Em debate com economistas, Fattorelli sustenta necessidade de uma nova arquitetura financeira

Compartilhe:

“Quem pensa o Brasil hoje?” O questionamento foi feito pela coordenadora nacional da Auditoria Cidadã da Dívida, a auditora Maria Lucia Fattorelli durante o debate promovido pelo Conselho Federal de Economia (Cofecon), Conselho Regional de Economia do Distrito Federal (Corecon – DF) e pelo Sindicato dos Economistas do Distrito Federal nesta sexta-feira (8/04).

Com o tema “Crise Fiscal, Gastos com juros da Dívida Pública e Auditoria da Dívida”, o evento contou com a presença principalmente de economistas e estudantes, com a proposta de pensarem e discutirem saídas para os problemas enfrentados pelo Brasil hoje.

Para Fattorelli, todas as recomendações para a política monetária nacional partem do Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial. “Essas instituições possuem uma cartilha, com pontos e sugestões de políticas e ações que devem ser cumpridas pelos países como independência do Banco Central e retirada de exigências trabalhistas e legais em caso de fusão”, ressaltou.

Após mostrar a disparidade entre o Brasil de abundâncias (naturais, culturais e humanas) e a realidade de escassez, ela lembrou que a crise é seletiva, prejudicando os mais pobres enquanto o sistema financeiro contabiliza lucros recordes ano após ano. “Diante da crise que passamos no país, se escuta falar em corte de investimentos, ajuste fiscal, mas não se fala em taxar grandes fortunas ou averiguar onde está o ralo que escoa os recursos do Estado”, lembrou.

Maria Lucia explicou ainda os mecanismos utilizados pelo Sistema da Dívida, que retiram recursos do orçamento, que deveriam ser aplicados em benefício da população, direto para o setor financeiro. “Em 2015, a dívida cresceu R$ 732 bilhões e para onde foi esse dinheiro? No sistema da dívida, a corrupção é institucionalizada e não há contrapartida”, denunciou.

Operações compromissadas e Swaps

Para Maria Lucia Fattorelli duas práticas bastante comuns usadas pelo Banco Central são pontos chaves para a crise atual: as operações compromissadas e os swaps cambiais.

As operações compromissadas realizadas pelo Banco Central foram responsáveis por retirarem do mercado produtivo cerca de R$ 1 trilhão de reais, isso para manter a base monetária em 5% do PIB. Para se ter uma ideia, a base monetária do Japão é de quase 30% .

“Ao enxugar esse dinheiro do mercado, o Banco Central trava ainda mais a economia do país. É um escândalo pensar que 1/5 do PIB está esterilizado no BC. Esse dinheiro poderia estar sendo usado para investimentos, empréstimo aos cidadãos, empresas e geração de emprego”, aponta.

Os Swaps cambiais, que são a troca de riscos entre as partes, tiveram resultados negativos de R$ 207 bilhões entre setembro de 2014 a setembro de 2015. Esse rombo se soma a já estrondosa dívida pública.

Dívida dos Estados

A tramitação do PLP 257/16, que trata das dívidas públicas dos estados, também foi levantada por Fattorelli. Ela denuncia que o projeto encobre duas irregularidades graves. A transformação da União em uma seguradora internacional para investimentos de empresas nacionais ou multinacionais no exterior e a garantia de remuneração de sobra de caixa dos bancos. “As pessoas estão morrendo pela omissão do Estado na prestação de serviços essenciais e eles estão discutindo remunerar bancos?”, criticou.

Ela convocou a todos para se mobilizarem contra o projeto que ainda retira direitos dos trabalhadores públicos e obriga os estados a passarem ppr reformas em suas estruturas administrativas.

Debate

Após a explanação da coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida, Maria Lucia Fattorelli, os economistas e também professores convidados para o debate José Luis Pagnussat e Roberto Piscitelli enriqueceram a discussão com novos dados sobre o tema da dívida e dos juros.

Pagnussat ressaltou que a taxa de juros dos setores públicos de outros países está bem abaixo das praticadas no Brasil, que é de 8,5% do PIB em 2015, enquanto países desenvolvidos praticam menos de 2%. Para ele, as despesas com juros no Brasil são altíssimas e essa política não é efetiva no combate a inflação.

Ele defendeu também a Desvinculação das Receitas da União (DRU), que segundo ele, seriam importantes para despesas em que não há imposto previsto. “Que nós possamos ser o país do planejamento e da construção do futuro”, disse.

O professor Roberto Piscitelli criticou a falta de transparência dos órgãos governamentais responsáveis pela divulgação das contas públicas. “Não é fácil encontrar informações úteis. O balanço geral da União, por exemplo, tem cerca de 600 páginas”, lembrou.

Piscitelli destacou que na comparação entre volume da dívida e custo da dívida, o Brasil, que chega a 9%, se distancia bastante de outros países emergentes, como a África do Sul, cerca de 3% do PIB, Índia com 4% .

“O que se gasta hoje com saúde, educação, segurança pública e assistência social é aproximadamente 2/3 do que é gasto com juros da dívida. Para esse ano, fazemos uma estimativa de que serão gastos quase R$ 1 trilhão de reais com o serviço da dívida”, informou.

Ele criticou a forma de cobrança de impostos, que recai de forma injusta sobre o trabalho e consumo e ressaltou a importância de se revelar quanto transferimos e para quem vai esse dinheiro. “Educação e informação são a chave para a mudança”.

Ao final do debate, Maria Lucia frisou a importância de se rever o modelo econômico atual, que acentua injustiças e dissemina desigualdade. “É preciso pensar uma nova arquitetura financeira, um modelo que esteja a serviço da economia real”, analisou.