Interpelação Extrajudicial dirigida ao atual relator do PLP 459/2017, Alex Manente, ao Presidente da Câmara, Arthur Lira e Líderes de todos os Partidos Políticos na Câmara

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INTERPELAÇÃO EXTRAJUDICIAL
dirigida ao atual relator do PLP 459/2017 em plenário da Câmara dos Deputados, ALEX SPINELLI MANENTE (Cidadania/SP), ao Presidente da Câmara dos Deputados, ARTHUR CÉSAR PEREIRA DE LIRA e Líderes de todos os Partidos Políticos e Bancadas na Câmara dos Deputados

 

Assunto: PLP 459/2017 – SECURITIZAÇÃO DE CRÉDITOS PÚBLICOS – Necessidade de alerta a parlamentares que detêm a responsabilidade de votar projeto de lei eivado de obscuridades, redigido de forma cifrada, inteligível e sem a devida clareza acerca de seu verdadeiro objetivo referente à realização de operação de crédito ilegal, o desvio do fluxo de arrecadação tributária e geração de prejuízos aos cofres públicos com danos irreparáveis às gerações atuais e futuras.

Ao Exmo. Sr.
Deputado Federal ALEX MANENTE (Cidadania-SP)
Relator do PLP 459/2017 em Plenário da Câmara dos Deputados Federais
Endereço do Gabinete: Gabinete 205 – Anexo IV – Câmara dos Deputados
Brasília – DF

Por intermédio de seus respectivos presidentes, as seguintes entidades:

  • AUDITORIA CIDADÃ DA DÍVIDA, associação sem fins lucrativos, CNPJ 12.537.204/0001-45, sediada em Brasília, Distrito Federal, no Setor de Autarquias Sul, Quadra 5, Bloco N, Edifício OAB, 1o andar, Asa Sul, CEP 70.070.939, Brasília-DF, composta por dezenas entidades da sociedade civil organizada e centenas de cidadãos voluntários mobilizados por todo o país;
  • SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR – ANDES-SN, CNPJ: 00.676.296/0001-65, sediado no SCS, Quadra 2, Edifício Cedro II, 5o andar, Bloco C, CEP 70.302-914, Brasília-DF;
  • FEDERAÇÃO NACIONAL DAS ENTIDADES DOS SERVIDORES DOS TRIBUNAIS DE CONTAS DO BRASIL – FENASTC, CNPJ 96. 793.146/0001-00, com sede na Rua Sete de Setembro nº 703, conjunto 601, Porto Alegre, RS; e

vêm à presença de V. Exa., apresentar INTERPELAÇÃO EXTRAJUDICIAL, a fim de dar ciência dos graves e relevantes aspectos escondidos no texto do PLP 459/2017.

A necessidade da presente INTERPELAÇÃO EXTRAJUDICIAL decorre do fato de o texto do referido PLP 459/2017 encontrar-se redigido de forma cifrada, inteligível, sem a devida clareza, expondo a risco o(a) parlamentar que vier a aprová-lo, tendo em vista que referido projeto propicia a realização de operação de crédito ilegal, o desvio de arrecadação tributária e, adicionalmente, prejuízos aos cofres públicos e às gerações atuais e futuras.

Não se trata de interferir no direito ao voto de cada parlamentar, que tomará, sob sua exclusiva responsabilidade, a decisão de aprovar ou não o referido projeto. A Interpelação Extrajudicial visa tão somente dar conhecimento dos diversos e graves aspectos relevantes escondidos no texto do referido projeto e assegurar que V. Exa., na condição de relator responsável pelo relatório do referido projeto em Plenário da Câmara dos Deputados Federais e/ou como presidente da Câmara dos Deputados ou líder de Partido Político ou Bancada nessa Câmara Federal, tome conhecimento do verdadeiro teor do PLP 459/2017, para que possa votar conscientemente e orientar corretamente aos(as) parlamentares integrantes de seus respectivos partidos.

           O PLP 459/2017 (PLS 204/2016 no Senado) visa recepcionar, na ordem legal e jurídica do Brasil, práticas flagrantemente inconstitucionais e lesivas, já adotadas por alguns entes federados e que vêm causando enormes prejuízos ao erário público e a gerações atuais e futuras, como alertado pelo Tribunal de Contas da União (TC 043.416/2012-8) e Ministério Público de Contas (TC 016.585/2009-0), a serem seriamente agravados no caso de aprovação do referido projeto.

Diversos órgãos de controle regionais também têm questionado o teor da “engenharia financeira” de que trata o PLP 459/2017, a exemplo dos Tribunais de Contas de Minas Gerais, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, entre outros, como constou de ALERTA enviado a todos os deputados e deputadas federais em dezembro de 2017, logo que o PLP 459/2017 passou a tramitar na Câmara dos Deputados, disponível em https://auditoriacidada.org.br/conteudo/alerta-aos-deputados-e-deputadas-federais-pela-rejeicao-ao-plp-459-2017-que-trata-da-securitizacao-de-creditos-pls-204-2016-no-senado/ . Cabe ressaltar que o Tribunal de Contas do Paraná manteve a decisão que suspendeu definitivamente a cessão de créditos tributários naquele Estado ( https://auditoriacidada.org.br/tce-mantem-determinacao-de-que-estado-do-parana-nao-ceda-direitos-creditorios/) e o Estado de Goiás interrompeu e suspendeu o processo de implantação do esquema de securitização naquele Estado  https://auditoriacidada.org.br/interrompida-a-implantacao-do-esquema-de-securitizacao-de-creditos-em-goias/ ), devido às graves consequências detectadas em relação ao funcionamento do esquema e o elevadíssimo custo com taxas de estruturação, administração etc. que superavam R$325 milhões.

Embora o PLP 459/2017 signifique uma burla a toda a legislação de finanças do país, o seu texto cifrado chegou a ser aprovado no Senado, onde tramitou sob o número PLS 204/2016, e sua constitucionalidade sequer foi analisada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) daquela Casa!

Na Câmara dos Deputados, o referido projeto também não foi devidamente analisado e debatido – como seria indispensável, dada a complexidade e graves consequências da matéria – pelo conjunto de parlamentares das Comissões de Constituição e Justiça ou pela Comissão de Finanças e Tributação, indo diretamente a Plenário.

Ao longo dos últimos anos, diversas foram as iniciativas para esclarecer os danos desse esquema e suas graves consequências, a exemplo de Audiências Públicas realizadas tanto no Senado Federal como na Câmara dos Deputados, disponíveis na íntegra em https://www.youtube.com/watch?v=JeosJzoDZsA e https://www.youtube.com/watch?v=2E177f3ztyU&list=TLGGAjsGt5Lasm8xODA0MjAyNA .

Cabe ressaltar a exposição do então juiz federal e hoje desembargador do Prof. Dr. Antônio Gomes de Vasconcelos que definiu o esquema como uma verdadeira pirotecnia linguística (https://auditoriacidada.org.br/video/audiencia-publica-na-cft-professor-define-como-pirotecnia-linguistica-plp-459-2017/ ) e da coordenadora nacional da Auditoria Cidadã da Dívida, que demonstrou como o esquema de securitização opera o desvio de recursos públicos por fora dos controles orçamentários (https://auditoriacidada.org.br/video/fattorelli-fala-sobre-plp-459-2017-em-audiencia-publica-na-camara-dos-deputados/) .

Também foram produzidos folhetos explicativos amplamente distribuídos a parlamentares, disponíveis em https://auditoriacidada.org.br/conteudo/folheto-consignado-de-recursos-publicos/ , https://auditoriacidada.org.br/conteudo/folheto-explica-plp-459-2017/ e https://auditoriacidada.org.br/conteudo/plp-459-2017-inconstitucional-e-lesivo-aos-cofres-publicos/ , por exemplo.

O projeto de lei PLP 459/2017, sob falsa propaganda de favorecer entes federados, esconde a “engenharia financeira” que na prática envolve, ao mesmo tempo:

(1) a realização de operação de crédito disfarçada, extremamente onerosa e não expressamente autorizada;
(2) o desvio do fluxo de arrecadação de créditos tributários ou não tributários pagos pelos contribuintes, durante o seu percurso na rede bancária, como garantia de pagamento da referida operação de crédito ilegal de forma extremamente onerosa, e, adicionalmente,
(3) a cessão fiduciária de créditos públicos, ou seja, transferência de propriedade do fluxo de arrecadação, de tal forma que grande parte da arrecadação tributária sequer alcançará os cofres públicos e será desviada durante o percurso desses recursos pela rede bancária para um grupo de contas vinculadas ao esquema, e o ente público perderá o controle sobre esses recursos desviados.

           Para não revelar o que está por trás desse grave projeto, o primeiro artigo do PLP 459/2017 modifica artigo da Lei 4.320 para o seguinte texto:

Art. 39-A. A União, o Estado, o Distrito Federal ou o Município poderá ceder ONEROSAMENTE, nos termos desta lei e de sua própria legislação, DIREITOS ORIGINADOS de créditos tributários e não tributários, inclusive quando inscritos em dívida ativa, a PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO ou a fundos de investimento regulamentados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

No entanto, o texto do projeto não especifica, por exemplo:

  • Qual é o ônus?
  • Quais direitos são cedidos?
  • Quem são as pessoas jurídicas de direito privado?

Por trás do termo “onerosamente” está escondido o comprometimento com vultosas garantias públicas que superam em muitas vezes o valor da operação de crédito ilegal, causando enorme dano às contas públicas, como fartamente provado durante a CPI da PBH ATIVOS S/A realizada pela Câmara Municipal de Belo Horizonte, cujo prejuízo está sendo inclusive discutido em Ação Popular em andamento na esfera judicial (https://auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2023/04/IMPUGNACAO-ACAO-POPULAR-PBH-ATIVOS-SA.pdf).

Por trás da cessão de “direitos originados” de créditos está a entrega do fluxo da arrecadação tributária mediante contrato de cessão fiduciária que corresponde à transferência de propriedade do fluxo da arrecadação, a qual leva ao desvio e sequestro de recursos públicos durante o seu percurso pela rede bancária e antes de alcançar os orçamentos públicos! Observe que o “crédito” não é cedido, mas sim o “direito originado” do crédito, que corresponde ao produto de sua arrecadação. Esta cessão corresponde, na prática à entrega de GARANTIA EXPLÍCITA POR PARTE DO ENTE PÚBLICO, a qual se estende a obrigações futuras de reposições e substituição de créditos cedidos e não adimplidos, como fartamente comprovado em Análise Documental disponível em https://auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2023/04/Comprovacao-das-explicitas-garantias-dadas-pelo-Estado-ao-esquema-de-securitizacao.pdf .

A pessoa jurídica de direito privado mencionada no texto do projeto é uma empresa estatal que está sendo criada em cada ente federado para operar essa perversa “engenharia financeira”, como já identificado em diversos entes federados, por exemplo: PBH Ativos S/A; MGi – Minas Gerais Participações S/A; CPSEC – Cia. Paulista de Securitização S/A; CFSEC – Cia Fluminense de Securitização S/A; Goiás Parcerias S/A; Recda S/A em Recife; InvestPoa em Porto Alegre, entre várias outras.

Portanto, a cessão de que trata o PLP 459/2017 é a CESSÃO DO DINHEIRO QUE ENTRA NO BANCO, JÁ PAGO PELO CONTRIBUINTE! Os operadores do esquema passam a se apoderar de parte da arrecadação tributária (ou não tributária) antes mesmo que estes recursos públicos alcancem os cofres do ente federado!

Dessa forma, o crédito tributário – seja de difícil ou de fácil cobrança – continuará sendo constituído, fiscalizado, cobrado e administrado pelos órgãos da administração tributária (Secretaria da Receita Federal ou Estaduais ou de Finanças municipais; Procuradoria da Fazenda Nacional, estaduais ou municipais). Todo o mérito pela arrecadação tributária continuará sendo dos órgãos da administração tributária federal, estadual ou municipal, porém, o fruto da arrecadação não irá mais integralmente para os cofres públicos, caso aprovado o PLP 459/2017.

Embora o PLP 459/2017 inclua a palavra “onerosamente”, que serve de guarda-chuva para todo e qualquer ônus decorrente dessa operação, o referido projeto tenta esconder o compromisso com garantias e indenizações na confusa redação do inciso IV:

IV – realizar-se mediante operação definitiva, isentando o cedente de responsabilidade, compromisso ou dívida de que decorra obrigação de pagamento perante o cessionário, de modo que a obrigação de pagamento dos direitos cedidos permaneça, a todo o tempo, com o devedor ou contribuinte

Cabe ressaltar que o que diz o citado inciso IV é simplesmente que o contribuinte que deve à Fazenda Pública continuará devendo, e o ente federado não irá quitar o seu débito, isto é, a obrigação de pagamento do crédito tributário continuará sendo do contribuinte perante a Fazenda Pública.

No entanto, as vultosas garantias e indenizações que a Fazenda Pública assume nessa operação estão escondidas por trás do termo “onerosamente”, que consta do projeto de lei e que serve de guarda-chuva para todo e qualquer ônus decorrente dessa operação.

Na prática, caso parte do fluxo de arrecadação cedido não se realize, o ente federado terá que substituir o referido valor por outro que tenha sido arrecadado, ou até indenizar o investidor, conforme comprovado documentalmente pela CPI da PBH Ativos S/A (Relatório da ACD disponível no link https://auditoriacidada.org.br/conteudo/relatorio-preliminar-especifico-de-auditoria-cidada-da-divida-no-2-2017/) e, posteriormente, em Análise Documental fundamentada, disponível em https://auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2023/04/Comprovacao-das-explicitas-garantias-dadas-pelo-Estado-ao-esquema-de-securitizacao.pdf .

E não se pode dizer que o que ocorreu em Belo Horizonte poderia não ocorrer em outras localidades. Estamos diante de um mesmo modelo, que já está em funcionamento em alguns entes federados e que o objetivo do PLP 459/2017 é dar “maior segurança jurídicaàs operações de cessão fiduciária de créditos “que já estão sendo efetuadas por alguns estados e municípios”, conforme constou expressamente da exposição de motivos do PLS 204/2016:

            Contrariamente à falsa propaganda de que tal projeto viria acelerar a arrecadação de créditos de difícil cobrança, o PLP 459/2017 desvia arrecadação tributária e viabiliza a realização de operação de crédito ilegal e não devidamente autorizada. Utiliza empresa estatal criada para operar engenharia financeira que possibilita o ingresso de algum dinheiro rápido por meio de empréstimo ilegal, porém, a um custo onerosíssimo e inconstitucional que afeta negativamente as finanças públicas atuais e futuras.

Em troca do empréstimo ilegal (que não é contabilizado como dívida pública, mas sim como “venda de ativo”, ou seja, venda de parte da arrecadação de créditos tributários e não tributários), o ente federado entrega, como garantia, a propriedade do fluxo da arrecadação de créditos, que é desviado, conforme indicado no diagrama a seguir.

            Os entes federados perdem o controle sobre a arrecadação de créditos tributários (parcelados ou não, inscritos ou não em Dívida Ativa), líquidos e certos, devido à cessão do fluxo de arrecadação desses créditos mediante contratos de alienação fiduciária ou outras ordens à rede arrecadadora. Esse desvio ocorre durante o percurso desses créditos pela rede bancária, para contas vinculadas ao esquema, que ficam em parte sob controle exclusivo de investidores privilegiados que adquirem os papéis emitidos pelo esquema.

Sem esse esquema, a totalidade dos recursos arrecadados chegaria integralmente aos cofres públicos. Com o esquema, somente uma parte dos recursos arrecadados alcança os cofres públicos, pois a outra parte é desviada para investidores privilegiados e sequer irá compor o orçamento público. Com isso, toda a legislação de finanças do país, que é estruturada no princípio do orçamento único, está sendo burlada por esse esquema, razão pela qual a aprovação desse projeto será um escândalo.

Inúmeras aberrações legais embutidas nessas operações ferem a Constituição Federal, o Código Tributário Nacional, a Lei de Responsabilidade Fiscal e toda a legislação de finanças do país. Por isso, graves questionamentos por parte de órgãos de controle federais, como já mencionado anteriormente e inclusive publicado em jornais https://monitormercantil.com.br/orgaos-de-controle-questionam-esquema-da-securitizacao-de-creditos/ .

A contratação disfarçada de dívida pública usa a empresa estatal criada para operar esse esquema. Essa “estatal não dependente”, pessoa jurídica de direito privado (a exemplo das que já estão operando em Belo Horizonte – PBH Ativos S/A – e em São Paulo – CPSEC S/A – entre outras), emite papéis financeiros, debêntures sênior, que oferecem juros elevadíssimos e são vendidas a investidores privilegiados sob a modalidade de “esforços restritos de colocação”, sem qualquer propaganda, de tal forma que somente alguns grandes operadores financeiros privilegiados tomam conhecimento e têm acesso a esse negócio.

Os juros oferecidos nessas debêntures são extorsivos! No caso da PBH ATIVOS S/A foram equivalentes a IPCA + 11% ao ano, ou seja, seria completamente insustentável, mas possui garantia total do ente federado, que entregará o fluxo de sua arrecadação tributária como garantia! Dessa forma, os recursos que deixarão de chegar aos cofres públicos beneficiarão o já lucrativo sistema financeiro! Um banco compra essas debêntures, paga à empresa criada para operar o esquema, esta fica com uma parte e repassa a maior parte ao ente federado, como mostra o diagrama a seguir.

            No caso de Belo Horizonte o banco BTG Pactual S/A, que foi o coordenador líder da operação de lançamento das debêntures, comprou a totalidade desses papéis por R$ 230 milhões. A empresa PBH Ativos S/A ficou com R$ 30 milhões e repassou R$ 200 milhões para o município de Belo Horizonte. O mecanismo foi uma mera fachada para o município obter esses R$ 200 milhões no mercado. Em troca desse empréstimo ilegal, o Município de Belo Horizonte comprometeu-se com garantias no montante de R$880 milhões, corrigidos pelo IPCA, mais 1% ao mês sobre esses R$ 880 milhões! Como esse empréstimo não é contabilizado como dívida, o seu pagamento se dá por fora, com aqueles recursos desviados ainda na rede bancária; um verdadeiro escândalo que está sendo discutido em ação judicial em andamento na esfera judicial https://auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2023/04/IMPUGNACAO-ACAO-POPULAR-PBH-ATIVOS-SA.pdf.

Caso não tivesse sido implementado esse esquema em Belo Horizonte, no período de abril/2014 a junho/2017 o município teria quase R$ 70 milhões a mais em caixa! Ou seja, numa operação de R$ 200 milhões, em apenas 3 anos, o município já teve perda comprovada de cerca de R$ 70 milhões, conforme dados oficiais analisados pela CPI da Câmara Municipal de Belo Horizonte, que permitiu acesso a escrituras, documentos contábeis e contratos da PBH Ativos S/A, cuja análise revelou que referida empresa é mero veículo de passagem para confundir e dificultar a visualização das operações ilegais e fraudulentas que envolvem o desvio e sequestro de recursos públicos, além da perda de controle sobre a arrecadação tributária e danos financeiros efetivos.

Em apenas 3 anos e dois meses de funcionamento e com uma operação de R$ 200 milhões o município de Belo Horizonte teve perda efetiva de cerca de R$ 70 milhões, já que sem o esquema teria recebido R$ 531,5 milhões e, devido ao esquema recebeu R$ 462 milhões no período. O impacto disso em todo o Brasil, ao longo de um período de tempo maior, será desastroso e aniquilará as finanças de todos os entes federados, com o agravante de acobertar esquema fraudulento, porque contratar dívida dessa forma disfarçada é crime, segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal. Além disso, devido à alienação fiduciária dos créditos parcelados a receber, essa perda continuará ocorrendo em escala exponencial ao longo dos anos.

O BTG Pactual S/A foi ao mesmo tempo o coordenador líder da emissão das debêntures pela PBH Ativos S/A e ele mesmo adquiriu a totalidade dessas debêntures. Também ele é que possui poderes sobre as Contas Vinculadas, que não podem receber qualquer interferência do Município nem da própria PBH Ativos S/A. A operação não foi registrada na CVM, com base na questionável Instrução CVM 476, que afronta o art. 19 da Lei 6.385/76.

O esquema da securitização envolve, adicionalmente, garantias públicas descomunais! Além da entrega do controle sobre a arrecadação dos créditos parcelados, caso algum desses créditos deixe de ser arrecadado, o Município se compromete com garantias e indenizações, ou seja, terá que repor com outros créditos ou indenizar com recursos, como comprovam os contratos analisados pela CPI da PBH Ativos S/A.

Essas garantias são documentadas por outros papéis também emitidos pela empresa estatal criada para operar o esquema – as debêntures subordinadas – as quais são entregues pela empresa ao ente federado, em troca do compromisso de garantia no montante exigido pelo mercado. No caso de Belo Horizonte essa garantia foi de R$ 880 milhões, acrescidos de atualização monetária calculada pelo IPCA e mais juros mensais de 1% sobre a totalidade desse montante. Esse dado indica o quanto essa operação é onerosa: para receber, de forma ilegal, R$ 200 milhões, o município se comprometeu com R$ 880 milhões atualizados e remunerados! Os dados demostraram que em 3 anos os R$ 200 milhões foram pagos, mas o esquema prosseguirá ao longo de 9 anos…

Ao contrário da propaganda enganosa de que o esquema da SECURITIZAÇÃO DE CRÉDITOS iria livrar o Estado de créditos podres, o esquema representa um grande rombo às contas públicas e a perda do controle sobre a arrecadação tributária. O ônus de cobrar o crédito tributário continua a cargo dos órgãos públicos, esteja ele inscrito em Dívida Ativa (cobrança judicial ou extrajudicial) ou não, seja de difícil arrecadação ou não. Todo esse trabalho de arrecadar, fiscalizar e cobrar continua a cargo do setor público, como aliás consta textualmente do projeto de lei. O que está sendo cedido de fato pelos entes federados não é o ônus de cobrar créditos de difícil arrecadação, como diz a propaganda falaciosa, mas sim o próprio produto da arrecadação tributária; o dinheiro que chega à rede arrecadadora, mediante a alienação fiduciária do fluxo da arrecadação.

O texto dos projetos de lei menciona a cessão de “direitos originados de créditos tributários e não tributários”, OMITINDO QUE TAIS “DIREITOS ORIGINADOS” CORRESPONDEM AO RECURSO JÁ ARRECADADO.

Estamos diante de um escândalo: esse PLP 459/2017 autoriza o desvio do dinheiro arrecadado de contribuintes, isto é, desvio do recurso já pago, ingressado na rede bancária. Esse grave fato está escondido no texto do referido projeto de lei, disfarçado na expressão “DIREITOS ORIGINADOS” de créditos. Esses “direitos” correspondem ao produto da arrecadação!

Ademais, esta entrega do produto da arrecadação é definitiva e formalizada por contrato de cessão fiduciária dos créditos, o que implica na transferência da propriedade e controle sobre os créditos públicos, conforme comprovado documentalmente no estudo da PBH ATIVOS S/A durante CPI da Câmara Municipal de Belo Horizonte, conforme contratos oficiais[1] , e  vem acompanhada do compromisso de garantia de adimplemento dos créditos, o que implica em operação “com retenção dos riscos” pelo ente federado, conforme comprovado por Análise Técnica Documental fundamentada disponível em https://auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2023/04/Comprovacao-das-explicitas-garantias-dadas-pelo-Estado-ao-esquema-de-securitizacao.pdf .

O PLP 459/2017 descumpre a Constituição Brasileira e todo o sistema normativo que compõe o arcabouço de proteção para as finanças públicas, uma vez que pretende conferir ares de legalidade à prática de ato lesivo ao erário público resultante de:

(a) contratação de operação de crédito ilegal, não autorizada, onerosíssima e não transparente;
(b) comprometimento do ente federado com vultosas garantias, indenizações, e, especialmente,
(c) desvio do fluxo de arrecadação tributária e respectivo sequestro de grande parte desses recursos em favor de investidores privilegiados durante o seu percurso pela rede bancária.

            Ressalte-se que apesar dessa afronta escandalosa à Constituição e todo o ordenamento financeiro do país, o referido PLS 204/2016 tramitou no Senado e chegou a ser aprovado por 43 votos, porém, sequer tramitou pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado!

A tramitação do PLP 459/2017 na Câmara dos Deputados também deixou de ser apreciado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, onde certamente seria imediatamente rejeitado, pois (a) atende exclusivamente aos interesses da especulação financeira e da financeirização do Estado, com grave lesão ao  interesse público; (b) contraria frontalmente os princípios da publicidade e transparência abrindo as portas para corrupção desenfreada; (c) significa a perda do controle sobre a parcela da arrecadação tributária cujo fluxo é cedido, com grave ofensa às normas de finanças públicas e lesão aos cofres públicos; (d) promove a antecipação de receita pública de forma extremamente onerosa e ilegal, gerando perdas financeiras vultosas e irreparáveis, além do comprometimento por tempo indefinido de todas as administrações e gerações futuras.

Todas as fases da operação de crédito, resumidas a seguir, foram cabalmente comprovadas por diversos documentos recebidos pela CPI da PBH Ativos S/A:

  • RECEBIMENTO DO EMPRÉSTIMO: o Município de Belo Horizonte recebeu R$ 200 milhões da PBH ATIVOS S/A (quando esta vendeu as debêntures sênior ao banco BTG Pactual S/A por R$ 230 milhões, comprometendo-se a pagar escandalosos juros equivalentes a IPCA + 11% ao ano).
  • PAGAMENTO DO EMPRÉSTIMO: que se comprovou ter sido efetuado mediante sequestro de cerca de metade dos recursos arrecadados de contribuintes no período analisado, os quais foram desviados, por fora do orçamento, para as Contas Vinculadas criadas por essa “engenharia financeira”. No período analisado, de abril/2014 a junho/2017, esse sequestro de recursos destinados ao banco BTG Pactual S/A somou R$ 259,96 milhões.
  • VULTOSA REMUNERAÇÃO: comprovada pela disparidade entre o valor recebido pelo Município de Belo Horizonte (R$ 200 milhões) e o valor que este se comprometeu entregar (R$ 880,32 milhões, mais IPCA, mais 1% ao mês), e, adicionalmente, pela perda comprovada no período analisado, de cerca de R$ 70 milhões.

A comprovação acerca da realização de operação de crédito, da concessão de garantias e da cessão fiduciária de créditos parcelados arrecadados, foi fartamente comprovada durante a CPI da PBH Ativos S/A realizada pela Câmara Municipal de Belo Horizonte, conforme constou do relatório apresentado pela Auditoria Cidadã da Dívida àquela CPI, disponível no link https://auditoriacidada.org.br/conteudo/relatorio-preliminar-especifico-de-auditoria-cidada-da-divida-no-2-2017/, e inicial da ação popular em andamento na esfera judicial, disponível em https://auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2023/04/IMPUGNACAO-ACAO-POPULAR-PBH-ATIVOS-SA.pdf, peças que comprovam e documentam o escândalo contido no esquema financeiro que o PLP 459/2017 visa “legalizar”.

Diante do exposto, estamos cumprindo a nossa parte e garantindo que Vossas Excelências, no exercício de suas respectivas responsabilidades, seja na condição de relator da matéria em Plenário da Câmara dos Deputados, ou como presidente da Câmara dos Deputados, ou líder de partido político ou bancada da Câmara dos Deputados, tome conhecimento da inconstitucionalidade flagrante, ofensa a toda a legislação que rege as finanças em nosso país e gravíssimos riscos para todos os entes federados e para a sociedade embutidos no texto cifrado e inteligível do PLP 459/2017, além de flagrantes ilegalidades, tais como:

a) o termo “onerosamente” constante do PLP 459/2017 é um verdadeiro cheque em branco que acobertará todo e qualquer ônus decorrente das operações envolvidas na “engenharia financeira” da denominada “Securitização de Créditos Públicos”;
b) a criação de empresa estatal para esse fim implica evidente desvio de finalidade (art. 173, CR/88);
c) sob o signo de “estatal não dependente” cria-se “estatal dependente”, regida pelo direito privado, constituindo-se em expediente para se esquivar do controle da Lei de Responsabilidade Fiscal;
d) a securitização de crédito público constitui mecanismo de geração de dívida pública mediante subterfúgio de operação de crédito disfarçada que não poderia ser realizada sem autorização expressa dos órgãos competentes;
e) por meio do artifício da securitização tal como se pretende “legalizar” procede-se à transferência, o desvio e o sequestro de recursos públicos arrecadados, durante o seu percurso pela rede bancária e antes que estes recursos alcancem os cofres públicos;
f) a emissão de derivativos financeiros (debêntures) por empresa estatal, com garantia pública real e com “retenção de riscos” é vedada pela Lei de Responsabilidade Fiscal (art. 35);
g) a constituição de garantia pelo ente público sem autorização legislativa e verificação do Senado é ilegal;
h) a entrega de parte dos recursos públicos (multas e juros sobre direitos creditórios) sem motivação legal implica renúncia de crédito tributário vedada pela legislação;
i)a cessão fiduciária dos direitos creditórios corresponde à transferência de propriedade da arrecadação desses créditos, perdendo o ente federado o controle sobre essa parte da arrecadação;
j) a cessão onerosa, nos moldes que se pretende “legalizar”, não pode ser procedida sem averiguação dos órgãos de controle;
k) a perda do controle sobre a arrecadação tributária em virtude da “Cessão Fiduciária de Créditos”, com renúncia de direitos em caráter irrevogável e incondicional é flagrantemente ilegal;
l) o esquema de securitização de créditos públicos que se pretende “legalizar” implica em desobediência das exigências constitucionais relativas ao orçamento público, às normas gerais de direito financeiro público da Lei no320/64 e à Lei Complementar no 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), Lei 8.666/93 (Lei de Licitações); Código Tributário Nacional e leis orçamentárias, como já mencionado anteriormente.

            Diante do exposto, é imprescindível que V. Exa. no exercício de suas respectivas responsabilidades, seja na condição de relator da matéria em Plenário da Câmara dos Deputados, ou como presidente da Câmara dos Deputados, ou líder de partido político ou bancada da Câmara dos Deputados, tome conhecimento do verdadeiro conteúdo do projeto de lei PLP 459/2017, que visa “dar maior segurança jurídica” à mesma “engenharia financeira” que já vem operando em alguns entes federados do país, com enormes danos legais, financeiros, econômicos e morais, conforme já apurado inclusive por uma CPI em Belo Horizonte  (https://auditoriacidada.org.br/conteudo/relatorio-preliminar-especifico-de-auditoria-cidada-da-divida-no-2-2017/) e inicial da ação popular em andamento na esfera judicial (https://auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2023/04/IMPUGNACAO-ACAO-POPULAR-PBH-ATIVOS-SA.pdf), razão pela qual apresentamos-lhe a presente INTERPELAÇÃO EXTRAJUDICIAL, para que surta  todos os efeitos jurídicos e legais.

Brasília, 02 de maio de 2024.

 

[1]

Contrato de Cessão Fiduciária de Direitos Creditórios, Vinculação de Receitas e outras Avenças 01/04/2014 https://auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2018/11/Contrato-de-Cess%C3%A3o-Fiduci%C3%A1ria_registrado-RTD-de-BH_16abril14-3.pdf
Primeiro Aditamento 29/01/2016 https://auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2018/11/1%C2%BA-Aditivo-ao-Contrato-de-Cess%C3%A3o-Fiduci%C3%A1ria-registrado-BH.pdf
Segundo Aditamento 25/04/2016 https://auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2018/11/PBH-Ativos-2%C2%BA-Aditivo-ao-Contrato-de-Cess%C3%A3o-Fiduci%C3%A1ria_reg.-RTD-BH.pdf
Contrato de Custódia de Recursos Financeiros e Administração de Contas Vinculadas 01/04/2016 1ª parte: https://auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2018/11/Contrato-de-Cust%C3%B3dia_registrado-RTD-RJ_parte-1.pdf

 

2ª parte: https://auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2018/11/Contrato-de-Cust%C3%B3dia_registrado-RTD-RJ_parte-2.pdf

 

3ª parte: https://auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2018/11/Contrato-de-Cust%C3%B3dia_registrado-RTD-RJ_parte-3.pdf

 

4ª parte: https://auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2018/11/Contrato-de-Cust%C3%B3dia_registrado-RTD-RJ_parte-4.pdf

 

5ª parte: https://auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2018/11/Contrato-de-Cust%C3%B3dia_registrado-RTD-RJ_parte-5.pdf

Primeiro Aditamento 29/01/2016 https://auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2018/11/1%C2%BA-T.A.-CONTRATO-DE-CUSTORIA-DE-RECURSOS-FINANCEIROS-E-ADM-DE-CONTAS-VINCULADAS.pdf
Segundo Aditamento 25/04/2016 https://auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2018/11/PBH-Ativos-2%C2%BA-Aditivo-ao-Contrato-de-Adm.-de-Contas_reg-RTD-BH.pdf