Lula quer fundos com menos imposto e IR para grande poupador

Compartilhe:

O Jornal Folha de São Paulo traz notícia preocupante: o Imposto de Renda (IR) sobre os ganhos com a dívida pública pode cair, para atrair os investidores a emprestar ao governo. Esta medida seria necessária para garantir o próprio pagamento da dívida, ou seja, garantir que o governo continue tomando empréstimos para pagar as amortizações e os juros que estão vencendo.

Importante ressaltar que, em 2006, já foi concedida isenção de IR para os estrangeiros que ganham com a dívida interna. Agora o governo estuda a redução do imposto para os brasileiros, aprofundando ainda mais uma estrutura tributária injusta, na qual os mais ricos pouco pagam, enquanto os trabalhadores e consumidores financiam o Estado. A queda na arrecadação de IR também afetará os estados e municípios, que têm direito à metade da arrecadação deste imposto, e atravessam grave crise financeira.

Atualmente, o imposto de renda incidente sobre os ganhos dos brasileiros com a dívida interna (por meio dos “Fundos de Investimento de Renda Fixa”) varia de 15% a 22,5%, dependendo do prazo no qual os recursos permaneceram aplicados. Enquanto isso, os trabalhadores assalariados pagam até 27,5% de Imposto de Renda, o que é uma grande injustiça.

Por exemplo: um milionário que ganhar um milhão de reais durante o ano com a dívida pública pagará uma alíquota de 22,5%, enquanto um trabalhador assalariado que ganhar mais de R$ 3.582 por mês já paga uma alíquota de 27,5%.

O Jornal O Globo mostra que o Banco Central coloca como condição para a queda dos juros a alteração no rendimento da poupança. Ou seja: mais uma vez fica claro que a taxa de juros no país é alta para se garantir que os investidores continuem financiando a dívida, pois do contrário, estes migrariam para a poupança.

O Globo também noticia que o Brasil emitiu US$ 750 milhões em novos títulos da dívida externa, com juros 2,52% acima dos juros cobrados pelo governo dos EUA. Neste ponto, cabe ressaltar que este adicional de juros é ilegítimo, pois representa uma remuneração extra exigida pelos investidores, segundo estes, para compensar o risco do país não pagar sua dívida. Porém, sempre pagamos a dívida religiosamente, razão pela qual, portanto, este adicional não se justifica. Portanto, faz-se necessária uma auditoria sobre a dívida externa brasileira, para que, dentre muitas outras coisas, possamos quantificar qual foi a influência deste mecanismo em nosso endividamento, e na sangria dos recursos nacionais.

Importante ressaltar que os altos juros pagos pelos títulos emitidos ontem atraíram grande quantidade de investidores que, por isso, aceitaram pagar um ágio para adquiri-los. Isto porque os altos juros que serão pagos pelo Brasil mais que compensarão os investidores deste custo adicional.

A Folha de São Paulo noticia a aprovação, no Congresso, de novo parcelamento de dívidas de grandes devedores de tributos ao governo, com grandes reduções de juros e multas. A taxa de juros será a TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo), atualmente de 6,25% ao ano, ou seja, 4% abaixo da Selic. Neste tema, cabe ressaltar uma grande contradição: ao mesmo tempo em que o governo concede grandes reduções de multas e juros para os grandes empresários, sequer coloca em discussão a revisão das condições de pagamento da dívida da União com o setor financeiro, sobre a qual incide a Selic.

Além do mais, foi incluído nesta medida um dispositivo gravíssimo, que garante a impunidade para agentes públicos que, sob a justificativa da crise, ocasionem prejuízo aos cofres públicos para salvar os investidores. Este é também o tema de notícia do Estado de São Paulo, que mostra que a medida beneficia ministros, presidentes do Banco Central e demais funcionários públicos que estão sendo processados por crimes contra o sistema financeiro.

O Estado de São Paulo também noticia o impasse no encontro de ontem entre os presidentes do Brasil e Paraguai, sobre a dívida da construção da Usina de Itaipu. O Paraguai reivindica a revisão do endividamento, devido à ilegitimidade desta dívida, conforme comentado em edições anteriores desta seção, e em artigo do Boletim da Auditoria Cidadã nº 19. Porém, o Brasil somente propõe uma prorrogação no prazo de pagamento, e uma pequena elevação no preço pago pelo uso da energia paraguaia. O Paraguai tem de destinar estes pagamentos para quitar a dívida com o Brasil.

Por fim, o Estado de São Paulo também noticia a reunião em Buenos Aires entre ministros da Fazenda de vários países da América do Sul, para discutir a criação do Banco do Sul. Este banco poderia ser uma alternativa às atuais instituições financeiras multilaterais, como o FMI e o Banco Mundial, cujo receituário se mostrou falido (cortes de gastos sociais, privatizações, etc).

Lula quer fundos com menos imposto e IR para grande poupador
Poupança com saldo maior pagará IR
Autor(es): KENNEDY ALENCAR
Folha de S. Paulo – 08/05/2009

Para evitar custo político, Lula quer excluir mais de 95% dos poupadores da mudança da regra causada pela queda nos juros

Para estimular investidor a permanecer nos fundos de investimento, governo prepara medidas para desonerar o setor

Com receio de desgaste político, o presidente Lula decidiu que a alteração que fará a poupança render menos não deve atingir a maioria dos aplicadores, relata Kennedy Alencar. A ideia é cobrar Imposto de Renda, mas sem atingir, segundo um ministro, “mais de 95%” dos aplicadores.
Ainda não há piso de tributação. Lula pediu à equipe econômica uma proposta para cortar tributos sobre os fundos de investimento, de forma a desestimular a ida de grandes aplicadores para a caderneta. Segundo o BC, menos de 4% dos poupadores têm mais de R$ 20.000.
Com receio do desgaste político, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu anteontem em reunião com a equipe econômica que a maioria dos aplicadores não será atingida pelas mudanças de regras de remuneração que irão fazer a caderneta de poupança render menos.
Segundo a Folha apurou, o governo vai cobrar IR (Imposto de Renda) sobre os rendimentos a partir de um patamar alto de aplicação – o que deixaria, nas palavras de um ministro, “mais de 95%” dos aplicadores com as atuais regras de ganho. Lula pediu que a equipe econômica elaborasse uma proposta para desonerar os atuais fundos de investimento, medida que deverá ser finalizada até a semana que vem.
Dessa forma, Lula estimularia grandes aplicadores a optarem pelos fundos, que recuperariam atrativos apesar da queda da taxa básica de juros, a Selic, que reduz os ganhos dessas aplicações.
Um auxiliar direto de Lula disse à Folha que o temor de dar uma bandeira à oposição na reta final do governo e nas eleições de 2010 levou o presidente a optar por não alterar as regras da poupança para os pequenos e médios aplicadores, a imensa maioria na poupança.
PSDB, DEM e PPS, partidos de oposição, têm criticado a possibilidade de mudança na poupança desde que o governo anunciou que cogitava tal medida após a queda dos juros. Com a redução de 3,5 pontos da Selic desde setembro, os fundos de investimento, que aplicam recursos nos títulos do Tesouro e financiam a dívida pública, perderiam atratividade na comparação com a poupança, que não paga IR e tem remuneração garantida de 6% ao ano mais a variação da TR (Taxa Referencial).
Números do Banco Central mostram que, em dezembro, 80,580 milhões de clientes (89,55% do total) tinham contas com saldo até R$ 5.000,00. Outros 6,578 milhões de contas (7,3% do total) eram de clientes com saldo de R$ 5.000,01 a R$ 20 mil. Menos de 4% dos poupadores possuíam contas acima de R$ 20.000.
Lula fez reuniões com a equipe econômica sob forte contrariedade. Alegava que Fazenda e BC foram imprevidentes ao não alterar com antecedência regras da caderneta e que tomar uma medida impopular na véspera de ano eleitoral seria suicídio político. A decisão de Lula de não mudar as regras para a grande maioria busca minimizar o desgaste político.
As alternativas, avaliou, dariam munição à oposição para falar que o governo “tungou” os pequenos poupadores. O PPS chegou a fazer propaganda na TV comparando a mudança de regras na poupança com o traumático bloqueio de contas do governo Collor, em 1990.
A não alteração das regras para a grande maioria dos aplicadores deverá ser anunciada em breve. Também pesou na decisão de Lula a avaliação de que o espaço para a queda dos juros não será tão grande e permitiria a manutenção do atual formato até o início do próximo governo. A Selic está em 10,25% ao ano, e o mercado prevê 9,25% até dezembro.
Além de tributar parte dos poupadores, Lula recebeu outras propostas da área econômica, que preferia simplesmente acabar com os juros fixos de 6% ao ano. Uma das ideias era vincular o ganho da poupança a um percentual da Selic. Também se cogitaram rendimentos diferenciados de acordo com o saldo ou mudança no cálculo da TR.
Na fórmula decidida por Lula, os grandes aplicadores da caderneta de poupança terão de pagar IR sobre os rendimentos ao fazer a declaração anual. Diante dessa possibilidade, o governo avalia que esses poupadores preferirão aplicar seus recursos nos fundos de investimento. A intenção de desonerar esses fundos seria uma forma de torná-los mais atraentes.
Os fundos de renda fixa são tributados com IR e IOF (Imposto sobre Operação Financeira). O IOF tem uma tabela regressiva. A partir de 30 dias de aplicação, há isenção desse imposto. Já o IR na renda fixa tem uma regressão mais longa.
Até 180 dias, os ganhos nos fundos de renda fixa são taxados em 22,5% de IR. Entre 181 dias e 360, essa cobrança cai para 20%. No intervalo de 361 a 720 dias, há nova queda (17,5%). E acima de 720 dias de aplicação são cobrados 15% de IR. A tributação é feita em maio, outubro ou na data do resgate.
Nos fundos de renda variável, não há cobrança de IOF, mas são pagos 15% de IR no resgate da aplicação.

BC: juros cairão mais após nova poupança
No meio do caminho, a poupança
Autor(es): Eduardo Rodrigues
O Globo – 08/05/2009

BC indica que não poderá reduzir mais os juros se regra de remuneração da caderneta não mudar
O Banco Central deu sinais de que novos cortes mais significativos de juros vão depender do anúncio de mudança de regras na caderneta de poupança. O alerta, de maneira velada, veio no texto da ata da última reunião do Copom, divulgada ontem. Na véspera, o presidente do BC, Henrique Meirelles, já citara que os fundos de investimento vinham perdendo recursos para a poupança, mais atrativa com a queda da Taxa Selic. A caderneta rende TR mais 0,5% e é isenta de impostos. Apesar disso, em abril, houve resgates de R$ 526,285 milhões.
A ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) — que na semana passada cortou em um ponto percentual a Taxa Selic, para 10,25% ao ano — indica que o Banco Central (BC) continuará a reduzir os juros, ao menos no próximo encontro, em junho. Para o colegiado, apesar dos sinais de recuperação das economias brasileira e global, o ritmo da atividade ainda é fraco, aqui e lá fora. Consequentemente, não há pressões inflacionárias.
Porém, o BC advertiu no documento, de forma velada, que resolver a questão da remuneração da poupança é elemento-chave para a continuidade da queda dos juros.
O texto, divulgado ontem pela autoridade monetária, reforça que “a continuidade do processo de flexibilização monetária torna premente a atualização de aspectos, resultantes do longo período de inflação elevada, que subsistem no arcabouço institucional do sistema financeiro nacional”. A frase é bastante similar ao alerta que o presidente do BC, Henrique Meirelles, fizera na véspera em videoconferência com empresários gaúchos: — Evidentemente que tudo tem custo e já começamos a ver alguns dos problemas causados por isso, (…) fundos de pensão que têm rentabilidades mínimas que estão revisando isso, a caderneta de poupança que tem questões fiscais e de rentabilidade… Então é interessante, na medida em que os juros começam a cair começam a se enfrentar os problemas de uma sociedade toda estruturada para operar com juros muito mais altos.
Copom vê inflação abaixo da meta
Com os cortes consecutivos na taxa básica de juros, a caderneta tem se tornado mais rentável do que as aplicações em fundos de investimento com taxa de administração acima de 1% ao ano — o que inclui a maior parte das aplicações oferecidas no varejo —, preocupando a equipe econômica, que, por isso, estuda mudanças no cálculo da remuneração da poupança.
O enfraquecimento dos fundos atrapalha, por exemplo, a administração da dívida pública, já que eles são grandes compradores de títulos federais.
— O Copom usou o termo “premente” para explicitar o interesse, a necessidade e a urgência de uma solução para a poupança que viabilize os novos cortes. É claro que o Comitê não ficará limitado por isso, mas ele sempre evita tomar decisões que causem distorções na economia — analisou o estrategista-sênior do banco WestLB, Roberto Padovani, que aposta em nova queda de um ponto na próxima reunião.
Já foram estudadas pelo governo diversas fórmulas de rendimento.
Uma das mais fortes é remunerar a poupança com parte da taxa básica de juros, a Selic (por exemplo, 65% da taxa). Outra é zerar a TR, e uma terceira é criar uma escala para a remuneração dos poupadores, de acordo com o valor do depósito, recebendo mais quem tem menos depositado. Ainda poderia ser instituída a cobrança de IR sobre depósitos acima de R$ 500 mil.
Na avaliação macroeconômica, que já leva em consideração a redução da meta de superávit primário (a economia do governo para pagar os juros da dívida) de 3,8% para 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país), a ata considera que houve leve redução, “ainda incipiente e sujeita a reversão”, da aversão ao risco de investidores, com retorno do movimento nas bolsas, elevando preços de ações e commodities. Além disso, o aumento do fluxo de capitais tem causado um aumento da cotação das moedas emergentes — o real entre elas — em relação ao dólar.
O Copom, no entanto, ressalta que a evolução dos preços em diversas economias aponta para uma significativa redução das pressões inflacionárias. “Dessa forma, o efeito líquido da desaceleração global sobre a trajetória da inflação doméstica segue sendo, até o momento, predominantemente benigno”.
Segundo o economista-chefe da Corretora Concórdia, Elson Teles, o BC deixou claro que continuará a afrouxar a política monetária: — O cenário é tranquilo, com todas as projeções de inflação ao fim do ano apontando para patamares abaixo da meta (de 4,5% pelo IPCA). Há espaço para novas reduções nos juros, mas como a distensão monetária já é longa, deve haver sim uma desaceleração nos próximos cortes.
Em meio ao debate sobre a mudança na remuneração da poupança, a captação da caderneta ficou negativa em R$ 526,285 milhões em abril, segundo o Banco Central (BC). O resultado é bastante inferior às perdas registradas até o dia 29 (R$ 1,878 bilhão), devido a um aporte de R$ 1,351 bilhão no último dia do mês. Segundo o diretor de Economia da Associação dos Executivos de Finanças (Anefac), Andrew Frank Storfer, apesar do clima de incerteza em relação às alterações nas regras do rendimento, o movimento dos poupadores no mês foi causado por outros fatores, como o pagamento de dívidas e tributos anuais.
Os principais partidos de oposição divulgaram ontem uma nota conjunta condenando a intenção de alterar o rendimento da poupança. Assinada pelos presidentes de PSDB, DEM e PPS, a nota afirma que a atual estrutura de remuneração — Taxa Referencial (TR) mais 6,17% de juros ao ano, com isenção do Imposto de Renda — deve ser mantida para todos os depositantes.

Brasil capta US$ 750 milhões com lançamento de título em Europa e EUA
Autor(es): Martha Beck
O Globo – 08/05/2009

Melhora externa faz cair taxa da emissão, que teve demanda de US$ 4 bi

O Tesouro Nacional voltou ontem a atuar no mercado internacional e fez uma captação de US$ 750 milhões.
Segundo técnicos do governo, a turbulência provocada pela crise financeira mundial diminuiu, permitindo a emissão do título Global 2019 nos mercados americano e europeu. Essa foi a segunda operação do ano. Segundo o Tesouro, houve forte demanda pelos papéis brasileiros — teria chegado a US$ 4 bilhões —, e isso permitiu que o governo captasse os recursos pagando taxas mais baixas. A emissão ainda poderá ser estendida ao mercado asiático, em mais US$ 37,5 milhões.
A taxa de retorno para os investidores foi fixada em 5,8% ao ano. Na primeira emissão do Global 2019, ocorrida em janeiro deste ano, a taxa havia sido de 6,127% ao ano. Além disso, o papel foi emitido com spread de 252 pontos-base acima dos títulos do Tesouro americano com vencimento em 2019. Em janeiro, o spread foi de 370 pontos, e a captação somou US$ 1,025 bilhão.
— O mercado de capitais está voltando à normalidade. Os investidores estão dispostos a comprar novamente os títulos brasileiros — disse um técnico.
— A redução da taxa de retorno para o investidor mostra que houve demanda forte.
O governo brasileiro tinha a intenção de emitir US$ 500 milhões, mas o valor subiu em função da procura pelos papéis.
A operação foi liderada pelos bancos Barclays Capital e Citigroup Global Markets. O Global 2019 foi ofertado ao mercado por 100,539% de seu valor de face e tem um cupom de juros de 5,875% ao ano. A liquidação financeira ocorrerá em 14 de maio, e os cupons serão pagos nos dias 15 de janeiro e 15 de julho de cada ano, até o vencimento, em 15 de janeiro de 2019.

Captações costumam ser feitas para honrar dívida externa, mas o Brasil já tem os recursos que precisa. Inclusive os R$ 14,2 bilhões para compor o Fundo Soberano, criado no fim de 2008, foram captados no mercado doméstico.
A ideia agora é melhorar a curva de juros e alongar a dívida brasileira.

Congresso aprova novo parcelamento de dívidas
Folha de S. Paulo – 08/05/2009

Dívidas com a Receita Federal, vencidas até novembro de 2008, poderão ser pagas em até 180 meses
Tamanho dos benefícios ainda vai depender do presidente Lula, que pode vetar juros pela TJLP e restabelecer o uso da Selic
A Câmara aprovou novo programa de parcelamento de dívidas de empresas e pessoas físicas com a Receita. Dívidas vencidas até novembro de 2008 poderão ser pagas em até 180 meses. Governo e oposição concordaram em retirar parte das alterações feitas pelo Senado.
A lei segue agora para a sanção do presidente Lula. Empresários e parlamentares tentarão convencê-lo a não vetar o parágrafo do texto que prevê a correção das dívidas pela TJLP, fixada em 6,25% ao ano -menos que a taxa básica do Banco Central, hoje em 10,25%. (págs. 1 e B4)
O Palácio do Planalto conseguiu reduzir a generosidade do novo programa de parcelamento geral de dívidas de empresas e pessoas físicas com a Receita Federal, aprovado ontem em definitivo pela Câmara dos Deputados.
No entanto, a extensão dos benefícios ainda depende do lobby parlamentar e empresarial que tentará convencer o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a não vetar o parágrafo do texto que prevê a correção das dívidas por taxas inferiores aos juros do Banco Central.
O programa se tornará lei a partir da esperada sanção presidencial, que, pela legislação, acontecerá em até 15 dias úteis. Depois disso, o Ministério da Fazenda tem 60 dias para detalhar os procedimentos a serem seguidos pelos contribuintes.
Em votação simbólica, sem contagem nominal, os partidos aliados e oposicionistas concordaram em retirar parte das alterações feitas pelo Senado que acrescentavam benesses ao projeto. No caso mais importante para o governo, foi restabelecida a regra derrubada pelos senadores que fixava, para os participantes de algum dos três programas anteriores de parcelamento criados desde 2000, uma prestação mínima equivalente a 85% da atual ou, no caso dos inadimplentes, da mais recente.
“Sem esse piso, não estamos certos de que não haveria perda de arrecadação”, afirmou o relator, deputado Tadeu Filippel li (PMDB-DF). Em cálculos não detalhados que circularam entre parlamentares governistas, o prejuízo para o erário variaria de R$ 2 bilhões a R$ 6 bilhões anuais – a crise econômica já levou o governo a reduzir a previsão de arrecadação deste ano de R$ 805 bilhões para R$ 757 bilhões.
Não estava em discussão o desenho básico do novo programa, proposto e aprovado pelos deputados e ratificado pelos senadores: qualquer dívida com o fisco vencida até novembro do ano passado poderá ser paga em até 180 meses, com abatimento de multas e juros de mora e correção pela TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo, adotada nos financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).

Contra, mas…
Embora a Receita tenha trabalhado contra o novo parcelamento, o governo Lula preferiu não sofrer o desgaste político de se opor à proposta, apresentada desde o ano passado pelo aliado PMDB, maior partido do Congresso. Há o compromisso de sancionar a maior parte do texto, mas os governistas afirmam que deverá ser vetada a correção pela TJLP.
Fixada atualmente em 6,25% ao ano, a taxa representa um subsídio se comparada aos 10,25% da Selic, taxa do BC que serve de referência para os juros de mercado e é aplicada nos parcelamentos ordinários de até 60 meses oferecidos pelo fisco. Na argumentação governista, a correção pela TJLP torna vantajoso suspender o pagamento de impostos e aplicar o dinheiro nos fundos de renda fixa oferecidos pelos bancos.
Uma conta grosseira dá ideia da diferença prática entre as taxas: na hipótese de uma prestação inicial de R$ 100 -o valor mínimo estabelecido para as empresas no novo programa- e um parcelamento de 180 meses, a prestação final chegará a R$ 428,69, se considerada uma Selic constante durante todo o período; com a TJLP de hoje, o valor seria de R$ 247,02.
Ao todo, a Receita estimou uma renúncia fiscal de R$ 30 bilhões ao ano com o novo programa, mas nem os governistas levaram o cálculo a sério: o valor, aponta-se, é apurado a partir da comparação entre as vantagens oferecidas e um cenário teórico em que todos os contribuintes estivessem pagando seus tributos em dia pelas regras normais.
Na prática, como a inadimplência cresceu com a recessão, o parcelamento deverá produzir um aumento momentâneo da receita.

Penduricalhos
O programa foi incluído pelos parlamentares no texto de uma medida provisória editada em 2008 (nº 449), cujo objetivo inicial era perdoar ou parcelar apenas dívidas com o erário até R$ 10 mil. No Senado, a MP ganhou outros penduricalhos que foram mantidos ontem.
Foi o caso de um artigo que livra funcionários e autoridades do governo de responderem individualmente em processos que questionem medidas extraordinárias tomadas em tempos de crise. A regra agradou tanto aos governistas como aos principais partidos de oposição. Só o PSOL protestou. “É a impunidade para agentes públicos que, sob a justificativa de crise, ocasionam prejuízos aos cofres públicos para salvar os interesses de investidores”, disse Ivan Valente (SP).
Aprovou-se ainda a prorrogação até 2014 da isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados na aquisição de automóveis por taxistas e por portadores de deficiência.

Congresso dá a governo poder ilimitado para blindar bancos
Socorro financeiro ganha carta-branca
Autor(es): Felipe Recondo e Denise Madueño
O Estado de S. Paulo – 08/05/2009

Acordo entre PT e PSDB dá poderes ao governo para defender bancos

Acordo costurado por líderes do PT e do PSDB permitiu ontem a aprovação de emenda à Medida Provisória 449 que proporciona verdadeira blindagem a ministros, presidentes do Banco Central e demais funcionários públicos que estão sendo processados por crimes contra o sistema financeiro. Segundo críticos da emenda, acaba de ser criado um ‘vale-tudo jurídico”, capaz de livrar banqueiros como Salvatore Cacciola, ex-dono do banco Marka, preso no Brasil e condenado por crimes financeiros.
Um acordo costurado por líderes do PT e do PSDB permitiu a aprovação de uma emenda à Medida Provisória (MP) 449 que concede uma verdadeira anistia aos ministros de Estado, presidentes do Banco Central (BC) e demais funcionários públicos que estão sendo processados por tomar decisões em defesa da solvência dos bancos que o Ministério Público considerou crimes contra o sistema financeiro.
As equipes econômicas dos governos dos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) sempre se queixaram do “oportunismo” dos processos e do fato de eles criarem insegurança nos agentes públicos que tomam essas decisões, mas os críticos da emenda aprovada ontem avaliam que a redação final do texto criou um vale-tudo jurídico, funcionando, na prática, como uma carta branca para o governo defender os bancos e justificar toda e qualquer medida adotada.
A emenda diz que os “agentes públicos” não sofrerão nenhum tipo de punição desde que as “medidas excepcionais” tenham sido tomadas e executadas “com o propósito de assegurar liquidez e solvência ao Sistema Financeiro Nacional, de regular o funcionamento dos mercados de câmbio e de capitais e de resguardar os interesses de depositantes e investidores”.

EMENDA CACCIOLA

Apesar de dirigir o benefício aos “agentes públicos”, se a emenda 19 não for vetada pelo presidente Lula ela também pode beneficiar banqueiros envolvidos em escândalos financeiros. No meio jurídico e entre parlamentares o texto já foi batizado de “Emenda Cacciola”. Ela pode ser usada na defesa de Salvatore Cacciola, ex-dono do banco Marka, condenado por crime contra o sistema financeiro e atualmente preso no Brasil.
A proposta de inclusão de uma emenda na MP 449, que trata da renegociação de dívidas tributárias com a União (leia mais nesta página), foi do deputado Sebastião Madeira (PSDB-MA). A emenda não foi acolhida na primeira votação da medida provisória, na Câmara dos Deputados, mas foi apoiada e aprovada por petistas e tucanos na votação do Senado – o Ministério da Fazenda apoiou a emenda.
Ontem, na segunda votação pelos deputados, só o PSOL se pronunciou contra a emenda 19, contrabandeada para dentro da medida provisória. Na votação simbólica, o líder do PSOL, deputado Ivan Valente (SP), disse que “em nome da adoção de medidas anticrise vão acabar com a fiscalização e a responsabilização do agente público”. O deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) defendeu explicitamente a aprovação da emenda 19 na MP que será encaminhada à sanção presidencial.

POR TABELA

A emenda serve, de acordo com advogados ouvidos pelo Estado, perfeitamente ao caso Cacciola. O ex-dono do Banco Marka se beneficiou de informações privilegiadas passadas pelo ex-presidente do Banco Central Chico Lopes às vésperas da desvalorização do real, em 1999.
Para evitar a quebra do banco e uma suposta crise sistêmica, Cacciola conseguiu do Banco Central uma ajuda superior a R$ 1 bilhão. Por causa disso, o ex-presidente do BC foi acusado e condenado pela Justiça.
Com a aprovação da emenda pelo Congresso e a promulgação pelo presidente da República, Chico Lopes poderia pedir para ser enquadrado na nova regra. Argumentaria que beneficiou o Marka para garantir a solvência do sistema financeiro, como prevê a emenda.
Se tiver sucesso, Cacciola será por tabela beneficiado – se o agente que praticou o ato ilegal não pode ser condenado, quem se beneficiou dele também não. Cacciola, portanto, poderia pedir à Justiça o mesmo benefício, o que só dependeria da apreciação do juiz.

Na justificativa para sua proposta, o deputado Sebastião Madeira afirmou que a medida “tem por objetivo preservar a liberdade de atuação dos agentes públicos responsáveis pela execução de medidas excepcionais com vistas a assegurar a liquidez e solvência” do sistema financeiro.
“Isso porque não podem tais agentes, no exercício de suas relevantes funções em tempos de crise econômica e financeira, ficar tolhidos pelo constante risco de responder por eventual malogro das medidas por eles tomadas no cumprimento de seu dever legal de zelar pela estabilidade do sistema financeiro”, afirma o deputado na proposta. Não poderiam ser beneficiados os agentes que agissem comprovadamente de má-fé.

ÍNTEGRAS

O que diz a ?Emenda Cacciola?
Emenda 19 (inclua-se no projeto onde couber): “”Art…
A hipótese de exclusão de ilicitude prevista no inciso III do art. 23 do decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, aplica-se aos agentes públicos incumbidos da execução de medidas excepcionais com o propósito de assegurar liquidez e solvência ao Sistema Financeiro Nacional, de regular o funcionamento dos mercados de câmbio e de capitais e de resguardar os interesses de depositantes e investidores.” Parágrafo único – No cumprimento das medidas excepcionais referidas no caput deste artigo, os agentes públicos não responderão civilmente ou com base na Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, salvo nos casos de dolo ou comprovada má-fé.”

O que diz a Lei de 1940
“Artigo 23 – Não há crimes quando o agente público pratica o fato: (redação dada pela Lei nº 7.209, de 11/07/1984):
I – em estado de necessidade;
II- em legítima defesa;
III – em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito
Parágrafo único – O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.”

Impasse entre Brasil e Paraguai continua
Autor(es): Lisandra ParaguassuChristiane Samarco, Gerusa Marques e Denise Chrispim
O Estado de S. Paulo – 08/05/2009

Lula e Lugo vão continuar tentando um acordo sobre a Usina de Itaipu

Nove meses de negociações e duas horas de conversa formal, ontem, entre os presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e do Paraguai, Fernando Lugo, não foram suficientes para que os dois países chegassem a um acordo sobre o preço da energia da usina hidrelétrica binacional de Itaipu. Lugo tomou posse em agosto do ano passado e fez da revisão do Tratado de Itaipu (1973) – impondo um aumento no preço da energia paga pelo Brasil – um ponto de honra política no cumprimento de uma promessa eleitoral. O governo Lula resiste a mexer no tratado para não abrir precedentes.
A assessoria do Itamaraty informou ontem à noite que os dois presidentes continuariam a negociar no jantar marcado para o Palácio do Alvorada. Por causa disso, admitindo a possibilidade de os dois países chegarem a um acordo, é que foi definido que não haveria nenhum tipo de declaração oficial nem assinatura de atos depois das reuniões no Itamaraty. O governo disse que qualquer declaração só seria dada hoje, na Base Aérea de Brasília, quando Lula e Lugo embarcam para uma viagem rumo ao Pantanal mato-grossense.

DESCRENÇA
Ao final de três dias de reuniões prévias para fechar uma cesta de propostas a oferecer a Lugo, foi em clima de descrença que o presidente Lula se reuniu no início da noite de ontem com o colega paraguaio. Antes mesmo de o encontro começar, a avaliação geral de ministros e técnicos do setor energético era a de que a reunião não produziria resultado algum.
Em conversas reservadas, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, queixou-se da “enorme agressividade” dos negociadores do país vizinho e previu que “dificilmente” o encontro produziria resultados concretos.
Outro interlocutor presidencial observou que a disposição do Palácio do Planalto em ajudar o presidente do Paraguai a superar a crise política que ameaça seu mandato acabou se convertendo em “irritação”.
Segundo este colaborador de Lula, o entendimento da equipe brasileira pode ser resumido em uma frase: “É preciso chamar o feito à ordem para poder prosseguir o entendimento”.
Isso ficou claro na conversa de Lula na véspera com quatro ministros – além de Lobão, Celso Amorim (Relações Exteriores), Dilma Rousseff (Casa Civil) e Guido Mantega (Fazenda), e também o assessor da Presidência para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia.
Participaram ainda desse encontro no qual foi marcada a posição do Brasil os presidentes da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Nelson Hubner, da Empresa de Pesquisa Energética, Maurício Tomasquim, e de Itaipu Binacional, Jorge Samek. As autoridades brasileiras não se conformam com a “agressividade excessiva” de aliados de Lugo, que responsabilizam o Brasil pelas dificuldades financeiras do País.
Em visita ao Congresso ontem cedo, Fernando Lugo, esquivou-se de abordar diretamente a questão de Itaipu nas declarações públicas que fez ao lado dos presidentes da Câmara dos Deputados, Michel Temer (PMDB-SP), e do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Com Temer a seu lado, Lugo destacou que o Brasil é um grande sócio para o desenvolvimento econômico do Paraguai e fez um chamado ao diálogo.
“Também temos dificuldades e situações que podemos superar juntos. Sou daquelas pessoas convencidas de que o diálogo é a melhor arma para solucionar as grandes e pequenas dificuldades”, afirmou.
Ao lado de José Sarney, Lugo insistiu que a nenhum país da América Latina é confortável ter um “vizinho pobre”.

Mantega discute na Argentina criação do Banco do Sul
Autor(es): Marina Guimarães
O Estado de S. Paulo – 08/05/2009

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, desembarcou ontem em Buenos Aires e se reuniu com o ministro de Economia da Argentina, Carlos Fernández, na Embaixada do Brasil. O encontro é uma preparação para a reunião que ambos terão hoje com os colegas do Equador, María Elsa Viteri, do Paraguai, Dionisio Borda, do Uruguai, Álvaro García, e da Venezuela, Alí Rodríguez Araque, para avançar nas discussões em torno do acordo de criação do Banco do Sul.
Os ministros de Economia dos seis países vão tentar detalhar “os acordos multilaterais vinculados ao convênio constitutivo” do banco regional, segundo nota oficial do ministério de Economia da Argentina

Notícias diárias comentadas sobre a dívida – 07.05.2009

O Correio Braziliense noticia os resultados da Marcha organizada ontem pela Ordem dos Advogados do Brasil e vários outros sindicatos e entidades, contra a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 12/2006, que limita o pagamento de precatórios por estados e municípios, ou seja, valores devidos principalmente a servidores públicos que ganharam na Justiça ações contra os governos. Ao mesmo tempo, a dívida financeira dos entes federados com a União é paga sem qualquer discussão, para garantir os recursos necessários ao governo federal pagar sua dívida junto ao setor financeiro. O Relator da PEC 12 anunciou que irá alterá-la, e fará uma Audiência Pública para colher as sugestões das entidades.

O Jornal O Globo traz artigo de Joseph Stiglitz, comentando sobre as políticas equivocadas impostas pelo Fundo Monetário Internacional aos países em desenvolvimento, como a redução dos gastos públicos (para garantir-se o pagamento da dívida) e a desregulamentação financeira. Estas medidas foram responsáveis pela própria crise que vivemos, e por isso estão totalmente desmoralizadas.

Stiglitz também comenta que a crise pode gerar dificuldades para os países pagarem suas dívidas, e que não temos ainda um sistema para lidar com esse problema. Sobre este tema, cabe ressaltar que o Equador, na reunião de Primavera do FMI/Banco Mundial, deu sua contribuição a esse debate: propôs a todos os países a realização de auditorias da dívida. Amparado pelas conclusões da Comissão para a Auditoria Integral da Dívida do Equador (CAIC), criada em 2007, o Equador anunciou, dia 20 de abril de 2009, a anulação unilateral de 70% da dívida referente aos Bônus Global 2030 e 2012, que representam 85% da dívida externa com os bancos privados internacionais.

PEC dos Precatórios alterada
Autor(es): Flávia Foreque
Correio Braziliense – 07/05/2009

Relator aponta itens inconstitucionais na proposta e promete realizar uma audiência pública em até duas semanas para discutir o tema. Mas a ampliação do prazo de pagamento para até 15 anos deve ser mantida

——————————————————————————–

José Varella/CB/D.A Press

Durante a manifestação, presidente da OAB entregou a Temer (PMDB-SP) uma carta-manifesto

A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que prolonga o prazo para o pagamento de precatórios (dívidas da administração pública decorrentes de uma decisão judicial definitiva) será alterada na Câmara Federal. A afirmação é do relator da PEC, aprovada no Senado no mês passado, deputado Eduardo Cunha (PMDB – RJ), que aponta dois itens inconstitucionais na medida. Um deles determina o pagamento da dívida de estados e municípios, avaliado em R$ 100 bilhões, de acordo com uma ordem crescente de valor das dívidas, ao contrário da ordem cronológica definida pela Constituição. O outro prevê a substituição do índice atual (inflação mais juros de 12% ao ano) pela taxa de caderneta de poupança, inferior à primeira.

“Temos que tentar atender estados e municípios que estão em dificuldade, mas sem atingir a ordem constitucional”, afirma o deputado. Cunha pretende realizar uma audiência pública em até duas semanas para discutir o assunto, antes de apresentar seu relatório à Comissão de Constituição e Justiça da Casa.

Ontem, uma marcha contrária à aprovação da PEC, organizada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), caminhou da sede da entidade em Brasília até o Congresso para pressionar a Câmara a não aprovar a proposta. A manifestação reuniu cerca de 1,5 mil representantes do Judiciário, Ministério Público, advogados e membros de organizações não governamentais com precatórios a receber.

De acordo com a PEC, de autoria do senador Renan Calheiros (PMDB – AL), o pagamento da dívida poderá ser realizado em até 15 anos. Hoje, esse prazo é de 18 meses, mas o período não é respeitado pelos devedores, apesar de ameaças de sequestro de recursos e intervenções. “Tem uma senhora nessa passeata de 90 anos. Você acha que ela vai esperar quanto tempo (para receber o precatório)? Tem um limite de vida também”, afirmou Maria Isabel Locateli, 54 anos, integrante do Sindicato dos Especialistas de Educação do Município de São Paulo (Sinesp).

Leilões
Com a PEC, os estados e municípios devedores poderiam destinar uma parcela fixa de sua receita para o pagamento dos precatórios. A fatia da receita a ser destinada aos precatórios seria de até 1,5% para os municípios e 2% para os estados. Ainda segundo a PEC, parte da dívida poderá ser paga por meio de leilões: aqueles que aceitem receber com maior deságio (quantias inferiores à dívida original) serão os primeiros beneficiados.

Advogados e magistrados apontam a medida como uma afronta às decisões do Poder Judiciário. “O cidadão não consegue ser beneficiado pelo meu trabalho porque aquilo que eu decidi passa a ser negociado pelo Estado. Todo o trabalho que o Judiciário teve para desenvolver o processo fica a perder de vista. (A PEC) é um verdadeiro golpe contra a decisão do Judiciário”, afirma Cláudio Montesso, presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho.

O presidente da OAB, Cezar Britto, entregou ao presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), uma carta-manifesto assinada por 166 entidades contrárias às mudanças propostas pela PEC. “(A medida) é o maior atentado à democracia brasileira depois do golpe militar, porque ela diz que os governantes estão livres para abusar do cidadão. Um país em que o governante é livre e o cidadão está amordaçado não é um pais democrático”, afirmou.

Os emergentes e a crise
Autor(es): Joseph E. Stiglitz
O Globo – 07/05/2009

Este deverá ser o pior ano para a economia global desde a Segunda Guerra Mundial, com o Banco Mundial estimando uma contração de até 2%.

Mesmo países em desenvolvimento que fizeram tudo certo — e têm políticas macroeconômicas e regulatórias muito melhores que as dos EUA — estão sentindo o impacto. A China deverá continuar em crescimento mas, em grande parte como resultado de uma queda aguda das exportações, num ritmo muito mais lento que os 11/12% dos últimos anos. A não ser que alguma coisa seja feita, a crise atirará na pobreza mais 200 milhões de pessoas.

A crise global requer resposta global, mas, infelizmente, a responsabilidade pela reação continua em nível nacional. Cada país tenta criar seu pacote de estímulo para reduzir o impacto sobre seus cidadãos, e não o impacto global. Ao calcular o tamanho do estímulo, os países compararão os custos sobre seus orçamentos com os benefícios em termos de aumento do crescimento e do emprego em suas economias. Como alguns dos benefícios (principalmente no caso de pequenas economias abertas) acumularão com outros, os pacotes de estímulo deverão ser menores e menos sofisticados do que poderiam ser. Por esta razão, é necessário um pacote de estímulo globalmente coordenado.

Esta é uma das diversas mensagens importantes a emergir de uma Comissão de Especialistas da ONU sobre a crise global, que eu presido, e que recentemente submeteu seu relatório preliminar às Nações Unidas.

O documento apoia muitas das iniciativas do G-20, mas pede medidas com foco nos países em desenvolvimento.

Por exemplo, enquanto se reconhece que quase todos os países precisam aplicar medidas de estímulo (somos todos keynesianos agora), muitas das nações em desenvolvimento não dispõem dos recursos para isso. Nem as instituições internacionais de financiamento.

Mas, se devemos evitar que entremos em outra crise da dívida, algum — talvez muito — do dinheiro terá que ser doado. No passado, a assistência foi acompanhada por “condições” abrangentes, algumas das quais impunham políticas fiscais e monetárias contracionistas — o oposto do que é necessário hoje — e exigiam desregulamentação financeira, uma das causas primárias da atual crise.

Em muitas partes do mundo, há um forte estigma associado a recorrer ao Fundo Monetário Internacional, por motivos óbvios. E há descontentamento não apenas entre os tomadores, mas também entre fornecedores de recursos. O dinheiro hoje está na Ásia e no Oriente Médio, mas por que esses países deveriam contribuir para organizações nas quais sua voz é limitada e que têm frequentemente executado políticas contrárias a seus valores e crenças? Muitas das reformas para melhorar a governança propostas pelo FMI e o Banco Mundial — afetando, obviamente, a forma como seus dirigentes são escolhidos — finalmente parecem estar na mesa. Mas o processo de reforma é lento e a crise não vai esperar. É, assim, imperativo que a assistência passe por uma variedade de canais, além, ou ao invés, do FMI, e incluindo instituições regionais.

Novas linhas de financiamento podem ser criadas, com estruturas mais em consonância com o século XXI. Se isso puder ser feito rapidamente (penso que sim), tais linhas poderão ser um canal importante para o desembolso de fundos.

Em sua reunião de novembro de 2008, os líderes do G-20 condenaram fortemente o protecionismo e se comprometeram a evitá-lo. Infelizmente, um estudo do Banco Mundial informa que 17 dos 20 países adotaram novas medidas protecionistas, principalmente os EUA com a provisão “buy American” incluída em seu pacote de estímulo à economia.

Mas há muito se reconhece que subsídios podem ser tão destrutivos quanto tarifas — e até menos justos, já que países ricos têm mais capacidade de concedê-los. Se existiu um campo de negociação equilibrado na economia global, não há mais: os subsídios maciços e os resgates de empresas praticados pelos EUA mudaram tudo, talvez de forma irreversível.

Na verdade, mesmo empresas em países industrializados avançados que não receberam subsídios estão em posição vantajosa. Elas estão em condição de assumir riscos que outras não podem, sabendo que, se falharem, serão salvas. Embora se possa entender os imperativos políticos internos que levaram a subsídios e garantias, os países desenvolvidos precisam reconhecer as consequências globais disso e providenciar assistência compensatória às nações em desenvolvimento.

Uma das mais importantes iniciativas de médio prazo pedidas pela Comissão da ONU é a criação de um conselho global de coordenação econômica, que não somente coordenaria a política econômica, mas também verificaria a existência de problemas pendentes e brechas institucionais.

À medida que a crise se aprofunda, vários países podem, por exemplo, se tornar insolventes. Mas ainda não temos um sistema para lidar com tais problemas.

E o sistema ancorado no dólar como moeda de reserva — espinha mestra do atual sistema financeiro global — está se debilitando. A China manifestou preocupações e o presidente de seu banco central se juntou à Comissão da ONU para pedir um novo sistema global de reserva. A Comissão entende que enfrentar este velho problema — levantado há mais de 75 anos por Keynes — é essencial para que tenhamos uma retomada robusta e estável.

Tais reformas não acontecerão de um dia para o outro. Mas não acontecerão nunca se não começarmos a trabalhar nelas agora.

JOSEPH E. STIGLITZ é economista. © Project Syndicate.

O Jornal Folha de São Paulo mostra que os maiores bancos privados do país mantiveram seus altos lucros no primeiro trimestre de 2009, principalmente devido aos ganhos com a dívida pública, que representa rendimento garantido em um momento de crise. Os lucros destas instituições financeiras apresentaram pequenas quedas comparativamente ao mesmo período do ano passado, porém, tais perdas se devem ao aumento das despesas para constituir reservas para a inadimplência, ou seja, que somente serão consumidas caso os devedores destes bancos não paguem seus débitos. Portanto, na prática, os lucros dos bancos foram bem maiores.

O Itaú-Unibanco lucrou R$ 2,562 bilhões no primeiro trimestre, apresentando queda de apenas 6% em relação aos 3 primeiros meses de 2008. O Bradesco lucrou R$ 1,723 bilhão, com queda de apenas 9,6%. Com a crise, os bancos privados reduziram a oferta de crédito às pessoas físicas e jurídicas, por meio de uma seleção maior dos devedores. E passam a aplicar mais nas chamadas “operações de tesouraria”, ou seja, principalmente títulos da dívida pública. Portanto, nota-se claramente que, exatamente em um momento de crise, quando o setor produtivo necessita de financiamentos a juros baixos e prazos mais longos, os bancos privados fecham ainda mais as torneiras do crédito, com medo da inadimplência, e aumentam ainda mais seus investimentos na dívida pública.

Em suma: o sistema financeiro nacional, em um momento de crise, não contribui com a recuperação econômica do país, devido ao endividamento público.

O Jornal Folha de São Paulo noticia o protesto dos índios em São Paulo, que ocuparam a Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), para denunciar a falta de assistência do governo federal: falta de saneamento, medicamentos atrasados, veículos de assistência sucateados. Quando analisamos os dados do orçamento da União, atualizados até 4 de maio (passado mais de 1/3 do ano), constatamos que até esta data a FUNASA somente havia executado 16% dos recursos de 2009 do Programa “Proteção e Promoção dos Povos Indígenas”, o que significa R$ 50,7 milhões. Este valor representa 1.600 vezes menos que o gasto com a dívida no período (excluindo-se ainda o gasto com refinanciamento da dívida, ou seja, a “rolagem”, que significa o pagamento de amortizações por meio da emissão de mais títulos).

Artigo no Estado de São Paulo, escrito pelo Secretário de Finanças do Mato Grosso, divulga a proposta de renegociação das dívidas dos estados com a União, aprovada por unanimidade na última reunião do Conselho Nacional dos Secretários de Fazenda (Confaz). A proposta consiste na retirada do índice de atualização monetária (o IGP-DI, que historicamente apresentou inflação bem superior aos demais índices), e reduzir em 2% o percentual da Receita Corrente Líquida dos estados comprometido com o pagamento da dívida. Esta notícia é importante, e mostra que a crise está colocando em evidência o problema das dívidas dos estados com a União, conforme comentado em edições anteriores desta seção.

O Valor Econômico mostra que o Brasil tentará impedir que o Paraguai vá à Justiça para questionar a dívida de Itaipu. O Brasil oferece alguns benefícios como o prolongamento da dívida, o que já foi rejeitado pelo nosso país vizinho (conforme notícia comentada de ontem). Mesmo esta proposta tímida já é considerada difícil pelo próprio governo brasileiro, pois faria com que a Eletrobrás e o Tesouro recebessem mais tarde os pagamentos feitos pelo Paraguai. Sobre este tema, importante ressaltar que os pagamentos da dívida feitos pelo Paraguai ao Brasil são destinados, principalmente, para o pagamento da dívida brasileira junto ao setor financeiro (ver artigo no Boletim Auditoria Cidadã nº 19).

Por fim, o Jornal O Estado de São Paulo noticia a entrada de dólares no país, devido às altas taxas de juros brasileiras. Ou seja: na própria avaliação de membros da equipe econômica do governo, os investidores estrangeiros pegam empréstimos nos países ricos (a juros próximos a zero) e vêm ao país para ganhar com os títulos da dívida interna, que rendem juros altíssimos..

Itaú reduz lucro com aperto no crédito
Autor(es): TONI SCIARRETTA
Folha de S. Paulo – 06/05/2009

Com a crise econômica, financiamentos contribuíram menos para o resultado do banco no primeiro trimestre de 2009

Mais seletivo, banco prevê que inadimplência chegue ao recorde de 6,9% até meados do ano e que só em setembro quadro mude

Maior banco brasileiro, o Itaú Unibanco reportou ontem queda no lucro no primeiro trimestre do ano, resultado da desaceleração das operações de crédito, do aumento da inadimplência, da redução na atividade econômica e da atuação mais difícil em meio às turbulências nos mercados.

O banco teve lucro líquido de R$ 2,562 bilhões, uma queda de quase 6% em relação ao mesmo período do ano passado, quando Itaú e Unibanco ainda operavam separadamente e teriam lucrado R$ 2,719 bilhões juntos. O resultado exclui efeitos não recorrentes como a compra de ações da Redecard, efeitos tributários e aumento de provisões para correção de planos econômicos. Com eles, a queda seria maior, de 27,62%.

O balanço vai em linha com o divulgado pelo Bradesco, que teve lucro de R$ 1,723 bilhão – 9,6% menos do que no primeiro trimestre de 2008.

Como efeito da crise, o Itaú afirma que diminuiu a demanda dos clientes por novos empréstimos. O banco também admite que foi “mais seletivo” na hora de conceder crédito.

O resultado foi um crescimento de apenas 0,3% da carteira total de crédito, em relação ao quarto trimestre de 2008, que somou R$ 272,7 bilhões. No caso do Bradesco, houve queda de 0,5% na carteira, que ficou em R$ 214,29 bilhões, cifra 0,5%.

A crise também diminuiu a importância do crédito no resultado dos bancos. Segundo Silvio de Carvalho, diretor financeiro do Itaú Unibanco, as operações de crédito costumavam responder por 45% do lucro do banco no ano passado; no primeiro trimestre de 2009, os financiamentos contribuíram com 35% do resultado. No Bradesco, o crédito respondia por 25% do lucro no ano passado; agora, contribuiu com 15%.
“O crescimento do crédito foi relativamente baixo. A atividade econômica implicou menor demanda e também fomos mais seletivos na concessão”, disse Silvio de Carvalho, diretor financeiro do banco.

Inadimplência

Maior preocupação dos bancos, a inadimplência subiu de 4,8% para 5,6% da carteira de crédito de dezembro para março. O maior aumento foi das pequenas e médias empresas, que saltou de 1,7% para 2,5%. No segmento de pessoa física, saltou de 8,1% para 9,8%.

A expectativa do banco é que a inadimplência continue subindo e chegue o recorde de 6,9% no início do segundo semestre. O Itaú só vê o recuo na inadimplência a partir de setembro, com o reaquecimento da economia. Para o ano, o banco trabalha com crescimento zero para o PIB.

O lucro do Itaú Unibanco também foi afetado pelo aumento das provisões para devedores duvidosos. A despesa com provisões totalizou R$ 4,373 bilhões no primeiro trimestre, aumento de 27,5% acima da feita até dezembro. O impacto só não foi maior porque o banco consumiu R$ 539 milhões em provisões adicionais, que já tinham sido feitas no fim do ano passado.

O resultado do Itaú Unibanco também foi reforçado pelos ganhos da tesouraria, uma das melhores posicionadas para trabalhar em períodos de turbulência nos mercados. Nas operações com o mercado, o Itaú teve ganho de R$ 1,207 bilhão, 143% mais do que no mesmo período de 2008.
“Tivemos uma presença importante nas poucas operações do mercado nesse primeiro trimestre. Até por conta da nossa posição de liquidez, acabamos tendo ganhos nesse mercado”, disse Carvalho.
Para 2009, o Itaú manteve a previsão de crescimento de 10% a 15% nas operações de crédito, sendo de pouco mais de 17% para os financiamentos a médias e pequenas empresas.

Índios invadem Funasa de SP e fazem reféns
Folha de S. Paulo – 06/05/2009

Grupo de 50 pessoas ocupa prédio no centro da capital e pressiona pela saída de coordenador do órgão

Moacyr Lopes Junior/Folha Imagem

Índios fecham ruas do centro de São Paulo em protesto contra a Funasa; local foi isolado pela PM

Um grupo de cerca de 50 índios invadiu ontem o prédio da Funasa (Fundação Nacional de Saúde) no centro de São Paulo. Eles fizeram reféns cerca de 80 funcionários de sete andares do prédio da entidade como meio de pressionar a exoneração do coordenador do órgão em São Paulo, Raze Rezek.
No início da noite, todos foram libertados, após Rezek afirmar que irá pedir demissão hoje. Ele disse que já havia entregado o cargo no ano passado, mas afirmou que o presidente da instituição, Danilo Forte, recusou sua demissão.
Na saída do coordenador do local, houve um momento de tensão. Os índios gritaram que ele não seria liberado caso não afirmasse para a imprensa que pediria demissão.
“O cargo pertence ao presidente da instituição”, repetia Rezek, para depois ceder e afirmar que irá pedir demissão. Já na rua, os índios fizeram uma dança para comemorar. Eles iriam dormir no local e esperar a decisão sobre a saída de Rezek, que prometeu voltar hoje para conversar com o presidente da Funasa por telefone.
Rezek chegou ontem para negociar com os índios acompanhado por policiais federais.
Os índios ocuparam o prédio por volta das 12h. Ninguém ficou ferido e não houve danos materiais. Os manifestantes chegaram a bloquear a rua onde fica o prédio. A Polícia Militar isolou a área e a via foi liberada no início da tarde.
De acordo com o indígena Darã, vice-presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena, a manifestação pede uma atuação mais eficiente da Funasa no Estado. “O saneamento nas terras indígenas não está sendo feito, os medicamentos estão atrasados e os veículos de assistência, sucateados”, disse.
Por volta das 16h40, os índios liberaram cerca de 80 reféns. Só a noite cinco chefes de seções do órgão e outros dois procuradores da entidade foram libertados. “Estamos reféns dessa situação, sem ter nada a ver com ela”, afirmou Gelza da Costa, responsável pelo setor de convênios da entidade, uma das pessoas detidas.
O cacique Guaracy, porém, negou que os funcionários fossem reféns. “Quem faz o índio refém é o homem branco.” Os índios que bloqueavam as entradas do prédio estavam armados com arco e flecha.

Uma solução para as dívidas dos Estados
Autor(es): Eder Moraes e Vivaldo Lopes
O Estado de S. Paulo – 06/05/2009

Em 1997, o governo federal implementou no Brasil o mais eficiente programa de controle do endividamento dos Estados e municípios já desenvolvido ao longo da História do País. Possibilitou, sob o guarda-chuva da Lei Federal nº 9.496/97, que todos os Estados da Federação pudessem renegociar suas dívidas contratuais e mobiliárias, alongando-as em 30 anos. Ao mesmo tempo introduziu rigoroso controle hierárquico por meio de contratos padronizados que estabeleceram fortes metas fiscais e proibição para contração de novos endividamentos. Em 1999, pela Medida Provisória nº 2.118, a União estendeu o mesmo programa às capitais dos Estados e a alguns grandes municípios que tinham o mesmo perfil de elevado endividamento dos Estados.

O arcabouço do programa de saneamento das finanças públicas e redução drástica do nível de endividamento das unidades federativas completou-se com a edição da Lei de Responsabilidade Fiscal, no ano 2000. É inegável reconhecer que os contratos de renegociação das dívidas dos Estados e municípios assinados ao longo de 1997 e 1999 constituíram passos fundamentais para a estabilidade econômica do País, ao mesmo tempo que impuseram um freio aos desmandos que havia anos ocorriam nas finanças dos Estados e municípios, ao garantir a solvência fiscal desses entes federativos. O arranjo estabelecido pela União definiu a taxa de juros de 6% ao ano para os Estados e 9% para os municípios, fixando como indexador dos contratos o IGP-DI, calculado pela Fundação Getúlio Vargas.

Naquele momento histórico da macroeconomia do País a renegociação das dívidas cumpriu perfeitamente seu papel estratégico. Entretanto, as rígidas regras impostas pela União para contratação de novas dívidas, os custos financeiros (6% ao ano mais IGP-DI) e a concentração das dívidas em apenas um credor (União) eliminaram a possibilidade de os Estados e municípios fazerem uso de políticas eficientes ou inovadoras de gestão de dívidas. E também reduziram drasticamente a capacidade de essas unidades da Federação promoverem investimentos públicos em sua infraestrutura econômica e social. Nesse período, convivemos com momentos em que a taxa média de juros interbancários (Selic) chegou a estratosféricos 26,5% ao ano, fato que possibilitava ao governo federal afirmar que mantinha juros subsidiados para os Estados e municípios – ainda que o IGP-DI tivesse apresentado variação anual de até 28% em alguns períodos dos 12 anos de implantação do programa de ajuste fiscal dos Estados e municípios.

Atualmente a dívida total dos Estados com a União é de R$ 348,8 bilhões. Os municípios (capitais) devem à União R$ 52,4 bilhões. O total devido por municípios e Estados à União é de R$ 401,2 bilhões. É provável que, diante da inflexibilidade fiscal dos contratos e do elevado nível de comprometimento de suas receitas líquidas para pagamento das parcelas anuais das dívidas, os Estados tenham aumentado sua carga tributária como uma política compensatória para fazer frente à redução de sua capacidade de investimentos para provimento de serviços públicos de boa qualidade.

A rápida alteração do cenário econômico no Brasil e no mundo está impondo a necessidade de redução das taxas de juros e maior aporte de recursos para investimentos públicos a fim de manter aquecida a economia do País. O momento é o mais adequado para a União promover uma nova reestruturação dos contratos das dívidas dos Estados, reduzindo a taxa de juros e retirando o IGP-DI como indexador inflacionário. Os movimentos do Banco Central indicam que teremos, em 2009, taxa de juros reais próxima de 4,54% ao ano, portanto, bem inferiores aos 6% cobrados pela União nos contratos das dívidas estaduais e municipais. A inflação deverá ficar abaixo da meta de 4,5%, permitindo a retirada de indexador inflacionário desses contratos.

Diante desse contexto, apresentamos à sociedade a seguinte proposta:

Retirar o IGP-DI e o IGP-M como indexadores dos contratos firmados à luz das Leis Federais nº 9.496/97 e nº 8.727/93.

Reduzir em dois pontos porcentuais o nível de comprometimento da receita corrente líquida dos Estados e municípios para pagamento das parcelas das dívidas renegociadas.

Os recursos economizados com a reestruturação dos contratos serão exclusivamente investidos em infraestrutura econômica, não podendo ser gastos com despesas de custeio.

Para nossa satisfação, esse texto foi aprovado por unanimidade na última reunião do Conselho Nacional dos Secretários de Fazenda (Confaz) – e mereceu destaque na capa e no noticiário do Estado. A repercussão combinada na esfera dos secretários fazendários e da grande mídia já causou os primeiros efeitos na sensibilidade dos responsáveis pelo tema no governo federal. Oficialmente, o Ministério da Fazenda recebeu o nosso pleito e neste momento o estuda. A abertura do diálogo é um sinal de que nossa proposta vai sendo tratada com a seriedade que merece, mas igualmente precisamos de celeridade, em razão das distorções que a atual situação provoca no caixa dos Estado. Nesse sentido, continua presente nossa intenção de desenvolver forte mobilização nacional em torno da bandeira que pede a troca dos juros das dívidas estaduais pela aceleração das obras do PAC – e consequente geração de milhares de empregos. Nós a entendemos como uma campanha a favor do Brasil e do aquecimento da nossa economia. Uma campanha do sim, e não do não. Entendemos que essa proposta guarda fina sintonia com as políticas contracíclicas adotadas pelo governo federal para enfrentamento da crise mundial, pois libera recursos dos próprios Tesouros estaduais e municipais para serem investidos em políticas desenvolvimentistas em seus próprios territórios, contribuindo decisivamente para o esforço de reaquecimento da economia brasileira. É hora, portanto, de o governo federal implementá-la.

Eder Moraes é secretário da Fazenda do Estado de Mato Grosso. Vivaldo Lopes é consultor econômico

Lula convoca ministros para evitar que Paraguai vá à Justiça por causa de Itaipu
Autor(es): Daniel Rittner
Valor Econômico – 06/05/2009

Tentando evitar o acirramento do contencioso com o Paraguai em torno da usina binacional de Itaipu, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva convocou quatro ministros e as principais autoridades do setor elétrico para uma reunião hoje à tarde, na véspera da chegada a Brasília de seu colega paraguaio, Fernando Lugo.

Lula quer alinhavar uma nova proposta para evitar a abertura de arbitragem internacional sobre a dívida de Itaipu. O presidente chamou para a reunião os ministros Edison Lobão (Minas e Energia), Dilma Rousseff (Casa Civil), Guido Mantega (Fazenda) e Celso Amorim (Relações Exteriores), além de representantes da Eletrobrás, da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). É do ex-ministro Nelson Hubner, hoje diretor-geral da Aneel, a autoria de uma das propostas em exame.

A proposta consiste no prolongamento da dívida assumida por Itaipu Binacional para a construção da usina, atualmente em cerca de US$ 18 bilhões, que vence em 2023. Dos US$ 45 por megawatt-hora (MWh) pagos pela Eletrobrás pela compra da cota de energia paraguaia em Itaipu, quase US$ 42 se destinam à amortização da dívida e ao pagamento de compensações, como royalties aos municípios afetados. O Paraguai diz que embolsa, efetivamente, apenas US$ 3,1.

Ao prolongar a quitação da dívida para 2030 ou 2040, como propôs Hubner no passado e agora defende uma parte do governo, a tarifa poderia ser mantida em US$ 45/MWh. No entanto, diminuindo o valor para o pagamento da dívida, sobraria mais dinheiro para o Paraguai. Na prática, isso seria como aumentar o preço da energia comprada do país vizinho.

O próprio governo brasileiro, porém, considera duas restrições na proposta. Primeiro, a Eletrobrás e o Tesouro Nacional, principais credores de Itaipu Binacional, demorariam mais tempo para receber seus créditos. Isso pode comprometer tanto o Tesouro quanto os investimentos planejados pela Eletrobrás. A segunda restrição é que, na interpretação de diplomatas que conhecem minuciosamente o Tratado de Itaipu, o prolongamento da dívida exigiria mudanças no documento, com a necessidade de exame pelo Congresso.

Essa proposta ainda não obteve apoio da Fazenda. Outra ideia é oferecer ao Paraguai a antecipação do pagamento pela compra de energia. Mas isso, além de exigir um projeto de lei, não agradou os negociadores paraguaios, que viram no gesto uma tentativa do Brasil de aproveitar a fragilidade financeira do país.

Enxurrada de dólares preocupa o governo
Autor(es): Fabio Graner e Renata Veríssimo
O Estado de S. Paulo – 06/05/2009

Governo se divide, porém, sobre como enfrentar o problema

A intervenção do Banco Central ontem no mercado de câmbio foi analisada por setores da equipe econômica como um indicativo de que é procedente a tese de que o ritmo menor na queda das taxas de juros pode provocar uma desvalorização mais acentuada do dólar em relação ao real.

Esse avaliação não corresponde à interpretação do Banco Central. Para a diretoria do BC, a valorização do real não pode ser atribuída, apenas, ao nível da taxa de juros, mas principalmente há outros fatores.

Segundo o Banco Central, as razões principais para a maior entrada de dólares no País e a pressão sobre o mercado de câmbio são a menor aversão ao risco no mercado internacional e a alta recente dos preços das commodities exportadas pelo Brasil.

DISPUTA

As visões divergentes entre integrantes da equipe econômica e do Banco Central sobre a questão foram acentuadas depois da última reunião do Conselho de Política Monetária (Copom), no dia 11 de março.

Na ocasião, o Copom decidiu reduzir o ritmo da queda dos juros de 1,5 ponto percentual, cortados na reunião anterior, para 1 ponto percentual.

Integrantes da equipe econômica ficaram insatisfeitos e, nos bastidores, manifestaram preocupação com uma valorização do real que seria provocada pelo grande volume de operações do tipo “carry trade”.

Nessas operações, os investidores captam recursos a juros baixos em mercados desenvolvidos e aplicam nos títulos brasileiros, que estão entre os de melhor rentabilidade no mundo.

Esse movimento seria favorecido pela diminuição da aversão ao risco por parte dos investidores internacionais e pela percepção de que o Brasil está em uma situação econômica melhor que a maioria dos países emergentes.

Segundo essa fonte da equipe econômica, a realização de swaps reversos , operação que equivale a uma compra de dólares no mercado futuro, não será suficiente para conter esse processo.

Já a visão do BC é de que a maior entrada de dólares no País não está relacionada à taxa de juros.

Notícias diárias comentadas sobre a dívida – 05.05.2009

O Portal G1 destaca que o Equador entrou com um pedido de arbitragem, cobrando indenização de US$ 250 milhões da construtora Odebrecht. Este pedido baseou-se na auditoria realizada pela firma italiana Eletroconsult, que apontou falhas na construção da Usina Hidrelétrica de San Francisco. O empreendimento foi financiado pelo BNDES.

Sobre este tema, cabe ressaltar que o Equador tem utilizado o mecanismo da auditoria para questionar o endividamento público. Amparado pelas conclusões da Comissão para a Auditoria Integral da Dívida do Equador (CAIC), criada em 2007, o Equador anunciou, dia 20 de abril de 2009, a anulação unilateral de 70% da dívida referente aos Bônus Global 2030 e 2012, que representam 85% da dívida externa com os bancos privados internacionais.

Já no Brasil, onde não se reduz o pagamento da dívida e se mantêm todos os privilégios do setor financeiro, os cortes orçamentários continuam gerando sérias consequências. O Jornal Folha de São Paulo destaca que o governo reduziu a meta anual de assentamentos de reforma agrária, como resultado dos cortes de recursos. A reportagem mostra que apenas em 2005 o governo Lula cumpriu essas metas anuais. Importante ressaltar que, dia 27 de março de 2009, o governo editou o Decreto nº 6.808, que reduziu fortemente (em 31%) os recursos do Ministério do Desenvolvimento Agrário, de R$ 3,5 bilhões para R$ 2,4 bilhões.

O Jornal O Globo mostra o impacto da seca no Sul do Brasil, que está levando os municípios a fecharem suas portas para economizarem recursos, para poderem garantir água às pessoas. Isto não precisaria ocorrer, caso o governo federal disponibilizasse recursos emergenciais em tempo real aos municípios, assim como é sempre garantido imediatamente o muito mais vultoso gasto com o endividamento.

No caso do governo do estado de São Paulo, a queda de arrecadação já gerou cortes de R$ 150 milhões na saúde, enquanto se mantém o pagamento da dívida do estado com a União. Este é o tema de reportagem do Estado de São Paulo, que mostra que há uma crescente pressão pela renegociação da dívida dos entes federados com a União. Conforme comentado anteriormente nesta seção, os pagamentos destas dívidas são utilizados pelo governo federal para as amortizações da sua dívida com o setor financeiro.

O Jornal de Brasília mostra a defasagem dos valores pagos aos servidores públicos do executivo federal a título de vale-alimentação. Este valor, congelado desde 2004, corresponde a R$ 5,70 por dia útil, em alguns estados. Várias reuniões já foram feitas com o Ministério do Planejamento pelo sindicato dos servidores para tentar aumentar o “vale-coxinha”, apelido dado ao ticket refeição concedido pelo governo federal. Porém, as restrições orçamentárias ocasionadas pelo endividamento público falam mais alto.

A Gazeta Mercantil noticia a marcha que ocorrerá amanhã, promovida pela Ordem dos Advogados do Brasil, contra a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 12/2006, que limita os gastos de estados e municípios com o pagamento de precatórios, ou seja, decorrentes de decisões judiciais, em sua maioria em favor de servidores públicos. Conforme já comentado anteriormente nesta seção, a aprovação desta PEC representaria grande injustiça com o trabalhador, credor legítimo por decisão judicial, ao mesmo tempo em que não há limite algum para o questionável pagamento da dívida financeira dos estados e municípios com a União.

A Gazeta Mercantil também mostra que o FMI concedeu empréstimo de US$ 17,1 bilhões para a Romênia, o que representa mais de mil vezes o valor da cota deste país no Fundo, o que não seria permitido em condições normais. O que mostra que o FMI está disposto a recuperar de qualquer forma seu “status” de emprestador mundial, na tentativa de justificar sua existência, mesmo que todo o seu receituário tenha se mostrado falido com a crise global.

Por fim, o Jornal O Globo traz notícia sobre a resposta negativa do Paraguai ao acordo proposto pelo Brasil, baseado na ampliação de prazo para pagamento da dívida referente à construção de Itaipu. O Paraguai considera a dívida ilegítima, pelas razões apontadas na edição de ontem desta seção.

Equador entra com pedido de arbitragem contra Odebrecht
País pede US$ 250 milhões de indenização por usina.
Odebrecht contesta e diz que pedido é ‘injustificado’.
05/05/09 – 08h20 – Atualizado em 05/05/09 – 08h20

——————————————————————————–
O Equador apresentou um pedido de arbitragem de US$ 250 milhões em uma corte local contra a construtora brasileira Odebrecht, argumentando o não cumprimento de um contrato para a construção de uma central hidrelétrica no país, disse um autoridade na segunda-feira (4).

No processo, apresentado perante um centro de arbitragem da Câmara de Comércio de Ambato, cerca de 120 quilômetros ao sul de Quito, o Equador pede “ressarcimento de perdas e danos” à empresa brasileira, a quem acusa de ter construído uma represa com falhas técnicas, com base numa auditagem feita na usina pela firma italiana Eletroconsult.

A ação contra a Odebrecht seria a primeira contra uma empresa estrangeira no Equador e a primeira nesse montante.

“O processo foi apresentado no centro de arbitragem em Ambato contra a Odebrecht. Acredito que vamos ganhar esse processo”, disse Jorge Glas, presidente do Fundo de Solidariedade, uma entidade estatal dedicada ao controle dos setores elétrico e de telecomunicações. Segundo ele, o valor cobre as perdas econômicas, o dinheiro gasto no conserto da usina e os juros, entre outras coisas.

A usina

A usina San Francisco foi construída pela Odebrecht e começou a funcionar em meados de 2007, mas no ano passado ficou paralisada por cerca de três meses por causa de problemas na construção, segundo o governo. Outra parada de quatro meses está programada para setembro deste ano.

No fim do ano passado, o governo do Equador expulsou a Odebrecht, dizendo que a empresa não havia cumprido suas obrigações. Glas afirmou que a estatal Hidropastaza entrou com o pedido de arbitragem na Câmara de Comércio de Ambato de acordo com o contrato assinado pela Odebrecht.

A Odebrecht contesta as acusações do governo equatoriano, o que levou o presidente Rafael Correa a expulsar a construtora do país, medida que gerou tensões nas relações entre Brasília e Quito.

Em comunicado à imprensa, a Odebrecht disse que o pedido de arbitragem faz parte de uma série de “medidas injustificadas” tomadas contra ela. A empresa disse que a construção da usina respeitou o contrato, e que quando a usina foi fechada a companhia imediatamente tomou medidas para a retomada das operações, com custo significativo para a própria Odebrecht.

A companhia afirmou que o pedido de arbitragem “viola os direitos da Odebrecht, um investidor estrangeiro que tem dado importante contribuição para o desenvolvimento econômico e social do país”.

Com informações da Reuters e da Agência Estado

Governo diminui meta anual de assentados
Autor(es): EDUARDO SCOLESE
Folha de S. Paulo – 05/05/2009

Além de ter o orçamento reduzido, Incra avalia estar mais próximo de beneficiar 75 mil em vez de 100 mil famílias sem terra

No órgão, há quem defenda limite anterior para fazer pressão por mais recursos; em 2007 e 2008, meta de 100 mil não foi alcançada

Por motivos políticos e orçamentários, o governo federal reduziu de 100 mil para 75 mil a meta deste ano de famílias assentadas no programa de reforma agrária -o que, mais uma vez, provocará desgaste com os sem-terra.
A prioridade de novo está longe dos acampamentos dos sem-terra, de acordo com a nova planilha de metas, definida na semana passada pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), órgão vinculado ao Ministério do Desenvolvimento Agrário.
Das 75 mil famílias previstas na meta, 42,8 mil (57%) estão na chamada Amazônia Legal (Estados do Norte, Mato Grosso e Maranhão), onde estão concentradas apenas 26% das 225 mil famílias acampadas à espera de um lote de terra.
Entre os Estados, a maior fatia da meta está no Pará (15,5 mil), seguido de MT (8.030), MA (6.020) e AM (5.520).
“Lamentavelmente é mais um sinal de que a reforma agrária não é prioridade. As metas já eram insuficientes e essa redução será motivo de muito embate. Vamos cobrar do governo”, disse Alberto Broch, presidente da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura).
Um dos motivos que levaram o governo a reduzir a meta é o fato de, desde o início do governo Lula, em 2003, ela somente ter sido cumprida em 2005.
Agora, ao reduzi-la para 75 mil, o Incra avalia estar diante de um número mais próximo de sua capacidade operacional. Em 2007 e 2008, a meta era igualmente de 100 mil, mas ao final desses anos o governo beneficiou 67,5 mil e 70,1 mil famílias, respectivamente.
Hoje, além da questão política, há o ingrediente financeiro. Após o corte orçamentário imposto aos ministérios, os recursos para a obtenção de terra caíram de R$ 950 milhões para R$ 500 milhões, sendo que, desse montante, cerca de R$ 300 milhões foram gastos.
O impacto desse corte, porém, tende a ser sentido com mais força no ano eleitoral de 2010. Isso porque a maioria dos assentamentos criados num ano tem seus processos iniciados em anos anteriores.
Procurado pela reportagem, o presidente do Incra, Rolf Hackbart, disse via assessoria que o novo número representa um equilíbrio maior entre meta e desenvolvimento dos assentamentos. Segundo ele, o órgão buscará uma suplementação orçamentária, e as famílias acampadas terão prioridade.
A redução da meta provocou um polêmico debate no Incra. Há quem defendesse a manutenção dos 100 mil como forma de pressionar a equipe econômica a liberar mais recursos.
Uma outra ala, porém, acha que as 75 mil também estão superestimadas: a valorização do preço da terra em todo o país dificulta a desapropriação de áreas no Sul, no Sudeste e no Centro-Oeste. O ministro Guilherme Cassel (Desenvolvimento Agrário) já disse que, ao priorizar o processo de regularização fundiária, a reforma agrária na Amazônia Legal será deixada em segundo plano. Servidores do Incra serão em breve deslocados para essa tarefa.

No RS, seca paralisa prefeituras
O Globo – 05/05/2009

Diante da seca no Sul do país, os 21 municípios gaúchos da região conhecida como celeiro decidiram paralisar todos os serviços das prefeituras na semana que vem.

O presidente da associação dos municípios da região, Claudemir Locatelli, prefeito de Vista Gaúcha, diz que os prefeitos decidiram parar serviços para economizar recursos. A verba economizada será utilizada no combate a estiagem, pois falta água potável na zona rural dos municípios. Só não serão paralisados serviços de saúde e coleta de lixo. Mas as aulas na rede municipal ficarão suspensas. Em todo o Rio Grande do Sul, já são 160 prefeituras que decretaram emergência.

Somente na tarde desta segunda-feira, foram mais oito. Entre eles Soledade e Candiota. O vice-prefeito de Candiota, Paulo Brum, afirma que 850 famílias do interior estão sem água potável, e são abastecidas por um caminhão-pipa.

O município de Erechim começou nesta segunda racionamento de água. A cidade foi dividida em duas partes e cada uma ficará abastecida durante 14 horas. A falta de chuva afeta a produção de energia elétrica em pequenas usinas hidrelétricas no norte e noroeste do Estado. Algumas funcionam somente poucas horas por dia. Em Victor Graeff, a Usina Cotovelo do Jacuí opera apenas no horário de pico de consumo.

Arrecadação de SP cai no quadrimestre
Autor(es): Silvia Amorim
O Estado de S. Paulo – 05/05/2009

Receita estadual de janeiro a abril foi de R$ 31,39 bi, ante R$ 31,52 bi do mesmo período do ano passado

Pela primeira vez desde o início da crise mundial, o governo de São Paulo registrou queda real de sua arrecadação em relação a 2008. Dados encaminhados ontem ao governador José Serra (PSDB) pela equipe econômica mostram que a receita estadual no primeiro quadrimestre deste ano (janeiro a abril) ficou R$ 1,3 bilhão abaixo do que estava previsto no Orçamento e já é 0,3% inferior, em termos reais – descontada a inflação -, a tudo que o Estado arrecadou no mesmo período no ano passado.

Segundo balancete da Secretaria da Fazenda, São Paulo arrecadou de janeiro a abril deste ano R$ 31,391 bilhões. A previsão era de que entrassem nos cofres estaduais R$ 32,667 bilhões. No mesmo período em 2008 a receita foi de R$ 31,528 bilhões – R$ 137 milhões a mais do que neste ano. O Orçamento para 2009 é de R$ 118,2 bilhões.

Serra considerou os números preocupantes e disse que mudanças terão de ser feitas no Orçamento. “As despesas nós vamos ter de ir ajustando”, disse.

Segundo o governador, diante desse cenário, não haverá como incluir novos gastos para este ano. “Despesa que não está no Orçamento não vai ser feita, porque significaria cortar outra coisa.” A expectativa de Serra é que a receita seja normalizada em maio.

Apenas na área da saúde, calculou o secretário da pasta, Luiz Roberto Barradas Barata, a queda na arrecadação representará cerca de R$ 150 milhões a menos para despesas.

O impacto negativo da crise nas finanças paulistas é anunciado num momento em que cresce a pressão de Estados por uma renegociação da dívida pública – feita no fim dos anos 90 – com a União, alimentada pela redução da taxa básica de juros, a Selic. O Estado mostrou anteontem que o gasto do governo federal com os subsídios para pagamento de juros dessas dívidas já supera R$ 184,5 bilhões.

Em tempos de crise, prefeituras já conseguiram com o governo federal recursos adicionais para compensar a redução no repasse de verbas do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).

RITMO MAIOR

O último balanço do governo de São Paulo, referente ao período de janeiro a março, já revelava queda na receita – R$ 733 milhões – em comparação ao previsto no Orçamento. Mas o que havia entrado nos cofres estaduais, até então, era maior do que o registrado de janeiro a março de 2008. Agora, a situação piorou. O ritmo de redução da arrecadação se intensificou em abril.

Serra disse ontem que o ajuste nos gastos, por enquanto, não será severo. “Já teve contingenciamento no começo do ano. Tinha dinheiro em caixa e a gente vai levando devagar porque a ideia é fazer uma coisa racional”, explicou o tucano, após participar de um evento de entrega de aparelhos auditivos para deficientes na capital.

Os investimentos, assegurou o governador, não passarão por cortes. “Os recursos para investimentos não provêm de receitas correntes. Eles vêm das outorgas de estradas, da venda da Nossa Caixa ao governo federal, da venda da conta salário e de financiamentos. É um dinheiro que não pode ser empregado em custeio”, afirmou.

Segundo Serra, o cenário mostra que “o governo não tem condições de brincar em serviço com aumento de outras despesas não previstas no Orçamento”. “A gente não imprime dinheiro, diferentemente do governo federal, que pode, quando não tem dinheiro, imprimir papel de dívida”, disse.

TÍQUETE DA UNIÃO VIRA O VALE-COXINHA
Valor do tíquete insuficiente
Ponto do Servidor – Maria Eugênia
Jornal de Brasília – 05/05/2009

Os servidores do Executivo federal não sabem mais a quem recorrer. Com o valor do tíquete-alimentação, apelidado de vale-coxinha, congelado desde 2004, a categoria tem participado de vários reuniões no Ministério do Planejamento mas, até agora, ninguém falou em reajuste. O Sindicato dos Servidores Públicos Federais do Distrito Federal (Sindsep) destaca que o benefício não é capaz de pagar por uma refeição completa (salada, prato principal, bebida não-alcoólica, sobremesa e cafezinho). Em Brasília, por exemplo, que concentra o segundo maior contingente de servidores do Executivo Federal (só perde para o Rio de Janeiro), o custo médio de uma refeição completa chega R$ 18,49. Para suprir essa necessidade, o servidor deveria receber um tíquete mensal de R$ 406,78. Porém, o maior valor mensal pago pelo Executivo é R$ 161. Isso quer dizer, R$ 7,36 por dia. Em alguns estados, chega a ser menos: R$ 126. No Legislativo, o benefício mensal chega a R$ 638, ou seja, R$ 29 ao dia. No Judiciário, os valores oscilam entre R$ 590 e R$ 630, que correspondem, respectivamente, a R$ 26,82 e R$ 28,64 por dia.

Entidades fazem marcha contra PEC 12
Autor(es): LUIZ ORLANDO CARNEIRO
Gazeta Mercantil – 05/05/2009

PRECATÓRIOS

A Marcha em defesa da Cidadania e do Judiciário — um protesto contra a Proposta de Emenda Constitucional 12 (“PEC do calote”) marcada para as 10h de amanhã, na Esplanada dos Ministérios — pretende reunir representantes de mais de 100 instituições, inclusive da magistratura, de acordo com o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto. A passeata vai sair da sede da OAB e terminar no Congresso, onde um manifesto será entregue ao presidente da Câmara, deputado Michel Temer (PMDB-SP).

A PEC 12 foi aprovada pelo Senado e está em tramitação adiantada na Câmara, onde os parlamentares sofrem pressão de governadores e prefeitos. Se a emenda for promulgada pelo Congresso, os governos estaduais e municipais poderão destinar ao pagamento dos precatórios (débitos a serem pagos a pessoas físicas e jurídicas, confirmados por decisões judiciais) apenas 2% e 1,5% de suas receitas líquidas, respectivamente.

O presidente da OAB — na reunião de ontem do Conselho Federal — previu “uma manifestação forte com essa marcha histórica”, já que, pela primeira vez, dirigentes do Judiciário, da advocacia e do Ministério Público estarão juntos “num protesto contra iminente decisão do Legislativo”.

FMI libera US$ 17,1 bi para a Romênia
Autor(es): DOW JONES NEWSWIRES WASHINGTON E ISLAMABAD
Gazeta Mercantil – 05/05/2009

EMPRÉSTIMO

O Fundo Monetário Internacional (FMI) anunciou ontem que aprovou um empréstimo de US$ 17,1 bilhões para a Romênia, disponibilizando imediatamente US$ 6,6 bilhões para o país do Leste Europeu.

O programa de empréstimos com duração de dois anos foi pensado para suavizar os efeitos da queda acentuada de fluxo de capital em meio à crise financeira mundial. Isto também deve dar mais tempo ao país para que consiga reequilibrar suas contas.

O valor do empréstimo é mil vezes maior do que a cota da Romênia para o FMI e foi considerado uma exceção pelo fundo.

“A crise mundial afetou a Romênia gravemente nos últimos meses”, afirmou Jeffrey Franks, responsável do FMI para tratar o caso da Romênia. “O anos de 2009 será um ano difícil e 2010 também deve ser um ano relativamente fraco”, previu.

O FMI estima que a economia da Romênia sofrerá uma contração de 4,1% este ano.

Revisão para o Paquistão

O FMI começou ontem a segunda revisão de um empréstimo no valor de US$ 7,6 bilhões ao Paquistão, disse uma fonte ligada ao governo. Membros da delegação paquistanesa iniciaram conversas com o FMI em Dubai. As negociações acontecerão até o dia 11 de maio, disse o funcionário, que pediu para não ser identificado.

A revisão vai ajudar a abrir caminho para a aprovação da terceira parcela de US$ 850 milhões do FMI. É provável que o conselho administrativo do organismo se reúna no final de maio ou início de julho para uma aprovação final, informou a fonte. O Paquistão recebeu em abril US$ 848 milhões como a segunda parcela de um empréstimo de US$ 7,6 bilhões do FMI. Ele até agora recebeu US$ 3,9 bilhões dentro de uma linha de crédito reserva de 23 meses.

Itaipu: para negociador paraguaio, proposta de alongar divida é ‘piada’
Autor(es): Janaína Figueiredo, Eliane Oliveira e Mônica Tavares
O Globo – 05/05/2009

Brasil pode compensar país vizinho com R$2 bi do BNDES para projetos

A possibilidade de ampliar o prazo para que o Paraguai pague sua dívida referente à construção da hidrelétrica de Itaipu – proposta que estaria sendo estudada pelo governo Lula, segundo o ministro de Minas e Energia Edison Lobão – foi considerada “uma piada de mau gosto” pelo engenheiro Ricardo Canese, coordenador da comissão de negociadores paraguaios.

– Se a proposta do Brasil for simplesmente estender o prazo para o pagamento de uma dívida que consideramos ilegítima, a única coisa que conseguirão será estremecer o relacionamento bilateral – disse Canese, às vésperas de um encontro entre os presidentes Lula e Fernando Lugo, em Brasília.

Lobão diz que Brasil não negocia sob pressão

O presidente do Paraguai desembarcará em Brasília na quinta-feira. Segundo Lobão, nesta rodada de negociações o Brasil poderia propor estender o prazo para o pagamento da dívida paraguaia de 2023 para até 2040.

– São piadas de mau gosto. Nenhum governo paraguaio aceitaria sequer discutir essa proposta – disse Canese ao GLOBO, por telefone.

Para o governo Lugo, a dívida de Itaipu, estimada em US$19,6 bilhões, deveria ser paga por empresas elétricas brasileiras: Furnas e Eletrosul. Lobão, por sua vez, disse ontem que o Brasil não negocia sob pressão.

– O presidente Lula quer ter uma liderança diferente na região, mas Lobão vem de um partido que respaldou a ditadura, tem uma posição mais dura. Seria uma grande decepção se o Brasil insistisse em manter os termos de um tratado da ditadura – afirmou Canese.

Lugo não deve sair de mãos vazias do encontro. Mesmo que o governo brasileiro não concorde em revisar o tratado de Itaipu nos moldes reivindicados por Lugo, não interessa a Lula ver o governo paraguaio fragilizado.

Para não revisar o tratado, assinado na década de 70, o governo brasileiro prefere oferecer outros benefícios para compensar o alto nível de ambição do Paraguai, que inclui até mesmo o perdão de parte da dívida do país com o Brasil, estimada em cerca de US$18 bilhões. Estão sendo cogitados, por exemplo, quase R$2 bilhões do BNDES para projetos do setor produtivo, sobretudo o energético.

Notícias diárias comentadas sobre a dívida – 04.05.2009

O Jornal Valor Econômico traz longa matéria sobre a posição paraguaia de contestar a dívida com o Brasil, referente à construção da Usina de Itaipu. Esta dívida é devida por Itaipu (empresa binacional, metade brasileira e metade paraguaia) ao governo brasileiro. O Paraguai se baseia em ilegalidades e ilegitimidades constatadas neste endividamento, como juros abusivos, superfaturamento na obra, dentre outras. Cabe ressaltar, neste tema, que uma eventual anulação da dívida de Itaipu com o Brasil não prejudicaria o povo brasileiro, pois os recursos pagos pelo Paraguai ao governo brasileiro são, em sua maior parte, destinados ao pagamento da questionável dívida pública federal brasileira com o setor financeiro. Na realidade, a anulação total ou parcial da dívida de Itaipu com o Brasil permitiria a redução dos custos de Itaipu, possibilitando, portanto, a redução das tarifas de energia elétrica (conforme artigo do Boletim Auditoria Cidadã nº 19).

A Gazeta Mercantil noticia a queda do superávit primário, anunciada recentemente pelo governo. Conforme comentado em edições anteriores desta seção, isto não significa que o governo tenha alterado sua política com relação ao endividamento. Em primeiro lugar, o superávit ocorrido (em % do PIB) nos 12 meses terminados em março deste ano ainda é superior ao terminado em agosto de 2002, último ano do governo FHC. Em segundo lugar, a queda no superávit não significa uma redução nos gastos com o endividamento, que continua sangrando os preciosos recursos públicos, gerando grandes e crescentes déficits orçamentários. E por último, o próprio Banco Central admite que o governo conseguirá cumprir a meta de superávit anterior, para o primeiro quadrimestre de 2009.

O Jornal O Estado de São Paulo mostra que os bancos nacionais, principalmente os privados, destinaram grande parte de seus recursos para a compra de títulos públicos, pois representam investimento garantido em meio à crise. Ou seja: a dívida pública representa um nó no sistema de financiamento do setor produtivo nacional, o que impede o investimento e a geração de novos postos de trabalho.

O Valor Econômico traz coluna de Luiz Sérgio Guimarães, que mostra como o Banco Central promove operações que beneficiam os investidores estrangeiros. O mesmo jornal também noticia que a queda nas taxas de juros americanas aumenta o ganho do investidor estrangeiro que aplica na dívida brasileira. Estes investidores geralmente tomam empréstimos nos EUA para aplicar em títulos brasileiros, obtendo o lucro fácil gerado pelo diferencial das taxas de juros, às custas do povo brasileiro.

A Folha de São Paulo traz matéria que mostra como o rentismo está instalado na cultura dos investidores, acostumados aos juros altos e ao ganho fácil com a dívida pública. As empresas “produtivas” também aplicam boa parte de seu capital em títulos públicos. A notícia também traz estudo que mostra que os juros da dívida interna somaram R$ 1,447 TRILHÃO desde julho de 1994 a fevereiro de 2009. Os recursos anuais do “Bolsa Família” correspondem a apenas um mês de juros da dívida. Porém, a reportagem, ao final, cita estudo já criticado na edição de 20/04/2009 desta seção, que dá a entender que os gastos com a dívida estariam em queda, enquanto os gastos com pessoal estariam ficando com esta fatia do orçamento.

O Jornal O Globo mostra que desde o início da “Lei de Responsabilidade Fiscal”, em 2000, os estados limitaram os gastos com pessoal em 49% da Receita Corrente Líquida (RCL), e o estoque do endividamento em duas vezes a RCL. A notícia diz ainda que a renegociação (“assunção”) das dívidas dos estados pela União foi determinante para esta suposta trajetória de “sustentabilidade fiscal”. Porém, na prática, como os estados obtiveram estes indicadores? Cortando gastos sociais, limitando os gastos com pessoal (o que inclui médicos, professores, etc, ou seja, pessoas fundamentais para os serviços públicos essenciais à população), de modo a permitir o aumento brutal dos pagamentos da dívida à União, reduzindo-se a relação dívida/RCL. Em suma: esta suposta “sustentabilidade fiscal” imposta pela LRF na realidade significa cortes de direitos fundamentais das pessoas, para que seja garantido o pagamento de uma questionável dívida, pois esta cresceu devido às altas taxas de juros estabelecidas pela esfera federal.

O Estado de São Paulo traz mais uma consequência deste ajuste fiscal dos entes federados às custas do sacrifício dos trabalhadores. Artigo de Fabio Oliveira alerta sobre os efeitos da Proposta de Emenda Constitucional 12/2006, que limita o pagamento de precatórios estaduais e municipais, ou seja, dívidas da Fazenda Pública com pessoas que venceram ações judiciais contra o Estado, geralmente trabalhadores. Cabe ressaltar que, por outro lado, os pagamentos das dívidas dos estados e municípios com a União (pagamentos esses destinados pela União ao pagamento de sua própria dívida com o setor financeiro) continuam intocáveis e sequer são colocados em debate.

Cabe perguntar: por que dois pesos e duas medidas? Por que não se pode sequer discutir a questionável e vultosa dívida financeira dos estados e municípios (que consome em alguns casos mais de 17% da RCL de vários entes federados), mas se pode calotear, por Emenda Constitucional, as dívidas legítimas e já julgadas com os trabalhadores, limitando-se seu pagamento a até 2% da RCL?

Por fim, o Jornal O Estado de São Paulo traz artigo de Marcelo de Paiva Abreu, sobre a injustiça que impera no mercado financeiro internacional: enquanto alguns (os países ricos) pagam a dívida na própria moeda que podem emitir, outros (o 3º Mundo) têm de realizar superávits no Balanço de Pagamentos para dispor de “moeda forte” para pagar a dívida. O artigo mostra como os países ricos já promoveram grandes calotes, enquanto o 3º Mundo leva o rótulo equivocado de “caloteiro”. O artigo mostra também que a ajuda estatal trilionária aos bancos e empresas falidos nos países do 1º Mundo provoca grande aumento na dívida destes países.

PARAGUAI CONTESTA DÍVIDA DE US$ 4,19 BI COM ITAIPU
PARAGUAI REJEITA PROPOSTAS PARA ACORDO SOBRE ITAIPU
Autor(es): Daniel Rittner
Valor Econômico – 04/05/2009

O governo do Paraguai rejeitou a última proposta brasileira para um acordo nas negociações da usina hidrelétrica de Itaipu e já montou as principais linhas de argumentação para um eventual pedido de arbitragem em corte internacional. A base da contestação está na suposta “ilegitimidade” da dívida assumida na década de 1970 para construir a hidrelétrica. O presidente Fernando Lugo e seus auxiliares diretos, que chegam quinta-feira ao Brasil, estão convencidos que pelo menos US$ 4,193 bilhões da dívida – em valores de 1996, sem atualização – são irregulares.

O engenheiro Ricardo Canese, principal negociador Lugo para Itaipu, disse ao Valor ter “esperança” de celebrar um acordo com o Brasil até o fim de 2009, mas confirmou a intenção paraguaia de recorrer à arbitragem internacional se não conseguir um entendimento. Canese ressaltou que o Paraguai não aceita um reajuste “tão pequeno” do valor que a Eletrobrás se dispõe a pagar pela energia de Itaipu.

O governo brasileiro ofereceu um aumento de US$ 45 para US$ 47 por megawatt-hora (MWh) pela eletricidade que o país vizinho tem direito e não usa. Isso geraria receita adicional de US$ 115 milhões anuais ao Paraguai. Além disso, o Itamaraty e o BNDES prometeram até US$ 1,5 bilhão no financiamento de projetos, segundo Canese. Para ele, essa oferta será analisada à parte e não influenciará as discussões de Itaipu. “Temos propostas do BID e de outros países. Se for vantajoso, aceitaremos, mas não tem a ver com a negociação de Itaipu.”

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva orientou a equipe do Ministério de Minas e Energia a estudar uma nova proposta, mas o negociador paraguaio frisou que, mesmo às vésperas de nova rodada de discussões, não recebeu nenhum sinal de avanço.

A argumentação de “ilegitimidade” a que se refere Canese tem base em documentos de 1985 e 1986, segundo ele, quando a Eletrobrás e a diretoria financeira de Itaipu Binacional calcularam a necessidade de uma tarifa de US$ 17 por kWmês, “de forma constante e até 2023” (quando o tratado bilateral deverá ser revisado), para a amortização da dívida. No entanto, sustenta Canese, as estatais Furnas e Eletrosul fixaram à época uma tarifa de US$ 10 kWmês, abaixo dos custos da hidrelétrica e impediram a queda da dívida do ritmo projetado.

O assessor de Lugo aponta ainda que entre 1988 e 1990, por estar produzindo toda a energia necessária para atender à demanda nacional, o Brasil deixou de contratar a potência instalada de Itaipu, contrariando obrigatoriedade definida pelo tratado firmado em 1973. Essas duas medidas teriam acarretado a dívida “ilegítima” de US$ 4,193 bilhões.

O Paraguai também pode denunciar o artigo 9 do tratado. Na avaliação dos vizinhos, ele gera dúvidas ao estabelecer que os recursos necessários à construção e operação da usina “serão supridos” pelas partes contratantes ou “obtidos pela Itaipu mediante operações de crédito”. Para os paraguaios, se o endividamento da binacional foi tomado junto às próprias partes contratantes, é condenável a incidência de juros sobre ela. Canese, entretanto, critica as taxas usadas – de 12% ao ano ou mais, sempre superiores à Libor – e alerta sobre evidências de “muito” superfaturamento na construção da hidrelétrica. “Temos conhecimento que houve.”

Hoje a dívida total de Itaipu está em cerca de US$ 18 bilhões. A usina tem potência instalada de 14 mil megawatts (MW), depois da recente instalação de mais duas turbinas, e entrega anualmente 75 mil GWh de “energia assegurada” – ou seja, com menos de 5% de falha no suprimento, devido a secas e esvaziamentos do reservatório. Essa energia é vendida por US$ 41,6/MWh.

A tarifa não dá lucro nem prejuízo à binacional. É suficiente apenas para pagar o serviço da dívida, os gastos de operação e os benefícios (royalties e ressarcimentos). Como o Paraguai consome somente 5% de toda a energia gerada por Itaipu, embora tenha direito à metade dela, exporta o restante ao Brasil. Por isso, além dos US$ 41,6/MWh, recebe mais US$ 3,1/MWh a título de “compensação”, o que totaliza praticamente US$ 45 por MWh.

Além da energia assegurada, a hidrelétrica gerou, nos últimos dez anos, uma média de 15 mil GWh de “energia adicional”. Ela não é contabilizada pelas autoridades do setor elétrico para garantir o suprimento de eletricidade, já que pode não ser produzida em função do volume de armazenamento do reservatório, mas é sempre exportada para o Brasil quando está disponível.

Pela energia adicional, a Eletrobrás paga US$ 5,2/MWh em benefícios (royalties e ressarcimentos) e US$ 3,1/MWh pela parte paraguaia, totalizando US$ 8,3 por MWh. O Paraguai quer igualar o valor das duas modalidades e, em nome de uma “compensação justa”, busca o preço praticado no mercado regulado brasileiro. Canese calcula que isso pode elevar em US$ 800 milhões a receita anual do país. Por outro lado, se a dívida for reduzida à metade, reconhecendo-se sua parte “ilegítima” e mantendo-se a tarifa atual, o Paraguai elevaria em US$ 1,3 bilhão sua arrecadação com a venda de sua energia para o Brasil.

“Para que a compensação seja justa, o preço deve ser o do mercado regulado do Brasil e o serviço da dívida não pode incluir a sua parte ilegítima”, argumenta Canese. O impacto para o consumidor brasileiro será de US$ 3/MWh, calculam os paraguaios.

Para comparação, o preço do MWh da usina de Jirau, no rio Madeira, será de R$ 71,4 – cerca de US$ 33 na cotação atual – quando ela entrar em funcionamento, em 2013. O Paraguai alega que, construindo uma linha de transmissão ao Chile, cuja matriz elétrica é essencialmente térmica, já recebeu sinalizações de que o país andino estaria disposto a pagar até US$ 120/MWh. Em resposta, o governo brasileiro disse que não pode pagar mais pelo preço da energia de Itaipu, segundo Canese, inclusive porque ela é mais cara do que a futura eletricidade do rio Madeira.

Na sua busca por “soberania hidrelétrica”, o governo do Paraguai quer liberdade para vender metade da energia de Itaipu a qualquer país, dando ao Brasil apenas um “direito de preferência”. Canese, no entanto, ressalta que está adotando uma postura de flexibilidade e aceita atingir seu objetivo “gradualmente”: no início, podendo exportar livremente somente sua cota de energia adicional, chegando à liberdade total em 2023, ano em que está prevista a revisão do Tratado de Itaipu. A partir de então, também a energia assegurada poderia ser vendida a países como Argentina e Chile, nas pretensões do presidente Lugo e sua equipe.

O Paraguai pleiteia nomear o diretor técnico e o diretor financeiro de Itaipu Binacional, o que tem sido uma prerrogativa do Brasil nos últimos 35 anos. “Seria um gesto muito apreciado por aqui”, diz Canese, confiante na boa vontade de Lula para avançar nas negociações e chegar a um acordo. Mudanças no tratado, segundo o paraguaio, não são necessárias. “Basta a sua correta interpretação”, conclui Canese.

O Paraguai também “exige” a construção de uma subestação de energia e obras de navegação que propiciem o restabelecimento do tráfego hidroviário interrompido pelo reservatório. A respeito do pacote de US$ 1,5 bilhão do BNDES para financiar projetos de infraestrutura e a abertura de um fundo de desenvolvimento de US$ 100 milhões, Canese é taxativo: “Não vamos confundir isso com as discussões de Itaipu.”

Superávit primário recua para 3,29% do PIB em março
Gazeta Mercantil – 04/05/2009

A redução da meta do superávit primário de 3,8% para 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB) proposta pelo governo ainda não está valendo oficialmente, mas o setor público já está gastando mais e, na prática, trabalha com os novos objetivos. O superávit primário dos últimos 12 meses encerrados em março foi de apenas R$ 95,915 bilhões, ou 3,29% do PIB. A meta original estabelece superávit primário de 3,8% do PIB e esse objetivo continua valendo enquanto o Congresso Nacional não aprovar o novo texto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2009. As mudanças foram propostas pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, em 15 de abril. Já o déficit nominal do setor público nos 12 meses terminados em março foi de apenas R$ 65,162 bilhões, o pior resultado desde dezembro de 2006, quando o fluxo em 12 meses apontava para saldo negativo de R$ 69,883 bilhões.

Os dados das contas públicas consolidados foram divulgados na última quinta-feira pelo chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Altamir Lopes. O déficit nominal acumulado em 12 meses vem crescendo gradativamente nos últimos meses, atingindo 2,23% do PIB no final do mês passado, o pior resultado desde março de 2007, quando foi de 2,43% do PIB. Em outubro de 2008, o déficit nominal ao final de 12 meses era de R$ 31,093 bilhões, o que representava 1,09% do PIB.

O resultado primário representa a economia do setor público, medida pelo total de receitas e despesas, excluindo gastos com pagamento de juros da dívida. O superávit de R$ 95,915 bilhões em 12 meses ao final de março foi o menor desde dezembro de 2006, quando houve resultado de R$ 90,144 bilhões. Em relação às riquezas produzidas pelo País, o índice de 3,29% do superávit primário em março foi o menor desde agosto de 2002, quando atingiu a marca de 3,14% do PIB.

As despesas com pagamento de juros em 12 meses somaram R$ 161,076 bilhões ao final de março, ou 5,52% do PIB. Os gastos com juros aumentaram em relação a fevereiro (quando foi de R$ 158,386 bilhões ou 5,44% do PIB), mas apresentam tendência de queda, destacou Lopes. É um reflexo da queda das taxas exigidas na rolagem.

Dados referentes exclusivamente a março indicam que o pagamento de juros consumiu R$ 14,103 bilhões, o pior resultado para esse mês desde o início da série, em 1991. “O aumento dos gastos com juros decorre de uma base que se amplia todo mês, mais o efeito do câmbio, já que o real teve apreciação de 2,66% no período”, explicou o executivo do BC.

Segundo Lopes, ativos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) sofrem efeito prejudicial quando o real se valoriza perante o dólar. O total da Dívida Líquida do Setor Público (DLSP) chegou a R$ 1,098 trilhão ao final de março, representando 37,6% do PIB (frente 37,1% do PIB em fevereiro). Lopes destacou que apesar do aumento, a dívida ainda mantém-se em patamares administráveis. Em dezembro de 2007, por exemplo, a DLSP somara R$ 1,150 trilhão, representando 42% do PIB.

Apesar da retração dos números quando considerados os fluxos em 12 meses, o superávit primário de março atingiu R$ 11,614 bilhões, portanto foi menor que o de igual mês do ano passado (R$ 15,403 bilhões), mas ainda assim maior que o de março de 2007 (R$ 7,138 bilhões). “O resultado foi bom, a despeito da redução de receita, que é natural neste momento de crise”, disse Lopes. O déficit nominal do período foi de R$ 2,489 bilhões.

O bom resultado primário de março deve-se à concentração de recolhimento de receitas no período, como os recolhimentos do ajuste do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Em outros anos, esses recolhimentos eram feitos de forma pulverizada, mas em 2009 as empresas deixaram para fazer esses pagamentos em março (que era o prazo final), e isso gerou um efeito extraordinário de arrecadação no período. Em relação a fevereiro deste ano, destacou Lopes, ocorreu uma elevação de R$ 6,6 bilhões no recolhimento de receitas, enquanto que as despesas cresceram R$ 1 bilhão, o que deu fôlego para o forte superávit primário.

Apesar de ter anunciado a redução da meta do superávit primário já para 2009, a regra ainda não está valendo. Isso significa que o governo central e as estatais terão de cumprir o objetivo estabelecido na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) original, o qual determina geração de uma economia de R$ 19 bilhões no primeiro quadrimestre. Mas isso não será difícil, explicou Lopes, pois entre janeiro e março já foi acumulado um superávit primário de R$ 12,535 bilhões.

“O que falta para cumprir a meta é R$ 6,475 bilhões em abril”, disse o chefe do departamento econômico do BC, destacando que considera o objetivo perfeitamente exequível. No entanto, será necessário fazer praticamente metade da economia de março.

Crédito público atinge 37,6% do total
Autor(es): Sergio Gobetti, Adriana Fernandes e Fernando Nakagawa
O Estado de S. Paulo – 04/05/2009
– 04/05/2009

Com política agressiva, Caixa e Banco do Brasil aproveitam a crise para ganhar espaço dos bancos privados

Os bancos públicos federais aproveitaram a crise financeira internacional para acelerar uma estratégia de crescimento e superação do setor privado. Nos últimos 12 meses, a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil (BB) entraram em nichos de negócio antes não explorados e ajudaram o setor público a avançar de 34,1% para 37,6% do volume global de operações de crédito do País.

A Caixa, que sempre foi identificada com o financiamento habitacional, pagamento de funcionários públicos e abraçava os pequenos poupadores e a população de baixa renda, ganhou um banco de investimentos para comprar participação em outras empresas, a CaixaPar, e entrou mais pesado no mercado de crédito para médias e grandes empresas, financiamento de automóveis e de eletrodomésticos. Na semana passada, anunciou que vai financiar viagens.

O Banco do Brasil, que conta com acionistas privados, mudou de direção, entrou no mercado imobiliário, de automóveis, eletrodomésticos e agora está submetido a um “contrato de gestão informal” com metas para redução dos juros dos seus empréstimos, como definiu o ministro da Fazenda, Guido Mantega, ao anunciar a substituição de Antonio Lima Neto por Aldemir Bendine no comando do instituição.

Essa expansão dos bancos públicos é explicada em grande parte pela inércia dos seus concorrentes privados, que, com medo da crise, pararam ou desaceleraram o ritmo de concessão de novos empréstimos, abrindo caminho para a Caixa e, principalmente, o BB.

Tradicionalmente especializados em nichos de operações de crédito, como habitação (Caixa) e agronegócios (BB), os dois bancos passaram a atrair pessoas físicas com o dinheiro que acabaram sugando de instituições privadas de porte médio durante a crise.

Os balanços do BB do ano passado dão a medida das mudanças. Entre junho e agosto de 2008, o banco captava cerca de R$ 12 bilhões em novos depósitos por mês. Em setembro, esse volume pulou para R$ 24 bilhões e, em outubro, para R$ 36 bilhões. No ano fechado, o BB conseguiu ampliar seu volume de depósitos de R$ 180,2 bilhões para R$ 246 bilhões.

“Tivemos um volume enorme de liquidez voando para dentro do BB”, diz o gerente de Relações com Investidores do banco, Marco Geovanne Tobias.

Seus principais concorrentes privados, Bradesco e Itaú-Unibanco, também “roubaram” depósitos dos bancos médios e terminaram 2008 com R$ 145,2 bilhões a mais. Mas, ao contrário do BB, aplicaram grande parte desse dinheiro em títulos públicos, com ganhos altos e sem risco. As aplicações dos dois conglomerados em títulos (públicos e privados, além de derivativos) cresceram R$ 104,7 bilhões no ano passado.

O BB, ao contrário, aposta suas fichas em operações de crédito. Em 2002, por exemplo, o banco possuía uma carteira de R$ 67,8 bilhões de títulos e apenas R$ 62,9 bilhões de operações de crédito. Em 2008, o volume de títulos continuava em R$ 70,9 bilhões, mas as operações de crédito já haviam pulado para R$ 224,8 bilhões. Ou seja, hoje o BB tem um volume de empréstimos 3,1 vezes maior do que sua carteira de títulos. No Bradesco, essa relação é de 0,84, e no Itaú-Unibanco, 1,7.

Na Caixa, apesar da expansão da carteira de crédito, ela ainda representa 67% do volume de títulos e valores mobiliários em decorrência da reestruturação realizada em 2001, o que obrigou o banco a absorver notas e letras financeiras do Tesouro. De 2007 para 2008, entretanto, a carteira de títulos da Caixa ficou praticamente inalterada. O volume de crédito (60% direcionado) cresceu de R$ 57,4 bilhões para R$ 81,8 bilhões. “Isso é o que tem de acontecer. O banco tem de viver de empréstimos, e não de papéis”, diz o vice-presidente de Finanças da Caixa, Márcio Percival.

A estratégia de priorizar empréstimos tem originalmente uma motivação comercial, pois – apesar do risco – possibilita maiores ganhos aos bancos, mas também atende aos propósitos políticos do governo Lula, que quer um sistema financeiro mais líquido, que financie o consumo de massas e faça a economia crescer.

“A estratégia de crescimento do crédito seria implementada no longo prazo, com base na perspectiva de queda da taxa de juros, mas a crise permitiu que a gente acelerasse, aproveitando a letargia dos concorrentes”, resume Tobias, do BB.

Isso não significa que essa estratégia comercial seja aplicada sem choques com o governo. Além da expansão do crédito, o governo quer que os bancos públicos contribuam para a redução da taxa de juros na ponta, enquanto os executivos das instituições pensam no lucro.

Com maior volume de empréstimos, entretanto, os técnicos dos bancos públicos admitem que é possível reduzir o spread. “O sistema financeiro tem custos elevados, mas nada que justifique esse spread”, diz Percival, da Caixa. “Precisamos ampliar a concorrência.”

Crise amaina e fundo aposta a favor do real
Por dentro do mercado – Luiz Sérgio Guimarães
Valor Econômico – 04/05/2009

Após suportarem perda acumulada de 8,14% em março e abril, os investidores estrangeiros finalmente desistiram de suas posições “compradas” em dólar futuro, mantidas desde o agravamento da crise, em setembro. A reversão de “comprado” para “vendido” em dólar futuro por parte dos hedge funds internacionais – mais um sinal de arrefecimento da crise – ocorreu oficialmente no pregão de quinta-feira. O total carregado pelo capital estrangeiro passou de “vendido” em US$ 48,95 milhões para “comprado” em US$ 665,45 milhões. Os fundos externos apostaram a favor do dólar e contra o real durante os últimos oito meses. Nos seis primeiros – de setembro a fevereiro – os lucros foram fantásticos. No período, o dólar disparou 45,22%. Mas a situação começou a se inverter em março. Os hedge funds iniciaram março com aposta recorde de US$ 9,07 bilhões contra o real, mas ela foi muito malsucedida e a moeda americana caiu no mês 2,19%. A derrocada do dólar se intensificou em abril, com desvalorização de 5,82%. Foi o bastante para os fundos. Resolveram “realizar” os lucros e sair da posição. E irão iniciar maio apostando a favor do real.

A reversão foi facilitada pela posição que o Banco Central decidiu assumir nas duas viradas de mês mais recentes. Como as instituições rejeitam os swaps cambiais em carteira – uma vez que, por serem títulos que rendem a variação cambial menos a taxa Selic, impõem perdas desde março -, o BC não está rolando a totalidade desses papéis. No começo de abril resgatou US$ 3,6 bilhões e hoje entregará outros US$ 3,7 bilhões. Vale dizer que, em dois meses, o BC assumiu posição “compradora” de dólar no mercado futuro equivalente a US$ 7,3 bilhões. Como surgiu este grande “comprador” no mercado, os hedge funds puderam se desfazer de suas posições e assumir o lado “vendido”.

A tendência é de ampliação dessas apostas a favor do real, mas tudo dependerá dos próximos desdobramentos da crise externa (atenção à divulgação hoje do teste de estresse de bancos americanos). Se os capitais voltarem, o BC não deve, na opinião do diretor da NGO Câmbio, Sidnei Nehme, reincidir no erro cometido no passado de permitir operações que provoquem uma exagerada apreciação do real. “O BC deve limitar a sua intervenção ao mercado à vista, onde há a efetiva sinalização do que ocorre em termos reais, comprando os excedentes e suprindo as faltas”, diz. O BC deve evitar a tentação de atuar na mão oposta, a da venda de contratos de swaps cambiais reversos. “Como não há razão para movimentos mais acentuados no mercado futuro que não sejam os de hedge verdadeiro, tudo o mais será especulação e não cabe ação por parte do BC. A sua ausência é mais eficaz para contê-la do que a sua interferência”, diz.

O evento doméstico mais ansiosamente aguardado nesta primeira semana de maio será a publicação, na quinta-feira, da ata da reunião do Copom realizada no dia 29. O analistas querem que o documento confirme a impressão inicial extraída da sucinta nota emitida ao término da reunião. Apesar do tom descomprometido do comunicado – “Avaliando o cenário macroeconômico e visando ampliar o processo de distensão monetária, o Copom decidiu reduzir a taxa Selic para 10,25% a.a., sem viés, por unanimidade” -, analistas entenderam que o Copom sinalizou não só a diminuição do ritmo de queda para 0,50 ponto como a vontade de realizar apenas mais dois cortes, nas reuniões de 10 de junho e 22 de julho. Após este extraordinário exercício de imaginação criativa, concluíram que a Selic será congelada em 9,25%. A única afirmação clara da nota, a de que o Copom “ampliou a distensão monetária”, não corresponde aos fatos. Na verdade, ele diminuiu a distensão monetária, ao reduzir de 1,5 para 1 ponto o ritmo de queda da Selic. A ata, seja lá o que dizer, irá confirmar o veredicto de piso de 9,25%. E também outro: o de que, seja lá o que acontecer com a economia brasileira, a Selic subirá em 2010.

Para o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, o argumento de que a Selic deve cair mais devagar para evitar que suba em 2010 não faz sentido. “Subir em algum momento ela vai precisar. Se se condiciona esse fator para 2010 ficamos com a impressão de intenções políticas de manter a qualquer custo a Selic baixa no ano que vem. Vale a oportunidade novamente que o BC tem de ser mais agressivo na queda da Selic nesse momento, sem ilações sobre quando precisará subir novamente, pois é óbvio que em algum momento a curva de juros se inverterá”, diz ele.

Venda de bônus de emergentes dispara com retorno recorde
Autor(es): Fábio Alves e Laura Cochrane
Valor Econômico – 04/05/2009

Os países em desenvolvimento venderam mais bônus este mês do que em qualquer período desde junho do ano passado, atraindo os investidores internacionais com rendimentos recorde e seguros contra perdas.

Os US$ 23,8 bilhões comercializados em títulos em abril elevam o total de 2009 para US$ 54 bilhões, 69% mais do que o total do mesmo período do ano passado, segundo dados reunidos pela Bloomberg. O retorno adicional para bônus corporativos dos mercados emergentes se ampliou para 7,7 pontos percentuais acima do pago pelos bônus do Tesouro dos EUA, em relação ao diferencial de 4 pontos percentuais registrado em setembro do ano passado, segundo revelam os índices do JPMorgan Chase.

“Estou verdadeiramente surpreso com o afluxo de bônus”, disse Ivan Ivanchenko, lotado em Moscou, diretor mundial de estratégia de pesquisa do braço de investimentos do VTB Group, o segundo maior banco da Rússia. “Neste universo de taxa de juro zero, em que o dinheiro não está rendendo nada, as pessoas estão, nitidamente, procurando algum lugar para pôr os investimentos para trabalhar.”

A JBS SA, sediada em São Paulo, a maior produtora mundial de carne bovina, pagou um recorde de 1.114 pontos-base em retorno adicional em relação aos bônus do Tesouro dos EUA para tomar US$ 700 milhões emprestados este mês, mais que o dobro que o ágio de risco da captação anterior, em 2006. A República Tcheca pagou aos investidores 190 pontos-base a mais que a taxa do swap médio referencial por seus eurobônus esta semana, o maior diferencial de todos os tempos e correspondente a oito vezes mais que o de dez meses atrás.

Os tomadores também estão assegurando os investidores contra potenciais prejuízos. A Telemar Norte Leste SA, do Rio de Janeiro, prometeu pagar aos detentores de bônus 101 centavos de dólar por dólar de valor de face do papel no caso de uma aquisição desencadear uma redução da classificação de crédito da empresa. A OAO Gazprom, sediada em Moscou, deu aos compradores a opção de resgatar bônus de dez anos depois de três anos.

As vendas de bônus dos mercados emergentes se recuperaram em relação à sua queda vertical, de 65%, observada no segundo semestre de 2008 em relação ao ano anterior, depois que o colapso do Lehman Brothers Holdings Inc. e a recessão mundial empurraram os investidores para a compra de bônus do governo dos Estados Unidos. Os mercados emergentes estão atraindo investidores depois que o Federal Reserve reduziu sua taxa de juro básica para a faixa de 0 a 0,25% e o Japão cortou seus juros para 0,1%.

“Vírus do rentismo” resiste à queda do juro
Autor(es): MARCIO AITH
Folha de S. Paulo – 04/05/2009

Redução da Selic expõe reação de investidores acostumados a obter do governo ganhos financeiros altos e seguros

Em um primeiro momento, os empresários e a classe média perdem mais do que ganham com a diminuição da taxa básica de juros

A Selic, taxa básica de juros da economia brasileira, está em seu menor patamar desde a criação do Real, em 1994. Tal fato deveria restaurar um mercado de crédito barato, beneficiando empresas e pessoas. Isso, é claro, a julgar pela conclusão da maioria dos estudos feitos nos últimos 15 anos contra a política de juros do governo. Mas não é o que tem ocorrido.

A queda da Selic tem gerado pouco efeito no custo final de empréstimos, com o qual demonstrou ter pouca correlação. E tem provocado muita resistência da classe média e de setores da economia acostumados a extrair ganhos de juros.
“O vírus do rentismo está encruado de tal maneira na sociedade que não será fácil eliminá-lo”, diz o economista Roberto Giannetti da Fonseca.
“Na verdade, todos nós fomos sócios dos juros altos durante os anos de estabilização incompleta da economia”, diz o ex-ministro Delfim Netto. “Alguns, é claro, foram sócios majoritários. Mas não será fácil desfazer a sociedade.”

Poupança
Prova mais visível dessa resistência é o medo do governo em mudar as regras da caderneta de poupança. Com a queda da Selic, a poupança, que tem regras fixas de rentabilidade (0,5% ao mês mais Taxa Referencial, a TR), ficou mais atraente do que os fundos, que pagam juros e são lastreados em títulos públicos.
O governo quer reduzir a rentabilidade do investimento por dois motivos. Primeiro, para adaptá-lo ao cenário de juros menores. Nenhum outro país tem aplicações que rendem 6% por ano, livres de imposto e taxas, como a poupança.
A mudança também teria como objetivo impedir que os investidores comecem a transferir dinheiro dos fundos para a poupança. Se isso acontecer, o Estado terá dificuldades para rolar a dívida pública.
Na última sexta-feira, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, encontrou-se com um grupo de economistas para discutir o assunto.

Elite
Uma das ideias ventiladas é a de manter a taxa de remuneração atual para depósitos abaixo de R$ 100 mil. Esses depósitos, de pequenos poupadores, concentrariam apenas 10% do volume total da poupança.
Para os demais poupadores, que possuem mais de R$ 100 mil (a “elite do rentismo”), a taxa de remuneração ficaria abaixo de 50% da Selic.
A proposta tem vários problemas. Ao tratar investidores com regras desiguais, abriria uma guerra judicial complicada. Além disso, nada impede que um mesmo investidor disperse seu dinheiro em várias contas na poupança, para si ou para outros da mesma família.
“A transferência do dinheiro para a poupança mostra que parte expressiva da sociedade não é assim tão contrária aos juros altos”, diz Alberto Borges Matias, professor titular de finanças da FEA-RP (Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP de Ribeirão Preto).
“O problema não está só na poupança. Grande parte dos ganhos do setor produtivo é hoje financeiro, não operacional. Algumas empresas vão perder. E, para compensarem a perda, podem até elevar seus preços.”
A rigor, as empresas brasileiras mais sofrem do que se beneficiam com o custo alto de capital. No Brasil, a despesa financeira representa 7% da receita líquida do setor não financeiro. No exterior, esse percentual é de apenas 1%.
O problema é que a diminuição da Selic não reduz imediatamente o custo dos empréstimos que as empresas são obrigadas a contrair para fazer investimentos e manter o capital de giro. Em um primeiro momento, portanto, juros menores do governo apenas reduzem parcela dos ganhos financeiros do setor produtivo.
O ex-ministro Delfim diz que o país vive as agruras de um momento difícil de transição. Segundo ele, se a queda da Selic for duradoura, é muito provável que todos se beneficiem. As pessoas terão mais acesso a financiamentos, a prazos mais longos; o custo de capital será mais baixo; as empresas brasileiras serão mais competitivas; e o custo que o governo paga para a rolagem de dívida vai ser menor, liberando investimentos públicos.
Um estudo feito pelos economistas Roberto Giannetti da Fonseca e Pedro Pedrossian Neto, com o apoio do ex-ministro Luiz Gonzaga Belluzzo, mostra o estrago que os juros altos provocaram nas finanças públicas nas últimas décadas.
Desde o advento do Plano Real, em 1994, até fevereiro de 2009, gastou-se cerca de R$ 1,447 trilhão com pagamento de juros da dívida interna líquida do setor público consolidado, o que representa metade do PIB atual de R$ 2,889 trilhões.
Somente desde o início do governo Lula, em janeiro de 2003, já se gastou R$ 885 bilhões em juros da dívida interna, sendo R$ 167 bilhões só em 2008. Apenas para referência, a soma de recursos do programa federal Bolsa Família em 2008 foi de aproximadamente R$ 16,5 bilhões, ou cerca de um mês de serviço da dívida que, em fevereiro, alcançou R$ 1,494 trilhão.
A redução da Selic, portanto, permitiria a liberação de mais recursos para investimentos. Desde, é claro, que o dinheiro liberado seja efetivamente usado para investimentos.

O governo federal gastou praticamente toda a economia que teve com a queda dos juros desde 2006 para reforçar sua própria estrutura e aumentar o salário do funcionalismo público. Entre abril de 2006 e fevereiro de 2009, os gastos anuais do governo central com juros caíram cerca de R$ 40 bilhões. No mesmo período, as despesas com pessoal subiram iguais R$ 40 bilhões, e as de custeio, R$ 26,7 bilhões. Já as despesas de capital -os investimentos propriamente ditos- aumentaram apenas R$ 14,7 bilhões.

Estados reduziram gasto com funcionalismo
O Globo – 04/05/2009

Despesas com custeio subiram, mas contas ainda são favoráveis, aponta estudo do Ipea

Balanços recentes sobre os efeitos da Lei de Responsabilidade Fiscal no controle das contas públicas reforçam a percepção de que as restrições impostas pela legislação tiveram um impacto maior no saneamento das contas dos estados e municípios do que nas finanças da União. O crescimento das despesas de pessoal nos estados foi estancado, na maioria dos casos, embora muitos tenham aumentado o uso de artifícios para se enquadrar nos limites da lei, e ainda recorram à Justiça para questionar esses limites.

Em 2000, sete estados extrapolavam o limite de 49% da Receita Corrente Líquida (RCL) para os gastos com pessoal, relativo ao Executivo. Em 2008, todos os estados estavam abaixo desse percentual, embora Alagoas e o Rio Grande do Norte tenham chegado ao chamado limite prudencial, o que indica que a despesa já representa 95% do limite imposto pela LRF.

Se ultrapassar o limite prudencial, o estado já fica impedido de contratar pessoal ou reajustar salários e precisará reduzir seus gastos no prazo de dois quadrimestres, para impedir sanções maiores, que são a suspensão dos repasses de recursos da União e a contratação de empréstimos.

A adequação da maioria dos estados aos limites impostos pela LRF foi favorecida pelo crescimento da receita tributária, mas, em muitos casos, houve uma redução efetiva das despesas com pessoal, dizem especialistas.

Estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgado em janeiro mostra que, num período de 11 anos, entre 1995 e 2006, os estados elevaram seus gastos de pessoal em apenas 0,34% do PIB. Embora não englobe todo o período de vigência da LRF, a pesquisa reflete os efeitos da lei, confirma um dos seus autores, o pesquisador Marcelo Piancastelli.

Apenas RS teve endividamento acima do limite em 2008

O estudo mostra, por outro lado, o avanço dos gastos de custeio dos estados, que pularam de 1,1% para 6,09% no período, em parte como escape usado pelos estados para se enquadrar nos limites de gastos de pessoal – na contratação de servidores terceirizados, por exemplo.

Mesmo com esse aumento, a análise das contas estaduais mostra um ajuste considerável decorrente dos efeitos da Lei Fiscal.

– Alguns estados têm problemas, mas, no conjunto, estão respondendo muito bem ao esforço de ajuste – observa Piancastelli.

Outro indicativo que reforça essa avaliação é a situação dos governos estaduais em relação às dívidas. Enquanto em 2000 sete estados estavam com endividamento acima do limite imposto pela LRF – duas vezes a Receita Corrente Líquida -, em 2008 só o Rio Grande do Sul se encontrava nessa situação, com uma relação de 2,4.

– A sustentabilidade fiscal é consequência da LRF e da renegociação das dívidas de estados e municípios. Isso é inquestionável. Foi um esforço que custou caro e não pode ser desperdiçado – diz o pesquisador do Ipea.

Constitucionalizando o calote
Autor(es): Fabio Ferreira de Oliveira
O Estado de S. Paulo – 04/05/2009

Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 12/2006, que altera profundamente as regras para pagamento de precatórios, constitui a mais arrematada violência à ordem constitucional e merece reação da sociedade.

Não há golpe maior sobre a presunção de solvabilidade do Estado nem ato mais atentatório à dignidade da Justiça do que o que se pretende instituir. Além disso, trata-se de verdadeiro crime contra os credores do Estado! A proposta faz os constitucionalistas vivos se sentirem mortos e revolve, nos túmulos, aqueles já falecidos. Viola a partição do poder, elimina qualquer possibilidade de que nos apresentemos como um país sério, consagra a insegurança jurídica e pressupõe a vida eterna dos credores.

Sob pretexto de instituir uma nova sistemática para o pagamento de precatórios, entusiasmados representantes dos Poderes Executivos, em suas três esferas, conseguiram aprovar no Senado da República a proposta de constitucionalização do calote, obtida com a óbvia exclusão dos principais interessados – os credores do Estado, munidos de decisões judiciais transitadas em julgado, ou, dito melhor, daqueles que ingressam na “história” como vítimas.

A barbárie das disposições propostas é inominável. A Constituição atual, em 1988, já determinou o parcelamento em oito anos dos precatórios então pendentes de pagamento. Posteriormente, a Emenda 30/2000 parcelou em mais dez anos o estoque da dívida pendente na promulgação e daquela oriunda das ações iniciadas até 31 de dezembro de 1999. Agora, depois de ter multiplicado por dez o já inadmissível prazo para cumprimento das condenações judiciais transitadas em julgado, depois de alterar o texto constitucional, já de origem vergonhoso, a proposta fraciona os pagamentos em porcentuais incidentes sobre a “despesa primária líquida do ano anterior”.

Para a União, os Estados e o Distrito Federal, o pagamento de dívidas judiciais será limitado a 2% da tal “despesa primária”. Para os municípios o limite é ainda mais inadmissível: 1,5%.

Trata-se de matemática demoníaca dos gestores do Estado. Sabem multiplicar prazos de pagamento, dividi-los em parcelas, somar resistências e subtrair direitos. Criou-se um “precatório dízima periódica”, com frações infindas.

Fazer pouco do Poder Judiciário é outro resultado da proposta. Não importa que haja condenação transitada em julgado. O gestor provisório da administração pública impõe ao Estado juiz a sujeição de suas decisões ao alvedrio do condenado. Torna o juiz um mero referencial da lei.

A PEC 12 cria limites ao cumprimento de decisões judiciais, que somente dentro de tais parâmetros têm de ser obedecidas pelos entes federativos! Mais do que isso: quanto menores as despesas dos governos, gerando teórico superávit em suas contas, menos eles terão de pagar a seus infelizes credores. É indispensável que se lembre, ademais, que o direito dos desafortunados credores do Estado já experimentou vilipêndios bastante graves.

Agora, no entanto, vai-se além. Depois de mitigar a ordem judicial que determina o pagamento de quantia líquida e certa, esvaziando assim a atribuição constitucional do Poder Judiciário e escandalizando os que ainda creem na tripartição dos Poderes, a proposta impõe um leilão de créditos, conduzido por instituições financeiras, de forma que, quanto mais necessitados os credores, menor parcela de seu crédito receberão.

Dos ínfimos porcentuais destinados ao pagamento das dívidas, 70% serão utilizados “para leilões de pagamento à vista” (parágrafo 4º, inciso II), independentemente da ordem cronológica dos respectivos títulos.

Com tal disponibilidade, certamente restarão desesperados credores, na dúvida entre a espera ad aeternum ou a rendição ao desmando, à escancarada violação de seu direito creditório judicialmente reconhecido. É cenário com o qual nem o mais contumaz inadimplente devedor privado poderia sonhar.

Além de outras excrescências, talvez o aspecto mais hediondo da medida proposta seja o de, mais uma vez, arrasar a segurança jurídica, tão cara ao desenvolvimento de qualquer nação.

O absurdo é que, quando se trata de dar o calote – talvez “constitucionalizar” o calote fosse a designação mais adequada – em títulos judiciais, não se pensa nas consequências sobre o chamado “risco Brasil”. É inexplicável que um país recentemente alçado à categoria de “investment grade” possa, a par de ser seguro para investimentos e credores de títulos públicos, inadimplir dívidas judicialmente reconhecidas, menosprezando assim o jurisdicionado e o Poder Judiciário.

Para evidenciar o hediondo desequilíbrio no tratamento aos credores estatais, note-se que o Brasil estaria decretando uma moratória sem precedentes em sua História, caso o Poder Executivo ousasse “propor” condições semelhantes às que a PEC 12 impõe aos credores de quaisquer outros títulos de dívida emitidos pelo governo.

Os defensores da PEC dizem querer preservar a capacidade do Estado de investir. O primeiro investimento, porém, poderia ser feito na decência e na retidão do trato não só do dinheiro público, mas principalmente na relação com os cidadãos.

Espera-se que a emenda não frutifique na Câmara dos Deputados, para onde foi remetida no dia 14 de abril. Os advogados, atentos, marcharão com os juízes, membros do Ministério Público e cidadãos de bem, a fim de chamarem a atenção da sociedade, repudiando a ilegítima ruptura da ordem constitucional representada por essa proposta de emenda constitucional.

Calotes de homens brancos
Autor(es): Marcelo de Paiva Abreu
O Estado de S. Paulo – 04/05/2009

Antes do cataclismo econômico de 2007-?, uma extensa literatura sobre a dívida externa soberana das economias emergentes se baseava em visão esquemática excessivamente simplificada. “Virtudes” macroeconômicas estariam assimetricamente distribuídas em escala global. Os critérios de caracterização de comportamento virtuoso ou pecaminoso eram, em muitos casos, discricionários ou baseados em evidência deficiente.

No centro do sistema, um restrito grupo de economias com boa reputação financeira, capazes de se endividar em sua própria moeda no mercado internacional. Na periferia, economias marcadas por “pecado original”, incapazes de se endividar no mercado internacional na sua própria moeda, sujeitas a crises periódicas de balanço de pagamentos e com reputação arraigada de caloteiros reincidentes.

Parecia pouco importante que, feitas as contas, muitas histórias de default na periferia de fato não resultaram em perdas para os credores. Apenas um pequeno número de economias havia sido capaz de transpor a soleira da virtude, deixando para trás um retrospecto financeiro desfavorável: entre elas, as economias do sul da Europa, agora atracadas a economias de melhor reputação, e, quem sabe, o Chile.

Com o derretimento parcial do centro do sistema, a partir do final de 2007, as memórias entorpecidas pela bolha foram avivadas, embora de forma seletiva. Começaram a ser evocados os episódios de abandono do padrão ouro pela Grã-Bretanha, em 1914 e em 1931, e pelos Estados Unidos, em 1933, levando as demais moedas de roldão. E, no entanto, a violação dos direitos de propriedade de detentores de ativos financeiros denominados nas moedas que haviam sido desvinculadas do ouro em 1914 havia sido reconhecida explicitamente pela Corte Internacional de Justiça de Haia, em sentença de 1929, contra o Brasil, determinando que o serviço de empréstimos franceses fosse pago com base em francos de 1914, e não nos francos “Poincaré” de 1928, com um quinto do conteúdo metálico de 1914. Esse entendimento deixou de ser “funcional”, do ponto de vista sistêmico, com o desdobramento da grande depressão na década de 1930.

O governo Roosevelt desvalorizou o dólar em mais de 60%, em relação ao ouro, em 1933, o Congresso dos Estados Unidos aprovou legislação compatível e a Corte Suprema norte-americana, em 1935, considerou legal o pagamento de dívidas em dólares nominais.

A história não acaba aí. A Alemanha havia suspendido, em 1930, os pagamentos de reparações. Em seguida, a França, a Grã-Bretanha e outros países europeus suspenderam o serviço de suas dívidas de guerra com os Estados Unidos. Na Grã-Bretanha, não apenas os tribunais também referendaram o repúdio da cláusula-ouro, como, em 1932, o governo utilizou expedientes truculentos e demagógicos para assegurar o sucesso da reconversão de boa parte da dívida pública para reduzir substancialmente as taxas de juros.

Ao final da 2ª Guerra Mundial, as negociações financeiras anglo-americanas tiveram como corolário a liquidação, em condições desfavoráveis, dos créditos acumulados em Londres, desde o início da guerra, por parceiros comerciais britânicos, muitos deles economias subdesenvolvidas. Só a Índia havia acumulado, até 1946, algo equivalente a quase US$ 60 bilhões atuais.

O retrospecto financeiro das economias no centro do sistema parece mais complexo do que sugeriria uma visão dicotômica separando a virtude, no centro do sistema, dos pecadores renitentes na periferia. No longo prazo, nem mesmo o centro do sistema escapa de pecados mortais. Nesse assunto não há purgatório, apenas diferentes dependências do inferno.

O controle de danos provocados pela crise atual tem resultado em enorme aumento de gastos públicos e da dívida pública no centro do sistema, algo entre 20 pontos porcentuais (p.p.) e 30 p.p. da relação dívida-PIB dos países afetados. O surgimento de pressões inflacionárias a médio prazo será seguramente um importante problema a ser enfrentado, especialmente nas economias com pior retrospecto prévio fiscal.

Há um perigo adicional: o crescimento da dívida aumentará a atratividade de “soluções” inflacionárias para a sua diluição. Seria uma reformatação da derrama decorrente da saída do padrão ouro nos anos 30.

Tudo isso chama a atenção para a necessidade de uma abordagem abrangente em relação à violação de direitos de propriedade, tanto no centro quanto na periferia. Preservação de direitos de propriedade requer elementos básicos, como garantia de propriedade com base em titulação, e não em posse de fato – assunto ainda não resolvido em países imaturos institucionalmente, como o Brasil. Requer também, além das obrigações contratuais do Estado em relação à sua dívida interna e externa, preservação do poder de compra da moeda.

Sob esse aspecto, no longo prazo, o desempenho das economias no centro do sistema parece bem menos virtuoso do que sugerido implicitamente pela concentração de análises na periferia pecaminosa.

Essas constatações, aplicadas ao Brasil, indicam que, de longe, as violações a direitos de propriedade decorrentes de políticas públicas têm menos que ver com a dívida externa e tudo que ver com inflação crônica e desvalorização cambial. Um real de hoje é equivalente a 2,75 quatrilhões de mil réis pré 1942.

O que dizer das pesquisas de opinião que indicam que a maior preocupação do eleitorado brasileiro, atualmente, seria com o nível da taxa de juros, e não com o recrudescimento da inflação? Tempos perigosos.