Dívida Pública, Previdência Social e os impactos para os trabalhadores

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Com o governo de olho nos recursos destinados à Previdência Social, o tema está na pauta de debate também das principais entidades de classe. Na última terça-feira (28), a Confederação Nacional dos Profissionais Liberais (CNPL) organizou um seminário, que faz parte do programa de formação da entidade.

CNPL

Intitulado “A questão da dívida pública, os dilemas previdenciários e seus impactos junto aos trabalhadores brasileiros”, o encontro teve a presença de dois especialistas no assunto da dívida pública e previdência social, a coordenadora nacional da Auditoria Cidadã da Dívida e auditora fiscal aposentada, Maria Lucia Fattorelli e o economista do IPEA e ex-secretário de Política Fiscal e Tributária do Ministério da Fazenda, Sérgio Wulff Gobetti.

O presidente da CNPL, Carlos Azevedo, explicou a importância da entidade sindical como protetora e fiscalizadora de abusos trabalhistas, como excesso da jornada e descumprimento de leis trabalhistas. “Essas várias formas de trabalho, análogas ao escravo, podem ocorrer até dentro de escritórios, são os escravos contemporâneos”, explicou.

Durante as apresentações, o subprocurador do Ministério Público do Trabalho (MPT), Luís Antônio Camargo de Melo relatou casos de doenças e mortes de trabalhadores durante suas funções laborais e enfatizou a necessidade de cobrarmos dos poderes públicos punições a esses setores. “Estima-se que 100 bilhões de reais são investidos todos os anos no sistema de saúde pública da previdência”, contou. Segundo o magistrado, as entidades sindicais e os trabalhadores precisam exigir e acionar o poder público para que sejam feitas intervenções no sentido de cobrar o ressarcimento dos cofres do sistema de saúde previdenciária. “O que acontece hoje é que as empresas optam por pagar a multa imposta pelos fiscais do trabalho e seguem descumprindo os acordos e explorando esses trabalhadores”, denunciou.

PREVIDÊNCIA

A coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida, Maria Lucia Fattorelli iniciou criticando o desmonte do Ministério da Previdência Social, feito pelo governo interino e as milhares de propostas que estão em vigor, com vistas a surrupiar os recursos destinados exclusivamente à sustentação da Seguridade Social, que inclui Saúde, Previdência e Assistência Social. “A Previdência Social não existe isoladamente. Quando foi criado esse conjunto de políticas sociais, também foi apontado os recursos que iriam financiá-lo”, lembrou.

Ela ressaltou que a Constituição Federal brasileira trabalhou o conceito de Seguridade Social e definiu uma série de tributos para custear seus três pilares criando o Orçamento da Seguridade Social.

Fattorelli acrescentou que quando se fala em déficit, os cálculos abrangem apenas as contribuições do INSS e comparadas às despesas da Previdência Social, omitindo-se uma série de fontes próprias que foram criadas para seu custeio.

“O que deveríamos estar discutindo é como ampliar a rede de saúde, ou como melhorar as condições dos aposentados. Mas não é essa a pauta. O que se fala agora é sobre reformas e a desvinculação das receitas da União, para usar esses recursos a critério de cada governante”, criticou.

Ela explicou como funcionam os mecanismos de transferência de renda do setor público para o privado, como swap cambial e operações compromissadas e como o sistema da dívida atua nas diversas esferas. Apontou que alguns fundos de pensão estão fazendo aplicações de risco em derivativos, colocando em risco o futuro de diversos trabalhadores.

A exploração predatória dos nossos recursos naturais, como minério de ferro e o nióbio, metal estratégico que está sendo levado do país sem que a população receba nada em troca, também foi levantada pela coordenadora.

Reforçou a necessidade de conscientização e mobilização social entorno da auditoria da dívida pública, e finalizou com uma frase de Karl Marx.

“ A emancipação dos oprimidos será obra deles mesmos”.

CRISE ECONÔMICA E FISCAL

O economista do IPEA, Sérgio Wulff Gobetti, defendeu que a crise fiscal tem raízes estruturais, com problemas antigos e que levarão o país a terminar o ano com um PIB de 7 a 8% menos que há 2 anos. “O país vive hoje uma combinação de crise estrutural das finanças públicas com uma brutal recessão econômica”, destacou.

Gobetti apontou que quando a economia entra em crise, afeta diretamente as receitas públicas tributárias, já que a indústria deixa de crescer, a população perde emprego e o consumo fica comprometido. No quadro de receitas e despesas primárias (que exclui as financeiras, como dívida pública) apresentado, mais da metade dos gastos do governo são com pagamentos de benefícios sociais, seguro desemprego, bolsa família, deixando uma margem muito pequena para investimentos em infraestrutura, que estão comprometendo o país.

“Chama a atenção do ponto de vista agregado que não há diferença na taxa real de despesa nos últimos 16 anos, mas a taxa de expansão das receitas, ao contrário, vem caindo consideravelmente, muito em função da política de desoneração tributária”, analisou.

Na avaliação do economista, o crescimento das despesas, seja com benefícios sociais, seja com investimentos públicos, foi importante para impulsionar o crescimento da economia e reduzir a pobreza, mas o uso crescente de subsídios e desonerações tributárias a partir de 2009 se mostrou ineficiente e custoso. Segundo ele, uma aposta de altíssimo custo e que não rendeu frutos.

RGPS

“O debate sobre a questão previdenciária envolve mais que o Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Com ou sem reformas, as despesas com a previdência irão crescer muito em relação ao PIB e isso tem a ver com a transição demográfica que estamos passando”.

Ele explica que o sistema previdenciário brasileiro não é apenas um sistema de poupança individual, mas um sistema de seguridade em que os benefícios não correspondem às contribuições. Alguns pagaram mais do que ganham e outros ganham mais do que pagaram.

“É preciso pensar numa solução pactuada e equilibrada e não apenas políticas que compromete os mais pobres. Essas, têm efeitos econômicos deletérios”, frisou.