Notificação extrajudicial contra a PEC 10/2020

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Aos (às)
Exmos (as). Sr. (Sras.) Deputados(as) Federais
RODRIGO FELINTO IBARRA EPITÁCIO MAIA
e todos(as) os(as) que irão votar a PEC 10/2020 em Plenário da Câmara dos Deputados
[email protected]
(enviado também para o endereço eletrônico de todos os demais 512 deputados/as)
Brasília-DF CEP 70160-900

AUDITORIA CIDADÃ DA DÍVIDA, associação sem fins lucrativos, devidamente registrada no CNPJ sob nº 12.537.204/0001-45, sediada em Brasília, Distrito Federal, no Setor de Autarquias Sul, Quadra 5, Bloco N, Edifício OAB, 1º andar, Asa Sul, CEP 70.070.939, representada por sua Presidente Maria Lucia Fattorelli Carneiro, brasileira, divorciada, Administradora e Contadora, Auditora Fiscal da Receita Federal do Brasil aposentada, CI nº M-575.880 SSP/MG, CPF nº 428.566.556-53, residente e domiciliada em Brasília-DF,

com fulcro no Art. 726 e seguintes do Código de Processo Civil – Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015, vem interpor a Vossa Excelência a presente

NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL

mediante as razões de fato e direito adiante articuladas:

I – DA NECESSIDADE DA NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL
Conforme desenvolvemos no decorrer da presente peça, a necessidade da presente Notificação Extrajudicial se justifica pois a PEC 10/2020 expõe a risco o parlamentar que votar a favor de alteração constitucional que, em resumo:

  • Provoca prejuízo de trilhões de reais aos cofres públicos, por meio de grave autorização para que o Banco Central opere no mercado secundário (de balcão), podendo comprar derivativos sem lastro e debêntures, sem limite de valor;
  • Admite que tais compras ocorram sem a identificação dos beneficiários, sem obedecer aos “Procedimentos Mínimos” recomendados pela Anbima, sem a possibilidade de investigação efetiva, sem limitar o prazo dos derivativos sem lastro e debêntures, sem a exigência de contrapartida alguma ao país;
  • Permite que o Banco Central pague por tais derivativos sem lastro e debêntures com recursos públicos, afetando gravemente o orçamento federal e provocando aumento exponencial da dívida pública, cujo peso recairá sobre o povo brasileiro;
  • Representa, na prática, a troca de papéis podres dos bancos por títulos da dívida pública federal, que ainda renderão juros mensalmente aos bancos, enquanto o Banco Central ficará com os derivativos sem lastro e debêntures em seu balanço;
  • Possui dispositivo que “legaliza” a incorreta emissão de novos títulos da dívida pública para pagar juros, o que já vem sendo praticado de forma inconstitucional pois burla o Art. 167, III conforme denunciado desde 2010;
  • Altera a Constituição Federal durante estado de calamidade pública, afrontando diretamente a proibição constante do Art. 60 § 1º da própria Constituição para situações equiparáveis (estado de sítio, de defesa, intervenção federal), nos quais a participação popular e o funcionamento do poder legislativo ficam prejudicados;
  • Está em sentido oposto aos objetivos fundamentais da República (Art. 3º da Constituição), pois o seu custo elevadíssimo subtrairá trilhões para servir aos bancos, impedindo a destinação de recursos para o desenvolvimento nacional, impossibilitando também a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais.

Não se trata de interferir no direito ao voto de cada parlamentar, que tomará, sob sua exclusiva responsabilidade, a decisão de aprovar ou não a referida PEC 10/2020. A presente Notificação Extrajudicial visa tão somente certificar que V.Exa. tomou conhecimento dos diversos e graves problemas de ordem jurídica, constitucional, econômico-financeira e social envolvidos na PEC 10/2020, assim como os seus impactos danosos à sociedade brasileira, e assegurar que V. Exa., seja na condição de Presidente da Câmara dos Deputados, Liderança de Partido Político com representação na Casa, Relator ou Parlamentar que irá votar a referida PEC 10/2020 em plenário, que deem conhecimento a seus pares e deliberem, no âmbito de suas responsabilidades político-parlamentares, as medidas necessárias para que sejam superados os referidos problemas, previamente à deliberação da referida proposta pelo Plenário da Câmara dos Deputados, registrando-se a presente manifestação nos anais da sessão que analisar a referida PEC 10/2020 na Câmara dos Deputados.

II – DOS FATOS

Em 1º de abril de 2020 à tarde, foi protocolado, na Câmara dos Deputados Federais, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 10, de 2020, que “Institui regime extraordinário fiscal, financeiro e de contratações para enfrentamento da calamidade pública nacional decorrente de pandemia internacional e dá outras providências”. A referida PEC 10/2020 foi votada pela Câmara, alterada pelo Senado, e agora retorna à Câmara.

A justificativa anunciada para a PEC/2020, denominada pelos autores e pela imprensa como “PEC do Orçamento de Guerra”, foi a de permitir o financiamento das ações emergenciais face à pandemia da Covid-19, para as quais seria necessário flexibilizar a “Regra de Ouro” e outras normas fiscais.

Tal justificativa se mostrou extremamente frágil , tendo em vista que tanto a Lei de Responsabilidade Fiscal como a Lei de Diretrizes Orçamentárias já preveem exceções no caso de Estado de Calamidade, permitindo o descumprimento de metas de resultado primário e outras normas. Adicionalmente, o STF já se manifestou no sentido de afastar as exigências constantes nestas leis (LRF e LDO) para as ações relacionadas à pandemia do coronavírus[ http://www.stf.jus.br/portal/cms/vernoticiadetalhe.asp?idconteudo=440384).]. Até mesmo o único dispositivo constitucional que poderia ser citado como entrave a tais ações, a chamada “Regra de Ouro”, também prevê exceção por meio da aprovação de créditos suplementares ou especiais, além de que o país possui já possui expressivo montante de recursos em caixa.

Diante da evidente fragilidade da justificativa anunciada para uma proposta de emenda à Constituição em período excepcional de pandemia, restou patente que, na realidade, o principal objetivo da PEC 10/2020 é outro, e visa beneficiar ainda mais os bancos, em ato de oportunismo inaceitável, diante do drama social e econômico que afeta a maioria das pessoas e empresas no país, conforme dados expostos a seguir na presente Notificação Extrajudicial.

Inicialmente, alertamos para o descabimento de uma alteração da Constituição Federal durante estado de calamidade pública, tendo em vista a proibição constante do Art. 60 § 1º para situações equiparáveis (estado de sítio, de defesa, intervenção federal), nos quais a participação popular e o funcionamento do poder legislativo ficam prejudicados.

Alertamos para a falta de urgência para a votação da PEC 10/2020, tendo em vista que o STF já afastou a aplicação da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para os gastos relacionados ao combate à pandemia do coronavírus[Leia] tendo em vistas que essas próprias leis já preveem exceções no caso de Estado de Calamidade, permitindo o descumprimento de metas de resultado primário e outras normas. Adicionalmente, temos mais de R$ 4 trilhões em caixa, dinheiro mais que suficiente e que pode ser usado para os gastos públicos relacionados à pandemia do coronavírus: saldo de R$ 1,4 trilhão na conta única do Tesouro Nacional[ Leia – Tabela 4 – Linha 44], mais de R$ 1,7 trilhão em Reservas Internacionais[ Leia , Série Temporal no 13621], e cerca R$ 1 trilhão no caixa do Banco Central[ Leia ]. Portanto, não existe a alegada “urgência”.

Alertamos que o conteúdo da PEC 10/2020 engloba dispositivo que “legaliza” a incorreta emissão de novos títulos para pagar juros, o que já vem sendo praticado de forma inconstitucional, pois burla o Art. 167, III conforme denunciado desde 2010[ Leia]. Tal mecanismo tem sido um dos principais responsáveis pelo aumento exponencial do estoque da dívida interna mobiliária federal. Em vez de suspender os pagamentos dos juros neste momento em que enfrentamos uma pandemia, tendo em vista que quem recebe juros pode esperar, a PEC 10/2020 caminha em sentido inverso e prioriza o gasto financeiro ao “legalizar” procedimento inconstitucional que tem prejudicado de forma grave as finanças nacionais.

Alertamos para a grave autorização que a PEC 10/2020 dá ao Banco Central para operar no mercado secundário (de balcão), podendo comprar derivativos sem lastro e debêntures, sem limite de valor, sem identificar os beneficiários, sem obedecer aos “Procedimentos Mínimos” recomendados pela Anbima, sem a possibilidade de investigação efetiva, sem limitar o prazo dos papéis[ Segundo especialistas do mercado financeiro, os papéis financeiros podem ser renovados no sistema em minutos. Dessa forma, papéis acumulados a 15 anos na “carteira podre” dos bancos poderiam ser facilmente renovados para uma data recente nos sistemas internos dos bancos.], sem a exigência de contrapartida alguma ao país, e mais: pagando tudo isso com recursos públicos e/ou títulos da dívida pública, cujo peso recairá sobre o povo brasileiro!

Alertamos para o fato de que o próprio presidente do Banco Central informou aos senadores em 09/04/2020, que o valor desse negócio será de R$972,9 bilhões[ Leia também disponível em: leia ] , mostrando que já naquela data ele tinha conhecimento preciso do conteúdo do pacote de créditos privados.

Alertamos para o fato de que esse valor de quase R$ 1 trilhão informado pelo presidente do BC ao Senado coincide com o valor divulgado em matéria de capa do Estadão dia 11/11/2019 e vários outros grandes meios de comunicação, citando levantamento feito pela IVIX Value Creation[ Leia também disponível em AQUI] e revelando que a “carteira podre” dos bancos chegava ao valor de quase R$ 1 Trilhão, sem considerar a correção monetária! Se computada essa correção, chegaremos a vários trilhões, pois esses ativos privados vêm sendo acumulados nos bancos há 15 anos, segundo o levantamento!

Alertamos para o fato de que foi suprimida, no Senado, a parte do texto inicialmente votado na Câmara que mencionava que o Tesouro Nacional faria o aporte de pelo 25% do valor da operação. Na prática, o Tesouro Nacional assumirá 100% do valor da operação! Os títulos da dívida pública que podem ser entregues em pagamento dos papéis adquiridos pelo Banco Central são emitidos pelo Tesouro Nacional. Ademais, segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal, o Tesouro Nacional arca com a totalidade dos prejuízos do Banco Central (LRF Art. 7o § 1o). Dessa forma, a conta recairá sobre o conjunto da sociedade.

Alertamos para o fato de que a autorização para que o Banco Central atue em mercado de balcão representa um rebaixamento da autoridade monetária do país a um mero operador independente do mercado financeiro, despendendo recursos públicos para a compra de títulos privados altamente questionáveis, que nenhuma outra instituição compraria, beneficiando unicamente instituições financeiras portadoras desses papéis há anos!

Alertamos para o fato de existirem graves erros[ Vídeo “5 erros da PEC 10” com Eduardo Moreira e outro especialista do mercado financeiro assista ] no texto da PEC que a tornam impossível de cumprir, impraticável, e, se aprovada como está, obrigará o Banco Central operar à margem da lei, desrespeitando a própria Constituição:

Micro, pequena e média empresa não emitem os títulos privados que a PEC 10 autoriza o BC adquirir e seria impossível para tais empresas obter nota de classificação de risco que custa de 30 a 50 mil dólares. Por quê o texto da PEC inclui algo falso e impraticável? “A preferência será para a aquisição de papéis emitidos por micro, pequenas e médias empresas, a fim de garantir liquidez para essas companhias.”

– No mercado secundário (de balcão), nenhum título será comprado de empresa (isso só ocorre no mercado primário) e não existe título de micro, pequena e média empresa.

A operação em mercado de balcão acontece entre investidores e o dinheiro não alcança nenhuma empresa em particular, como aliás afirmou categoricamente o senador Anastasia, conforme trecho de seu relatório transcrito a seguir:
Por outro lado, a natureza do mercado secundário e as características dos títulos a serem adquiridos impedem que se imponha restrições relativas à dispensa de pessoal ou às bonificações de diretores de empresas, pois a empresa não-financeira emissora do título não é a beneficiária da aquisição no mercado secundário, que tem caráter fluido. Em verdade, o grande objetivo desta medida é dar liquidez ao mercado secundário, gerando confiança em seu regular funcionamento, sem beneficiar individualmente qualquer empresa, mas sim todo o sistema de crédito. Daí a impossibilidade de acolher as emendas que se referem a estas limitações, não por seu justo mérito, mas por impossibilidade fática.

– A PEC exige que cada título privado a ser comprado pelo BC, tenha classificação de risco ditado por uma das maiores agências internacionais de risco acima de BB- . Essa classificação significa “grau especulativo”. Além de a PEC 10/2020 reconhecer que o Banco Central poderá adquirir títulos privados de baixa qualidade (que nenhuma outra instituição compraria!), é importante ressaltar que as agências classificadoras têm tido a sua conduta seriamente questionada, em especial desde a Crise de 2008, por atuarem a favor de seus próprios contratantes, ou seja, os bancos, com evidentes conflitos de interesses. Também têm sido acusadas de grosseiros erros de avaliação de rating, denúncias de venda de pareceres e até fraudes denunciadas pelo Governo dos Estados Unidos da América do Norte[ leia ].

– Além de sequer existir avaliação de rating para diversos dos títulos privados citados na PEC 10, a Anbima recomenda, em relação à avaliação de risco de créditos privados[ Anbima – Parecer de Orientação 11/2008, citado na Dissertação de Mestrado Tatiana Guazzelli, disponível em leia também disponível em leia ], que tal avaliação, quando existir, deve ser usada apenas como informação adicional, e não como condição suficiente para a sua aquisição:
(vii) utilizar o rating e a respectiva súmula do ativo ou do emissor, fornecido por agência classificadora de risco, quando existir, apenas como informação adicional à avaliação do respectivo risco de crédito e dos demais riscos a que devem proceder, e não como condição suficiente para sua aquisição.

– A PEC 10 admite que o Banco Central adquira os títulos privados CCI e CCB, que são derivativos privados que nunca tiveram liquidez, o que contradiz com o que consta do objetivo da PEC. Ademais, não existe rating de agência internacional para esse tipo de título privado de baixa negociação. Por quê incluíram esses papéis no texto da PEC 10?

– A PEC 10 admite que o Banco Central adquira também os CRI e CRA, que são pacotes derivados de um conjunto de outros títulos de créditos distintos. Não tem sentido o rating do pacote. O rating teria que ser de cada título dentro do pacote.

– A PEC 10 fala em preço de referência, no entanto, além de tal preço não existir para vários títulos privados listados na PEC, tal preço de referência fica totalmente fora de parâmetro de mercado em tempos de crise, possibilitando que a venda ao BC seja feita por valor completamente fora da realidade. Trata-se de um cheque para dar dinheiro público para bancos e corretoras e aumentar ainda mais seus lucros. Bancos ainda poderão comprar títulos a preços baixos e vender para o BC pelo preço que quiserem!

– A menção à limitação na distribuição de juros sobre capital próprio, lucros e dividendos é inócua, pois além de não estar expressa na PEC 10, cujo texto remete tal possível restrição a uma futura regulamentação pelo Banco Central (caput do Art. 9o do texto aprovado no Senado), não é possível saber quais as condições dessa possível “contrapartida”. Além disso, o texto mantém o pagamento de juros sobre o capital próprio e dividendos até o mínimo obrigatório estabelecido em lei ou no estatuto social, o que não produz resultado algum na prática, tendo em vista que o estatuto social pode ser alterado a bel prazer dos interessados até o dia da publicação da PEC, por exemplo, ou após a pandemia e a vigência da PEC, ou da forma a vir regulamentada pelo Banco Central posteriormente. Também mantém a remuneração, fixa ou variável, de diretores e membros do conselho de administração, no caso das sociedades anônimas, e dos administradores, no caso de sociedades limitadas, limitando-se a vedar apenas eventual aumento desses ganhos (em alguns casos altíssimo) de tais administradores. Além do mais, tais remunerações podem ser aumentadas livremente até que a PEC seja promulgada, por exemplo, ou após a pandemia e a vigência da PEC, ou da forma a vir regulamentada pelo Banco Central posteriormente. Assim, essa possível “contrapartida” se mostra como uma falácia, sem efeito prático algum, face aos imensos lucros que os bancos terão com a benesse de trilhões que a PEC 10/2020 autoriza que o Banco Central lhes conceda, às custas do aumento da dívida pública que recairá sobre o povo brasileiro.

Alertamos para o fato de que as outras contrapartidas (relacionadas à manutenção de empregos) inseridas no Art. 4o do texto da PEC 10 votado em segundo turno no Senado não alcançam os beneficiários das compras de créditos privados pelo Banco Central, tendo em vista que:
os beneficiários dessas operações feitas pelo Banco Central não serão identificados, o que impossibilita verificar o cumprimento de qualquer contrapartida;
– segundo o próprio relator Anastasia a operação se dará com instituições financeiras e nenhuma empresa será beneficiada diretamente, conforme trecho de seu relatório já transcrito previamente nesta Notificação Extrajudicial.

Alertamos para o fato de que antes de autorizar tal operação Vossas Excelências teriam que solicitar ao Banco Central a completa discriminação dos beneficiários, o detalhamento dos riscos envolvidos e demais informações sobre cada um dos créditos privados englobados no valor de R$972,9 bilhões informado pelo presidente do Banco Central aos senadores em 09/04/2020, sob pena de assumirem a corresponsabilidade sobre os danos provocados por tal operação às cegas.

Alertamos para o fato de que não foram apresentadas a justificação e a motivação para a inclusão no texto da PEC 10/2020 dessa estranha autorização para que o Banco Central opere no obscuro e desregulamentado mercado de balcão, adquirindo questionáveis títulos privados com recursos públicos da ordem de R$ 1 trilhão, como declarou o presidente do BC ao Senado, e cuja atualização monetária (levantamento da IVIX Value Creation[ leia ]) poderá chegar a vários trilhões, impactando gravemente o orçamento público e gerando Dívida Pública completamente ilegítima, resultante da mera assunção de carteira podre de bancos.

Alertamos para o fato de que a PEC 10/2020 faculta o Banco Central realizar funestas operações e “inovações” financeiras praticadas dos mercados autorregulados e acima do Estado, cujas consequências provocam a explosão da dívida pública e a consequente aplicação de medidas de austeridade e ajuste fiscal para pagar essa dívida, cortando toda a capacidade de investimentos sociais em áreas essenciais como saúde, educação e pesquisa científica, assistência social etc., além de suprimir direitos sociais, em especial os previdenciários e trabalhistas, aprofundando cada vez mais a desigualdade social, enquanto os lucros dos bancos seguem batendo recordes trimestrais bilionários.

Alertamos que esse questionável conteúdo da PEC 10/2020 está em sentido oposto aos objetivos fundamentais da República (Art. 3o da Constituição), pois o seu custo elevadíssimo subtrairá trilhões para servir aos bancos, impedindo a destinação de recursos para o desenvolvimento nacional, impossibilitando também a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais. A PEC 10/2020 conflita também com os princípios da Economia de Francisco e Clara, que o Papa Francisco vem divulgando e convocando principalmente a juventude do mundo todo para debater, voltados para o respeito à vida das pessoas e da Natureza como um todo, e não mais aos lucros injustificáveis e predatórios.

Por essas razões, a PEC 10/2020 representa uma fraude sob o ponto de vista do combate à pandemia e da luta pelo bem-estar da população brasileira, configurando um “cheque para bancos”, com evidente dano ao erário público, que não pode fazer parte da Constituição brasileira.

II – DO DIREITO

O novo Código de Processo Civil, nos seus artigos 726 e 727, menciona a Notificação destinada à prevenção de responsabilidade, provimento de conservação e ressalva de direitos, bem como à manifestação de qualquer intenção de maneira formal:

“Art. 726. Todo aquele que desejar prevenir responsabilidade, prover a conservação e ressalva de seus direitos ou manifestar qualquer intenção de modo formal, poderá fazer por escrito o seu protesto, em petição dirigida ao juiz, e requerer que do mesmo se intime a quem de direito.”

“Art. 727. Também poderá o interessado interpelar o requerido, no caso do art. 726 , para que faça ou deixe de fazer o que o requerente entenda ser de seu direito.”

Por meio desse instrumento legal, informa-se ao Interpelado a relevância do tema sob o prisma do direito atingido, visando a produção de prova da ciência inequívoca acerca do fato, suas consequências e implicações. Por tal via, busca-se resguardar o direito, de forma a, inclusive, constituir prova, prevenir responsabilidades, prover a conservação do direito e a própria ressalva dos direitos afetados, como colaciona o magistério de Humberto Theodoro Júnior.

A Notificação extrajudicial implica em que o interpelado receba uma comunicação quanto aos fatos e ao direito que se pretende preservar e proteger, embora não se caracterize, imediatamente, como lide processual. Ela tem, assim, caráter preventivo, de modo a preservar direito e impedir que venha a ser o mesmo prejudicado, até mesmo, pela ignorância do interpelado.

E, ainda que não pressuponha a necessidade lógica da existência de uma ação principal, pode vir a subsidiá-la e sustentá-la, como evidência, mesmo, de que as questões de direito e respectivas consequências econômicas lesivas às pessoas, à economia do país e aos cofres públicos, não foram observadas.

No caso em tela acham-se presentes os pressupostos fáticos e jurídicos para que os Interpelados, em função de sua responsabilidade política e social, como representantes eleitos pelo Povo Brasileiro, sejam alertados e advertidos quanto ao risco jurídico, econômico, financeiro e social de suas deliberações relacionadas ao dispositivo contido na PEC 10/2020 que autoriza o Banco Central operar em mercado secundário (de balcão), podendo comprar derivativos sem lastro e debêntures, sem limite de valor, sem identificar os beneficiários, sem obedecer aos “Procedimentos Mínimos” recomendados pela Anbima, sem a possibilidade de investigação efetiva, sem limitar o prazo dos papéis, sem a exigência de contrapartida alguma ao país, e mais: pagando tudo isso com recursos públicos e/ou títulos da dívida pública em montante que poderá alcançar trilhões de reais, cujo peso recairá sobre o povo brasileiro!

Em termos jurídicos, a PEC nº 10/2020 – conhecida como “PEC do Orçamento de Guerra” – contém ofensas evidentes à Ordem Constitucional, como:

– o total descabimento de uma alteração da Constituição Federal durante estado de calamidade pública, tendo em vista a proibição constante do Art. 60 § 1º para situações equiparáveis (estado de sítio, de defesa, intervenção federal), nos quais a participação popular e o funcionamento do Poder Legislativo ficam prejudicados;

– a ofensa aos objetivos fundamentais da República (Art. 3o da Constituição), pois o seu custo elevadíssimo subtrairá trilhões para servir aos bancos, impedindo a destinação de recursos para o desenvolvimento nacional, impossibilitando também a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais;

– a ofensa ao art. 167, III do próprio texto constitucional;

– o grave prejuízo às contas públicas em montante que alcançará trilhões de reais, em benefício direto do setor financeiro que atua no desregulado mercado de balcão (bancos e corretoras), privilegiando a destinação de recursos públicos diretamente para os setores já mais aquinhoados e lucrativos;

– a condenação da população em geral a um sacrifício imenso, pois esta terá que arcar com o prejuízo das contas públicas resultante desse mecanismo espúrio inserido na PEC 10/2020 de várias formas: restrição de direitos, perda de patrimônio público, ausência de investimentos necessários ao desenvolvimento socioeconômico do país que seguirá condenado de forma ainda mais profunda ao aumento da desigualdade social.

Diante disso, é imprescindível que todos(as) os(as) Excelentíssimos(as) Senhores(as) Deputados(as) Federais ora Interpelados, em função de sua condição de Presidente da Câmara dos Deputados, Liderança de Partido Político com representação na Casa, Relator ou Parlamentar que irá votar a referida PEC 10/2020 em plenário tomem conhecimento dos diversos e graves problemas de ordem jurídica, constitucional, econômico-financeira e social envolvidos na referida PEC 10/2020, assim como os seus impactos danosos à sociedade brasileira, e deliberem, no âmbito de suas responsabilidades político-parlamentares, as medidas necessárias para que sejam superados os mencionados problemas, previamente à deliberação da referida proposta pelo Plenário da Câmara dos Deputados registrando-se a presente manifestação nos anais da sessão que analisar a referida PEC 10/2020 na Câmara dos Deputados.

Por tais razões de fato e de direito, é apresentada a presente NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL[ A entrega da Notificação Extrajudicial está sendo feita por meio eletrônico, tendo em vista a vigência do estado de calamidade pública e a decretação do isolamento social, que impedem a notificação pessoal.] , para que surta todos os efeitos jurídicos e legais.

Brasília – DF, 28 de abril de 2020.

Maria Lucia Fattorelli
Coordenadora Nacional da Auditoria Cidadã da Dívida

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REFERÊNCIAS

http://www.stf.jus.br/portal/cms/vernoticiadetalhe.asp?idconteudo=440384).

http://www.stf.jus.br/portal/cms/vernoticiadetalhe.asp?idconteudo=440384).

https://www.bcb.gov.br/content/estatisticas/docs_estatisticasfiscais/Notimp3.xlsx – Tabela 4 – Linha 44

https://www3.bcb.gov.br/sgspub/localizarseries/localizarSeries.do?method=prepararTelaLocalizarSeries , Série Temporal no 13621

https://auditoriacidada.org.br/conteudo/fonte-da-informacao-de-r-144-trilhao-no-caixa-do-tesouro-nacional-em-dez-2019/

https://auditoriacidada.org.br/conteudo/relatorio-especifico-de-auditoria-cidada-da-divida-no-1-2013/

Segundo especialistas do mercado financeiro, os papéis financeiros podem ser renovados no sistema em minutos. Dessa forma, papéis acumulados a 15 anos na “carteira podre” dos bancos poderiam ser facilmente renovados para uma data recente nos sistemas internos dos bancos.

https://www.moneytimes.com.br/ativos-privados-que-bc-pode-comprar-caso-pec-seja-aprovada-somam-r-9729-bilhoes/ também disponível em:

https://auditoriacidada.org.br/presidente-do-banco-central-informa-a-senadores-que-as-operacoes-autorizadas-pela-pec-10-podem-chegar-perto-de-r1-trilhao/

https://epocanegocios.globo.com/Economia/noticia/2019/11/epoca-negocios-retomada-da-economia-pode-destravar-carteira-de-r-1-tri-em-creditos-podres.html também disponível em https://auditoriacidada.org.br/grandes-jornais-revelaram-a-existencia-de-r1-tri-em-papeis-podres-nos-bancos/

Vídeo “5 erros da PEC 10” com Eduardo Moreira e outro especialista do mercado financeiro https://www.youtube.com/watch?v=thS524EqaZE

https://veja.abril.com.br/economia/governo-dos-eua-processa-agencia-de-classificacao-de-risco-por-fraude/

Anbima – Parecer de Orientação 11/2008, citado na Dissertação de Mestrado Tatiana Guazzelli, disponível em https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2132/tde-13022014112150/publico/Dissertacao_Mestrado_Tatiana_Guazzelli.pdf também disponível em https://auditoriacidada.org.br/conteudo/cedula-de-credito-bancario-aspectos-juridicos-de-sua-negociacao-e-protecao-dos-investidores/

https://www.ivixvaluecreation.com/clipping

A entrega da Notificação Extrajudicial está sendo feita por meio eletrônico, tendo em vista a vigência do estado de calamidade pública e a decretação do isolamento social, que impedem a notificação pessoal.