Leilões de Bacias Petrolíferas, de Hidrelétricas, e o Sistema da Dívida

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Maria Lucia Fattorelli[1]

Rodrigo Ávila[2]

Heitor Claro[3]

O Governo Federal, por meio de leilões, tem vendido o patrimônio nacional. São recursos naturais de grande riqueza – bacias petrolíferas e hidrelétricas. Ao mesmo tempo em que alega não dispor de recursos para os necessários investimentos nestas áreas, o governo mantém intocada a Lei 9.530/1997, aprovada no governo FHC, segundo a qual todos os lucros das estatais distribuídos à União devem ser destinados ao pagamento da Dívida Pública, o que é altamente questionável.

Em relação ao petróleo, a 11ª rodada de leilões de Bacias Petrolíferas – realizada pelo sistema de concessões, onde as empresas terão 30 anos para explorar seus campos de petróleo – ofertou 289 Blocos por 2,8 bilhões de reais. Tal valor está muito aquém do que seria compatível com a riqueza das jazidas, estimada entre 10 a 13,5 bilhões de barris. A Agência Nacional do Petróleo (ANP) se manifestou no sentido de que podem ser até 19,1 bilhões de barris de petróleo e gás, o que daria em valor de mercado o total aproximado de dois trilhões de reais. O valor arrecadado com os leilões do petróleo (o chamado “bônus de assinatura”) será todo destinado ao superávit primário, ou seja, a reserva de recursos para o pagamento da dívida pública.

Importante lembrar também que os royalties do petróleo têm sido destinados para o pagamento da dívida, em violação às leis que destinam tais recursos para áreas como meio ambiente e ciência e tecnologia. Em 2008, por exemplo, um estoque de R$ 20 bilhões dos royalties (pertencentes à União) foram indevidamente destinados à amortização da dívida, em operação que chegou a ser considerada irregular pelo Tribunal de Contas da União.

Estes números fazem parte do cenário de enriquecimento de grupos nacionais e estrangeiros, financiados por empresas públicas brasileiras, como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, que a juros baixos tem favorecido a a aquisição de patrimônio público estatal por grupos privados. Essa benesse tem custado caro ao Tesouro, que emite títulos da dívida pública com os juros mais elevados do mundo e repassa recursos ao BNDES.

Os leilões de hidrelétricas se configuram na entrega de patrimônio público para empresas estrangeiras, muitas vezes, também, com recursos de financiamentos públicos, pelo modelo de concessão do Governo Federal. Serão leiloadas hidrelétricas da Companhia de Energia Elétrica de São Paulo-CESP, da Companhia Energética de Minas Gerais-CEMIG e da Companhia Paranaense de Energia-COPEL, incluindo a Hidrelétrica de Três Irmãos/SP. A energia nestas concessões será mais cara: segundo o boletim Brasil de Fato (12/08/2013), a energia gerada por hidrelétricas da Eletrobrás vendem energia mais barata do que estas, que têm, ou terão, operadores privados após o leilão das hidrelétricas; as empresas do grupo Eletrobrás vendem energia a R$ 32,00/MWh, já a AES Tietê, por exemplo, vende a R$ 182,00/MWh, encarecendo a conta de luz do trabalhador brasileiro. Além do mais, para 2014, funcionarão os sistemas de bandeiras de consumo, que aumentarão a conta de luz do trabalhador justamente na hora em ele chega do trabalho, no horário da noite, conforme o Boletim Brasil de Fato de maio/2013 relata:

“A Agência Nacional de Energia Elétrica (ANNEL) aprovou o sistema de bandeiras tarifárias, com as bandeiras verde, amarelo e vermelho, uma clara estratégia para beneficiar as empresas geradoras. A medida entrará em vigor a partir de janeiro de 2014 e representará um aumento nas tarifas de R$ 15,00 para cada 1.000 kWh consumidos, quando a bandeira for amarela, ou R$ 30 para cada 1.000 kWh consumo quando for bandeira vermelha. Considerando que a tarifa média das residências brasileiras, sem impostos é de R$ 330,00 para cada 1.000 kWh, com a bandeira for vermelha significará 9% de aumento.”

“A tarifa intermediária será cobrada das 17 às 18 horas e das 21 às 22 horas, e custará três vezes mais que a tarifa fora de ponta. Já a tarifa fora de ponta, cobrada nos demais horários, custará 55% da tarifa de referência, ainda não especificada pela Aneel.”

A dívida pública brasileira, que já representa 78% do PIB e consome quase 50% do orçamento da União, possui diversos indícios de ilegalidade e ilegitimidade que foram comprovados inclusive pela CPI da Dívida Pública realizada na Câmara dos Deputados em 2009/2010. Essa dívida, que nunca passou por auditoria, como prevê a Constituição Federal, é altamente questionável, como também revelam estudos elaborados pela Auditoria Cidadã. O elevado volume de recursos consumidos pelo Sistema da Dívida tem impedido a realização dos investimentos necessários em todos os âmbitos, inclusive para projetos energéticos. Adicionalmente, as exigências relacionadas  à privatização das estatais, impostas pelo FMI desde a década de 80 e já incorporadas à agenda política dos últimos governos, têm provocado a sucessiva entrega do patrimônio público ao setor privado.

Afetado pelos mesmos interesses privados que regem o Sistema da Dívida, o setor energético não tem sido pensado de forma a atender aos interesses da população e do meio ambiente, que demandam energia limpa e de baixo custo. A política energética tem sido pautada por interesses privados, que têm levado ao contínuo enriquecimento de privilegiado grupo privado nacional e internacional. Por isso é urgente e necessário repensar o modelo econômico atual.

 

 

Bibliografia:

Dívida e Energia: http://www.andes.org.br/andes/print-ultimas-noticias.andes?id=5745

Leilões de Bacias Petrolíferas: http://pcb.org.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=6011:o-leilao-do-petroleo-parte-do-maior-pro

Leilões de Hidrelétricas: http://g1.globo.com/economia/negocios/noticia/2013/04/governo-publica-regras-para-novos-leiloes-de-hidreletricas.html

Modelo de Privatizações de energia e petróleo: http://www.brasildefato.com.br/node/12882

Receitas dos leilões para o superávit primário:

http://economia.ig.com.br/2013-06-14/receita-de-privatizacoes-engordara-superavit-primario.html

 

[1] Coordenadora Nacional da Auditoria Cidadã da Dívida (www.auditoriacidada.org.br)

[2] Economista, voluntário da Auditoria Cidadã da Dívida

[3] Estudante de Economia da UnB, colaborador da Auditoria Cidadã da Dívida

 

 

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Dezenove parques eólicos parados no país causam prejuízo de R$ 400 mi

Se estivessem funcionando, os geradores poderiam alimentar mais de 500 mil casas com média de quatro moradores em cada uma.

 

Um problema de infraestrutura, que inclui também problema de gestão, tem consequência na conta de luz dos brasileiros. No início do ano, mostramos no Bom Dia Brasil parques eólicos estão parados por falta de linhas de transmissão. Agora em julho, 19 deles completaram um ano sem funcionar. Um prejuízo que já passa de R$ 400 milhões.

Doze parques do maior complexo de energia eólica da América Latina foram inaugurados em julho do ano passado e estão parados. São 184 torres em uma área que abrange três municípios do Sudoeste da Bahia.
Se estivessem funcionando, os geradores seriam capazes de alimentar mais de 500 mil casas com média de quatro moradores em cada uma, ou uma população de mais de dois milhões de habitantes.
Além desse complexo, outros sete parques do Rio Grande do Norte estão na mesma situação. Foram inaugurados há um ano e não funcionam por falta de linhas de transmissão. A CHESF, companhia estatal que deveria ter entregue as conexões, atribui o atraso a três fatores.
“O processo de licenciamento ambiental, o processo de anuência dos órgãos do patrimônio histórico, e hoje uma questão muito grave, a questão fundiária”, diz João Bosco de Almeida, presidente da CHESF.
A energia que deveria ser gerada nesses parques eólicos já foi leiloada. E, de acordo com o contrato, as distribuidoras têm que pagar mesmo sem receber. Assim, as usinas não perdem dinheiro. É o caso da Renova Energia, que administra os parques do Sudoeste da Bahia.

“Nós recebemos a receita, mesmo porque essa receita é usada para pagar o financiamento que contraímos junto ao BNDES. São R$ 15 milhões ao mês”, revela Carlos Mathias Becker, diretor-presidente da Renova Energia.

Os 19 parques eólicos da Bahia e do Rio Grande do Norte já receberam cerca de R$ 400 milhões durante este ano em que ficaram parados. Segundo a Aneel, no fim, quem paga essa conta é o consumidor, pois esse valor é considerado um custo extra e entra no reajuste da tarifa.
Para garantir a geração de energia, o governo decidiu que apenas as usinas próximas a subestações de transmissão poderão participar dos próximos leilões.
“Nesse próximo leilão de energia eólica que vamos ter agora, o gerador eólico só pode ofertar energia se existir conexão pronta para que ele conecte os parques eólicos”, diz João Bosco de Almeida, presidente da CHESF.

 

Fonte: BOM DIA BRASIL 30/07/2013