CÂMARA DIVULGA ERROS DA PEC 10/2020

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Maria Lucia Fattorelli

Em matéria divulgada pela Agência Câmara, detectamos a repetição de erros contidos na PEC 10/2020 que poderão induzir Deputados(as) a um voto equivocado na PEC 10/2020, que retornou do Senado.

O texto da PEC 10/2020 aprovado no Senado mantém a geração de trilhões de reais de Dívida Pública completamente ilegítima, resultante da transformação de carteira podre de bancos em decorrência da atuação do Banco Central como um mero agente do mercado de balcão! Como se não bastasse, essa aberração da PEC 10, batizada de “PEC do Orçamento de Guerra”, está feita em momento excepcional de calamidade pública, equiparado às excepcionalidades mencionadas no Art. 60, § 1º da Constituição que proíbe emendas à Constituição e impossibilita a devida participação social e democrática 1 .

Nesse texto, fazemos o contraponto da matéria publicada pela Agência Câmara, em partes:

AGÊNCIA CÂMARA:Na versão aprovada pelos senadores, o BC só poderá atuar nos mercados secundários, adquirindo esses títulos privados apenas de quem já detenha os papéis (como bancos e fundos de investimentos).”

CORREÇÃO DA AUDITORIA CIDADÃ DA DÍVIDA: Esse primeiro trecho da matéria da Agência Câmara confirma o que temos dito desde a primeira versão da PEC 10/2020: o dinheiro das compras feitas pelo Banco Central irá para instituições financeiras (bancos e fundos de investimentos), e não para empresas!

O que a matéria não informa é que esses títulos privados poderão ser vendidos pelos bancos ao BC pelo preço que quiserem! O valor dessas compras feitas pelo BC será de R$972,9 bilhões 2 , como informado pelo presidente do Banco Central aos senadores em 09/04/2020, demonstrando que já naquela data ele tinha conhecimento preciso do conteúdo do pacote de créditos privados. O valor informado pelo presidente do BC ao Senado coincide com o valor do levantamento feito pela IVIX Value Creation 3 , o qual revela que a “carteira podre” dos bancos chegava ao valor de quase R$ 1 Trilhão, sem considerar a correção monetária! Se computada essa correção, chegaremos a vários trilhões, pois esses ativos privados vêm sendo acumulados nos bancos há 15 anos, segundo o levantamento!

Assim, além de grande parte desses títulos privados já se encontrarem na “carteira podre” de bancos há vários anos, eles ainda irão lucrar muito com esses papéis podres, pois poderão comprá-los em mercado por preços baixíssimos e vender ao BC por preços muito mais altos.

AGÊNCIA CÂMARA: “A preferência será para a aquisição de papéis emitidos por micro, pequenas e médias empresas, a fim de garantir liquidez para essas companhias.”

CORREÇÃO DA AUDITORIA CIDADÃ DA DÍVIDA: Tal afirmação repete o constou do texto votado em segundo turno no Senado e denota desconhecimento quanto ao tipo de empresa que pode emitir papéis financeiros (debêntures e derivativos que a PEC 10/2020 menciona). Somente grandes empresas – S/A -podem emitir tais papéis, a não ser no caso de empresas de fachada, fantasmas, ou as novas empresas estatais não dependentes que têm sido criadas para operar esquemas financeiros fraudulentos da denominada Securitização de Créditos Públicos (estas costumam ser criadas com capital reduzido e emitem debêntures com garantia estatal elevadíssima).

Adicionalmente, o preço de uma avaliação de rating por uma agência internacional varia de 30 a 50 mil dólares! Uma empresa pequena, ainda que tivesse algum título privado, não conseguiria adquirir uma avaliação de rating 4 . Assim, esse trecho da PEC 10/2020 é uma mentira! E será uma vergonha passar a fazer parte da Constituição!

AGÊNCIA CÂMARA: “Os ativos precisam ter baixo risco (classificados na categoria “BB-” ou superior), e o BC poderá exigir contrapartidas”.

CORREÇÃO DA AUDITORIA CIDADÃ DA DÍVIDA: O texto aprovado no Senado admite que os ativos que serão adquiridos pelo Banco Central tenham classificação em categoria de risco de crédito no mercado local equivalente a BB- ou superior, ou seja, coloca na Constituição que o BC poderá comprar ativos de “GRAU ESPECULATIVO”, que é o significado de BB-!

A inclusão no texto da PEC de que haveria avaliação do crédito privado por uma agência internacional de risco soa como uma enganação para induzir parlamentares a achar que estariam aprovando algo seguro! As agências classificadoras têm tido a sua conduta seriamente questionada, em especial desde a Crise de 2008, por atuarem a favor de seus próprios contratantes, ou seja, os bancos, com evidentes conflitos de interesses. Também têm sido acusadas de grosseiros erros de avaliação, denúncias de venda de pareceres e até fraudes denunciadas pelo Governo dos Estados Unidos da América do Norte 5 . Ademais, será altamente questionável a avaliação, por uma
agência internacional de risco, de derivativos privados emitidos por empresas não-financeiras, sendo que tais ativos sequer são negociados em  bolsas de valores! É evidente a impossibilidade de uma avaliação minimamente séria!

Cabe ressaltar o que recomenda a Anbima em relação à avaliação de risco de créditos privados 6 :

(vii) utilizar o rating e a respectiva súmula do ativo ou do emissor, fornecido por agência classificadora de risco, quando existir, apenas
como informação adicional à avaliação do respectivo risco de crédito e dos demais riscos a que devem proceder, e não como condição suficiente para sua aquisição.

Assim, além de sequer existir avaliação de rating para diversos desses créditos privados, a recomendação da Anbima é no sentido de que tal avaliação, quando existir, deve ser usada apenas como informação adicional e não como condição suficiente para a aquisição do derivativo.

AGÊNCIA CÂMARA: “Segundo o texto, bancos e empresas que venderem títulos serão proibidos de aumentar a remuneração de diretores e conselheiros. Também não poderão pagar dividendos acima do mínimo obrigatório estabelecido em lei”.

CORREÇÃO DA AUDITORIA CIDADÃ DA DÍVIDA: Em primeiro lugar, essa parte ainda será regulamentada pelo Banco Central, conforme consta do caput do Art. 9 o do texto aprovado no Senado, ou seja, não se sabe as condições dessa possível “contrapartida”. Além disso, o texto mantém o pagamento de juros sobre o capital próprio e dividendos até o mínimo obrigatório estabelecido em lei ou no estatuto social, o que é inócuo, dado que o estatuto social pode ser alterado a bel prazer dos interessados até o dia da publicação da PEC. Mantém a remuneração, fixa ou variável, de diretores e membros do conselho de administração, no caso das sociedades anônimas, e dos administradores, no caso de sociedades limitadas, limitando-se a vedar apenas eventual aumento desses ganhos (em alguns casos altíssimo) de tais administradores. Além do mais, tais remunerações podem ser aumentadas livremente até que a PEC seja promulgada.

Será uma vergonha se essa aberração que consta da PEC 10 7 vier a fazer parte da Constituição brasileira!

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1 https://www.extraclasse.org.br/opiniao/colunistas/2020/04/pec-10-acoberta-lavagem-de-trilhoes-de-papeis-podres-
acumulados-nos-bancos/
2 https://www.moneytimes.com.br/ativos-privados-que-bc-pode-comprar-caso-pec-seja-aprovada-somam-r-9729-bilhoes/
3 https://epocanegocios.globo.com/Economia/noticia/2019/11/epoca-negocios-retomada-da-economia-pode-destravar-carteira-
de-r-1-tri-em-creditos-podres.html também disponível em https://auditoriacidada.org.br/grandes-jornais-revelaram-a-existencia-
de-r1-tri-em-papeis-podres-nos-bancos/
4 https://www.youtube.com/watch?v=thS524EqaZE
5 https://veja.abril.com.br/economia/governo-dos-eua-processa-agencia-de-classificacao-de-risco-por-fraude/
6 Anbima – Parecer de Orientação 11/2008, citado na Dissertação de Mestrado Tatiana Guazzelli, disponível em
https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2132/tde-13022014112150/publico/Dissertacao_Mestrado_Tatiana_Guazzelli.pdf
também disponível em https://auditoriacidada.org.br/conteudo/cedula-de-credito-bancario-aspectos-juridicos-de-sua-
negociacao-e-protecao-dos-investidores/
7 Na última versão do texto da PEC 10 votada em segundo turno do Senado o dispositivo que trata dessa autorização ao BC consta
do Art. 8 o do texto. Essa informação é importante porque ao longo da tramitação, tanto o texto do dispositivo como a sua
numeração mudaram várias vezes. Na primeira versão na Câmara constava dos §10º e 11 o do novo Art. 115 acrescentado ao ADCT
pela PEC 10/2020. Ainda na Câmara, passou a constar dos §9º e 10 o do mesmo Art. 115 do ADCT. No Senado, o relator modificou
totalmente o instrumento: em vez de acrescentar dispositivos diretamente ao ADCT, o Senador Anastasia suprimiu a emenda ao
ADCT e a transformou em uma emenda à Constituição, renumerando os artigos e modificando também o texto do dispositivo em
questão. A autorização para o BC atuar no mercado de balcão constou inicialmente do Art. 7 o no Senado e, no texto votado em
segundo turno, constou de seu Art. 8 o .