governo nem sabe para quem paga a dívida

 

Por Maria Lucia Fattorelli e Rodrigo Ávila*

 

As deputadas federais Fernanda Melchionna (PSOL/RS), Samia Bomfim (PSOL/SP) e David Miranda (PSOL/RJ) apresentaram o Requerimento de Informações 696/2019, em 5/6/2019, solicitando ao Ministro da Economia, Paulo Guedes, os nomes dos detentores de títulos da dívida pública federal interna, e o valor detido por cada um deles.

O governo respondeu que sequer sabe para quem paga os juros e amortizações da dívida pública e, mais uma vez, alegou que as informações estão protegidas por “sigilo bancário”, conforme documento disponível na página da Câmara dos Deputados (https://bit.ly/2MafzFQ).

Essa resposta contraria frontalmente o art. 37 da Constituição Federal , segundo o qual a administração pública de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá ao princípio da publicidade. Enquanto todas as demais despesas da União são divulgadas publicamente, inclusive com divulgação de nome e CPF/CNPJ de cada beneficiário ou servidor público na internet , os gastos com a dívida pública ficam escondidos, sem qualquer transparência, sigilosos…

O governo divulga apenas grupos econômicos detentores de títulos (bancos, fundos de investimento, entidades de previdência, etc.), o que está muito longe de atender à Constituição e diversos dispositivos legais que exigem a transparência das informações públicas.  É fundamental  saber quem são os grandes beneficiários dos fundos de investimento e também do que o governo chama de “Previdência”, onde se inclui também a previdência aberta, onde qualquer milionário pode também colocar sua fortuna. Quando vão à imprensa, analistas conservadores dizem que os principais componentes deste grupo são da classe média. Porém, quando perguntado oficialmente, o governo se cala e alega sigilo…

O requerimento de informações também questionou a razão pela qual, em 2017, o governo  anunciou um valor de R$ 118 bilhões a título de atualização monetária da dívida pública federal, apesar do índice IGP-M ter sido negativo. Tal questionamento é importante, pois sistematicamente a parcela atribuída a “atualização monetária” tem sido subtraída dos juros nominais da dívida, tornando este valor subestimado. Ao mesmo tempo,  essa mesma parcela atribuída a “atualização monetária” tem sido adicionada à chamada “rolagem” ou “refinanciamento”, inflando esta rubrica, que é constantemente desprezada por governistas e analistas neoliberais –  e até mesmo alguns economistas ditos de “esquerda” – sob a falsa alegação de que se trataria apenas de uma troca de dívida velha por nova, quando na verdade tal valor corresponde em grande parte aos juros nominais da dívida. Essa manobra burla o Art. 167, III da Constituição e tem sido responsável pelo crescimento exponencial da dívida.

Em relação a esse aspecto, o governo respondeu parcialmente, limitando-se a informar que o valor da atualização monetária teria sido apenas de R$ 94,9 bilhões, porém, neste dado omite a atualização monetária correspondente aos títulos que o Tesouro Nacional entrega ao Banco Central e este aos bancos, nas denominadas “Operações Compromissadas” que recebem os generosos juros e privilegiam bancos com a remuneração de sua sobra de caixa.

Apesar de o IGP ter sido negativo em 2017, o governo apurou um valor positivo, sob o escandaloso argumento de que considerou a atualização monetária desde a data da emissão de cada título, e não apenas no exercício de 2017. Tal metodologia é frontalmente contrária ao disposto na Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2017, em seu artigo 91, segundo o qual “a atualização monetária do principal da dívida mobiliária refinanciada da União não poderá superar, no exercício de 2017, a variação do Índice Geral de Preços – Mercado – IGP-M da Fundação Getúlio Vargas.” (grifo nosso).

A resposta a este Requerimento de informações mostra, mais uma vez, que para atender aos interesses financeiros vale tudo: sigilo de informações, burla à Constituição (art. 37 e 167, III), e à LDO, o que reforça a necessidade de ampla auditoria da dívida pública, com participação da sociedade civil!

AUDITORIA JÁ!

 

*Respectivamente, coordenadora nacional da Auditoria Cidadã da Dívida, e economista da ACD.